Clash austríaco

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O GP da Áustria de 2016 e aquele que foi, provavelmente, o pior desfecho de última volta da história.

Já peço desculpas por antecedência, mas não tem como não se irritar. Lewis Hamilton vence na Áustria com uma ultrapassagem na ÚLTIMA VOLTA, e isso passa longe de ter sido empolgante. Foi blasé, até meio vergonhoso. Provavelmente o pior desfecho de última volta que eu me lembre de ter visto. Coisa de F1 no Playstation.

A categoria está numa crise tal, que até mesmo o que é pra ser épico e espetacular não empolga mais. Nem mesmo desfechos com ultrapassagem de última volta!

Quando a gente lembra de lances maravilhosos em momentos finais de corridas como Reims 1953 (Hawthorn x Fangio), Monza 1967 (Surtees x Brabham x Clark), Kyalami 1978 (Peterson x Depailler), Silverstone 1987 (Mansell x Piquet), Suzuka 2005 (Räikkönen x Fisichella) ou Montreal 2011 (Button x Vettel), e olha pro que aconteceu neste último domingo, bate até enjoo no estômago.

Confesso que estou de saco cheio de Lewis Hamilton x Nico Rosberg. Já enjoou. Deu pra ti, como diriam os gaúchos. A meus olhos, os dois já deram provas mais do que suficientes para mostrar que são pilotos aptos, mas não são homens a altura do equipamento e da responsabilidade que tem em mãos.

“Ah, mas a culpa desse acidente na Áustria foi toda do Rosberg”. Sem dúvida, disso não há como discordar – não foi um lance controvertido, com múltiplas interpretações, como na batida do GP da Espanha<https://gptotal.com.br/?p=13254>.

Nico tinha o direito de defender a posição, mas não o direito de impedir o adversário de fazer a curva: manobra sem cérebro (brainless), como definiu Toto Wolff. Os comissários concordaram também, e aplicaram a Nico 10s em seu tempo de prova, o que não mudaria seu 4º lugar, conquistado com o carro se arrastando, após perder o pódio para Max Verstappen e Kimi Räikkönen.

Mas Lewis, que tomou a portada na cara, tem seu próprio histórico de diarreias mentais também. Tanto que mesmo sendo a vítima desse último choque, está implorando pra Mercedes não implementar ordens de equipe, o que provaria em definitivo que os dois precisam de babás porque não sabem se comportar como adultos na pista.

Em 2014, o primeiro choque entre os dois foi no GP da Bélgica. Foi bastaaaaaante ridículo: Rosberg não aliviou, e logo na segunda volta, colidiu com Lewis. Um teve o bico quebrado, outro, o pneu traseiro rasgado. A vitória acabou nas mãos de Daniel Sorrisão Ricciardo. Na época, sob o título de Dias de Super Nanny<https://gptotal.com.br/?p=9131>, escrevi:

É inacreditável que dois dos mais competentes profissionais do mundo em suas profissões, com o salário de astronômicos oito (!) dígitos anuais estejam se comportando como dois participantes de reality show.

O que realmente me irrita é que os fatores externos se sobrepõem cada vez mais ao que estes dois estão fazendo dentro de seus carros prateados na luta pelo título.

Não são mais os pegas na pista (como no Bahrein) que tomam as manchetes, mas sim o mimimi declaratório e as posturas de mocinho-bandido que flutuam de acordo com os novos acontecimentos do paddock.

O que realmente me preocupa é a história que eles estão erigindo. Sabe o que vamos contar para as gerações futuras? “A Mercedes produzia super carros naquela época, os pilotos eram rápidos, mas muito mimados, não sabiam se comportar, precisavam tomar puxão de orelha da equipe todo o tempo”.

Não sei se dá tempo pra mudar essa história. Essa lenga-lenga é a mesma há três anos. O trecho que escrevi num já longínquo agosto de 2014 cai como uma luva com o que aconteceu ontem.

Esse novo clash nasceu de um conjunto de fatores. Nico, 6º do grid, se deu bem nas táticas de pneus ao longo da corrida, inclusive no período de Safety Car, acionado quanto o então líder Sebastian Vettel teimosamente continuou na pista com pneus velhíssimos que não só estavam prestes a explodir como de fato explodiram. Teimosia da Ferrari que deu muito errado.

Nos momentos finais da corrida, Nico colocou os pneus supermacios, e deixou Lewis em xeque. Quando colocaram borracha nova para o inglês, esta era a macia, mais resistente. Na situação de Lewis, eu também chamaria o rádio e perguntaria por que compostos diferentes para ambos.

E é preciso, ao menos nesse ponto, pagar tributo à Mercedes, que acertou. Deu a Lewis um pneu com decaimento certo para aquele número de voltas com stint puxado.

Assim como em outras oportunidades, Nico não soube trabalhar a vantagem que tinha na liderança. Sucumbiu à pressão de um caçador. Já vimos isso acontecer em outras oportunidades, como Austin 2014. E com isso, aquela vantagem enorme de ter vencido as 4 primeiras corridas do ano vai esmaecendo.

Na tabela de pontos, apenas 11 pontos os separam: 153 x 142. Atrás deles vêm os pilotos da Ferrari, que agora estão rigorosamente empatados em 96 pontos.

Mais uma vez elogios e elogios a Verstappen. Seu segundo lugar, à frente de Räikkönen foi conseguido com um espetacular stint de 56 voltas com o mesmo jogo de pneus macios – o mais longo da prova. Kimi tinha pneus 7 voltas mais novo, e mesmo assim não conseguiu ameaçar o posto do jovem holandês.

Ainda mais legal do que ver Romain Grosjean pontuar novamente pela Haas foi o belíssimo 10º lugar do já ótimo Pascal Wehrlein. Com a Manor, supostamente pior carro do grid, o alemão ficou na frente da Haas de Gutiérrez, das Renault de Tambay e Warwick, perdão, de Palmer e Magnussen, e das Sauber de Nasr e Ericsson, além, claro, do simpático Rio Harianto com a outra Manor, que fechou os que completaram a prova.

Wehrlein foi humilde o suficiente para dizer que não sabe de onde tirou ritmo para conseguir entrar na zona de pontos. Eu também não sei, mas desconfio de vários fatores, sendo o principal deles, claro, o motor Mercedes.

Apesar de ser uma versão 2015, o propulsor alemão ainda é um foguete – e aparentemente melhor do que os motores 2016 da concorrência! Wehrlein, pasmem, foi o 7º mais rápido no setor 1 da pista (Verstappen, por exemplo, foi apenas o 10º), enquanto foi o 3º pior no setor 2, e o 4º pior do setor 3.

O setor 1, é bom lembrar, tem a reta dos boxes, a primeira curva, e a reta seguinte, o que se traduz num carro que compensou as deficiências de downforce com uma regulagem bem limpa, e que não era alcançado pelos rivais com chassis mais equilibrados. A Sauber, que continua zerada este ano, tinha as piores velocidades de reta do dia…

Isso, claro, nasceu de uma boa posição no grid (Pascal aproveitou bem o qualify), uma boa largada, e uma defesa limpa de posição contra carros melhores que o seu, que não tinham como ultrapassar na pista.

Por mim, já podem demitir ou Lewis ou Nico ao fim do ano, e botar Pascal no lugar. Talvez ele seja mais adulto que esses dois…

Estou em crise. A F1 já está absolutamente desmotivadora. Eu sequer assisti a corrida em Baku, que o querido Marcel Pilatti assumiu em texto pra eu poder contar o espetáculo que é Le Mans. E pior, não me fez falta nenhuma. Não bateu curiosidade, não me lamentei por não pegar nenhum VT. E olha que não perco um GP ao vivo sem motivo de força maior há muito, muito tempo. Décadas.

Não sei se vou aguentar ver ano que vem os carros de F1 com aquelas tiras de sandálias Havaianas cercando o piloto. Até o que é “em nome da segurança” se torna ligeiramente ridículo.

Como se não bastasse termos carros horrorosos, a FIA está planejando a panos baixos um esquema de equalização de motores. Já fiz essa pergunta e vou fazer de novo: como a Fórmula 1 espera resultados diferentes querendo que todos sejam iguais?

E nisso emendo outra pergunta: de que adianta um colunista azedo? Estou no meu limite. Ano que vem eu talvez pare de escrever as colunas sobre as corridas e só escreva sobre o passado. Afinal, a mim o futuro se apresenta como uma limonada sem açúcar.

Abração!

Lucas Giavoni
Lucas Giavoni
Mestre em Comunicação e Cultura, é jornalista e pesquisador acadêmico do esporte a motor. É entusiasta da Era Turbo da F1, da Indy 500 e de Le Mans.

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