A PRIMEIRA DO LEÃO

O mês Senna
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ESCÂNDALOS!!!
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“A bloody mess!”

Foi assim que Patrick Head classificou a corrida de Ralf Schumacher no último GP do Bahrein. Não sou nenhum especialista em tradução, mas em bom português esta frase ficaria algo entre “um lixo” e “um horror”. A batida com Takuma Sato na sétima volta custou ao piloto uma justa advertência. Depois dela, Ralf se arrastou até os boxes, voltou à pista para dar um totó em Giancarlo Fisichella e garantir o sétimo lugar, o mínimo para quem dispunha de um equipamento como o dele.

Head e Frank Williams devem ter preocupações demais no presente para ficarem se lembrando do passado. A saída de Ralf parece consumada após sua errática caravana no deserto. Que Montoya vai embora é fato e, sinceramente, não sei até que ponto os chefes da equipe lamentam isto: após aparecer como o novo fenômeno da Fórmula 1 em 2001, com uma bela ultrapassagem sobre Michael Schumacher em Interlagos, a única coisa digna de nota que o colombiano fez na categoria foi se casar com aquele pitéuzinho chamado Connie (sou um fissurado nela, o pessoal do AutoMotor Esporte sabe muito bem disso). De resto…

Além do mais, o revolucionário “bico de papagaio” do FW26 ainda não deu sinal de ser um passo à frente em relação às outras equipes e o motor BMW, mesmo sendo o mais potente da categoria atualmente, não conseguiu sequer garantir uma pole para a Williams até agora.

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Mas eu, saudosista incorrigível, não resisto e fui caçar na memória e nos livros alguns registros de anos melhores para Patrick Head e Frank Williams. Minha atenção se voltou para o dia 6 de outubro de 1985, data do Grande Prêmio da Europa daquela temporada. Foi o dia em que nasceu um piloto com o espírito de luta e a garra que Ralf e Montoya jamais demonstraram: Nigel Mansell.

O fim-de-semana começou com Ayrton Senna estabelecendo nos treinos o padrão a ser atingido, como foi costume naquela temporada. O piloto da Lotus aproveitou a potência superior do motor Renault de classificação para ser o mais veloz nas duas sessões e marcar a sexta pole de sua carreira. Ao seu lado no grid de largada, comprovando a evolução dos pneus Pirelli, estava Nelson Piquet. Era a primeira vez na história que a primeira fila de um Grande Prêmio de Fórmula 1 tinha dois pilotos brasileiros.

Mas havia logo atrás duas sombras brancas-amarelas-e-azuis para atormentar a vida de Senna e Piquet. A Williams estreava em Brands Hatch o FW10B, uma versão revisada do carro daquela temporada, feita para otimizar o uso dos propulsores Honda, os mais potentes em condições de corrida em 1985. Mansell, em terceiro no grid, e Keke Rosberg, em quarto, iriam dar trabalho.

Largando do lado limpo da pista, Senna e Mansell pularam à frente antes da primeira curva. Mas o inglês tomou uma trajetória aberta na curva Druids e foi ultrapassado por Rosberg e Piquet. O início de prova foi eletrizante, com Keke pressionando Senna de todas as formas. Na sexta volta, Rosberg colocou por dentro na curva Surtees, o brasileiro da Lotus não deixou a porta aberta e o finlandês acabou rodando. Piquet, que vinha logo atrás, não teve como evitar a batida e abandonou ali mesmo.

Rosberg se arrastou até os boxes e voltou à pista exatamente à frente de Senna, prestes a tomar uma volta. Segurou o brasileiro por duas ou três curvas, o suficiente para que Mansell chegasse perto. Na nona volta, o inglês consegue a ultrapassagem exatamente no mesmo lugar da confusão anterior e assume a liderança.

Parece que, naquele instante, Mansell quebrou um bloqueio psicológico entre o piloto desastrado que era para o grande vencedor que se tornou. Na volta seguinte, o piloto já abriu uma vantagem de quatro segundos para Senna, diferença que subiria para mais de 20 até o final da prova. “Mansell teria ganho de qualquer forma, com ou sem ajuda de Rosberg”, resignou-se o brasileiro. Aos 31 anos de idade, o “Leão” comemorou sua primeira vitória na Fórmula 1 como uma criança, ao mesmo tempo que Alain Prost comemorava no pódio seu primeiro título mundial.

Ninguém ali em Brands Hatch imaginava, mas era apenas o primeiro de 31 triunfos de Mansell na categoria, sendo 28 deles defendendo a Williams. O piloto é também o que mais disputou corridas pela equipe, 95 Grandes Prêmios em três passagens distintas (85 a 88; 91 e 92; e 94). Uma marca que, salvo contratempos, será superada por Ralf Schumacher no GP da Bélgica. Números não dizem muita coisa, eu sei, mas ter o insosso alemão no topo desta lista seria uma mancha na história da equipe. Um lixo, um horror.

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Dizer que os pilotos do WRC são capazes de qualquer coisa é meio óbvio. É só ver a habilidade deles ao volante dos indomáveis carros de rali por estradas tão estreitas e sinuosas, repletas de curvas cegas e cujo único meio de visão são as palavras do co-piloto, e isto ao mesmo tempo em que é preciso se concentrar em acelerar, frear, puxar o freio de mão, etc, etc.

Uma prova viva disto é o escocês Colin McRae. O piloto foi forçado em fazer um ano sabático porque nenhuma equipe do WRC quis pagar o que ele pedia. Mas quem consegue ficar longe da velocidade? Em janeiro, McRae já estava em ação na rali Paris-Dakar ao volante do Nissan projetado pelo nosso colega Ricardo Divila. Chegou até a vencer algumas etapas, mostrando que tinha jeito para enduros.

Mas se uma fácil transição do rali de velocidade para o rali cross-country parece óbvia, o que dizer do que McRae fez na última semana? Nos primeiros testes para as 24 Horas de Le Mans deste ano, o escocês pilotou pela primeira vez a Ferrari 550 com que vai disputar a prova. E cravou o melhor tempo para os carros da categoria GTS, superando gente com enorme experiência em máquinas deste tipo.

É o que gente chama de “jeito para a coisa”. Já que Frank Williams anda procurando pilotos para o ano que vem, porque não experimentar McRae? Seria, no mínimo, um excepcional golpe de marketing!

Abraços e até semana que vem!

Luis Fernando Ramos
GPTotal
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A nossa versão automobílistica do famoso "Carta ao Leitor"

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