Eu queria ter sido esse cara…

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Se eu fosse um piloto, queria ser como Nelson Piquet.

Se eu fosse um piloto, queria ser como Nelson Piquet.

Gostaria de ser ele pelos títulos, vitórias em GPs, poles, quilômetros na liderança e outras marcas que me colocariam quase sempre entre os dez melhores de todos os tempos – nunca como o melhor – e isso me bastaria porque esta história de ser o melhor não costuma acabar bem e te impõe mais castigos e peso sobre as costas do que recompensas.

Queria ser Piquet para poder ter vencido tanto e de forma tão espetacular sem nunca ter nas mãos um Fórmula 1 majoritariamente superior ao da concorrência e, quando isso aconteceu, como em 87, ter tido pela frente um osso duríssimo de roer, um inglês meio idiota mas rápido e valente como o capeta.

httpv://www.youtube.com/watch?v=dQhT2jsPgGw

Gostaria de ser o Piquet também pelos virtualmente incontáveis km de testes em todas as pistas do mundo para desenvolver os maravilhosos Brabham de Gordon Murray, os motores BMW, os pneus Pirelli, os motores Honda e os Williams de Patrick Head, aquelas cadeiras elétricas da Lotus e o Benetton de John Barnard.

E, claro, por ter feito uma das mais belas ultrapassagens de todos os tempos – e logo em cima de quem…

httpv://www.youtube.com/watch?v=lvIEtggFbvY&feature=youtu.be

Queria ter sido o Piquet pela vida cigana, pelas belas mulheres, pela filharada linda que ele semeou mundo afora, pelo iate Gostosa, pelas farras conhecidas e por aquelas que nem ele, boquirroto de nascença, ousou confessar.

Queria ser o Piquet para ter a coragem que ele teve de acelerar aqueles foguetes turbocomprimidos, 1100, 1200 cavalos presos às costas por tirantes pouco mais resistentes que velcro, a coragem que ele teve encarando a volta a Indianápolis com os pés uns cinco ou seis quilos mais pesados de tantos pinos e parafusos colocados depois da magnífica porrada no ano anterior.

httpv://www.youtube.com/watch?v=Mx7smI3_vtg

Mas queria ser o Piquet principalmente porque ele curtiu e construiu tudo isso que citei até agora e muito mais sem perder a humanidade, sem se tornar um ser de outro planeta, sem quebrar as ligações dele com o mundo real.

Tricampeão do mundo, ele continuou mais ou menos o mesmo dos tempos de Brasília, dos tempos em que “emprestava” peças dos carros de clientes desavisados da sua oficina mecânica para barbarizar nos rachas de final de semana ou dos tempos em que comprava e dava um guaribada em carros usados para completar o orçamento do mês, mesmo já correndo da Fórmula 1. Não sei da vida financeira de Piquet hoje em dia e desconfio que ele ganhou muito menos dinheiro do que deveria ter ganho mas tenho a certeza que ele ainda é capaz de dormir no chão, ao lado do carro, como fazia nos tempos da Fórmula Super Vê, simplesmente porque não tinha dinheiro para o hotel.

Ok. Se eu fosse o Piquet, teria dito muitas besteiras ao longo da minha carreira – besteiras gratuitas e sem a mínima graça, como aquela de chamar Enzo Ferrari de gagá ou insinuar que Ayrton Senna era gay. Teria tomado algumas invertidas brabas de chefes de equipe e jogado para o ar muitas oportunidades de vitórias pela simples impaciência de negociar melhores contratos.

httpv://www.youtube.com/watch?v=Dylf9vB7-Js

Teria tido um final de carreira um pouco melancólico na Fórmula 1 e teria tido, pelo caráter irridento e provocativo, menos reconhecimento do que merecia de fato. Mas o que são estes pedregulhos, estes fiapos de papel, estes grãos de areia, numa carreira de três campeonatos mundiais, 23 vitórias e tantas outras conquistas?

E o principal, seu eu fosse o Piquet, teria chegado aos 50 anos sabendo que fui capaz de ter feito sonhar toda uma geração de torcedores e dado a eles o prazer raro de comemorar três títulos mundiais por uma combinação de coragem, talento e malícia, bem ao jeito brasileiro, como nem Emerson e Senna foram capazes.

Esta coluna foi publicada originalmente em 16 de agosto de 2002, para comemorar os 50 anos de Nelson Piquet.

Em 11 de agosto de 2008 escrevia esta coluna, um pouco menos apaixonada mas creio que, ainda assim, possa ser lida como uma justa homenagem ao aniversário de 60 anos de Piquet, comemorado hoje.

Em nossa página no FaceBook, mais fotos e vídeos sobre a carreira dele.

Bom final de semana

Eduardo Correa

Eduardo Correa
Eduardo Correa
Jornalista, autor do livro "Fórmula 1, Pela Glória e Pela Pátria", acompanha a categoria desde 1968

19 Comments

  1. Grande disse:

    Piquet pra mim o numero1sempre com carros enferiores pelo menos nos dois primeiros titulos e se tivesse ido pra maclarem em 1988 sena seria um Rubens Barrchelo melhorado

  2. Salvador Costa disse:

    Se eu fosse jornalista, eu queria ter sido Eduardo Correa….

  3. wladimir disse:

    Marcel, sir Jack Brabham ser o menos valorizado é, de fato, a pior das injustiças. O próprio Piquet o idolatra. Porque o que torna o old Jack o maior não são estatísticas, mas o fato de ser o único a vencer o campeonato com o carro que levava seu nome. O que chegou mais perto foi Bruce McLaren que venceu uma e dois anos depois morreu. Sem mencionar John Surtees que foi campeão em duas e quatro rodas.

  4. Cleiton disse:

    Quando comecei a acompanhar F1, Nélson Piquet já era campeão do mundo e um dos maiores da categoria. Essa história de citar os “5 melhores” é muito pessoal, pois para um inglês podem ser Mansell, Moss, Hunt, Hawthorn e Hamilton.
    Na minha lista Piquet não fica entre os 5, mas nem por isso deixo de citá-lo como um dos maiores da história, por tudo o que o Edu relacionou nesta coluna.
    Dentro das suas características, Piquet foi insuperável!!!
    E sou fã assumido do cara!!!

  5. Mauro Santana disse:

    Uma coisa só que eu não vi o grande Nelson Piquet comentando, que é a destruição de Jacarepaguá.

    Piquet nunca foi de poupar as palavras, e por que este silêncio com a destruição do seu “quintal”!?

    Mauro Santana
    Curitiba-PR

  6. Fernando Marques disse:

    Piquet chega aos 60 anos … O tempo passa rápido e a gente nem percebe … eu tive alegria de ver ele correndo na Formula Super V e Formula 1 … pude praticamente ver toda a sua carreira nas pistas … na minha lista ele sempre é o primeiro …


    Eduardo,
    eu penso que se Nelson Piquet fosse diferente do que ele sempre foi jamais seria o Piquet …



    Eu sempre gostei das opiniões do Piquet … ele fala sempre o que quer, esteja certo ou errado …


    MArcio,

    poucos anos depois que ele “se aposentou” da Formula 1 me lembro que Piquet disse que ganhava mais dinehiro como empresario do que como piloto de Formula 1 … ele citou como exemplo uma confecção que ele tinha nos EUA (se não me engano chamado Pilar Rossi, mesmo nome de seu iate) que rendia por ano 5 vezes mais do que ele ganhou na Lotus (equipe onde financeiramente fez seu melhor contrato)

    Fernando Marques
    Niterói RJ

  7. Marcel Pilatti disse:

    Eu concordo com o que você falou, Lucas. No Brasil, uma série de fatores contribui para que isso aconteça, mas parece que “O buraco é mais embaixo”.

    Naquela eleição de AutoSport, em que Senna foi escolhido o número 1, Piquet ficou somente na 13ª posição. Imediatamente à frente dele, Emerson e em 11°, Nigel Mansell. Uma posição à frente de Mansell, Gilles Villeneuve.

    Não consigo encontrar uma explicação muito lógica para que isso aconteça. É fato que, no caso de Gilles, suas características o levaram a ser um cara super amado, pouco importando os resultados. Algo como um Garrincha (que obteve grandes números): a galera ficou endoidecida com seus espetáculos, e ele foi se tornando uma lenda TAMBÉM por conta de sua morte.

    Tento racionalizar e compreender o porquê de Piquet quase nunca ser incluído numa lista de 5, 7 pilotos. Pra mim, ele tem uma posição muito especial na F1, provavelmente podendo estar entre os 4 melhores da história.

    O vejo acima de Prost e Schumacher, por exemplo, sem nenhuma hesitação.

    Mas por que será que somos poucos, nessa visão? Não tem nada a ver com Globo, estamos falando em escala mundial e sobre as análises de Nelson até mesmo dentro da F1.

    Será que seus derradeiros anos, especialmente as duas temporadas de Lotus, o “queimaram”, mais ou menos como está acontecendo com Schumacher?

    Será que suas opiniões criaram uma antipatia tão grande em torno do personagem, que passou a confundir-se opinião pessoal com análise profissional?

    Será que, mesmo tendo executado “A” ultrapassagem de todos os tempos, não passou pra história que Piquet era um piloto pouco espetacular – aqui resida onde Mansell talvez o “supere” nos corações.

    Sei lá, só sei que o cara é foda. Não à toa o defini como Maradona da Fórmula 1.

    • Cassio disse:

      Acredito que Piquet não é tão valorizado porque não estava nem aí para o marketing pessoal. Levando em conta ainda as oportunidades em que ele deu de bico na imprensa, me parece até normal que apenas opiniões mais especializadas o consideram como um dos maiores. Aliás, Piquet talvez seja o tri-campeão menos valorizado, não?

      abraço

      Cassio

    • Marcel Pilatti disse:

      Acho que o menos valorizado dos 5 é o Jack Brabham… O Stewart e o Lauda aparecem aí até hoje, um era o grande adversário de Emerson e o outro tem as ressurreições e toda uma mística envolta… o brabham é de fato restrito somente aos especialistas… e ganhou “apenas” 14 corridas, os outros, no mínimo 23…

    • Cassio disse:

      Mas será que o Brabham é tão desvalorizado assim no cenário internacional? Talvez seja, mas por ser um piloto de uma era mais antiga. O Stewart, como você bem lembrou, aparece aí o tempo todo, e é britânico, o que pode explicar de certa forma porque ele acaba sendo mais valorizado do que Piquet e Brabham. Já Lauda, dispensa comentários, certo?

      Aliás, de todos os tri-campeões, acredito que Stewart seja o único que não considero um piloto espetacular. Senna tem Donnington, Brabham foi campeão construindo o próprio carro, Lauda ressucitou, aposentou e voltou para ser campeão, Piquet fez a maior ultrapassagem da história. Se alguém puder ajudar lembrando um momento espetacular do Stewart, eu agradeço.

      Abraço

    • Marcel Pilatti disse:

      Cara, creio que o Jack Brabham só seja respeitado e reconhecido dessa forma internacionalmente nos meios mais especializados mesmo. Acho muito difícil ele ficar em listas e eleições entre os 20, 15… exemplo: na eleição de AutoSport, ficou apenas em 18°. O que o coloca abaixo de Mika Hakkinen por exemplo?

      Enfim, sobre Stewart, na minha lista pessoal ele acaba mesmo sendo o 5° dentre os tricampeões, mas ele teve alguns momentos bizarros, sim: o principal exemplo talvez seja nurburgring 1968, em que ele ganhou com 4 minutos de vantagem para o segundo colocado – detalhe: estava chovendo.

      Já li algumas coisas a respeito de que ele usava pneus Dunlop, que eram muito melhores com pista molhada, mas é uma diferença tão absurda que não parece haver justificativas.

      O Márcio e o Lucas podem nos ajudar mais.

    • Cassio disse:

      Sobre Brabham, a primeira explicação que me vem à cabeça para que ele não seja tão valorizado quanto merece é o fato de ter corrido a muito mais tempo do que os outros tri-campeões. Mas isto é apenas uma impressão.

      Já do Stewart, vencer em Nurburgring na chuva e ficar 4min a frente do segundo colocado é como meter umas 3 voltas em circuitos atuais!!! Não conhecia este feito, mas é impressionante! Mesmo assim, os feitos dos outros tri-campeões são muitos, de forma que para subir em meu conceito, o escocês precisa mostrar algo a mais.

      abraços

      Cassio

  8. Mauro Santana disse:

    Grande Edu!

    Estou gostando muito de poder reler estas belas colunas, e aproveitando a oportunidade, gostaria de solicitar uma, a coluna “Justiça” do Marcio Madeira.

    Coloca ela novamente no ar Edu!

    Abraço!

    Mauro Santana
    Curitiba-PR

    • Edu disse:

      Oi Mauro

      por algum motivo – corrijo uma hora dessas – a gente não divulga muito o endereço do “velho” GPTo mas ele está no ar, firme e forte, com todas as colunas e cartas dos leitores. Aqui está o endereço: http://gptotal.com.br/2005/

      Abração

      Edu

  9. Pois é, Edu, lembro e ter lido este texto lá atrás, em 2002, e de lá para cá algumas coisas parecem ter ficado mais claras.
    Sobre a situação financeira, por exemplo, Nelson é hoje um dos homens mais ricos do Brasil, ganhando muito mais dinheiro com suas empresas do que jamais sonhou ganhar na F1. Não ficarei surpreso se vir seu nome numa lista de bilionários nos próximos anos.
    E, conforme pude testemunhar em 2009, continua comendo a mesma pizza de rua que comia em seus tempos de Camber, nos anos 70. Só que, agora, no fim de noite quando o movimento é menor.

  10. Roberto Andrade disse:

    “é porque ele não morreu”, Lucas.

  11. Lucas disse:

    Pena que, como comentado, ele não tem o reconhecimento que merece. Em quase toda compilação de “maiores / melhores”, quase sempre ele figura abaixo de Nigel Mansell, o que pra mim nunca fez sentido – o inglês teve quatro campeonatos com o melhor carro e só levou um título, num ano em que tinha um dos carros mais dominantes da história e um segundo piloto profissional. Piquet ganhou três títulos – um deles em cima do próprio Mansell – e é considerado inferior? Vá entender…

    • Marcel Pilatti disse:

      Um fato interessante nesse comparativo Mansell X Piquet, Lucas, se dá na nossa página do facebook: no dia do aniversário de Mansell, eu apenas coloquei uma foto do Leão e disse: “Hoje Mansell completa 59 anos”. 29 pessoas curtiram a foto.

      Ontem, no aniversário de Piquet, colocamos o álbum com 21 fotos, 17 curtiram. Depois, o álbum das caricaturas do carro: 11 curtiram.

      É uma amostragem muito pequena, eu sei, mas não deixa de ser interessante…

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