Festa, heróis e espionagem

“Em nome do pai”
09/11/2003
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12/11/2003

Panda

Três e pouco da madrugada do último sábado. Rubinho, Tony Kanaan, Gil de Ferran e Felipe Massa sobem ao palco armado no salão de festas do Hotel Grand Hyatt, em São Paulo, tomam os microfones das mãos dos cantores da banda e, abraçados, entoam “Ana Júlia”, “E Vai Rolar a Festa” e outras músicas próprias de ocasiões festivas – no caso o casamento de Tony com a bela Daniele.

Legal de se ver a alegria daqueles quatro garotões que, às custas do próprio talento e coragem, chegaram aonde chegaram e agora se divertiam à larga.

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Tony Kanaan parecia bastante emocionado durante a cerimônia. Na festa, se soltou e logo usava a gravata cinza como bandana. Sua alegria rivalizava apenas com a do pai da noiva, meu querido amigo José Adir.

Que esta alegria espontânea dure para sempre, são os meus votos ao Tony e à Daniele.

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Impressionante a figura de Alex Zanardi.

Acompanhou a cerimônia toda do casamento – mais de uma hora – em pé. Na festa também passou bom tempo em pé, apoiado de leve em duas muletas curtas, ao lado da pista de dança. Retirou-se por volta da 1h, sozinho. Trinta e seis horas mais tarde, terminava as 500 Milhas da Granja Viana em 4o lugar, na companhia de Servia, Michel Jordain e Vasser, que também estavam na festa.

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A gente fala sempre de Zanardi mas pouco de outro herói das pistas e da vida: Clay Regazzoni, paraplégico desde o acidente em Long Beach/80.

No final de outubro, ele disputou a Maratona de Lausanne e percorreu os 42 km da prova em 2h15 num triciclo movido por pedais acionados pelas mãos. Detalhe: Clay tem 64 anos.

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Saiu esta semana uma breve biografia de Ayrton Senna escrita pelo jornalista Daniel Piza.

Em 142 páginas com fotos, ele relembra a carreira do brasileiro baseando-se principalmente nos livros excepcionais de Christopher Hilton.

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Os leitores me perdoem a economia do comentário mas creio que não vale a pena queimar uma pestana sequer no momento com a liminar que suspende a realização do GP do Brasil daqui a onze meses.

Não é a primeira vez, não será a última que se arma este circo para no fim ficar tudo por isso mesmo. A novidade é apenas a antecedência com que começou a confusão. Na corrida deste ano, tivemos liminar concedida até no sábado véspera da corrida e tudo acabou se arranjando.

Por isso, recomendo aos leitores uma certa distância do noticiário a respeito. Economiza-se tempo e descrê-se um pouco menos da Justiça.

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Na semana passada, a polícia alemã prendeu um engenheiro da Toyota, acusando-o de ter roubado ou obtido por meios ilícitos material técnico da Ferrari.

Os policiais alemães revistaram o escritório e oficina da Toyota em Colônia (onde são projetados e fabricados os carros de Da Matta e Panis) e apreenderam arquivos de computador e desenhos.

A Toyota nega envolvimento no caso, dizendo apenas empregar o engenheiro, que trabalhou tempos atrás na área de pesquisa aerodinâmica da Ferrari.

Se as denúncias se confirmarem, será o mais grave caso de espionagem (ou roubo puro e simples) de material técnico da Fórmula 1 desde o escândalo Arrows.

A equipe Arrows, explica-se, foi fundada em 1978 e contratou muitos funcionários da equipe Shadow, inclusive o projetista Tony Southgate. Quando o Arrows FA1 foi apresentado, descobriu-se que ele era idêntico ao Shadow que havia sido projetado pelo próprio Southgate. A Arrow foi condenada por um tribunal inglês a destruir o carro.

Outro caso notório aconteceu em 70 ou 71, quando três funcionários da McLaren furtaram projetos técnicos para a construção de um carro de Fórmula Indy. Um dos funcionários terminou preso e cumpriu pena.

Suspeitas de espionagem são pontuais na Fórmula 1 e, acredito, em sua maior parte verdadeiras, já que o trânsito de pessoal entre as equipes é intenso. Pode acontecer inclusive de alguém levar idéias pré-desenvolvidas para seu novo empregador mas não revelar a ele que já as tinha aplicado antes.

Mas nem sempre é tão simples assim. Você pode ter os planos em mãos mas usar, por exemplo, um material diferente para confeccionar determinada peça ou mesmo fazê-lo com menos perícia do que o necessário.

Um artigo do jornalista Mike Lawrence, que me foi enviado pelo Ricardo Divila, lembra a história da March que, em 81, adquiriu um Williams FW07 de segunda mão, modelo normalmente considerado como o melhor carro asa jamais fabricado. As pretensões da March eram explícitas: fazer um carro o mais parecido possível e não se fala mais nisso.

Mas não deu certo: faltou habilidade aos técnicos da March assim como materiais de qualidade. E o carro terminou a temporada sem marcar um ponto sequer.

Não quero absolver o técnico espião nem dizer que não deve haver preocupação com espionagem na Fórmula 1 mas o princípio técnico é apenas o ponto de partida de um longo processo que só termina nas pistas e que depende de um enorme acúmulo de competências, experiências e recursos que nenhum espião consegue levar no bolso.

É por isso que é tão difícil para uma equipe trocar o meio do pelotão pelas primeiras posições.

Boa semana a todos

Eduardo Correa

Eduardo Correa
Eduardo Correa
Jornalista, autor do livro "Fórmula 1, Pela Glória e Pela Pátria", acompanha a categoria desde 1968

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