Oportunidades 1

Live com Emerson e Emmo
16/06/2020
Oportunidades 2
23/06/2020

Nestes dias de confinamento imposto pelas autoridades e pelo nosso próprio medo a um inimigo invisível e ímpio, fico com a estranha sensação de parecer um monge trancado em sua cela e o dia inteiro dedicado ao estudo e à introspecção, enquanto o mundo segue impertérrito seu curso lá fora.

Assim, como um expectador entristecido por todo o sofrimento que nos rodeia, que atinge já milhares de pessoas afligidas pela perda irreparável de algum ser querido, e impotente tentando imaginar o que o futuro ainda nos reserva ou temeroso em pensar naquilo que encontraremos lá fora quando finalmente recuperarmos nossa ansiada “liberdade”, só nos resta esperar e desejar que todo este sacrifício e terrível tributo de dor, tenham servido para sacudir mais de uma consciência e para trazer à tona tudo de bom que há em nós para, assim, sair novamente à rua sendo melhores pessoas das que éramos antes desta nossa reclusão. A vida nos está oferecendo uma nova oportunidade para fazer isso. Não a desperdicemos!

Pensando nesta nova oportunidade que temos perante nossos olhos, me veio à memória uma velha fábula chinesa (não só vírus vem de lá!) que, de alguma forma, me inspirou esta humilde coluna.

Numa remota zona rural da China, morava um menino cujo nome era Chiang. Sendo órfão, vivia com seus avôs e os três, com grande sacrifício e duro trabalho, sobreviviam do que sua humilde roça e alguns animais lhes proporcionavam. Porém, os velhinhos queriam algo melhor para o neto e, vendo que o garoto era bastante inteligente, o inscrevem na escola da aldeia mais próxima, que ficava a vários quilômetros de distância.

Chiang tinha de recorrer essa distância a pé e, uma vez de volta em casa, tinha que ajudar nas tarefas de lavoura e no cuidado dos animais. Mesmo assim, avançava muito bem nos estudos. Contudo, conforme se aproximava o fim do curso e devia superar o exame final, como requisito para continuar na escola, as coisas começaram a ficar mais e mais difíceis para o garoto.

O inverno se aproximava inexorável e os dias eram cada vez mais curtos. Quando terminava de ajudar seus avôs, Chiang já não podia estudar para o exame, pois na humilde cabana em que viviam não havia luz artificial. Isto era algo que a Chiang lhe deixava muito preocupado, pois sem luz para poder ler seus livros e se preparar bem para o exame, seu sonho de continuar os estudos podia se truncar.

Os dias passavam e o sol se ocultava cada vez mais cedo, fazendo que as noites fossem cada vez mais longas e escuras.

Numa dessas noites, enquanto olhava pela janela a bela lua cheia que brilhava no firmamento, nosso garoto, já desanimado e triste por sua situação, vê como a primeira nevada do inverno havia coberto os campos com um espesso manto branco. Então, Chiang percebe como aquele manto branco refletia o brilho da lua e decide sair da cabana para comprovar se aquela luz era suficiente para poder ler seus livros. Para sua grata surpresa, assim era e o menino, ainda a custa de passar frio, noite após noite, aproveita aquela luz para estudar lá no meio do campo.

Assim, bem preparado, Chiang consegue superar o exame com excelência… para seguir adiante com seus estudos.

Aproveitar as oportunidades que se nos apresentam é algo fundamental em todos os campos da vida e na Fórmula 1 não seria diferente.

Nem sempre essas oportunidades dependem de um mesmo, pois sabemos que, em mais de uma ocasião, dispor de um bom patrocinador ou ter uma nacionalidade determinada, resultam muito convenientes para que as melhores oportunidades se apresentem. Tomar a decisão correta também é um fator muito importante e logo nos vem à memória os casos de pilotos como Jacky Ickx ou Carlos Reutemann, cujas carreiras foram menos brilhantes do que se esperava do seu talento, por estar no lugar certo… mas no momento errado.

Com tudo isso em mente e tratando de ver se, de algum modo, podia encontrar uma relação entre o histórico de um piloto e os resultados que este obteve ao longo de sua carreira, decidi me concentrar em encontrar essa relação no caso daqueles pilotos que conseguiram se consagrar campeões em duas ou mais ocasiões, lembrando que os anais da Fórmula 1 registram 16 pilotos com dois ou mais títulos.

Como sabem, sempre gosto de apresentar tudo de forma proporcional, pois creio que a frieza dos números absolutos não nos conta toda a verdade. Assim, busquei uma série de fatores, além dos ditos números, para que nos ajudassem a ter uma melhor ideia de como estes pilotos se desenvolveram ao longo dos anos e os resultados nos mostram algumas curiosidades.

Os primeiros pilotos apresentados são aqueles cujas carreiras se desenvolveram, majoritariamente, nas décadas dos anos 50 e 60, e um resumo de sua trajetória na Fórmula 1 nos mostra a seguinte informação:

Aqui temos a idade de suas estreias e a de suas retiradas, assim como as temporadas disputadas por cada um deles. Também vemos que percentagens de tempo de suas vidas haviam dedicado à competição, respeito à idade que tinham no momento de sua retirada.

 Aqui vemos estes dados representados num gráfico:

Como vemos, Graham Hill e Jack Brabham foram os que dedicaram a maior porção de suas vidas à Fórmula 1, enquanto que Ascari e Clark os que tiveram a mais breve estância na categoria, ainda que temos que recordar que ambos perderam a vida de forma prematura em acidentes, truncando suas brilhantes carreiras. Clark, com 24 anos, foi quem mais jovem iniciou seu andamento no campeonato e, ao perder a vida também bastante jovem, apresenta uma percentagem alta no quesito de porção de vida dedicada à competição.

Por sua parte, Fangio faria sua estreia no campeonato apenas uns dias antes de cumprir 40 anos de idade. Como uma espécie de presente de aniversário, o argentino venceria o GP de Mônaco, sua segunda aparição na Fórmula 1!

 

 

Os seguintes dados compilados se referem aos próprios resultados obtidos durante suas carreiras na categoria, mas, como disse sempre apresentados de maneira proporcional:

Neste caso, apresento a percentagem de vitórias durante suas carreiras unicamente em relação às corridas terminadas. Faço isto devido ao fato de que a fiabilidade dos carros foi aumentando muito com os anos e, desde que o sistema de pontos que leva em conta todas as corridas foi introduzido em 1991, esta passou a ser crucial no desfecho dos campeonatos, sendo assim algo que as equipes buscavam conseguir com afinco. Inclusive, desde faz já tempo, a fiabilidade é uma exigência do regulamento, o que eleva as oportunidades de obter bons resultados com mais frequência. Portanto, achei mais justo levar em consideração apenas as corridas terminadas.

Também apresento a percentagem de vitórias nas temporadas em que os pilotos foram sérios concorrentes ao título, sendo finalmente campeões ou estiveram em condições de disputar o título até a última corrida (por exemplo, Piquet em 1986), assim como essa mesma percentagem para o resto de temporadas.

Por último, temos o que eu chamo de “coeficiente de aproveitamento” e com o que trato de ver como os dados anteriores se relacionam entre si para nos mostrar que tão bom foi o grau de aproveitamento dos pilotos nas temporadas em que estiveram competindo na máxima categoria do automobilismo. Para isso busquei uma formula o mais simples possível que nos oferecesse um resultado claro e proporcional desse aproveitamento. Assim a fórmula escolhida é esta:

Segundo esta fórmula, o coeficiente máximo que se poderia alcançar seria de 11, como resultado de conquistar o campeonato vencendo todas as provas nas temporadas participadas.

Vistos de maneira gráfica, estes dados se apresentam assim:

Aqui vemos claramente como Alberto Ascari e Jim Clark  aproveitaram muito bem sua breve passagem pela Fórmula 1 e de como suas mortes nos privou de dois excelentes pilotos que, sem dúvida, ainda teriam dado muitas satisfações aos entusiastas do automobilismo.

No caso de Clark é quase certo que o campeonato de 1968 seria seu se não tivesse perdido a vida no ínterim entre os GPS da África do Sul, que vencera, e o GP da Espanha. Porém, isso brindou uma oportunidade de ouro a seu companheiro na Lotus, Graham Hill, quem a aproveitaria muito bem para conquistar seu segundo título. No primeiro deles, Hill soube aproveitar com mestria sua pilotagem refinada para poupar o carro, sendo o único piloto a conseguir terminar todas as provas do calendário. Contudo, sua longevidade na categoria, deixa sua percentagem de aproveitamento como a mais baixa, seguido por Brabham, outro piloto longevo.

Concluo em nosso próximo encontro. Bom final de semana a todos

Manuel Blanco

Manuel Blanco
Manuel Blanco
Desenhista/Projetista, acompanha a formula 1 desde os tempos de Fittipaldi É um saudoso da categoria em seus anos 70 e 80. Atualmente mora em Valência (ESP)

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