BASTA!

Ele garantiu a emoção
12/07/2004
WITH A LITTLE HELP FROM OUR FRIENDS
16/07/2004

O incrível descaso da Rede Globo com a Fórmula 1 livrou os torcedores brasileiros de um dos momentos mais ridículos na história da categoria. Ao contrário de 90% das emissoras que possuem os direitos de transmissão das corridas, a dondoca da mídia tupiniquim passa ao vivo apenas o segundo treino classificatório, privando seus telespectadores da chamada “pré-classificação”. No caso do GP da Inglaterra, foi um mal que veio para o bem.

A bizarrice começou com Michael Schumacher, que rodou na curva Brooklands como uma borboleta recém-nascida voa em torno de seu casulo. Rubens Barrichello optou por uma escapada de pista amadora, foi tão típico de sua pilotagem que poucos notaram haver algo errado. Depois, escancarou: diversos pilotos faziam os dois primeiros setores em ritmo normal, para passear no último. Juan Pablo Montoya, por exemplo, estava com o melhor tempo até após a última curva. Aí, freou sua Williams, fez as unhas, comeu um Big Mac, cantou um mambo para a esposa pelo rádio e, mais ou menos dez minutos depois, acelerou novamente para completar sua volta na pré-classificação.

Sim, chegou o dia em que os pilotos da Fórmula 1 foram à pista para decidir quem era o mais lento, título ganho não sem méritos pelo insosso austríaco Christian Klien, que rodou os mais de 5 quilômetros de Silverstone em 1min38s648, mais de quinze segundos acima de uma volta considerada “normal”.

Talvez você tenha visto estas cenas em alguma reportagem posterior, mas não há como comparar o impacto de vê-las ao vivo: o silêncio incrédulo do público, as risadas superioras de Jenson Button nos boxes da BAR, um dos únicos que encarou a sessão com a devida seriedade. Pegou mal, a mídia chiou, Michael Schumacher voltou a fazer caras e bocas na tevê alemã para tentar explicar o inexplicável. Foi tão convincente quanto Paulo Maluf jurando não possuir contas no Exterior recheadas com dinheiro público.

Pior foi ver a chiadeira de outro picareta de marca maior, o senhor Bernard Ecclestone. “Se os pilotos não fazem o trabalho deles direito – e o trabalho deles é divertir o público -, então eles merecem ser multados”, foi a macarrônica ameaça feita pelo dirigente. Ora, Mister E, os pilotos estão apenas jogando com um regulamento redigido pelo assecla do senhor, o Max Mosley, e cujo texto, ainda que não-oficialmente, certamente passou pelo seu crivo antes de ser sancionado no início da temporada. A quem você pensa que engana, ó tenebroso anão?

Era uma possibilidade visível para qualquer criança. Segue um trecho da coluna que eu escrevi no mês de fevereiro, quando comentava sobre o novo regulamento. “Há outro ponto polêmico. Imagine que há previsão de chuva para a metade do segundo treino classificatório. Desta forma, todos tentarão ser o mais lento possível no primeiro treino – assim eles entram primeiro na pista na sessão que vai definir o grid. Já pensou?”

Culpar os pilotos, como Bernie e parte da mídia fizeram, me parece injusto. Rubens Barrichello, famoso por suas frases desencontradas, foi quem explicou com mais serenidade a situação. “O que ocorreu é um resultado do formato de classificação. Você tem de ser egoísta e olhar para sua estratégia. No final das contas, é parte da estratégia estar na pista na hora certa. Por isso não sou contra (o que fiz)”, falou. Ou como diria o saco de pancadas particular do Galvão Bueno: “a regra é clara”.

A Fórmula 1 onde os pilotos disputam para ver quem é mais lento é a cereja no bolo da administração Ecclestone-Mosley. Chega! Chega! Chega! Impeachment já para tamanhos incompetentes! Provavelmente eu deveria seguir o conselho do Panda e relaxar, deixando que esta gente mesquinha cave seu próprio buraco. É uma idéia, mas antes vale uma reza braba para ver se São Gilles consegue colocar Sir Jackie Stewart, o Branco, no comando da categoria. Já tive o prazer de conversar com o escocês uma vez, uma simpatia de pessoa, exatamente o oposto dos dois panacas que hoje estão dando as cartas.

Quanto a você, nobre leitor, pense bem antes de comprar seu ingresso para o GP do Brasil em outubro (aliás, uma corrida que não vai valer para nada). São Paulo é uma cidade conhecida por suas pancadas de chuva vespertinas. Já imaginou, você lá na arquibancada, setecentos mangos a menos na sua conta bancária, vendo uma série de pilotos estacionarem seus bólidos na subida dos boxes durante a volta rápida na pré-classificação? Só vai faltar o nariz de palhaço…

Abraço e até a próxima semana!

Luis Fernando Ramos
GPTotal
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A nossa versão automobílistica do famoso "Carta ao Leitor"

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