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O que a história de John D. Rockefeller e situação atual da Fórmula 1 têm em comum?

Pouco antes daqueles fatídicos dias do outono de 1929, John D. Rockefeller, como com frequência fazia, se dirigia à bolsa de valores de Wall Street. Também, como era freqüente, parava um momento no velho engraxate que havia lá perto, para que lhe polisse seus sapatos. Após anos com essa rotina, os dois homens haviam desenvolvido certa confiança e, naquela ocasião, enquanto o magnate recebia as atenções do engraxate, este lhe pergunta:

– Mr. Rockefeller, o que está havendo aí dentro?

Rockefeller, surpreendido e sem saber a que se referia o engraxate, simplesmente exclama:

– Aí dentro?!

Seu interlocutor continua:

– Sim, Mr Rockefeller! Estou percebendo que, ultimamente, meus fregueses estão nervosos e parecem bastante preocupados!

O magnata, intrigado mas sem saber o que responder, paga o serviço recebido e continua seu caminho com os sapatos bem reluzentes. Contudo, alguns dias depois, Rockefeller ordena vender todas as suas ações justo antes da terrível debacle financeira que viria a continuação, salvando-se de umas certas e quantiosas perdas. É lógico pensar que aquela conversa com o modesto engraxate terminasse por convencer-lhe de que haviam indícios de que nada bom se aproximava e rapidamente atuou em conseqüência.

Eu, temo não ter o mesma capacidade de observação daquele humilde engraxate mas, sei lá, tampouco gosto dos indícios que percebo na formula um e nada me faz pensar que a especialidade possa melhorar no futuro. Ultimamente, há uma tendência a recorrer a velhas glórias em forma de retorno de passados e ilustres campeões (Schumacher e Raikkönen), ressurgimento de gloriosas equipes (Lotus) e vitoriosas parcerias (Williams-Renault) ou a futura reimplantação dos motores turbo, numa espécie de tentativa de trazer de volta uma das mais gloriosas épocas da Fórmula Um.

No entanto, habitualmente, quando se recorre ao passado é devido a que o presente não resulta suficientemente atraente e o futuro se vislumbra ainda pior. Por conta da crise econômica (ou, talvez, aproveitando-se dela como desculpa), alguns organizadores de GPs estão reconsiderando seus compromissos com o tio Bernie. Um exemplo disso é o grande prêmio da Espanha, que será disputado de forma alternativa entre Valencia e Montmeló a partir de 2013 para, assim, poupar uns bons milhões de euros. França e Belgica podem seguir o mesmo destino, pois nenhum dos dois organizadores parece disposto a continuar perdendo seu dinheiro.

Resulta curioso que a FIA, em seu empenho de que as equipes poupem dinheiro, vem propiciando justo o contrário, cada vez que implementa algum novo regulamento tendente á poupança. O fornecedor único de pneus tinha esse objetivo e… não funcionou. A maior durabilidade do motor… também, mas as despesas em investigação para conseguir essa maior durabilidade, superam os gastos de construir algumas unidades mais por ano.

Ainda temos a suposta preocupação da FIA pela ecologia e sua obsessão pelo “verde”. Dizem que sua pretensão é que a Fórmula Um não seja associada com a imagem de uma atividade cara e frívola mas, os times da “Champions League” gastam ainda mais e ninguém se queixa! Acaso há algo mais frívolo que uns marmanjos correndo atrás duma bola? Nos dois casos, se trata apenas de proporcionar espairecimento ou distração. Não há nada transcendental nisso. Quando nos sentamos perante o televisor, esperamos passar um bom momento e, ainda sequer de maneira fugaz, esquecer a cotidianidade e preocupações de nossas atribuladas vidas. Nada mais!

Segundo as últimas noticias, para a temporada 2014 está prevista a implantação de motores v6 turbo de 1600cc, o que obriga aos fabricantes a involucrar-se em novos investimentos. Na proposta inicial, o motor devia ser um 4 cilindros, mas os fabricantes e o próprio tio Bernie, logo reclamaram dizendo que este motor resultava pouco glamouroso para a formula um . Diz a FIA estar preocupada com a imagem de frivolidade da categoria, mas… acaba dando prioridade ao glamour!

Essa preocupação ecológica me resulta contraditória com o fato de permitir as trocas de pneus. Eu sempre fui em contra disto e talvez não seja objetivo neste ponto, mas se os trocas fossem banidas…. não se poupariam vários milhares de pneus por temporada? Não seria isto mais respeitoso com o meio ambiente?

A temporada de 2005, quando não houve trocas de pneus, resultou muito interessante para os aficionados, mas o problema é que para a Pirelli (ou o fornecedor que fosse), a ausência de trocas não lhe resulta atraente. Com as trocas, a gente fica mais atenta ao que acontece durante as corridas, pois o que acontece está intimamente ligado aos pneus. Até chegaram ao absurdo de exigir o uso de dois tipos de pneus por GP para gerar ainda mais expectativa, de maneira que o pneu seja o centro das atenções (a Pirelli, inclusive, cogita introduzir outro tipo de composto para as classificações).

Tudo isto, resulta até lógico pois… para que diabos iria a Pirelli gastar tanto dinheiro fornecendo um produto se este passasse despercebido? Onde estaria o retorno buscado? Dentro dessa suposta política tendente à poupança, também temos a limitação de testar. A FIA apresentou esta medida como a panacéia que reduziria gastos e igualaria as oportunidades das equipes. Novamente, foi justo ao contrário pois, além de não propiciar nenhuma poupança (as equipes gastaram mais em sofisticados simuladores para compensar a falta de testes nas pistas), tal limitação reduz drasticamente a capacidade de evolução das equipes recém-chegadas pois, como sabemos, e em qualquer âmbito da vida, os bons resultados são fruto da experiência, e a experiência é o fruto dos maus resultados.

Sem a possibilidade de experimentar, aprimorar e aprender dos próprios erros, como podem chegar os bons resultados? Como dizia John D. Rockefeller: “ Para conseguir triunfar é necessário abrir novos caminhos em vez de recorrer velhas trilhas de sucessos passados”. Creio que isso é justamente o que a FIA devia fazer pois as velhas trilhas por onde andam circulando parece que não conduzem a nenhum lugar. Sim, temo que há indícios de que as coisas não vão melhorar e o pior é que lá na praça da concórdia de paris, onde fica a sede da FIA, também temo que não haja nenhum engraxate que lhes alerte desses indícios e faça que vejam o que acontece perante seus olhos, tal como aquele humilde engraxate de Wall Street fez com Rockefeller.

Manuel Blanco
Manuel Blanco
Desenhista/Projetista, acompanha a formula 1 desde os tempos de Fittipaldi É um saudoso da categoria em seus anos 70 e 80. Atualmente mora em Valência (ESP)

3 Comments

  1. Lucas Giavoni disse:

    Belo texto, meu caro Manuel. A narrativa sobre Mr. Rockefeller é especialmente interessante, não conhecia essa história.

    Ao menos para mim, um aspecto fica bastante claro: essa nova Era Turbo prevista para 2014 causará imediata comparação àquela que durou de 1977 a 1988. E creio que muitos podem se decepcionar – a começar por mim. Afinal, não haverá briga por mais potência, a pressão do turbo (único e de um estágio) deverá ser muito limitada e eu duvido que permitam que esses novos motores cheguem a 800 cavalos – muito abaixo do que poderiam render – e novamente saberemos que não estão no limite. A maneira com as quais os motores devem ser construídos é bastante restritiva. Por mais tecnológica que a F1 tenha se tornado, todos poderão ter o sentimendo de que tudo não passa de um retrocesso. Se o som (recuso-me a usar o verbete “barulho”) dos motores também decepcionar, pronto, teremos uma crise de identidade.

    Para aqueles que quiserem saber sobre 2014, a FIA já divulgou o regulamento técnico:

    http://argent.fia.com/web/fia-public.nsf/A0425C3A0A7D69C0C12578D3002EBECA/$FILE/2014_F1_TECHNICAL_REGULATIONS_-_Published_on_20.07.pdf

    Saudosistas de plantão, se preparem… Os indícios não estão favoráveis.

  2. Mauro Santana disse:

    Olá Amigos do GPTotal!

    Gostaria de comentar um pouco a respeito dos novos carros da Indy!

    Na minha opinião, estão lindos, e dão de 10 x 0 nos da F1.

    Os pneus, a carenagem, e principalmente, o ronco dos motores turbo.

    Este ronco lembra muito a F1 dos anos 80, e ficou um show!!

    http://www.youtube.com/watch?v=HDbLmwwt0A0

    Bem que os novos motores da F1 poderiam ser iguais ou parecidos, pois a Indy não está muito preocupada com o meio ambiente, e tenho certeza de que, nem a Indy e muito menos a F1, vão impedir que o mundo piore a cada ano.

    Então, meus amigos, vamos curtir o que ainda temos de bom no mundo da velocidade.

    Abraço a todos!

    Mauro Santana
    Curitiba-PR

  3. Fernando Marques disse:

    A Formula 1 depois que virou um jogo de video game para os pilotos anda perdendo a graça a cada ano … o ideal era ela deixar de ser um video game para os pilotos …

    Fernando Marques
    Niterói RJ

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