Por que aposto em Hamilton de novo

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Por dever profissional e por curiosidade, tenho acompanhado a perspectiva real de ver um brasileiro (Gabriel Medina) tornar-se campeão mundial de surfe. E isso me faz pensar em Bernie Ecclestone.

Faz cinco dias que procuro notícias sobre a última etapa do Campeonato Mundial de Surfe e encontro basicamente as mesmas informações: por conta das condições do mar no Havaí, a etapa foi adiada para amanhã. Minha mais recente e profunda relação com o surfe é a canção “Menino do Rio”, composição de Caetano Veloso que a então Baby Consuelo imortalizou no início dos anos 1980.

Por dever profissional e por curiosidade, tenho acompanhado a perspectiva real de ver um brasileiro – Gabriel Medina, no caso – tornar-se campeão mundial de surfe. Só nos resta esperar que o mar reúna condições ideais para o tira-teima entre o brasileiro e dois veteranos. E, desculpem-me, mas isso me faz pensar em Bernie Ecclestone.

Porque, afinal de contas, a Fórmula 1 (ou o futebol, ou a NBA) não seria o sucesso comercial que se tornou se não soubesse quando e se suas corridas (ou jogos) aconteceriam. Primeiro, fico com dó desses rapazes bronzeados e de cabelos clareados pelo sol, com a ajudinha providencial da água oxigenada. Porque associo sua imagem com a de náufragos à espera de um bote salva-vidas.

A associação de ideias decorre da praia, claro. Mas nenhum deles ali está famélico, à espera de salvação, e todos sabem nadar. E começo a substituir o dó pela inveja, e penso que deve ser muito melhor curtir a praia de Pipeline e, sei lá, cara, cair no mar quando pintar a chance, sem estresse, sacou? Melhor do que sair correndo do Brasil para o deserto de um emirado, ou de Mônaco para muitas horas de voo até o Canadá, ou do Japão para os Estados Unidos. Não sei quanto ganham os meninos do Rio de hoje, mas suspeito que seja bem menos do que recebem os pilotos mais prestigiados do grid. E me ponho a pensar que estes, os ricos, talvez invejem momentaneamente a vida de sol e mar de seus colegas das pranchas.

Mas fizeram suas escolhas, e não devem estar insatisfeitos com elas. Lewis Hamilton amadureceu, fez a escolha certa ao trocar a McLaren pela Mercedes no exato momento em que a nova equipe começava a ascender na Fórmula 1. Como Hamilton havia feito no final de 2012, Sebastian Vettel também abandonou o ninho e abraçou o desafio de ser o novo alemão vencedor na Ferrari.

Nos dois casos, ambas as mudanças foram vistas como escolhas financeiras: pratas da(s) casa(s), o inglês e o alemão não pareciam satisfeitos com seus rendimentos e buscaram capitalizar suas carreiras. Nesse sentido, a escolha de Hamilton foi mais ousada: saiu da McLaren com um único título, ainda precisando medir-se consigo mesmo para confirmar que o campeonato de 2008 não era do tipo “raio que cai só uma vez”. Vettel tem menos a perder: quatro títulos mundiais, vários recordes, já tem seu nome inscrito na história de forma incontestável (mas, se quiserem contestar, a caixa de comentários está aí para isso). É o goleiro que catou tudo durante o jogo e vai para a cobrança de pênaltis. Se pegar um, unzinho que seja, está no lucro. Reerguer a Ferrari será um bônus – tremendo bônus, claro – mas se não o fizer, não manchará a carreira por isso.

O domínio da Mercedes parece longe de acabar, principalmente porque o ano de 2015 não representa uma ruptura com a temporada anterior em termos de regulamento técnico. Tendo um carro que é bom de aerodinâmica e com o melhor motor da temporada, a Mercedes deve continuar alguns passos à frente da concorrência. Porque, convenhamos, provavelmente guarda o pulo do gato das unidades de força para si. Por isso, não, não acredito que a Williams ameace esse domínio no próximo ano. Acredito que Felipe Massa e Valteri Bottas continuem tendo chances de poles, pódios e até de vitória, mas ainda como coadjuvantes da Mercedes.

E por que aposto em Hamilton e não em Nico Rosberg? Sinceramente, acho que fomos longe demais nas comparações entre os dois e a mítica dupla da McLaren formada por Ayrton Senna e Alain Prost. Hamilton não é Senna, Rosberg não é Prost. Mas, se há algo em Hamilton que o aproxime do brasileiro é seu desejo de vencer, lançando mão inclusive de movimentos nos bastidores da equipe.

Hamilton enquadrou Rosberg em 2014, dentro da equipe, exercendo uma autoridade que provavelmente ele mesmo se outorgou, ainda que o alemão tenha feito corridas muito boas. Rosberg é bom. Hamilton é marvado. O espírito de Hamilton pode tirá-lo do prumo, assim como uma sequência de problemas técnicos com o carro. Mas Rosberg ainda não me inspira a confiança que um campeão do mundo precisa transparecer. É parafuso que espana, basicamente.

Olhando para a temporada de 2015 agora, três meses antes de seu início, a força que me parece mais próxima da Mercedes é a Red Bull. E justamente porque o regulamento mudou pouco. Acho improvável que Adrian Newey não consiga aproximar seus carros do que o time da Mercedes perpetrou em 2014. Ele fez algo parecido em 2009, quando a Brawn surgiu com a solução do difusor duplo. Talvez (e aqui ofereço, de bandeja, munição para os detratores de Vettel) Newey pudesse ter empreendido essa aproximação ainda neste ano, se o piloto alemão tivesse se entendido melhor com o carro. O australiano Daniel Ricciardo entendeu-se, mas talvez fosse jovem demais e com experiência de menos para capitanear essa virada de jogo. Seria lindo vê-lo fazer isso em 2015.

E seria lindo, também, porque a ascensão de Ricciardo, como a de Bottas, poderia delinear um novo rumo para a Fórmula 1. É magnífico ter tantos campeões do mundo em ação – Hamilton, Vettel, Jenson Button, Kimi Raikkonen e Fernando Alonso. Mas é fato que a Fórmula 1 não coroa um campeão inédito desde 2010. A geração atual, especialmente Button, Raikkonen e Alonso, está no ocaso de suas carreiras. Não quer dizer que não rendam um bom caldo, mas apontam para a inexorável renovação da Fórmula 1. E eu, se tivesse que apontar entre os novatos quais os futuros campeões, não hesitaria em apostar rapidamente em Ricciardo e Bottas. Mas, antes disso, veremos Hamilton campeão mais uma vez.

Encerro aqui minha temporada de colunas no GPTotal em 2014. Agradeço à equipe do site por mais este ano e, especialmente, aos leitores. Voltamos em 12 de janeiro. Ótimas festas e um 2015 maravilhoso para todos!

PS: Nem uma palavra sobre Alonso e Button juntos, na McLaren? Acho que Button não será o zero à esquerda que Raikkonen foi para Alonso, mas não consigo apostar no sucesso da McLaren neste primeiro ano de motor Honda. Pronto, dei a cara para bater um monte de vezes. Eu gosto disso…

Alessandra Alves
Alessandra Alves
Editora da LetraDelta e comentarista na Rádio Bandeirantes desde 2008. Acompanha automobilismo desde 83, embalada pelo bi de Piquet e pelo título de Senna na F3.

3 Comments

  1. Fernando Marques disse:

    Ainda bem que estava errado e o Gabriel Medina faturou o titulo inedito de campeão mundial de surf.
    Fiquei meio cismado pois era tal de foto dele com Neymar, com Pato, com Luciano Hulk e não sei mais quem, todos fora da área do surf querendo aparecer e ganhar alguma coisa cima dele … sei lá …

    Fernando Marques

  2. Mauro Santana disse:

    Belo texto Alessandra!!!

    Bom, a essa altura todos já sabem que o Medina conquistou o caneco, um feito inédito para o Brasil.

    O Piá é Fera!!

    A respeito da F1 2015, nos resta aguardar, e espero que o clima tanto na Mclaren como na Mercedes pegue FOGO!!!

    Abraço!

    Mauro Santana
    Curitiba-PR

  3. Fernando Marques disse:

    Alessandra,

    Ótimas festas e um 2015 maravilhoso para você também.

    Estou um pouco apreensivo com a sorte do Gabriel Medina em Pipeline. Não sou expert no assunto mas acho que tem muita gente, principalmente fora da area, querendo aparecer em cima do sucesso dele. Sei lá. Quero estar errado.

    O ano de 2015 da Formula 1 promete muita coisa. Torço por surpresas. Alguém que encare de frente a Mercedes. Tipo a Mclaren … seria perfeito …

    Daniel Ricciardo ou Valtery Bottas? … sou mais o filandes …

    Fernando Marques
    Niterói – RJ

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