Alguns leitores já perguntaram porque o italiano Achille Varzi, um dos maiores pilotos de todos os tempos, não aparece nos textos de George Monkhouse, publicados aqui no GPTotal por Carlos Chiesa, sobre a temporada de 1937. Afinal, ao lado de Tazio Nuvolari, Bernd Rosemeyer e Rudy Caracciola, Varzi é um dos astros da época de ouro do automobilismo, um piloto magnífico, de estilo suave e eficiente, com vitórias antológicas na carreira, sendo uma das esperanças da equipe Auto Union na luta contra a Ferrari e a Mercedes.
A explicação para a ausência de Varzi – ele fará uma única corrida importante em 37 – é um grande segredo do automobilismo, uma história que envolve adultério e vício numa droga terrível, a morfina. E, pior, um vício a que Varzi foi induzido pela mulher que amava.
Achille Varzi nasceu em 8 de agosto de 1904 em Galliate, próxima a Milão, filho de um fabricante de tecidos. Começou a correr com seus irmãos em motocicletas nos anos 20. Alto e elegante, Varzi já tinha uma reputação formada em 23, quando encontrou pela frente Tazio Nuvolari, um mantovano baixote e desengonçado. Seriam rivais ferrenhos nas pistas durante a vida inteira, o que não impediu que se tornassem bons amigos fora delas, a ponto de, no final de 27, quando decidiram passar ao automobilismo, terem formado uma equipe para a qual compraram carros da marca Bugatti.
A equipe durou pouco. Batido por Tazio nas quatro primeiras corridas de 28, Varzi comprou um Alfa e foi cuidar da vida. Em 29, tornou-se campeão italiano. Em 30, junta-se, assim como Tazio, a equipe oficial da Alfa Romeo e sofre nova derrota para o rival, desta vez nas Mille Miglia, numa corrida antológica, onde Tazio recupera grande desvantagem, dirigindo com os faróis apagados durante a madrugada e assim evitando alertar o rival.
Mas Varzi não demoraria a conquistar a sua vitória antológica, naquele mesmo ano, em Targa Florio. Levando consigo um mecânico, como mandava a regra naqueles tempos, Varzi tentou reabastecer o carro em movimento com gasolina de uma lata. O combustível acabou caindo sobre o escapamento, incendiando o carro. Varzi não considerou aquilo grave o bastante para estacionar e seguiu assim até a bandeirada. Somadas a outras vitórias, ele é proclamado novamente campeão italiano de 30.
Outro encontro marcante entre Tazio e Varzi aconteceria em Mônaco, 1933. Numa corrida de 100 voltas e mais de 3 horas e meia de duração, os italianos disputaram a liderança centímetro a centímetro, até que, na última volta, Varzi forçou uma ultrapassagem impossível na subida para o Cassino. Tazio tentou retomar a ponta mas seu motor simplesmente não suportou o esforço, explodindo espetacularmente.
Semanas mais tarde, a dupla italiana se envolveria numa das grandes farsas da história do automobilismo, combinando o resultado do GP de Tripoli para que pudesse, mancomunada com outras pessoas, usufruir um prêmio milionário concedido pela loteria italiana.
Em 34, Varzi assina com a equipe Ferrari, que competia com carros da Alfa Romeo, mas logo tornou-se claro que o futuro estava nas recém chegadas equipes alemãs, turbinadas pelo dinheiro nazista, e Varzi assina com a Auto Union para a temporada seguinte.
Lá, ele se apaixona perdidamente – porque foi um amor de perdição – pela alemã Ilse, casada com seu companheiro de equipe Paul Pietsch. Varzi era solteiro e vinha “enrolando” uma namorada de juventude, Norma, que termina abandonada.
Varzi e Ilse começam a se ver clandestinamente mas, na medida em que cresce a paixão, acabam deixando transparecer a relação até que o caso se torna evidente para os mais próximos. Os resultados de Varzi são poucos em 35, a despeito de algumas corridas brilhantes.
No final do ano, Pietsch deixa a equipe e a mulher, que passa a viver com Varzi. Começavam aí os problemas.
Mas esta parte da história fica para nossa próxima coluna.
Abraços
Eduardo Correa