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29/09/2014

Sexta-feira passada, depois de uns dias em viagem, noto em minha caixa de correios um pacote assinado pelo amigo Lucas Giavoni. Era um pôster do grande John Watson, num McLaren, em Zolder-1982.

Sexta-feira passada, depois de uns dias em viagem, noto em minha caixa de correios um pacote assinado pelo amigo Lucas Giavoni. Dentro, um bilhete, dizendo: “Assim que bati o olho nesse pôster que veio encartado numa GrandPrix International de 1982, já sabia pra quem ia enviar. Feliz Aniversário!”. O pôster: John Watson, num McLaren, em Zolder. Giavoni, parceiro de longa data, sabe que Watson é um de meus pilotos favoritos em todos os tempos, e o presente não poderia ser melhor.

Aproveitando a data e o pôster, publico novamente esse texto, escrito três anos atrás. 

A vitória de Jenson Button no Canadá* foi, sob todos os aspectos, histórica: ganhou aquela que foi corrida mais longa de todos os tempos, parou seis vezes nos boxes, sofreu duas punições, outras duas colisões que quase provocaram abandonos, enfim: seria impensável que ele se sagrasse vencedor.

Mas há um fator que tornou sua corrida ainda mais especial: quando abriu a 40ª volta (de um total de 70), Button aparecia na 21ª e última colocação. Foi uma legítima “prova de recuperação”, o que me trouxe à mente outro britânico que corria pela McLaren: John Watson.

Watson pode não ter sido um dos maiores pilotos de todos os tempos, mas possui um dos grandes recordes da história da categoria: em Long Beach, 1983, partiu da 22ª posição e terminou em 1º! Essa foi, simplesmente, a vitória com maior distância entre a posição do grid e a final.

httpv://youtu.be/MRQSkkXc7gI

Nessa mesma corrida, Niki Lauda, seu companheiro de equipe, largou na 23ª posição e chegou em 2º, o que pode nos levar a crer que a vitória de Watson tenha sido fruto somente da superioridade técnica e que isso não fosse algo característico do piloto. Mas era.

John Marshall Watson nasceu em Belfast, Irlanda do Norte, e estreou na Fórmula 1 em 1973, após algumas boas corridas na Fórmula 2, dada uma oportunidade da Brabham. Ele disputou o GP da Inglaterra daquele ano, e a última prova da temporada, nos EUA. Em ambas, teve um mau desempenho nos treinos e a performance nas corridas acabou cedo, em virtude de problemas quando andava no fundo do pelotão.

No entanto, foi contratado pela equipe para a temporada seguinte, e começou a dar algumas mostras de sua capacidade: marcou seus primeiros pontos no mundial em Mônaco, numa prova onde largou em 23º e terminou em 6º! Sua melhor exibição, no entanto, talvez tenha acontecido no GP da Áustria: Watson largou em 11º e andava em 6º quando teve problemas no carro. Foi aos boxes e, depois de voltar, era 21º. E terminou a corrida na 4ª colocação!

Tornaria a pontuar nos EUA, onde fez uma prova discreta, largando em 7º e terminando em 5º. Para a temporada de 1975, Watson vai para a equipe Surtees, onde amarga o pior ano de sua carreira, sem conseguir marcar pontos. Mas na última prova da temporada toma uma importante decisão: se muda para a Penske.

Depois de marcar pontos na África do Sul, Watson faz sua primeira grande prova de recuperação: na Bélgica terminou em 7º depois de completar a 1ª volta em 18º. O primeiro pódio da carreira aconteceria na França, onde partiu na 8ª posição e encerrou a corrida em 3º. Na prova seguinte, novo pódio, em uma das maiores exibições de sua carreira.

Watson marcou o 11º tempo na classificação de Silverstone mas, na 7ª volta quando vinha em oitavo, teve problemas que o jogaram para a 19ª posição. A partir daí, uma tremenda escalada de posições o levou ao 4º lugar ao fim do GP que, com a desclassificação de James Hunt, o colocou em 3º.

Na Alemanha, largou em 19º e já estava em sétimo quando a prova foi interrompida na 14ª de 45 voltas. Tantas corridas boas em tão pouco tempo tinham endereço certo: a primeira vitória. E ela viria na mesma corrida em que Watson pela primeira vez alinhou seu carro na 1ª fila.

No chuvoso GP da Áustria, Watson (largou em 2º) e Peterson (3º) dividiram a liderança nas voltas iniciais, mas a partir da 12ª (de um total de 54) seria o piloto da Penske quem assumiria a primeira colocação e não mais a perderia. Ele terminou a prova com quase 11 segundos de vantagem para Laffite, mesmo tendo marcado apenas a 4ª volta mais rápida.

httpv://youtu.be/GN2dtVGpvxs

O norte-irlandês ainda faria boas exibições na Itália e nos EUA, mas em 1977 estava novamente correndo pela Brabham.

Na equipe que lhe concedeu a chance de correr na F-1, Watson momentaneamente acabou com a fama de não ser bom nos treinos: além da primeira pole da carreira, em Mônaco, largou outras 5 vezes na primeira fila e mais 5 entre os 6 primeiros. Porém, nas corridas aconteceu tudo ao inverso: pontuou em apenas 3 GPs e somente na França (2º) conquistou um pódio.

Mas não porque fizesse corridas fracas: em Monte Carlo, andou em 2º até metade da prova, quando teve o motor quebrado. Na Alemanha, cenário igual: era segundo quando seu motor quebrou na 8ª volta. Finalmente, no GP da Inglaterra (onde havia marcado o 2º melhor tempo), liderou a prova desde o início até a 50ª de 68 voltas, quando um problema na bomba de gasolina o tirou da prova.

Apesar da 13ª colocação geral, para 1978 havia esperanças: Watson teria como companheiro de equipe Niki Lauda.

A temporada começa forte: no Brasil é um retorno aos velhos tempos: largando em 21º, era 16º na 1ª volta e terminou o GP em 8º, depois de vir da 22ª colocação com problemas nos boxes. Na África do Sul, o primeiro pódio: largou em décimo e foi terceiro com várias ultrapassagens.

Nos EUA, larga em 5º e já na primeira volta era 2º. Mas abandona prematuramente com vazamento de óleo. Em Mônaco, corrida em que era sempre um destaque, largou em segundo e assumiu a ponta, lá se mantendo a 37ª volta, quando começou a ter problemas no carro. Conseguiu terminar em 4º.

Watson marcaria a segunda e última pole de sua carreira na França, onde terminou em 4º. Na Itália, protagonizou mais uma boa recuperação, vindo de 11º no começo da prova para 4º no final. Seria beneficiado pelas punições sofridas por Andretti e Villeneuve, e terminaria com a 2ª colocação.

httpv://youtu.be/3ltpzz-r64s

Ele seria sexto naquele mundial, e para 1979 assinaria com a McLaren.

As duas primeiras temporadas de Watson na equipe inglesa foram dificílimas: as posições nos treinos voltaram ser aquelas de fundo do grid (hoje em dia, Watson só passaria ao Q3 em 2 de 15 etapas!). No mundial, marcou 15 pontos, subindo ao pódio apenas na primeira etapa. Porém, nos brindou com novos épicos: na Bélgica, foi de 22º a 6º, e no Canadá terminou nessa mesma posição tendo completado a 1ª volta em 21º!

Em 1980, ele divide os boxes com ninguém menos que Alain Marie Pascal Prost, que estreava na F1. Watson fez o serviço de casa, pontuando mais que o jovem francês, mas teve uma temporada inferior à anterior em termos de pontos: apenas 6. Mas o GP dos EUA (que marcou a primeira vitória de Nelson Piquet) foi daqueles históricos: 21º no grid, 4º na chegada.

Faria ainda grandes exibições no Brasil (saindo e 23º chegou a andar em 9º terminando em 11º), na Áustria (de 22º para 8º antes do abandono) e Alemanha (foi de 20º a 6º abandonando a corrida), mas só pontuaria no Canadá, onde largou em 7º e encerrou a etapa em 4º.

Voltaria a vencer no ano seguinte, quando conseguiria aparecer com mais frequência nas primeiras posições do grid. Depois de uma grande corrida de recuperação no Brasil (saiu de 15º e andou a maior parte da prova em 5º, quando teve problemas mecânicos e terminou em 8º), conseguiu 3 pódios consecutivos em Mônaco (3º), França (2º) e Inglaterra, onde venceu depois de aparecer em 10º na quarta volta!

Faria ainda grande espetáculo no Canadá, quando, após largar em 9º, terminou em 2º na prova em que Gilles Villeneuve correu sem o bico do carro. Havia grandes expectativas para 1982, quando a McLaren anunciava a contratação de Niki Lauda, que não disputava nenhum GP desde 1979. Como Watson se sairia face ao grande bicampeão?

John Watson não apenas bateu o companheiro de equipe como teve o melhor ano de sua carreira na Fórmula 1, e muito provavelmente teria sido campeão do mundo não fosse a deficiência da McLaren nos treinos (como parâmetro, podemos ver as posições de largada de Lauda).

No incrível GP da Bélgica, que começara com a triste morte de Villeneuve nos treinos, Watson parte da 10ª colocação para uma vitória estupenda, conseguida nas voltas finais.

Mas o grande momento ainda estava por vir: no GP dos EUA-Leste, Watson marca o 17º tempo nos treinos. Devido ao excesso de chuvas, a prova é interrompida na 6ª volta, quando Watson já era 13º. Reiniciada a corrida, ele faz uma escalada sensacional até a vitória. Seu desempenho foi tão inquestionável que ele chegou a ultrapassar 3 carros em uma só volta. Um deles era Lauda.

httpv://youtu.be/MW5hK1SCXIg

Sim, não é nenhum exagero apontar Watson como provável campeão daquela temporada. Embora não possamos jamais esquecer que foi o ano da supracitada morte de Villeneuve e que o outro Ferrari (Didier Pironi) também abandonaria o campeonato em virtude de um acidente sofrido durante treinos em Hockenhein, o desempenho de Watson foi excelente.

Na Alemanha, largou em décimo e abandonou em 3º a menos de 10 voltas (Rosberg, o campeão por 5 pontos de vantagem, vinha em 4º). Na Áustria, largou em 18º, caiu para 21º e chegou a estar em sétimo quando abandonou. Por fim, no GP dos EUA-Oeste: largou em 11º, e já era terceiro quando teve problemas e terminou em 7º (Rosberg estava atras quando ele teve problemas).

No ano seguinte, ainda dividindo os boxes com Niki lauda, Watson teve um contrato aos moldes de Ayrton Senna em 1993: ganharia por corrida, e não pela temporada.

Ele novamente terminou o campeonato à frente do tricampeão. E obteve uma vitória, justamente aquela que lhe concede o incrível recorde de 21 posições ganhas até a 1ª colocação final. E já havia nos brindado com outra exibição genial no GP do Brasil, onde largou em 16º e já era 11º na 1ª volta. Infelizmente, abandonou por quebra de motor quando era 2º.

O destino, entre irônico e triste, quis que Watson se aposentasse ao final daquela temporada e fosse substituído justamente por Alain Prost, aquele a quem ele havia superado 3 anos antes, e visse seu companheiro de equipe, aquele que fora superado por ele em duas temporadas consecutivas, ser campeão do mundo em 1984.

Mas o ato final de Watson foi bastante simbólico: após dois anos parado, substituiu Niki Lauda no GP da Europa de 1985. Assim, ele foi o único piloto desde 1975 a usar o número 1 sem ser campeão mundial (!).

httpv://youtu.be/0pXkCx2QOEQ

Nos treinos, marcou apenas o 21º tempo. Na largada, partiu muito mal e terminou a 1ª volta na 25ª colocação. Mas, a partir daí, traria à tona um de seus clássicos: com várias ultrapassagens, terminou a prova na 7ª posição.

Tinha ele quase 40 anos. Hoje ele tem 65 e vive tranquilamente na Inglaterra comentando GPs para a Sky Sports.
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*Coluna publicada originalmente em 16 de junho de 2011.

Marcel Pilatti
Marcel Pilatti
Chegou a cursar jornalismo, mas é formado em Letras. Sua primeira lembrança na F1 é o GP do Japão de 1990.

3 Comments

  1. Mauro Santana disse:

    Pra mim, um dos maiores feitos que o John Watson fez na F1, foi o desenvolvimento do motor Turbo Tag Porsche na Mclaren em 1983, pois foram poucos os pilotos que tiveram o privilégio e a capacidade de pilotar os carros dos anos 70 e as bestas feras dos anos 80.

    Abraço!

    Mauro Santana
    Curitiba-PR

  2. Fernando Marques disse:

    Também sempre gostei muito do John Watson. Para mim ele foi um piloto meio que azarado, pois sempre andava bem mas sempre seu carro quebrava … me lembro que vibrei muito com a sua primeira vitoria na Austria pilotando um Penske … naquele ano os focos principais da temporada eram o Lauda e o Hunt, e ele com a Penske surpreendeu vencendo a prova com autoridade liderando quase desde o inicio até o fim …

    Fernando Marques
    Niterói RJ

  3. Ronaldo disse:

    1982 foi um dos campeonatos mais injustos da história. Não que Rosberg não mereça a honraria, jogou com o regulamento debaixo do braço, e apesar de todos os azares dos rivais, sua grande velocidade em treinos e o sangue frio em momentos decisivos levaram a taça para casa. Na tabela de pontuação é evidente que havia pilotos mais qualificados para o título, especialmente a dupla da Ferrari, que sucumbiu aos próprios brios e Watson, que entre azares e um equipamento inferior, nada pôde fazer. Façamos justiça, no no entanto, a Lauda, que teve o mesmo número de vitórias que Watson naquela temporada, com apenas nove pontos a menos no fim.

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