Do cinco para o seis

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Nas últimas quarenta temporadas, os anos terminados em 5 tiveram campeonatos decididos com alguma antecedência, mas foram sucedidos por temporadas históricas terminadas em 6, decididas na última corrida

Nessa época do ano, de novo começo, sempre refletimos como está nossa vida e temos esperanças por melhoras em todos os setores dela. É a esperança que nos move frente às dificuldades, obstáculos e críticas que sofremos ao longo do dia a dia.

Em 2015, a F1 teve um ano esquecível e apanhou de forma até mesmo justificável, devido às suas disputas políticas, regras esdrúxulas e a cobiça de dinheiro e poder por parte do seu organizador-mor e companhia bela. Porém, há esperança. Esperança de que em 2016 não tenhamos uma temporada tão enfadonha e pontuada por disputas extrapista.

E para quem acredita em numerologia, há um alento. Nas últimas quarenta temporadas, os anos terminados em 5 tiveram campeonatos decididos com alguma antecedência, mas foram sucedidos por temporadas históricas terminadas em 6, decididas na última corrida

Até 1973, Niki Lauda era mais um ‘pay driver’ no grid da F1, até fazer duas corridas (Mônaco e Canadá) pela BRM que chamaram a atenção de Enzo Ferrari. Somando-se a isso a indicação de Clay Regazzoni, Lauda foi contratado pelos italianos em 1974.

Rega acabou disputando o título daquele ano com Emerson Fittipaldi, mas Lauda já tinha dado todos os indícios que iria tomar as rédeas da Ferrari. Com sua disciplina e conhecimento técnico, iria transformar, na prática, todo o potencial teórico da escuderia de Maranello numa equipe verdadeiramente de ponta.

Quando o modelo 312T ficou pronto na terceira corrida de 1975, a Ferrari se tornou a equipe a ser batida e Lauda venceu quatro corridas em cinco durante o verão daquele ano, liquidando com Clay Regazzoni, que teve uma incrível série de abandonos, assim como os pilotos das demais equipes da época. Lauda garantiu o seu primeiro título em Monza, na penúltima etapa do ano, mas o austríaco já se preparava para 1976. “Após a temporada, me preparei seis horas por dia para poder enfrentar os meus rivais”, disse Lauda no final de 1975.

E o cenário estava ainda mais promissor para que Lauda dominasse em 1976. Regazzoni sabia que tinha perdido a sua grande oportunidade em 1974 e agora estava relegado a segundo piloto da Ferrari. A Brabham tinha ficado com o vice-campeonato de Construtores, mas Bernie Ecclestone tinha anunciado a parceria com a Alfa Romeo e 1976 seria um ano duro de desenvolvimento para Carlos Reutemann e José Carlos Pace.

Tyrrell e Lotus preparavam seus revolucionários carros para 1976 e 1977, respectivamente: o P34 de seis rodas e carro-asa (desenvolvido secretamente durante a temporada 1976) e, deste modo, não esperavam frutos para aquele ano.

Já a McLaren sofria o golpe de ver seu primeiro piloto, Emerson Fittipaldi, abandonar a equipe no fim de novembro de 1975 para viver o sonho da equipe de sua família.
Mesmo sendo uma estrela da época, Emerson estava fora da briga para 1976. Com todos os grandes pilotos contratados e a temporada começando em um mês, a McLaren teve que se contentar com James Hunt, que tinha feito uma ótima temporada com a Hesketh, mas era mais conhecido pelo seu estilo bon-vivant do que fazia dentro da pista.

Hunt fez poucos testes com a McLaren, equipe que tinha conquistado um título e um vice de pilotos nos dois últimos anos, mas o inglês fez a pole na primeira corrida do ano em Interlagos. Prova vencida por Lauda. Parecia que 1976 seria um ano dominado por Niki Lauda e sua Ferrari, mas o destino quis que aquela temporada que se iniciava quarenta anos atrás se tornasse icônica.

Alain Prost era um piloto incomodado no início de 1985. Com dois vice-campeonatos consecutivos (1983 e 1984) em que liderou a maior parte do certame para perder o título na corrida final, o francês já era chamado de ‘Stirling Prost’ pela imprensa inglesa, por ser o melhor piloto do pelotão, mas não ter nenhum título de F1 na carreira. Ainda havia a pressão de dar o primeiro título mundial de F1 à França.

Porém, Prost parecia ter todos os seus fantasmas exorcizados em 1985. Nelson Piquet teve um ano terrível em termos de confiabilidade em 1984 e em 1985 teria que desenvolver os pneus Pirelli. Niki Lauda teve que enfrentar a preferência da McLaren por Prost para se tornar tricampeão em 1984 por meio ponto, mas o austríaco ficou desencantado com a situação e se desmotivou para 1985. As portas estavam escancaradas para Prost e, mesmo sofrendo uma pressão da Ferrari de Michele Alboreto no meio da temporada, o francês venceu com alguma sobra o seu primeiro título de F1 em 1985, assegurando o campeonato com duas provas de antecedência, em Brands Hatch. Porém, no dia em que conquistou o seu primeiro Campeonato Mundial, Prost viu sinais do que vinha pela frente.

Prost garantiu o título com um quarto lugar, numa prova vencida por Nigel Mansell, a primeira vitória do inglês na F1, com a Williams. A parceria Williams-Honda estava crescendo muito naquele final de ano e garantiria para a equipe vitórias nas três últimas provas da temporada de 1985, sendo duas com Mansell, até então considerado um piloto rápido, mas atrapalhado e até mesmo bobalhão. Só que o inglês estaria bem mais confiante para 1986.

Para melhorar, a Williams receberia em 1986 o bicampeão Nelson Piquet, que saía da sua zona de conforto na Brabham para tentar o terceiro título da carreira. Ayrton Senna deu um verdadeiro show em sua primeira temporada numa equipe de ponta e conquistou tanta moral que vetou Derek Warwick na Lotus e para 1986, teria a equipe toda para si.

Com a aposentadoria de Lauda, a McLaren, que havia dominado as duas últimas temporadas, contratou Keke Rosberg como companheiro de equipe de Prost, que permanecia como primeiro piloto da equipe, que tentaria se manter na ponta por um terceiro ano seguido, motivado e aliviado pelo primeiro título. Estava armado o cenário para 1986, que muitos consideram uma das melhores temporadas da história da F1.

“Por que vou correr para eles, se só os vejo nos meus retrovisores?”, teria argumentado Michael Schumacher ao seu empresário Willi Weber quando este o convencia a aceitar a proposta da Ferrari. Schumacher havia acabado de demolir a concorrência com seu Benetton-Renault e garantia o seu segundo título mundial consecutivo com duas corridas de antecedência. Mesmo a Williams tendo o melhor carro da F1 desde a metade de 1991, apenas dois títulos de pilotos (1992 com Mansell e 1993 com Prost) haviam sido conquistados pela equipe de Grove até 1995, muito pelo enorme talento de Schumacher e pela, digamos, melhor leitura do regulamento por parte da Benetton de Flavio Briatore.

Naquele momento, a Ferrari era carta fora do baralho na briga pelo título, mas Jean Todt, desde 1993 na diretoria, havia apresentado um projeto para tornar a escuderia o melhor time da F1 à médio prazo e Schumacher, mesmo reticente, saiu de sua zona de conforto na Benetton, e se transferiu para a Ferrari no final de 1995, surpreendendo a todos.

Com a trágica morte de Senna em 1994, Damon Hill assumiu o posto de primeiro piloto da Williams, mas o inglês acabou derrotado pelo talento superior de Schumacher em 1994 e 1995, trazendo dúvidas para a equipe de Frank Williams. Dizia-se que qualquer piloto poderia vencer com os supercarros projetados por Adrian Newey, mas a prática não se mostrou verdadeira. A Williams precisava de um anti-Schumacher e a escuderia virou seus olhos para o outro lado do Atlântico. Trouxe o jovem Jacques Villeneuve, recém-campeão da F-Indy e das 500 Milhas de Indianápolis. Como se não bastasse ser bastante promissor, ele carregava um sobrenome mítico de volta à F1.

Ao contrário de Michael Andretti, Villeneuve fez o seu dever de casa e testou milhares de quilômetros para se adaptar ao carro de F1. Não era esperado, porém, que o canadense fosse um forte opositor à Damon Hill, mais adaptado à Williams e que não teria Schumacher tão forte como nos anos anteriores, além de contar com o maior erro da carreira de Briatore: escolher os veteranos e desmotivados Jean Alesi e Gerhard Berger para substituir Schumacher na Benetton.

Porém, Villeneuve surpreendeu o mundo e disputou palmo a palmo o título com Hill, que foi decidido em favor do inglês apenas na última prova do ano. Enquanto via a Williams decidir entre seus pilotos quem seria o campeão de 1996, Schumacher trabalhava incessantemente para fazer ressurgir a Ferrari. Ainda naquele ano, Michael venceria três corridas, inclusive uma obra-prima em Barcelona, debaixo de um dilúvio num carro funcionando com apenas 9 cilindros. O que não se sabia, vinte anos atrás, era que uma Era se iniciava e que quebraria todos os recordes mais tarde da F1. Era o início da Era Schumacher na Ferrari.

Após anos ininterruptos de domínio da Ferrari e de Michael Schumacher, a F1 finalmente conhecia um novo vencedor no final de 2005. Com sua pilotagem sólida e sem erros, o jovem Fernando Alonso quebrava o recorde de Emerson Fittipaldi e se tornava o mais jovem Campeão Mundial de F1 ao derrotar a McLaren de Kimi Räikkönen, garantindo o título na cidade de Emerson, em São Paulo, com duas corridas de antecedência.

Mesmo não tendo o melhor carro por toda a temporada, Alonso conquistou sete vitórias com seu Renault, se aproveitando das várias falhas da McLaren, último carro de Newey na equipe, que, mesmo sendo mais veloz, tinha uma confiabilidade abaixo da crítica, deixando Räikkönen várias vezes na mão, tanto na classificação como nas corridas.

Mas o que havia acontecido com Michael Schumacher e a Ferrari? Desde 2002, quando a Ferrari fez mais pontos no Mundial de Construtores do que todas as demais equipes somadas, Max Mosley, presidente da FIA, apresentava ‘Pacotões’ anuais para dar ‘emoção’ à F1, mas que nada mais era do que decisões à base da canetada para tentar frear o domínio da Ferrari. Em 2003 quase deu certo, mas Schumacher ainda foi o campeão. Já em 2005, Mosley foi certeiro.

A Bridgestone construía pneus sob medida para o estilo de Schumacher, que fazia voltas voadoras em determinados momentos das corridas: nas primeiras voltas quando liderava a prova e nas voltas anteriores aos seus pit-stops. Schumacher esmagou a concorrência em 2004 com essa fórmula, além do ótimo carro que tinha em mãos. Contudo, com a proibição da troca de pneus programadas em 2005, a Bridgestone não pôde fazer pneus tão extremos e a Michelin se sobressaiu com Renault (Alonso) e McLaren (Räikkönen).

Porém, a Ferrari não veria seu domínio ir embora sem se movimentar. Usando sua força política, trouxe a troca de pneus programada de volta em 2006, fazendo com que a Bridgestone pudesse construir pneus que ajudassem a estratégia da Ferrari novamente. Após anos conturbados e de muita reclamação sobre sua situação dentro da equipe, a Ferrari trocou Rubens Barrichello pelo piloto da casa Felipe Massa, que teria em seu primeiro ano de Ferrari uma única missão: ajudar Michael Schumacher a voltar às vitórias.

O alemão de 37 anos dava claros sinais de que se aposentaria no final de 2006 e gostaria de sair por cima da F1. Porém, Schumacher sabia que teria em Alonso e Räikkönen dois rivais ferrenhos e motivados para se manterem no topo da F1. Era o ‘passado’ contra o ‘presente’ da F1 em disputa dez anos atrás, num campeonato cheio de reviravoltas dentro e fora da pista. Enquanto isso, o ‘futuro’ se desenvolvia na F3 Europeia. Com quinze vitórias em vinte provas, o protegido da McLaren Lewis Hamilton se sagrava campeão da categoria em 2005, enquanto o protegido da Red Bull, Sebastian Vettel, conquistava o título de Novato do Ano. Não demoraria muito para Hamilton e Vettel se juntar a Alonso e Räikkönen como protagonistas na F1.

O cenário para 2016 não se mostra muito animador para que essa regra do “cinco pra seis” se confirme esse ano. A Mercedes venceu de forma absoluta o campeonato de 2015 e com Lewis Hamilton ainda mais confiante, não deu chances ao companheiro de equipe Nico Rosberg, que se mostra um degrau abaixo do inglês. A Ferrari cresceu muito de 2014 para 2015 com a chegada de Vettel, mas ainda se mostra longe do ritmo da Mercedes, assim como a Renault terá muito trabalho para voltar ao nível de dez anos atrás e a Honda terá que tirar um coelho da cartola (algo em torno de 3s) para tirar a McLaren da vexatória situação em que esteve ao longo de todo o ano passado.

Contudo, enquanto há esperança, vamos esperar que a F1 melhore nesse 2016 e, quem sabe, o campeonato seja disputado até a última corrida. E no futuro, se mostre também histórico.

Um abraço.
JC Viana

JC Viana
JC Viana
Engenheiro Mecânico, vê corridas desde que se entende por gente. Escreve sobre F1 no tempo livre e torce pelo Ceará Sporting Club em tempo integral.

3 Comments

  1. Fernando Marques disse:

    Sinceramente não tenho com que me empolgar com a temporada de 2016 … serão 21 corridas e outro passeio da Mercedes … não consigo enxergar outro cenário

    Fernando Marques
    Niterói RJ

    • Mauro Santana disse:

      Seja bem vindo JC Viana!

      Concordo contigo Fernando!

      E não sei pra que 21 etapas.

      Fica esse papinho mole de cortar gastos, mas vão cada vez mais aumentando o número de GPs.

      Pra mim, o ideal sempre foi 16 GPs.

      Abraço!

      Mauro Santana
      Curitiba-Pr

      • Obrigado Mauro,

        Mas o aumento do número de corridas convém bastante para a F1, pois gera um aumento de exposição da F1 nas TV’s, aumentando a barganha na hora de negociar novos contratos, além de ser mais dinheiro entrando devido aos altos valores cobrados aos novos promotores de corridas. Resumindo, significa mais dinheiro entrando no bolso do Bernie e das equipes…
        Concordo em parte com você no número de provas. Vinte e uma provas é um exagero, mas acho que 18 seria um bom número.
        Abraços!
        João Carlos Viana

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