Aprendeu!

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Em Janeiro de 2009, em meio famigerado episódio de evasão fiscal e conspiração enfrentado por Helio Castroneves, a equipe Penske precisava de um piloto que pudesse correr no carro #3 enquanto o brasileiro defendia-se judicialmente.

Nomes foram cogitados, como o do falecido Justin Wilson, ou do americano Ryan Hunter-Reay. Mas o contratado acabou sendo Will Power, oriundo da extinta equipe KV, piloto indicado pelo próprio Castroneves.

O novato fez um bom trabalho e terminou em sexto lugar a prova de abertura de St. Petersburg, para logo em seguida saber que Helio havia conseguindo reverter na justiça dos Estados Unidos todas as acusações e já estava apto a voltar para seu carro.

Roger Penske não pensou duas vezes e conseguiu umas corridas a mais para aquele australiano rápido, a bordo do terceiro carro. Desta vez com o #12 no bico, Power chegou em segundo já na prova seguinte, em Long Beach, e correria outras quatro provas da temporada, incluindo mais um pódio em Toronto, e uma vitória convincente em Edmonton partindo da pole. Sua média de pontos em 2009 foi maior que dos titulares Castroneves e Ryan Briscoe.

O cara era bom e fez por merecer um contrato cheio para as temporadas seguintes. As vitórias vieram, mas os títulos não. Teimava em ser vice. Vencia muitas provas do ano, fazia poles aos montes, liderava voltas e voltas. O que lhe faltava? A manha para correr em ovais, os quais sempre ficava bem abaixo do esperado.

Demorou, mas Will Power aprendeu.

Foi finalmente campeão da Indy em 2015, com direito a uma vitória em Milwaukee que praticamente selou o campeonato. E no domingo tornou-se o mais novo vencedor das 500 Milhas de Indianápolis.

Will Power não apenas aprendeu as manhas. Mudou sua atitude. Em seu discurso de vitória, Power falou que nunca teve um mês de maio tão bom, a começar pela vitória no circuito misto, no começo do mês. E quando um piloto diz que nunca dormiu tão bem em um mês como o de maio, o mais importante e movimentado, você tem a certeza que esse cara tem cabeça para ser vencedor.

Pensa num cara que fez tudo certo. Power conseguiu andar bastante rápido nos treinos e na corrida passou a primeira metade poupando equipamento, resumindo-se a discretamente andar no ritmo dos líderes. Até então, os grandes destaques eram o pole Ed Carpenter, que mais uma vez fez valer sua expertise em encontrar acertos mágicos para qualificação, e Tony Kanaan, com a força de sempre em uma pista que, exceto em 2013, sempre lhe foi ingrata.

A ingratidão para Kanaan veio em forma de pneu furado na volta 90, mas Ed agora perceberia o quanto Power estava determinado, a bordo de um carro perfeito para o calor de 30 graus que deu as caras no Indianapolis Motor Speedway. Quando esquenta, o ar fica menos denso, o que se ajusta melhor a acertos com um pouco mais de downforce e suspensões que sejam mais gentis com os pneus, que, caso contrário, podem desgastar a borracha em excesso, ainda mais com um novo pacote aerodinâmico que apresentou globalmente menos downforce que o antecessor.

As táticas para o final da corrida variaram, mas acabou prevalecendo o ritmo dos líderes, e entre eles, Power. Sim, foi um anticlímax quando Stefan Wilson e Jack Harvey, azarões que até então eram impiedosamente caçados por Power, entraram nos pits na volta 198 totalmente secos.

Mas há o outro lado. Power foi competente o suficiente para estar na frente de Carpenter e outros carros muito fortes, como os de Alexander Rossi, Ryan Hunter-Reay e do companheiro Simon Pagenaud, além de não cometer erro algum.

Mérito também para o veterano Scott Dixon, num ano em que a Ganassi simplesmente não se achou em Indianápolis. Fazendo corrida discreta, Dixon foi o único a conseguir fazer uma tática alternativa de pits funcionar, e terminou num bom terceiro lugar, atrás apenas de Power e Carpenter.

Power foi o vencedor, mas o showman da corrida foi o quarto colocado Alexander Rossi. O vencedor de 2016 partiu do fundo do grid após um acerto ruim de qualify para ser o piloto mais agressivo na pista, com direito a muitas ultrapassagens por fora, no limite da linha aderente da pista, flertando com a farofa. Lembrou muito o patrão Michael Andretti, de quem certamente pegou muitas dicas. Fica aquela certeza que Rossi ainda pode fazer outras proezas na pista.

O único cara que parece não seguir dicas de Michael (e do patriarca Mario) é o Marco Andretti!

Só mencionei o Marco, claro, para lembrar que esta é mais uma edição, desde 1969, que um Andretti não vence em Indianápolis.

O novo pacote aerodinâmico deste ano garantiu carros bastante rápidos na pista, um bom nível de vácuo, e uma característica que pegou muita gente, de novatos a veteranos: a saída de traseira é bem mais abrupta que nos anos anteriores e não dá pra ser corrigida. Isso acabou com as corridas de Danica Patrick, Helio Castroneves, Ed Jones, Tony Kanaan e Sebastien Bourdais.

Tony fez uma excelente corrida na disputa pela liderança, e atualmente é tarefa ainda mais árdua remar do fundo do pelotão até o topo. Recentemente revi a edição de 1995, vencida por Jacques Villeneuve. No começo da prova ele tomou uma punição de duas voltas por ter passado do Safety Car durante uma bandeira amarela.

Claro que Jacques teve sorte para descontar suas voltas, mas tinha um carro com rendimento superior a ponto de conseguir essa façanha, num ambiente em que a variação de desempenho era bem maior.

Meu amigo Arlindo Silva disse algo interessante: a vitória de Power ficaria lado a lado com as edições de 1983 e 2013, que acabaram sendo tributos a pilotos extremamente relevantes a categoria e que não haviam vencido na prova principal do calendário.

Nas edições mencionadas, Tom Sneva e Tony Kanaan colocaram merecidamente seus nomes no troféu BorgWarner.

Até Le Mans! Abração!

Lucas Giavoni
Lucas Giavoni
Mestre em Comunicação e Cultura, é jornalista e pesquisador acadêmico do esporte a motor. É entusiasta da Era Turbo da F1, da Indy 500 e de Le Mans.

1 Comments

  1. Fernando Marques disse:

    Lucas,

    eu achei muito legal ver o Will Power vencer as 500 Milhas este ano … já faz tempo que ele disparadamente é o melhor piloto da Indy … e já fazia tempo que ele merecia uma vitoria deste naipe …
    quanto ao Helinho e Kanaa mais uma vez eles fizeram um bom papel na corrida mas falando sério a boa época deles já passou … precisamos de novos e bons nomes na Indy assim como precisamos na Formula 1 …

    Fernando Marques
    Niterói RJ

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