OS PREDADORES

EQUIPE GPTOTAL ESTRÉIA EM CORRIDA BASTANTE DISPUTADA!
30/09/2004
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04/10/2004

Já é assunto velho: a Ford anunciou o encerramento total de suas operações com a F 1, o que inclui a venda da Cosworth e o fim da equipe Jaguar. Com isso, existe a perspectiva de a F 1 ficar com apenas nove equipes e 18 carros por corrida. Um número baixíssimo, poucas vezes visto pela categoria em mais de 50 anos de história.

A saída da Jaguar colocou toda a categoria em estado de alerta e comprovou o fracasso da estratégia imaginada por Mosley e Ecclestone (com a anuência dos chefes de equipe, é bom lembrar): transformar a F 1 em um clube de elite, fechado, no qual a admissão de novos sócios só seria obtida mediante a compra de uma das equipes já existentes. E, de quebra, mostrou a capacidade de Ecclestone e Mosley, como verdadeiros predadores, destruirem o – vamos chamar assim – “ecossistema” do automobilismo internacional.

Desde que assumiu a presidência da FOCA (Formula One Constructors Association), Ecclestone dedicou-se exaustivamente a preservar os interesses da Fórmula 1 e dos chefes de equipe. Muito justo, pois essa era justamente a sua função. E não se pode negar que o tino comercial de Bernie contribuiu muito para o crescimento da categoria no aspecto promocional. Se hoje nós temos certeza de que vamos assistir a todos os GPs (exceto em casos excepcionais como o do GP da Bélgica), isso se deve em boa parte ao trabalho de Ecclesone.

Ao mesmo tempo em que construía uma Fórmula 1 forte, Ecclestone dedicou-se cuidadosamente a destruir qualquer coisa que pudesse ameaçar a hegemonia do seu reinado. No final da década de 1980, quando a CART aparecia como alternativa atraente à Fórmula 1, Ecclestone (com o aval da FIA) tratou de desmoralizar a categoria o quanto pôde, a fim de eliminar qualquer possibilidade de ela rivalizar em importância com a F 1.

Logo em seguida, a FIA, instada por Bernie, aplicou uma injeção letal no Campeonato Mundial de Esporte-Protótipos ao impôr motores aspirados de 3,5 litros (iguais aos da F 1) a partir de 1992. Com isso, ficavam afastados concorrentes como Porsche (motores turbo), Jaguar (motores de 7 litros) e Mazda (motores rotativos). Mesmo bastante enfraquecida, a categoria continuou, levando a FIA a matá-la com um tiro de misericórdia no final de 1992. Ecclestone havia atingido seu objetivo: de 1993 em diante, haveria apenas um campeonato mundial forte para os fabricantes e equipes investirem seu dinheiro.

Em 1998, a FIA determinou (com a concordância dos chefes das equipes existentes na época) que a Fórmula 1 poderia ter um número máximo de 12 equipes. Atingido esse número, uma nova equipe só poderia entrar na brincadeira se comprasse uma das já existentes. Nos cálculos de Bernie, Max e Cia. (por “Cia.”, entenda-se todos os donos das equipes da época), isso significaria uma valorização imediata de todas as equipes, mesmo as Minardi e Arrows da vida, independente de seus resultados. Os dirigentes e chefes de equipe tinham certeza absoluta de que todo e qualquer grupo da indústria automobilística teria interesse em participar da Fórmula 1.

Bernie, Max e Cia. pensaram tudo direitinho. Só esqueceram de combinar com os adversários. Em 1999, o campeonato mundial começou com 11 equipes: McLaren, Ferrari, Williams, Jordan, Sauber, Minardi, Sauber, Benetton, Stewart, Arrows e Prost. A partir de 2000, a Honda seria a 12ª equipe, após passar todo o ano de 1999 fazendo testes com um chassi construído pela Dallara e pilotado pelo holandês Jos Verstappen. Mas a morte do engenheiro Harvey Postlethwaite, coordenador do projeto da equipe da Honda, fez a empresa abortar o projeto e ficar na F 1 somente como fornecedora de motores. Imediatamente, a Toyota apresentou-se para ocupar a vaga, e aí a FIA criou mais uma novidade: aumentou a caução cobrada às novas equipes para o exorbitante valor de US$ 48 milhões.

A temporada de 2002 seria a primeira com as tais 12 equipes no grid, mas a Prost faliu antes mesmo da primeira corrida e a Arrows seguiu o mesmo caminho ainda durante a temporada. E assim a F 1 ficou com dez equipes, agora reduzidas a nove.

Durante todos esses anos, os custos da F 1 foram subindo em ritmo estonteante. As medidas da FIA para atacar isso acabaram produzindo efeito contrário. Em 2002, a Ferrari tinha orçamento anual estimando em US$ 300 milhões. No final daquele mesmo ano, Mosley baixou o pacote de medidas que transformou o regulamento nesta merda que se vê hoje, com este sistema horrível de definição do grid de largada, pontuação que nivela a disputa por baixo e regras estapafúrdias de motores tendo que durar um final de semana inteiro. Este último item, segundo Mosley declarou na época, contribuiria para uma significativa contenção de custos e aumento de competitividade. Como hoje o orçamento da Ferrari é estimado em US$ 600 milhões, fica difícil sustentar que Mosley teve sucesso.

Ecclestone, Mosley e Cia. imaginaram, numa época em que a economia global estava bem mais próspera, que a entrada na Fórmula 1 seria indispensável para qualquer fabricante de automóveis. Enganaram-se redondamente: há várias empresas automobilísticas fortes que nunca deram a menor bola para a F 1. Hoje, Mosley admite que as equipes independentes é que garantem a continuidade da categoria. Pena que ele só tenha acordado depois que várias delas faliram.
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Segundo o “Pacto de Concórdia”, as equipes podem ser obrigadas a inscrever três carros para completar as 20 vagas do grid. Mas Paul Stoddart, dono da Minardi, revelou: segundo está escrito no “Pacto de Concórdia”, o piloto desse terceiro carro não terá direito a pódio nem pontos. Estará lá apenas para completar o grid, mas de resto será como se não existisse.

É por causa da preocupação em criar regras estúpidas, idiotas, absurdas e inúteis como essa que a Fórmula 1 chegou aonde chegou.

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Breves considerações sobre o GP da China:

– Bela vitória de Barrichello

– Schumacher fez muitas besteiras nos treinos e na corrida, mas não se pode negar seu profissionalismo e humildade. Fez questão de ir até o final da corrida, mesmo quando já sabia que não conseguiria nenhuma colocação relevante. Saiu do carro sorrindo, tirando sarro da própria atuação e cumprimentou Barrichello pela vitória. Outra coisa: que tática mais esquisita aquela de abastecer após a largada…

– Ralf voltou bem, ficando à frente de Montoya nos treinos. E Montoya… reagiu da maneira típica dele: insinuando que a equipe “desviou o foco” para o carro de Ralf.

– Foi para isso que Flavio Briatore trocou Trulli por Villeneuve?

Luiz Alberto Pandini
GPTotal
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A nossa versão automobílistica do famoso "Carta ao Leitor"

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