Bobby Deerfield

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Você sabia que José Carlos Pace foi dublê de Al Pacino num filme sobre Fórmula 1? Conheça a história de "Bobby Deerfield"

No dia 12/03/2008 eu publiquei, aqui mesmo no GPtotal, uma coluna intitulada “Um personagem fascinante”, dedicada à incrível jornada de Niki Lauda ao longo de 1976. E, curiosamente, ao fim da narrativa eu questionava por que aquela temporada ainda não tinha virado tema de um filme em Hollywood.

Bom, quem acompanha nossa página no Facebook ou curte as novidades sobre cinema, sabe que isso está para mudar. Na esteira do sucesso do filme “Senna”, produtores da sétima arte parecem ter se lembrado que sim, histórias passadas em pistas, têm potencial para atrair multidões e agradar críticos. Prova disso é que não apenas a dramática temporada de 1976 vem sendo retratada – com impressionante fidelidade, diga-se de passagem – no filme “Rush”, como também é sabido que outro longa está sendo produzido com a missão de registrar a intensa relação envolvendo Jackie Stewart e Fraçois Cevert na Tyrrell. Além destes dois, já confirmados, também são fortes os rumores acerca duma película dedicada a Mike Hawthorn e Peter Collins.

Toda esta efervescência – que pode muito bem vir a saturar o mercado e levar a novo período de esquecimento – fez com que me animasse a finalmente ver um filme pouco lembrado entre os fãs das corridas, mas que, ao menos para nós brasileiros, trás curiosidades bastante interessantes. Falo aqui de “Bobby Deerfield – Um momento, uma vida”, gravado justamente em 1976. Estrelado por ninguém menos que Al Pacino, e seu dublê nas cenas de corrida, um tal de José Carlos Pace. Que, tragicamente, perderia sua vida no ano seguinte, meses antes da estreia da película.

Bobby Deerfiled, a rigor, não deve ser considerado um filme sobre corridas, mas antes uma história de pretensões dramáticas ambientada nelas. De fato, seria mais preciso afirmar que o filme trata da morte, e das várias formas de se relacionar com ela – e talvez apenas por isso tenha sido ambientado em torno dos sangrentos GPs em meados dos anos setenta.

Logo na primeira sequência com corridas, por exemplo, ocorre um acidente fatal. O “sortudo” em questão foi Carlos Reutemann – o pobre argentino provando que a arte imita a vida, quando o assunto é azar. Claro que o nome foi trocado, mas a indumentária estava lá, e tinha como intuito trazer a foice para perto do personagem principal logo de cara. Reutemann, afinal, era companheiro de Pace no início de 76, e a similaridade de equipamento leva o personagem de Al Pacino a querer investigar, por conta própria, as causas do acidente.

Suspeitando que algum animal pudesse ter invadido a pista, Deerfield visita no hospital um piloto que sobreviveu à mesma batida, e lá acaba conhecendo Lilian, a mulher pela qual irá se encantar ao longo da trama.

A um só tempo interessada e incomodada pela relação de proximidade mantida entre pilotos e a finitude da vida, Lilian jamais deixa o tema ser esquecido. Até que, por fim, é revelado que ela própria sofre de uma doença terminal, e tem muito pouco tempo de vida. Ao saber disso, Deerfield fala sobre a forma como a morte de um cão o traumatizou na infância, levando-o a não pensar muito sobre o assunto. E, como se não houvesse referências suficientes, o próprio irmão do piloto chega a perguntar se ele gostaria de ser informado quando sua mãe viesse a falecer.

O final do filme, claro, eu deixo para quem se dispuser a assistir. No entanto, já deu para perceber que, enquanto drama, a obra não traz muita novidade e não pode ser considerada nada além de mediana. Mas, claro, não é por suas virtudes artísticas que o filme está sendo resenhado aqui.

Indo ao que nos interessa, as cenas de corrida não devem somar mais do que seis ou sete minutos, em dois momentos principais ao longo da trama. As que foram produzidas não passam lá muita credibilidade, especialmente quando envolvem batidas. Já as demais são bastante preciosas, tanto pelo que mostram de corridas reais, como pelos bastidores das mesmas. Emerson, Mario, Peterson, Pryce, Depailler, Hunt… Todos estão lá, paramentados ou não. E, claro, acima de todos está José Carlos Pace.

httpv://www.youtube.com/watch?v=IaYSB_ejx7g

Mas… Por que Moco?

Bom, o destaque absoluto para a Brabham, claro, se deve ao faro de Bernie Ecclestone, que rapidamente tratou de fechar um acordo paralelo com os produtores para ter mais visibilidade na obra. Ainda assim, permanece um mistério o motivo que levou a produção a utilizar capacete e macacão pertencentes a Pace, enquanto Reutemann era condenado a queimar vivo logo nos primeiros momentos da história.

Quem certamente comemorou muito a opção foi a Brahma, patrocinadora pessoal do brasileiro, que acabou tendo sua marca mostrada diversas vezes. Se a empresa chegou a pagar alguma quantia que tenha justificado a opção por Moco é algo que nunca cheguei a saber, mas é bem possível. Afinal, a Seiko conseguiu inserir nada menos que um comercial de seus relógios em meio ao filme, protagonizado justamente pelo grande astro das pistas, Bobby Deerfield.

Por dinheiro ou por acaso, o fato é que o filme oferece raras imagens onboard da pilotagem de Pace, ainda que obviamente gravadas em baixas velocidades. Além disso, é possível ver ao menos um pôster da grande vitória do brasileiro em Interlagos, além de diversas tomadas de sua tocada inspirada ao longo de alguns GPs daquela temporada.

O filme explica também por que Moco teve uma bandeira estadunidense pintada na asa de seu Brabham no GP da África do Sul de 1976, no lugar da tradicional flâmula verde e amarela. Tudo, claro, em nome do espetáculo.

Em termos de continuidade, o filme chega a ser grotesco. Reutemann, por exemplo, aparece em diversas cenas de corridas, mesmo após ter sua morte decretada logo no início do filme. Noutra vez, uma largada é simulada com uma falsa 1ª fila dominada pela Brabham, antes que a edição corte para a largada do GP da Espanha com Lauda e Hunt na ponta…

Mas, a despeito de tantos problemas, Bobby Deerfield acaba sendo um filme obrigatório para quem curte corridas no Brasil. Graças a ele o nome de José Carlos Pace tem registro no site mais importante de cinema em toda a net, o Imdb, e também graças a ele ainda existe algum registro audiovisual da condução do brasileiro, a partir do interior do próprio carro. E como se nada disso bastasse, ora bolas, estamos aqui falando de uma obra de Hollywood na qual ninguém menos que Al Pacino se travestiu de piloto, e o fez com a imagem do saudoso Moco. Somente isso, a meu ver, já torna qualquer filme digno de ser visto.

Quem tem o hábito de baixar arquivos na net não terá dificuldades para encontrar o filme, ou para obter a legenda no site legendastv. E, se em última análise esta não é nenhuma obra-prima do cinema, nem tampouco se aproxima em interesse ao roteiro real que se desenrolava enquanto o filme era produzido, ao menos Bobby Deerfield deve ajudar o aficionado a entrar no clima da F1 em 1976 enquanto Rush não sai.

Por que este sim, meus caros, promete ser um novo clássico do gênero. É aguardar para ver.

Aquele abraço a todos,

Márcio Madeira

Márcio Madeira
Márcio Madeira
Jornalista, nasceu no exato momento em que Nelson Piquet entrava pela primeira vez em um F-1. Sempre foi um apaixonado por carros e corridas.

6 Comments

  1. walter vidal disse:

    Grande Márcio, sempre impecável.

  2. Aurélio Madruga Rodrigues disse:

    Maravilhoso! Grand Prix, sim, conheço e vi tantas vezes, fotográfia inovadora (como 2001 de Kubrick em 1968). Minhas grandes paixões: Cinema, Literartura, Violão Erudito e a F1! A F1 ‘foi’ tão extraordinária que, como grandes obras clássicas ( A Diniva Comédia, Metamorfose), jamais poderão serem filmadas, reproduzir cenas ou sensações. Aquilo que foi gravado, o que foi dito, nem a grande arte do cinema poderá expressar o que aconteceu de fato. Chama-se “Roteiro Adaptado”. Bem feito, mesmo assim, seria um luxo.

    Aurélio
    Porto Alegre – RS

  3. Rsrsrs, que salada, hein Manuel? Não sabia dessa não, obrigado pela informação. Abraço, meu amigo, e até breve.

    • Manuel disse:

      Oi, o filme tambem pode ser baixado do E-Mule em espanhol. Basta digitar no campo de busca ” Un instante, una vida “, que foi o titulo do filme aqui na espanha.

  4. Manuel disse:

    Bela lembrança, Márcio.

    Uma curiosidade respeito a esse filme é que, em algumas das cenas filmadas durante o GP da Espanha ( acho que durante os treinamentos ), foi Reutemann quem ocupou o lugar de Pace. Parece ser que o brasileiro se encontrava indisposto e o tio Bernie, para cumprir o contrato com o produtor do filme, mandou o argentino sair à pista com o capacete do brasileiro.

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