50 vezes Hamilton

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Vitória de Hamilton na pista que parece ter sido desenhada pra ele.

Austin, Texas. 2014: pole de Rosberg, Hamilton completando a primeira fila. Vitória de Hamilton, Rosberg em segundo. 2015: pole de Rosberg, Hamilton completando a primeira fila. Vitória de Hamilton, Rosberg em segundo. 2016: pole de Hamilton, Rosberg completando a primeira fila. Vitória de… Hamilton, Rosberg em segundo.

Nada mudou nos últimos 3 anos. Hamilton mostra que é de fato o “rei de Austin” – lembremos: Lewis venceu lá também em 2012. São, portanto, 4 vitórias em 5 corridas. Adicionalmente, iguala Michael Schumacher, que venceu em Indianápolis 5 vezes, e Ayrton Senna, dono de 5 triunfos divididos em Detroit e Phoenix – Hamilton havia vencido nos EUA em 2007.

A vitória de Lewis foi decidida, mais do que na pole, no seu posicionamento na primeira curva. Rosberg fez, a meu ver, a escolha errada num hairpin com tal relevo, perdendo a posição para Ricciardo logo na sequência. De resto, Hamilton garantiu a vitória tranquilamente, nunca sendo ameaçado. Rosberg precisou se ocupar demais com a Red Bull e, pensando a longo prazo, evitou riscos ao máximo.

O “Circuito das Américas” é das mais interessantes pistas dentre as novas, desenhadas pelo mestre Herman Tilke. Gosto dos S’s, e há uns trechos interessantes. Mas há partes da pista que não são muito rápidos.

Apesar de as velocidades máximas serem bastante altas (Kevin Magnussen atingiu a maior, 345.1 km/h), durante a corrida várias vezes tive a impressão de que os carros estivessem mais lentos: em velocidade média, Austin ficou apenas em 14º lugar dentre as etapas ocorridas na temporada, superando apenas Mônaco, Singapura, Hungria e Espanha.

Me chama a atenção a disputa interna da Ferrari: em três dos últimos quatro GPs Kimi Räikkönen superou Sebastian Vettel, e estava à sua frente no mundial até agora.

2016 se mostra uma temporada bastante complicada para Vettel pois, mais do que sua dificuldade em bater um piloto 8 anos mais velho e cujo dicionário nunca apresentou a palavra motivação, ele começa a ser questionado interna e externamente.

No começo do ano, escrevi uma coluna comparando as trajetórias de Niki Lauda, Alain Prost, Michael Schumacher, Fernando Alonso e Vettel enquanto pilotos da Ferrari.

Minha análise foi de que Lauda e Schumacher encontraram momentos mais propícios do que o francês e o espanhol encontraram, e também mais do que aquele que Sebastian enfrenta. Também por isso, ficava claro que Vettel dificilmente conseguiria repetir o sucesso de Schumy, tampouco reviver seus dias de Red Bull.

No entanto, a faceta atual de Vettel – não apenas por performance, mas pelos constantes envolvimentos em batidas e reclamações – o coloca abaixo dos quatro na Ferrari e, especialmente, joga mais luz sobre suas disputas com Alonso nos anos do tetra: qual deles era de fato o maior piloto do mundo nos anos em que o alemão nadou de braçada?

Max Verstappen, a personificação do “ou se ama ou se odeia” da Fórmula 1, foi pra cima de Vettel. Mais uma manobra de audácia e talento.

Depois, cometeria dois erros frutos de afobação, primeiro na entrada antecipada nos boxes e depois na tentativa insana de manter-se na prova.

httpv://youtu.be/WXsGE0mLi4k

Max lembra muito o Hamilton de 2007, mas é ainda mais cru e não está na melhor equipe.

2017 será o ano para Verstappen se firmar.

Quem parece que vai ter outra grande oportunidade de (se) provar em 2017 é Felipe Nasr: a informação de Reginaldo Leme, de que ele será o piloto da Force India, é uma oportunidade fantástica.

Alguns comentários a respeito de situações que envolveram essa transição.

1)       Ao que consta, Bernie Ecclestone envolveu-se diretamente na mudança, e a motivação parece clara: com a aposentadoria de Massa, tio Bernie vê que o mercado brasileiro (que sempre foi muito importante para a categoria) pode estar a perigo.

Situação muito semelhante aconteceu 25 anos atrás, também envolvendo um brasileiro e também tendo “necessidade de mercado” como grande justificativa: a “troca” Benetton-Jordan entre Roberto Moreno e Michael Schumacher.

2)      Nos treinos viu-se a Sauber claramente preterir Nasr em virtude de o piloto ter revelado contatos com outras equipes. A imprensa brasileira não gostou. A mesma imprensa que em retrospecto defende a ação da Toleman, em 1984: a equipe suspendeu para o GP da Itália seu piloto titular, Ayrton Senna, porque este havia assinado com a Lotus.

3)      Apesar das ameaças anuais e dos recentes comentários do prefeito eleito de São Paulo, parece que Interlagos estará assegurada enquanto Bernie estiver por perto…

Nada mais emblemático do que a disputa entre Felipe Massa e Fernando Alonso.

Além da excelente manobra do espanhol para superar Felipe na pista, Alonso mais uma vez passa Massa na tabela do campeonato. Com um carro inferior, indiscutivelmente.

Vale citar um comentário do amigo Márcio Madeira: “Quantas vezes vimos Massa alcançar um adversário, andar junto sem tomar decisão, acabar com os pneus e de caçador virar caça?”.

Em última análise, essa foi uma das principais razões para ele perder o Mundial de 2008, retrospecto que terminarei na próxima semana.

Das regras estúpidas da Fórmula 1

Alonso não deveria, como não foi, ter sido punido pelo choque na ultrapassagem com Massa. Porém, por manobra plasticamente idêntica Rosberg foi punido na Malásia.

Outra estupidez é essa de Safety Car virtual: Rosberg por muito pouco não sofreu punição após a “tentativa de ultrapassagem” sobre Wehrlein na saída dos boxes, e ainda se viu obrigado a seguir o compatriota em procissão.

As estratégias não permitiram, mas Nico poderia ter perdido a segunda posição que remou para reconquistar.

Sobre a efemeridade dos números

Hamilton chega à sua 50ª vitória e está uma atrás de Alain Prost e de tornar-se o segundo maior vencedor da história da categoria. Em breve deverá, também, se tornar o piloto com o maior número de pole-positions: é o terceiro com 58, o recordista tem 68. Com 101 pódios, está a seis de se tornar o segundo. Dono de 31 melhores voltas, deve se tornar o segundo colocado no geral em mais duas temporadas. E completou hoje 2.820 voltas na liderança, faltando menos de 200 para ser o segundo que mais liderou.

Um currículo inquestionável.

Outra marca interessante para Hamilton: agora é ele o piloto que marcou pole-positions no maior número de circuitos – Austin foi a 23ª pista diferente onde largou na primeira colocação.

Além de números em excesso, mostra que é versátil.

Há três anos a dúvida era apenas quando (e não mais “se”) Sebastian Vettel iria superar Schumacher. Àquela altura, Hamilton era considerado alguém fadado a ter uma grande carreira, mas longe do Olimpo. A vaga era de Vettel.

E agora?

Dois comentários sobre a transmissão da prova:

Quando a rodada do Campeonato Brasileiro substitui os GPs, nossa primeira reação é a reclamação. As críticas. O principal ponto é o menor acesso à categoria, uma vez que, por mais assinaturas que a TV a cabo possa ter, nunca irá se equiparar ao alcance da emissora oficial. Entretanto, no que tange à cobertura e ao espaço dado às notícias relacionadas à corrida, o modelo de ontem é infinitamente melhor.

O outro comentário é uma crítica não à equipe ou ao canal em si, mas ao despreparo dos narradores esportivos brasileiros em geral: as corridas em Mônaco e nos EUA são aquelas que mais atraem personalidades. Naturalmente, estas serão filmadas e terão seus nomes mencionados.

Na corrida de hoje, porém, vimos a surfista que era alpinista, é Americana mas nasceu no Canadá. Vimos também a tenista vencedora de Grand Slams ser confundida com sua irmã — muito mais famosa, aliás.

Por fim, enquanto um cidadão é filmado e aparece seu nome, o narrador fala: “realmente aqui tem um monte de gente famosa, está aí Ed Moses“. E pronto.

Ed Moses não é “um famoso”: é um dos maiores nomes da história do atletismo, dono de duas medalhas de ouro olímpicas, só não vencendo três por conta do boicote aos Jogos de Moscou.

httpv://www.youtube.com/watch?v=FLw140sj-zg

Moses detém uma das maiores marcas não apenas de sua modalidade mas de todo o esporte mundial: 122 vitórias seguidas, 9 anos, 9 meses e 9 dias sem perder uma prova nos 400 metros com barreira.

Esses números não são efêmeros.

Boa semana a todos.

Marcel Pilatti
Marcel Pilatti
Chegou a cursar jornalismo, mas é formado em Letras. Sua primeira lembrança na F1 é o GP do Japão de 1990.

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