Respirar fundo é fundamental

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A caixa de tomada de ar é uma das características mais distintivas de um carro F1 moderno. Situado logo acima da cabeça do piloto, o orifício de entrada de ar em forma oval determina não apenas o formato da tampa do motor, mas também o fluxo de ar para dentro deste. Na coluna de hoje veremos o que este componente faz em detalhes, e também o que se passa debaixo da carroceria e dentro do motor.

A caixa de tomada de ar, e o sistema de admissão como um todo, rege a quantidade máxima de ar admitido pelo motor e, portanto, a quantidade de combustível possível de se queimar, determinando o nível de potência que o motor poderá produzir. A entrada de ar que vemos é apenas a ponta do iceberg com relação ao sistema de admissão do motor. Em alta velocidade, o ar é empurrado para dentro da caixa de ar e para baixo, em um tubo oco que termina em forma de cunha em sua base, onde o filtro de ar está situado. O ar chega ao filtro de ar a uma pressão superior à atmosférica como consequência da pressão dinâmica criada pela velocidade do veículo. Uma “cunha” de ar eficiente manterá uma percentagem tão elevada desta pressão dinâmica quanto possível antes do ar se encontrar com o filtro.

O trabalho do filtro de ar é, então, filtrar qualquer partícula ou corpo estranho, como areia ou pedriscos, impedindo-as de entrar no motor. O ar limpo é consumido, então, pelas trombetas onde estão localizadas as válvulas borboleta. Se estas estiverem fechadas, o ar será represado no local; se estiverem abertas, o fluxo de ar continuará sua viagem e será misturado com o combustível. Finalmente, esta mistura combustível-ar passa para a câmara de combustão através das válvulas, onde é ativada pela vela de ignição, impulsionando o pistão para baixo com a força da combustão, transferindo torque ao eixo de manivelas.

Por que o sistema de ar é tão importante para o desempenho do carro?

O ar – ou melhor, o oxigênio – é uma parte essencial do processo de combustão, e ter fluxo de ar suficiente na máxima pressão possível maximizará a quantidade de torque produzido. A entrega deste ótimo depende, portanto, das partes constituintes do sistema. Em primeiro lugar, a forma da caixa de ar controla a quantidade de ar que pode ser admitida no motor. Se a entrada for muito pequena, o motor ficará “enforcado” e, consequentemente, produzirá menos energia. Se for grande em excesso, no entanto, o motor não será mais eficiente em uma escala linear – mais ar não significa mais poder; desta forma, a quantidade correta deve ser introduzida. Isso se relaciona com tentar manter a pressão absoluta o mais alto possível. Para conseguir isso, é preciso manter o máximo de pressão dinâmica gerada pela velocidade do carro. Isto é, naturalmente, um compromisso com o efeito adverso de arrasto aerodinâmico de se ter uma caixa de ar muito grande, o que também criaria turbulência para a asa traseira.

O filtro de ar também precisa ser muito robusto. Um filtro de malha muito apertada dificultará demasiado a passagem do ar, e a pressão diminui. Por outro lado, com uma malha aberta demais corre-se o risco de corpos estranhos adentrar no motor, causando danos irreparáveis nos pistões e outros componentes internos do motor. Por esta razão, os fabricantes dos motores se preocupam não apenas com a estanqueidade do filtro de ar, mas também com sua capacidade de reter detritos.

Quais são os regulamentos técnicos que regem os filtros de ar?

Surpreendentemente, existem muito poucos regulamentos técnicos que regem os filtros de ar. Os principais proíbem qualquer sistema que diminua a temperatura do ar de admissão do motor e a restrição de quaisquer sistemas que aumentem o volume de oxigênio admitido acima da porcentagem encontrada no ar (aproximadamente 20%). Depois, existem as prescrições aerodinâmicas gerais, razão pela qual se vê grande número de variações nos desenhos de entradas de ar: algumas são redondas, enquanto outras são divididas por um pilar central. Mas, em qualquer caso, deve-se manter o compromisso sobre as características do filtro de ar, que precisam proteger o motor.

Equipes e fabricantes de motores, portanto, trabalham em uníssono para desenvolver a caixa de ar, uma vez que é uma área onde o desempenho aerodinâmico do veículo e do motor pode ser ajustado.

A evolução da caixa de ar tem sido impulsionada principalmente pela aerodinâmica. A forma evoluiu de acordo com sistemas de redução de arrasto e com a carroceria mais estreita, mas também foi afetada pela instalação de resfriadores perto da extremidade traseira do duto de ar. Na era do F-Duct vimos também algumas mudanças grandes, enquanto hoje com DRS o ar da admissão é usado para efeitos aerodinâmicos abaixo da asa traseira.

O isolamento térmico das caixas de ar também avançou desde que a carroceria dos carros se tornou mais apertada. Uma carroceria mais apertada dá menos oportunidade para o calor escapar, portanto evitar o superaquecimento do ar que entra no motor se torna crucial, uma vez que temperaturas mais baixas do ar significam mais potência.

Para o filtro de ar, muito trabalho foi realizado para melhorar a qualidade do ar admitido pelo motor, aplicando sistemas inteligentes para separar os detritos mais à montante do que à jusante. Além disso, quando a vida do motor foi estendida por regulamento, o filtro de ar também teve de evoluir: uma melhor filtragem significa uma maior potência média.

E se o regulamento dos motores não fosse congelado, o que estaríamos vendo agora no que diz respeito ao design da caixas de ar?

É muito difícil dizer, uma vez que está o design está intimamente ligado à admissão, mas é justo dizer que estas caixas certamente seriam muito mais complexas, possivelmente incorporando geometria variável, por exemplo. É até possível pensar que poderíamos ter projetos diferentes mudando para cada pista. Poderia ser desenvolvido também um sistema de borboleta única sistema de borboleta, reduzindo o peso final do motor.

Curiosidade: no final da reta do circuito de Xangai, onde o carro atinge cerca de 330 km / h, com DRS aberto, a pressão de ar no filtro de ar será próxima de 1.070 milibar – a pressão do ar ambiente normal é de cerca de 1.020 milibar. Isto significa que o motor produz cerca de 5% mais de potência – equivalente a 40 cv – do que a “velocidade de marcha”.

Além disso, a combinação da pressão de ar dentro da caixa de ar e ressonância gerada pela onda de alta frequência do motor é tal que a estrutura física da caixa de ar precisa ser suficientemente robusta para lidar com a deformação da parede da mesma. Estas deformações podem chegar a até 10mm.

Tendo em vista o exposto na coluna de hoje, é preciso dizer uma verdade: motores precisam, acima de tudo, respirar bem! Não por acaso motores turbo produzem muito mais potência do que os aspirados, para uma dada cilindrada (o que, para os mais puristas, é considerado trapaça)! Mas isto é assunto para outra coluna.

Abraços e até a próxima.

Cassio Yared
Cassio Yared
Engenheiro Mecânico, acompanha a F1 desde o milagre da sexta marcha. Possui especial interesse pelas tecnologias desenvolvidas na categoria.

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