Terceiro estágio

Embalamos para o tri?
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A temporada, deste modo, tem tudo para terminar sendo descrita nos livros de história como aquela que teve três estágios. Começou confusa, cheia de vencedores, viu Alonso se destaca para no final ter o alemão retomando as rédeas nas corridas finais, em hegemonia igual a de 2011.

Bem-vindos novamente a 2012, após uma bem sucedida viagem para 1986, na minha temporada preferida. Tivemos neste fim de semana um GP da Índia que nos indicou de modo definitivo um novo – e conhecido – rumo ao campeonato.

No começo do ano, como já foi amplamente debatido, a imprevisibilidade foi a grande atração – por vezes alardeada ao exagero (para não usar a palavra “deslumbre”) por parte da imprensa. Hoje até nos perguntamos, um pouco atordoados, como diabos Nico e Pastor conseguiram vitórias nas primeiras provas.

Esse ambiente embaralhado é bastante raro na F1, e aconteceu em alguns momentos bem pontuais, como em 1982 – ainda que, naquele caso, a tragédia tenha sido fator preponderante, quando pensamos que Gilles e Didier eram donos do melhor carro daquele momento. E também haviam outros fatores, como a migração para o Turbo, guerra de pneus, regulamentos permissivos (lê-se “não imbecis”), carros que permitiam ultrapassagens com muito mais naturalidade etc.

Em meio ao caos do início, começou a destacar-se Fernando Alonso, o homem com maior poder de adaptação da F1 atual, vide a coluna do meu irmão Márcio Madeira. Tinha comigo que, munido de uma combinação de velocidade e consistência acima da média, da maneira como os eventos aconteciam, e com a capacidade do espanhol em tirar o máximo de pontos que as corridas lhe permitiam (sobretudo naquela vitória sensacional em Valencia), o tri seria dele. De maneira mais do que justa.

Entretanto, a partir de Suzuka, aproximadamente, chegamos a um segundo estágio desta camaleônica temporada: a polarização. Se antes um monte de candidatos perseguia Alonso a uma distância relativamente curta – e com carros que por vezes eram superior, apenas para apimentar ainda mais o contexto -, nas últimas corridas vimos Sebastian Vettel desgarrar dos demais concorrentes e se apresentar como o principal rival.

A polarização é um estágio muito mais conhecido e comum. Duas equipes ou, sobretudo, dois pilotos, se mostram logo em estágios iniciais, como postulantes ao título. Historicamente, temos exemplos às pencas. Para 2012, este estágio demorou a acontecer, mas veio. Realisticamente, não é possível dizer que o título vai ficar com alguém que não seja Fernando Alonso ou Sebastian Vettel. Tanto que o terceiro colocado (ainda) é Kimi Räikkönen, com campanha maravilhosamente consistente para quem teve, na maioria das vezes, apenas na terceira ou quarta equipe mais rápida dos fins de semana de GP. Comparei a campanha do gélido finlandês à de 1990 de Piquet. De fato, está cada vez mais parecida, só falta vitória nas últimas corridas.

Entretanto, o GP da Índia nos trouxe definitivamente para um terceiro estágio (!) no ano, que dá título a este texto. A quarta vitória seguida de Vettel fez surgir uma velha conhecida: a HEGEMONIA, conceito este já explorado de modo bem direto pelo Edu – em textos com parte 1 e 2.

Sebastian, com o inegável brilhantismo de Adrian Newey a solucionar problemas, parece ter recuperado aquela forma arrasadora de 2011. O alemão é um piloto com menos adaptabilidade que Alonso, isto é fato. Porém, nas condições certas – e estamos presenciando uma condição pra lá de certa -, é veloz e virtualmente imbatível. Faz as coisas parecerem fáceis. Com o carro certo, Vettel crava a pole (não custa lembrar que ele já é o 3º poleman da história), larga bem e é capaz de abrir 10s em 15 voltas de maneira irritantemente tranquila.

As hegemonias sempre foram muito presentes na F1, ao mesmo tempo que são tão incompreendidas – sobretudo para os fãs, que querem mesmo ver disputas freada a freada entre vários pilotos. Para quem gosta de estudar o passado, no entanto, sabe o que significou hegemonias como Fangio-Mercedes, Clark-Lotus-Climax, Andretti-Lotus-Cosworth, Lauda-Ferrari etc. São combinações que tornam-se reverenciadas e lembradas com tanta intensidade quanto disputas polarizadas entre pilotos e equipes.

Se pensarmos que a próxima prova é em Abu Dhabi, naquele suntuoso e belíssimo complexo que possui um circuito comparado a um poderoso sonífero, sabemos o quanto a Red Bull anda bem por lá – sobretudo com Vettel. A prova seguinte é Austin, mais novo dos tilkódromos, em que mais uma vez o alemão picareta plagiou a si mesmo: retas enormes que terminam em cotovelos, sequências de curvas irritantes e intermináveis em terceira marcha e áreas de escape exageradamente grandes – quem erra, volta rapidinho. Outro lugar para os touros vermelhos ficarem na frente.

Depois, para fechar, teremos Interlagos, pista menos previsível de apostar. Mas pode ser tarde demais. Se pensarmos no favoritismo de Vettel para as próximas duas provas, o campeonato pode ser decidido nos States. Seria horroroso para o público brasileiro, uma vez que a Platinada vai exibir, no mesmo momento, o hegemônico futebol – como se a emissora não tivesse poder de alterar as datas e horários do campeonato. Voltamos aos sinais piratas, como aconteceu para os fãs de Le Mans – corrida não exibida pela cada vez mais perdida Fox Sports, um arremedo de canal de esporte, que não faz nem sombra à qualidade da ESPN e que só serviu, até agora, para matar o Speed Channel e irritar frequentemente os fãs de automobilismo.

Se este cenário futuro pode causar certo desânimo, após tanta reviravolta e um começo de campeonato tão distinto, temos no espírito de luta do próprio Alonso a garantia de que ele não vai jogar a toalha. A forma como ele pilotou na Índia, partindo pra cima da dupla da McLaren agressivamente na largada, e garantindo um ótimo 2º lugar, é mostra deste espírito. Fiquei sem saber se, caso Webber não tivesse problemas no kers, se ele realmente iria conseguir manter a dobradinha, pois Alonso estava com a faca nos dentes.

A temporada, deste modo, tem tudo para terminar sendo descrita nos livros de história como aquela que teve três estágios. Começou confusa, cheia de vencedores, viu Alonso se destacar em seguida em disputa com Vettel, para no final ter o alemão retomando as rédeas nas corridas finais, em hegemonia igual a de 2011.

Posso estar enganado, mas é o que está pintando.

Defendendo-se satisfatoriamente de Räikkönen (que renovou contrato; no modus icemanus de responder, apenas disse que “ficar na Lotus era algo óbvio”), Massa largou em 6º e chegou em 6º, sem oferecer qualquer mostra de que poderia alcançar o duo da McLaren. Fez uma corrida burocrática. Mas é relativamente bom. Num passado recente, nem isso ele conseguia fazer. Pela primeira vez em muito tempo, vejo sinais consistentes de evolução em Felipe após período tão negativo de resultados. A renovação de contrato, apesar das cláusulas, parece ter feito bem a ele.

Bruno Senna, por seu lado, salvou mais um pontinho. Não sei dizer se continua na Williams, pois trata-se de uma combinação de grana e resultados.

Neste fim de semana a MotoGP definiu seu campeão, com o bi de Jorge Lorenzo. A corrida disputada em Philip Island teve vitória do garoto da casa, Casey Stoner, que tristemente está se aposentando. Mas isso é assunto para os amigos especialistas nas duas rodas. Só faço o gancho…

Sem descanso, estamos prontos para Abu Dhabi.

Aquele abraço!

Lucas Giavoni
Lucas Giavoni
Mestre em Comunicação e Cultura, é jornalista e pesquisador acadêmico do esporte a motor. É entusiasta da Era Turbo da F1, da Indy 500 e de Le Mans.

6 Comments

  1. Fernando Marques disse:

    Voltando a falar da temporada de 2012 fico pensando que a sorte do Alonso foi embora quando as Mclarens perderam força, principalmente em relação ao Hamilton. Até o GP de Cingapura ninguem estava andando mais que as Mclarens. Se não houvesse queda de rendimento o Alonso poderia ainda estar lider face tirando proveito da “briga” entre Vettel e Hamilton …

    Fernando Marques
    NIterói RJ

  2. Mauro Santana disse:

    Hoje esta completando 25 anos do tricampeonato do grande Nelson Piquet!

    Obrigado Piquet, por todas as emoções que você nos proporcionou naquela temporada de 1987!

    Parabéns Piquet, Tricampeão do Mundo!

    Abraço!

    Mauro Santana
    Curitiba-PR

  3. Luiz Paulo disse:

    “Como diabos Nico e Pastor conseguiram vitórias nas primeiras provas.?”
    A resposta é simples: A Pirelli escolheu eles para ganharem naqueles dias para fazer média……

  4. Manuel disse:

    Oi amigos,
    Concordo plenamente com o Lucas. Só gostaría que esta “hegemonia” da Red Bull estivesse fora de toda dúvida, mas… com os tais difusores soprados e, agora, o DRS duplo, resulta tarefa dificil acreditar em tal hegemonia.

  5. Fernando Marques disse:

    Concordo com o Lucas … a temporada de 2012 caminha para Vettel ser campeão … mas apesar da atual hegemonia prevejo que o Alonso vai fazer custar caro este campeonato … pela forma como vem pilotando ele merece o titulo de campeão moral de 2012 …
    O que poderia ajudar o Alonso a meu ver seria alguma quebra ou problema com as RBR’s durante a corrida … sei lá tenho a impressão que os Touros Vermelhos são mais frageis … o Webber teve problemas neste domingo e de certa forma o Vettel tambem … se isto não acontecer o campeonato termina na terra do Tio Sam e de repente a Ferrari deixa o MAssa brigar por vitoria no GP do Brasil …

    Fernando Marques
    Niterói RJ

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