Óculos de sol valorizado

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Cada edição das 500 milhas de Indianápolis é uma chance de vermos a história sendo escrita. E dessa vez foi especial.

Quem gosta de automobilismo já sabe: cada edição que assistimos das 500 Milhas de Indianápolis é a História do esporte a motor sendo escrita diante de nossos olhos. E diante de uma vitória tão popular como foi a de Tony Kanaan neste domingo, guardaremos essa edição da principal corrida dos Estados Unidos com ainda mais carinho na memória.

Se havia um piloto, dentre os 33 que largaram, que até então mais havia lutado pela vitória, este piloto era Kanaan. Durante a corrida, TK igualava um incômodo recorde. Era a 9ª edição em que ele liderava sem vencer, assim como havia feito Michael Andretti no passado – lembrando que o primogênito de Mario jamais saboreou o leite da vitória. E Tony já tinha o recorde pessoal de ter liderado ao menos uma volta nas sete primeiras edições em que correu, sendo esta sua 12ª participação.

Esse sentimento de merecimento contagiou o público presente no Indianapolis Motor Speedway – e torna-se uma lição ao público brasileiro. Mesmo com os populares garotos locais Marco Andretti (olha que sobrenome!) e Ryan Hunter-Reay (atual campeão) como fortíssimos candidatos, a galera levantava mesmo com o Tony. Eles, que sempre são classificados como ufanistas patrióticos, deixam o sentimento de merecimento sobressair-se à nacionalidade, algo que não me recordo de ter visto por essas terras.

De quebra, ele pode gabar-se de ter vencido a mais rápida e mais disputada edição de toda a história centenária do Speedway. Isso porque a velocidade média de 187.433 mph (301.644 km/h) superou o da edição de 1990 vencida pelo holandês voador Arie Luyendyk, com média de 185.981 mph. E foi a mais disputada pelo recorde de 68 alternâncias de líder durante as 200 voltas, superando a edição de 2012 com o famoso duelo “Win or Wall” entre Franchitti e Sato. Os dois, por sinal, estiveram longe da win e junto do wall este ano…

Tony recebeu congratulações de todas as partes do mundo. Uma das mais interessantes veio de Gil de Ferran, que exatamente uma década atrás triunfava na Brickyard. Ele fotografou o próprio anel de vencedor, e mandou a foto para Tony via Twitter: “Welcome”.

Na corrida, como reflexo do treinos, o que vimos foi um total domínio dos pilotos com motores Chevrolet (não se engane pela gravatinha dourada: é um legítimo Ilmor). Restava aos pilotos Honda apenas uma cartada: com motores mais econômicos, a única esperança era consegui fazer um pit a menos que a concorrência, ou de não precisar de um splash-and-go nos momentos decisivos. Mas nada disso aconteceu, por conta das bandeiras amarelas no final, que permitiram a todos reabastecer e ter combustível para ir até o final sem problemas.

Outra particularidade observada: pilotos de cara pro vento – ou seja, que tomavam a liderança – sempre consumiam mais, em nítida semelhança com o que ocorre com o ciclismo. Por serem obrigados a abastecer uma ou duas voltas mais cedo que a concorrência, acabavam ficando para trás, por vezes sem chance de escalar o pelotão novamente. O pole Ed Carpenter, que chegou em 10º, foi um caso típico.

Este ano, mais do que nunca, ficou claro que a tática correta para se ganhar a corrida foi acompanhar o ritmo dos mais fortes e ter equipamento para extrair tudo no final, incluindo trabalho no vácuo e relargadas agressivas, porém perfeitas. Este cenário ajuda a explicar o porquê das 68 mudanças de líder e o porquê de ter sido vencedor o Tony, que mostrou-se combatido e determinado desde o começo.

Faltando 13 voltas para o fim, Graham Rahal bateu e provocou uma bandeira amarela que tinha tudo para decidir a corrida. Nessa altura, Hunter-Reay era líder e Tony, o 2º. Era nítida a postura intimidadora que TK exercia durante o período de Pace Car. E quando veio a verde, a três giros do fim, ele partiu como um predador rumo à liderança. Três curvas depois, o tri-vencedor Franchitti bateu para selar a vitória do amigo. Mesmo que com final abreviado, é possível crer que seria muito difícil super Kanaan dali em diante se a bandeira verde se mantivesse.

O próprio Kanaan nunca escondeu isso: no tempo em que corria na equipe de Michael Andretti, puxou o patrão num canto e perguntou algo parecido com “cara, agora que você tá aposentado, me conta como é que você fazia pra largar e relargar tão bem”. TK aprendeu direitinho. Ele é, de longe, o mais habilidoso nesse quesito desde a aposentadoria de seu antigo patrão e mentor.

Dentre os principais postulantes à vitória, além dos já mencionados Andretti e Hunter-Reay, tivemos a excelente surpresa Carlos Muñoz, de imberbes 21 anos. O colombiano da Indy Lights comportou-se como veterano e, com um carro muito bem acertado pela Andretti, esteve sempre no pelotão da frente, pilotando sem afobamento. Ele também passou Hunter-Reay na relargada final e fechou a corrida num espantoso 2º lugar. Certamente impressionante.

Outro destaque positivo foi AJ Allmendinger, também em participação interina, pela Penske. Após ter sido pego ano passado no exame antidoping da Nascar por inadvertidamente ter tomado uma vitamina com substância proibida, viu seu mundo despencar: foi dispensado pela Penske, que, entretanto, agora lhe deu essa chance de voltar para os monopostos. E o americano andou muito bem, chegando a brigar pela vitória. Seu azar foi ter o cinto desatado durante a corrida: um pit extra minou suas chances de permanecer no pelotão dianteiro.

Helio Castroneves, que fechou em 6º, sempre acompanhou o ritmo dos mais fortes, mas nunca mostrou-se como candidato à vitória. Dentre os pilotos da Penske, Allmendinger foi realmente o melhor, mesmo que Will Power também tenha liderado parte da corrida – o australiano foi apenas o 22º e último dos que estavam na mesma volta do líder.

Nem vou comentar a burrice fundamental da Band em cortar a transmissão após a bandeirada e perder a comemoração histórica do Tony para passar um importantíssimo jogo da 1ª de 38 rodadas de campeonato brasileiro de futebol. O que eu acabei de descrever sobre o fato já é mais que suficiente.

Encerro justificando o título desta coluna. Em 2009, Tony foi vítima de um incêndio de reabastecimento durante a etapa de Edmonton, sofrendo algumas queimaduras leves. Tratou o assunto com bom humor, como sempre, e logo surgiu o apelido de “Tocha Humana”, em alusão ao personagem do então recém-lançado filme do Quarteto Fantástico.

Resolvi fazer no Photoshop uma montagem: peguei o pôster do filme e coloquei a cabeça de Kanaan por cima da do ator Chris Evans, com todos os efeitos de iluminação, cor e sombra para ficar caprichado. E mandei a imagem através do Anderson Marsili, competente assessor de comunicação do Tony.

Resultado: o Tony gostou tanto da montagem que pediu ao Marsili para me mandar de presente um estiloso óculos de sol HB, sua marca pessoal. Meu irmão Guilherme adorou o regalo e pediu para ficar com ele.

Hoje posso dizer com orgulho que temos em casa um presente dado por um cara que é campeão da Indy e vencedor das 500 Milhas de Indianápolis. Está mais valorizado do que nunca. Agora, teremos que comprar uma base, uma redoma de vidro e um sistema de alarme para guardá-lo…

Próxima parada: Le Mans. Ah, fim de maio e começo de junho é um período maravilhoso para o esporte a motor…

Aquele abraço!

Lucas Giavoni

Lucas Giavoni
Lucas Giavoni
Mestre em Comunicação e Cultura, é jornalista e pesquisador acadêmico do esporte a motor. É entusiasta da Era Turbo da F1, da Indy 500 e de Le Mans.

12 Comments

  1. Rafael Carvalho de Oliveira disse:

    Espero que está vitória nas 500 milhas de mais patrocínios ao Tony para continuar na indy ano que vem ou uma equipe das grandes o contrate! A KV é uma equipe promissora mas ainda não tem potencial para brigar de igual com as grandes! Posso até quebrar a cara até o fim do campeonato mas temo que ele seja na KV como um Alonso na Ferrari. O TK pode até disputar o titulo mas vai ficar sempre no quase. Entendam, o que eu quero dizer é que desde 2010 o Alonso esta sempre no quase na Ferrari.

  2. Rafael Carvalho de Oliveira disse:

    A indy este foi a mais disputada dos últimos anos, tanto no fim, no meio e nas primeiras posições! Aquela batida do Hildebrand logo no começo da corrida huuummm…. Acho que Panther passou da hora de dispensar o piloto, o cara é muito ruim! A Panther tem estrutura para alcançar vôos maiores, não ficar brigando com pelotão do fim e o meio do grid. O colombiano Carlos Munhoz já deixou seu cartão de visitas na indy, desempenho surpreendente. Sei que não posso julga lo por apenas uma corrida mas me ar risco em dizer que ele melhor que o francês Tristan Vautier! O Viso que trate de acelerar porque se não vai perder a vaga o ano que vem, o Munhoz esta no mercado dando sopa!

  3. Flaviz Guerra disse:

    Ahahah verdade sobre o óculos Lucas. Pela sua coluna, lembrei que também tenho um guardado (fazia o site da HB uns 2 anos atrás). Vou copiar sua sugestão da redoma 😛

    abraços

    • Lucas Giavoni disse:

      Viu só, Flaviz, a relíquia que tenho em casa?

      Vou ter que fazer uma apólice de seguro para proteger esse meu presentinho especial…

      Abração!

      Lucas Giavoni

  4. Mauro Santana disse:

    Bela coluna amigo Lucas!

    Concordo com o Fernando, e tenho um baita orgulho de poder ter assistido ao vivo pela TV todas estas vitórias brasileiras na Indy 500.

    Mais uma vez, PARABÉNS TK, e obrigado por nos proporcionar uma grande emoção, e que foi muito semelhante com a que tive em 1989 com a vitória do Grande Rato!

    Abraço!

    Mauro Santana
    Curitiba-PR

    • Lucas Giavoni disse:

      Obrigado pelas palavras, amigo Mauro!

      Felizmente comecei bem cedo a acompanhar o esporte a motor, e, não somente peguei o ápice da rivalidade Prost-Senna como também assisti a temporada 89 da Indy, vibrando muito com o Emerson. Tenho muita admiração por aquela geração de virada de década, com o grande Rick Mears, Mario e Michael Andretti, Al Unser Jr., Bobby Rahal, Arie Luyendyk, Danny Sullivan, Raul Boesel, Teo Fabi… Era muito legal.

      Abração!

      Lucas Giavoni

      • Lucas Giavoni disse:

        Ah, detalhe importante!

        Tenho em casa o famoso pôster da extinta revista Grid com o Raio-X da Penske-Chevrolet 89 do Emerson que ele… autografou pra mim em 2008. Outra relíquia pra botar no seguro!

        • Mauro Santana disse:

          Olá Lucas!

          Realmente aquele tempo tínhamos grandes feras na Indy, e as corridas eram um show, não é a toa que naqueles anos o velho Bernie morria de medo da Indy vir para o Brasil, um dos motivos que ele fez questão de detonar o anel externo de Interlagos.

          Eu tenho um poster do Emerson de pé ao lado do seu Penske #20 1989 de capacete calçando as luvas para entrar no bólido, mas infelizmente ainda não tive um “tempinho” para pedir ao velho Rato que o autografe para mim, rsrs…

          E como aquela Penske era linda!

          Abraço!

          Mauro Santana
          Curitiba-PR

  5. Fernando Marques disse:

    Eu acho que esta vitoria do Tony levanta uma questão interessante. O Emerson Fittipaldi deve estar mais que orgulhoso de abrir as porteiras para o automobilismo brasileiro. Ensinou o caminho para ser campeão na Formula 1 e o Brasil ao todo tem 8 titulos e mais de 100 vitorias.
    Fez a mesma coisa na Indy Cars. Hoje o Brasil alem de titulos na categoria ( me recordem o quanto?) e simplesmente 8 vitorias nas 500 Milhas de Indianapolis, palco onde somente americanos brilhavam …

    Fernando MArques
    Niterói RJ

    • admin disse:

      Fernando, somando CART e IRL, acho que são 5 (1 do Emerson, 2 do Ferran, 1 do Kanaan e 1 do Da Matta).

      abraço!

    • Lucas Giavoni disse:

      Oi Fernando!

      Emerson Fittipaldi é um personagem tão incrível do esporte a motor brasileiro que foi o homem a abrir as portas não apenas da F1, como também na Indy, quando recomeçou a carreira do zero e foi nos States tão vitorioso quando em seus tempos de Europa. Somando Indy e Cart, o Brasil possui 5 títulos e mais de 100 vitórias, um retrospecto impressionante, mas que tende a diminuir, pois a renovação de estrelas “tipo exportação” têm diminuído consideravelmente. É um reflexo da nova realidade do esporte a motor internacional, e todo o atraso do automobilismo brasileiro, que não tem categorias de formação que deem conta disso.

      Abração!

      Lucas Giavoni

      • Fernando Marques disse:

        Se não me engano o Bruno Junqueira também triunfou na Indy … ou estou errado …
        Já falei aqui que o automobilismo brasileiro, internamente falando, não soube tirar proveito das vitorias e sucesso por nossos pilotos mundo afora … é uma pena hoje a nossa esperança se restringir apenas ao Felipe Nash …

        Fernando MArques
        Niterói RJ

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