O melhor de todos os tempos – parte 3

O melhor de todos os tempos – parte 2
04/08/2017
O melhor de todos os tempos – final
09/08/2017

Relembre o início desta saga clicando aqui.

A Alfa decide se retirar das competições em 33 então Rudi se junta a Chiron, que tinha sido demitido da Bugatti, para fundar a Scuderia C. C.. Eles compram 3 Alfas 8C “Monza” e a Daimler Benz cede um caminhão para o transporte. O carro de Chiron era azul com uma faixa branca e o de Rudi branco com faixa azul. Eles se inscrevem para o GP de Monaco.

No segundo dia de preparativos, Rudi leva Louis para uma volta no circuito, para que ele se familiarizasse com a Alfa. Na entrada da Tabacaria três dos quatro freios falham, o que desestabiliza o carro. Em fração de segundo Rudi teve que escolher entre mergulhar no mar ou bater na parede. Instintivamente ficou com a segunda opção.

Cuidadosamente ele tratou de tirar suas pernas do carro. Queria mostrar que estava intacto. Mas quando apoiou a perna direita no chão sentiu como se facas em brasa estivessem fincadas nela.

Rudi desmaiou e foi amparado por Louis. Foi colocado em uma cadeira na Tabacaria enquanto aguardava ser levado ao hospital, onde constataram múltiplas fraturas na cabeça do femur. Os médicos acharam que ele nunca mais poderia correr. Após seis meses com a perna engessada descobriram que sua recuperação tinha sido muito melhor que o esperado.

Com a ascensão ao poder do partido nazista em 30 de janeiro de 1933, o interesse em demonstrar a superioridade alemã se disseminou. Mercedes e Auto Union foram escolhidas como campeãs nacionais, e passaram a receber subsídios governamentais. Você ouviu esse discurso mais recentemente?

Ambas passaram então a desenvolver seus projetos para o ano seguinte.

Neubauer foi a Lugano em novembro visitar Rudi e Charly. Estava cumprindo o acordo mas queria saber se Caratsch estava em condições de pilotar. Rudi se esforçou para provar que sim mas Alfred não se convenceu, propôs um teste em AVUS no início de 34, e fecharam o acordo.

Mas quis o destino que um outro tipo de dor acometesse Caracciola. Em fevereiro o grupo de esquiadores em que sua adorada Charly estava foi atingido por uma avalanche e ela não sobreviveu.

Ele imediatamente decidiu se afastar de tudo e considerou inclusive parar de correr.

Chiron o convenceu a dar a volta de honra antes do início do GP de Monaco de 34 e apesar das dores na perna, agora cinco centímetros mais curta que a esquerda, dores que nunca mais o abandonaram, sentiu que devia voltar.

Em Abril vai fazer um teste em AVUS com a W25 e é considerado apto.

Neubauer decide não inscrever as Mercedes na primeira corrida, também em AVUS, porque as Auto Union apresentaram desempenho superior.

Mas Caratsch está de volta ao GP da Alemanha, em Nurburgring. Hans Stuck da Auto Union está na frente mas Rudi o ultrapassa por fora no Karussel na 13a. volta. Infelizmente seu motor quebra na volta seguinte.

O GP da Italia começa debaixo de um calorão. Rudi larga em quarto mas logo alcança o segundo, com Stuck novamente na liderança. Na volta 59 a dor na perna direita se torna insuportável e ele para nos boxes para ser substituído por Fagioli. Este vence, seguido por Nuvolari, que tinha substituído Stuck.

Seus melhores resultados no resto dessa temporada foram um segundo lugar no GP da Espanha.

Ele liderava e Fagioli o passou, para irritação de Neubauer, que tinha mandado o italiano se manter nessa posição. Vence a subida de montanha do Passo Klausen.

Em 1935 Caratsch e a Mercedes se mostram dominantes.

Rudi abre a temporada vencendo o GP da Bélgica, à frente de Fagioli e von Brauchitsch, que dividiram outra W25. Nuvolari obtém uma vitória surpreendente em Nurburgring com sua Alfa P3, à frente de Stuck e Rudi.

O GP da Suíça tem lugar no Circuito de Bremgarten, em Berna, Rudi vencendo à frente de Fagioli e a nova estrela da Auto Union, Bernd Rosemeyer.

Rudi e Fagioli repetem a dose na Espanha, sendo seguidos por von Brauchitsch.

Nesse GP aconteceu uma coisa engraçada. As posições no grid eram sorteadas e Rudi foi contemplado com a última fila. Ele costumava largar e lutar logo para assumir a liderança. Mas nessa largada ele esqueceu que a posição dos pedais do carro de corrida era diferente da do seu carro de passeio e pisou no acelerador quando deveria brecar. E assim chegou à primeira curva em velocidade muito acima da que seria o normal. Os concorrentes, vendo aquele maluco chegar, trataram de sair do caminho para não terem suas corridas terminada antes da primeira volta (parecia um Grosjean no início da carreira?) foram dando passagem, e de repente era ele quem estava na liderança.

Mesmo tendo sido traído pela quebra da transmissão no GP da Italia, esses resultados asseguram o primeiro campeonato para Caratsch. Em uma época em que o transporte intercontinental era feito por via marítima, ser campeão europeu equivalia a ser campeão do mundo.

Ele ainda vence em Eifelrennen e termina em segundo em Barcelona, no Penya Rhin GP. Larga mal no GP de Tripoli (a Libia era então uma colónia italiana) e após 4 paradas para troca de pneus, que sofriam com o calor intenso do deserto, chega ao terceiro lugar. Herda o primeiro quando Nuvolari e Varzi param nos boxes e aí se mantém, apesar de um ataque de Varzi. Rudi contou depois que foi durante essa corrida que ele se sentiu realmente recuperado do acidente.

Para a temporada de 36 a Auto Union apresentou seu Tipo C. A Mercedes tinha mantido o chassis W25, apenas encurtado, mas com um motor de quase 5L. A combinação não funcionou.

Apesar disso Rudi sai vencendo em Monaco, mas debaixo de chuva, o Regenmeister voltou.

Ele obtém ainda uma vitória em Tunis, mas o carro era tão inferior, quebrava tanto, que Neubauer decidiu retirar a Mercedes no meio do campeonato. E assim Rosemeyer se tornou campeão.

Para 37 a Mercedes não podia falhar, e trouxe o chassis W125, muito superior, com um motor supercharged de 5,6L, oito cilindros, fornecendo 650HP (150 a mais que o motor do ano anterior).

A primeira corrida importante do ano ocorreu em AVUS, que agora tinha sua curva norte inclinada, aparentemente para atender uma sugestão do Führer.

Em uma W125 carenada Rudi duela com Bernd a uma média de 250km/h até que a transmissão quebra.

No GP da Alemanha ele larga na segunda fila mas logo assume a ponta e lá se mantém até o final, seguido por von Brauchitsch e Rosemeyer.

Em Monaco Rudi larga na ponta e se reveza na liderança com von B., até que um parafuso cai dentro do sistema de indução durante um pit stop, fazendo com que ele perca 3 minutos e meio.

O GP da Suiça, em Bremgarten, é disputado debaixo de chuva. Caratsch não apenas vence como estabelece um novo recorde de volta, 169km/h.

O GP da Italia seria disputado, pela primeira vez, em Livorno. Rudi larga na ponta e vence com 0,4 segundos sobre seu colega Lang. Esses resultados novamente asseguram, com antecipação, seu segundo campeonato. Rudi vence a corrida seguinte, Masaryk Grand Prix, herdando a ponta quando Bernd derrapa e atinge a guia da calçada.

Nesse ano (Junho) Caracciola se casa pela segunda vez, com Alice “Baby” Hoffman-Trobeck, cronometrista da Mercedes. Ele estava no topo de sua carreira. Junto com Neubauer e o engenheiro Rudolf Uhlenhaut, outra lenda, formavam o primeiro trio vencedor da história, antecedendo em muito Todt-Brawn-Schumacher.

Baby Caracciola era tida como uma gênio da cronometragem. Conseguia fornecer uma visão clara das diferenças de tempo do grid inteiro em tempo muito curto. Antecessora das equipes TAG Heuer e Longines.

Na próxima coluna, a conclusão dessa história.

Carlos Chiesa
Carlos Chiesa
Publicitário, criou campanhas para VW, Ford e Fiat. Ganhou inúmeros prêmios nessa atividade, inclusive 2 Grand Prix. Acompanha F1 desde os primeiros sucessos do Emerson Fittipaldi.

3 Comments

  1. Fernando Marques disse:

    Chiesa,

    meu questionamento também se dá no fato no valor do orçamento anual que a Mercedes, Ferrari, Honda e Renault possuem hoje em dia que praticamente impede qualquer aventureiro de tentar alguma sorte na Formula 1 e conseguir ter destaque … ao fim dos anos 50 a maioria das grandes montadoras saíram da Formula 1 e os garagistas ingleses tiveram uma oportunidade impar de entrar e brilhar na Formula 1. E isso durou praticamente até ao fim dos anos 90 … depois disso só a Mclaren que hoje em dia de garagista não tem nada) conseguiu triunfar com Hamilton …
    Mas nos anos 50 e antes disso a Formula 1 ou na Formula Grand Prix eram dominados pelas grandes montadoras … mas creio que não era tão inflacionário como hoje ou então a perda da sensação do poder aquisitivo do dinheiro me faça pensar que poderia haver chances para equipes não oficiais brilharem nas pistas …
    Com relação a comparar a carreira do Rudi e de outros grandes nomes da época com o que vemos hoje é impossível … estes caras foram heróis, não mediam esforços para estar nas pistas e não eram tão apegados a tanto dinheiro como atualmente … não consigo ver ninguém de hoje com este status … nem Schumacher … isso acabou com o Senna … pega a carreira do Piquet ou do Lauda como exemplos para ver o que eles fizeram para chegar na Formula 1 e triunfarem …
    Mais uma vez parabéns pela história … poder relembrar estes bons tempos do automobilismo faz muito bem a saúde …

    Fernando Marques

  2. Fernando Marques disse:

    Chiesa,

    Rudi Caracciola … que carreira!!!!
    Uma pergunta, ou melhor te peço uma opinião: Corridas de automóveis sempre foi coisa pra rico. Tinha que ter muito dinheiro para correr. As grandes montadoras como a Mercedes, Auto Union, Alfa Romeu inflacionavam muito o automobilismo naquela época?
    Salve as boas histórias!!!

    Fernando Marques
    Niterói RJ

    • Carlos Chiesa disse:

      Oi Fernando. Você pegou muito bem o ponto, é uma carreira e tanto. Extraordinária, mesmo comparando com supercampeões pós-guerra, não acha? Quase covardia comparar com certos astros de hoje, me parece. Sobre a sua pergunta, penso que as montadoras observaram que os ricos que competiam não tinham muito compromisso, estavam mais a fim de divertimento do que trabalhar. Com isso pilotos que competiam na base do sacrifício, trocando o almoço pela janta para poder correr, começaram a se mostrar mais interessantes. Imagine-se no lugar do Neubauer. Você vê aquele rapaz de nome italiano desempenhando esplendidamente em categorias inferiores. Nota que ele se dispõe a conversar com o engenheiro-chefe, Uhlenaut, e trocar informações úteis. Ao contrário dos ricos, Rudi precisava vencer para se manter e se manter no esporte, portanto era um compromisso só. Não creio que os salários inflacionaram nada, porque não devia existir uma base de comparação. Penso que esse quadro continuou, em escala cada vez menor, ate o final dos anos 50. Taffy von Trips era nobre, e teve um conde belga que morreu nos anos 60 a bordo daquela Porsche de F1, naquele momento já obsoleta (está na minha coluna sobre a temporada de 64). O equivalente a eles hoje são os pilotos que pagam para correr, concorda?

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