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Qual a melhor analogia possível para descrever o GP da Bélgica?

Nico Rosberg fez a lição de casa, Daniel Ricciardo também, e o pódio foi completado por um Lewis Hamilton que minimizou em muito o prejuízo de ter largado no fundo do pelotão e sai da Bélgica ainda líder. Cada piloto da Mercedes tem agora 6 vitórias na caderneta de 2016.

Assim que encerrado o GP, passei todo o domingo a tentar encontrar a melhor analogia possível para descrever a corrida.

Essa prova em Spa-Francorchamps pareceu aqueles refrigerantes que, quando a gente abre, sai um gás tão forte que quando bebemos, até sai lágrima do olho – fica difícil saborear. Mas que logo depois se estabiliza e daí sim podemos matar a sede de corridas.

“Todo o gás” das 10 primeiras voltas acabaram sendo uma corrida à parte das 34 voltas restantes. A começar pelo choque entre Sebastian Vettel, Kimi Räikkönen e Max Verstappen.

Já é difícil três carros fazerem juntos uma curva qualquer. Quando se trata do grampo da Source então, a coisa fica impossível e a trocação de tinta se torna inevitável.

Os choques só aconteceram porque Vettel foi enganado pelas circunstâncias. Por fora, ele fez a leitura que apenas dois carros – os dois vermelhos – iriam contornar juntos e então fez trajetória suficiente para dois carros.

Mas o oportuno mergulho de Max por dentro mudou toda a dinâmica da coisa, com os resultados que vimos ao vivo. Não se pode repreender Vettel, que tinha uma informação limitada, e não iria alargar a trajetória à toa. É o típico incidente de corrida, que foi finalizado com aquele fogo saindo debaixo do carro de Kimi nos boxes. Caramba, o que foi aquilo?

Como diriam aqueles canais de vendas, “mas espere, não é só isso”. Tivemos um Pascal Wehrlein enchendo a traseira de um Jenson Button que saiu de Spa sem motivo algum para comemorar seus 300 GPs na F1.

Tivemos também o furo de um Carlos Sainz ligeiramente Villineuvesco, a continuar andando mesmo com danos irreparáveis até rodar fatalmente. O espanhol não foi o único a ter pneu furado: Felipe Nasr também acabou tendo azar.

O gran finale foi a assustadora estampada que Kevin Magnussen deu na saída da Eau Rouge e interrompeu a prova.

Surgiram questionamentos sobre alguma possível quebra de componente para provocar a rodada e o acidente. Na minha leitura, foi uma simples sambada em cima de zebra alta que fez o carro perder aderência numa das extremidades, que quando voltou ao chão, ganhou tração demais e provocou aquela chicotada em direção à barreira de pneus. Diferentemente dos carros antigos, não há nesses F1 modernos uma “janela” de derrapagem controlada. Há muito os engenheiros abandonaram o atrito dinâmico pelo atrito estático. O pneu não escorrega “pouquinho”. Joga o carro no descontrole de uma só vez quando sai do “trilho”.

O chassi da Renault já não é nenhum primor em estabilidade, tração, geração de downforce. Como se não bastasse isso, o trecho era de aclive (que “tira” downforce), e Spa é o circuito com a segunda menor carga de asa de toda a temporada, perdendo apenas para Monza, claro.

Os carros mais potentes podem usar mais asa, mas os mais fracos, como é o caso do Renault, precisam tirar ainda mais asa pra andar rápido nas retas. Aposto que K-Mag estava com pouquíssimo downforce, o que contribuiu decisivamente para seu descontrole.

Mas o realmente mais grave foi ver seu encosto de cabeça sendo ejetado pela força do acidente. Isso é gravíssimo. Ele poderia, na volta da inércia, ter batido a nuca. O Hans pode ter tido um papel decisivo de proteção ao pescoço. Foi muita sorte ter saído apenas com um corte no tornozelo e liberado para correr em Monza.

Dezessete minutos depois da inevitável bandeira vermelha, aí sim tivemos uma corrida. Rosberg e Ricciardo mantiveram-se em primeiro e segundo, e tivemos os maravilhosos desempenhos de Fernando Alonso e Lewis Hamilton. O inglês teve sorte de sair ileso da tempestade do começo, com o período de Safety Car virtual e na posterior paralisação da corrida, que fez com que todos pudessem trocar seus pneus.

Ainda mais agressivo foi Alonso, que largou em 22º, passou a primeira volta em 12º, em 10º na terceira, e era quarto (!) quando foi lançada a bandeira vermelha. Tivesse ele a bordo de um carro melhor, e o espanhol iria pelo menos manter essa posição na corrida, isso se não entrasse em luta direta pelo pódio.

Mas a McLaren rema, rema e não sai do lugar. O espanhol foi sendo superado aos poucos, pelas duas Force India, de Nico Hülkenberg e Checo Pérez, e pelo recuperado Sebastian Vettel, que relargou em 11º e veio escalando o pelotão.

Ao menos Alonso se manteve à frente das Williams, claramente sem ritmo, que ficaram ensanduichadas por Räikkönen.

Daniil Kvyat infelizmente é um piloto acabado. Ele é bom, tem potencial, mas sentiu demais seu rebaixamento para a Toro Rosso. Sua espiral descendente não tem mais volta. Sua renovação para o próximo ano seria apenas um mero prêmio de consolação por ter que engolir o sapo este ano.

Mas pelo que sei, o Dr. Helmut Marko não é chegado a prêmios de consolação…

Ferrari, Red Bull e Force India – não necessariamente nesta ordem – evoluíram e mostraram excelente desempenho na pista belga. Infelizmente não a ponto de se equiparar à Mercedes. Ainda faltam alguns décimos importantes. Os prateados ainda tem o melhor motor e o melhor chassi do grid.

Mas há um componente extremamente positivo aqui: as equipes estão sendo obrigadas a investir em upgrades porque estão em franca luta no campeonato de construtores. Vale uma bela grana no fim do ano em premiação.

O fratricídio da Ferrari na primeira curva (que me lembrou Montjuïch 75, quando Regga e Lauda se bateram na largada) fez com que a Red Bull abrisse leve vantagem na luta pelo vice. Por enquanto, placar de 274 a 252 para o time do energético.

A luta pela quarta força, entretanto, está ainda mais apertada. A Force India evoluiu nas pistas e passou a Williams por míseros 2 pontos. Está 103 a 101. Ao que parece, são os indianos agora o segundo melhor time a ser impulsionado por usinas Mercedes-Benz. A próxima corrida é Monza, com suas retas enormes e demanda por cavalos de força, que pode corroborar com essa afirmação.

A Williams, nessa fase “Martini”, nunca esteve tão baixa em performance. Em 2014, após a 13ª etapa, tinham 177 pontos. Em 2015, até mais: 198. Até agora, portanto, computaram praticamente metade disso.

Fui escalado excepcionalmente para escrever a coluna do GP no lugar do nosso querido Márcio Madeira, que está cuidado do mais novo herdeiro do GPTo, o Francisquinho. O guri esteve doente, mas já está melhorando.

Aproveito para reforçar meus votos de melhora, e que em assim que ele esteja plenamente alfabetizado, daqui alguns anos, que possa fazer sua estreia aqui neste site, desbancando a precocidade do Max Verstappen…

Abração!

Lucas Giavoni
Lucas Giavoni
Mestre em Comunicação e Cultura, é jornalista e pesquisador acadêmico do esporte a motor. É entusiasta da Era Turbo da F1, da Indy 500 e de Le Mans.

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