Futuros campeões ou vítimas?

UM ANO DE GPTOTAL
04/09/2002
DUAS HOMENAGENS
09/09/2002

Panda

A Fórmula 1 ainda não terminou de comemorar os recordes à náusea de Michael Schumacher nem de queimar em sua fogueira a carreira de Felipe Massa e já se pergunta quem serão seus próximos campeões e/ou vítimas.

Agora que a lua de mel com Montoya passou, a bola da vez como futuro campeão é Kimi Raikonenn. Depois de algumas boas corridas nesta segunda metade de temporada, Kimi está na capa das revistas, seu estilo de pilotar é esmiuçado e os chefões da McLaren e Mercedes se derretem em elogios ao pós-adolescente finlandês, que vai completar 23 anos daqui a pouco mais de um mês.

Destaca-se especialmente a frieza de Kimi. Até Ron Dennis mostrou-se impressionado com a intensidade da frieza do garoto – e frieza é uma qualidade apreciada por chefes de equipe. Na via inversa, há quem compare Kimi a Gilles Villeneuve e a corrida roda-a-roda entre ele e Montoya em Hockenheim 02 à mítica Dijon 79, quando Gilles e Rene Arnoux fizeram o par de voltas mais fantástico da história da Fórmula 1.

Descontando-se os exageros de praxe, não há dúvidas de que Kimi está em grande fase e merece elogios. Eu mesmo disse isso aqui recentemente que o considero o futuro principal opositor de Montoya na Fórmula 1 pós-Schumacher.

Mas devagar com o andor. Em primeiro lugar, é preciso dar tempo ao tempo. O talento latente de Kimi, assim como o de Montoya, precisa ser temperado com experiência. Ambos precisam receber pacotes técnicos consistentes e, o mais importante de tudo, precisam manter as suas motivações.

Não sei se você tem acompanhado a trajetória de Guga. Eu, você sabe, gosto muito do manezinho. Acho-o um Esportista com E maiúsculo, um verdadeiro exemplo. Ele saiu de Floripa com as próprias pernas e conquistou o mundo do tênis (aliás, Guga lembra muito um certo Emerson Fittipaldi…) mas não se deixou deslumbrar. Continuou o mesmo, gostando de fazer as mesmas coisas que fazia quando era um desconhecido, inclusive não dando muita bola para a imprensa.

Ele sofreu aquela cirurgia, perdeu o ritmo de jogo e parece estar relutando um pouco em voltar à velha forma. Talvez já tenha experimentado o sucesso de ser o número 1 do ranking e não queira se expor a todo o stress que isso exige.

O mesmo vale para o jovem piloto. A Fórmula 1 pode ser um inferno. Treinos, viagens, mais treinos, eventos promocionais idiotas, mais viagens, mais treinos e pressão, pressão e mais pressão, o tempo inteiro. Será que esta neurose, esta loucura, vale a pena?

Com vinte e poucos anos de idade, muito talento para pilotar e o pai te enchendo a paciência, você não tem escolha. Vai em frente para ver no que vai dar. Mas conforme os meses vão passando e você começa a ver o quanto custa tudo aquilo, pode muito bem concluir que o melhor mesmo é pegar o dinheiro que ganhou até ali e ficar surfando e azarando as gatinhas em Floripa.

Não sei se se faz surf na Finlândia ou na Colômbia mas Kimi e Montoya já têm dinheiro suficiente no bolso para viverem suas vidas confortavelmente. Enveredarão por este caminho ou estão dispostos a continuar na Fórmula 1 e desafiar os deuses em troca de glórias e recordes?

As vitórias, os recordes, a força dos campeões começa e termina na cabeça.

+++

Agora vamos falar da fogueira, da impiedosa fogueira da Fórmula 1 capaz de consomir a carreira de jovens de 21 anos.

Pois acredite, meu amigo. Nelsinho Piquet Jr., do alto dos seus 17 anos, já é citado como um futuro provável talento da Fórmula 1 pós-Schumacher pela revista inglesa Autosport.

Eles fizeram uma reportagem destacando – adivinhe só – Kimi Raikonenn e acharam legal acrescentar outros prováveis candidatos ao estrelato. Eles citam Franck Montagny, francês de 24 anos, Robbie Kerr, inglês de 22, Heikki Kovalainen, finlandês de 20, Antonio Pizzonia, de 21, Lewis Hamilton, inglês de 17, Tomas Scheckter, 21 anos, filho de Jody, Vitantonio Luizzi, italiano de 21, Kousuke Matsuura, japonês de 22 e o trio que está domindo a Fórmula 3000 2002, Tomas Enge, Giorgio Pantano e Sebastien Bourdais, com 25, 23 e 23 anos respectivamente. Média de idade dos doze indicados: 21 anos.

Agora imagine você com 17 anos de idade sendo citado por uma, vá lá, bíblia do automobilismo como promessa para a categoria máxima do automobilismo. São crianças que nem podem sair sozinhos de casa já são citados deste jeito. Imagine como fica estas cabecinhas tenras e parcamente amadurecidas. Gente com espinha na cara e já se espera deles que se ombreiem com Schumacher, Senna, Clark, Fangio… É muita pressão para pouca cabeça.

Não é a toa que nenhuma ou quase nenhuma destas previsões costuma dar certo e tantos jovens acabam na fogueira.

+++

Está no ar desde ontem o especial sobre os trinta anos do primeiro título de Emerson e do Brasil na Fórmula 1. É um homenagem singela a um feito extraordinário de um jovem que soube amadurecer e conquistar o sucesso.

Cresci vendo Emerson correr. Acompanhei sua carreira desde seu desembarque na Europa, em 69, graças à cobertura do Jornal da Tarde. Torci como louco por ele, inclusive nos anos Copersucar. E ele sempre compensou de sobra toda torcida.

O primeiro contato que tive com Emerson foi em 74, quando ele testava o McLaren em Interlagos. Ao lado do Roberto Agresti, estava sapeando a conversa dele com jornalistas. De repente, ele vira para mim e pergunta: quantas voltas tinha o GP – e o besta aqui não sabia a resposta!.

Nos poucos contatos que tive com ele nos anos seguintes, Emerson sempre mostrou que era aquilo mesmo que se imagina dele: um cara gentil, cordial, honesto e dedicado. Um Campeão, em suma, menos reconhecido do que deveria ser. Aliás, não há o que possa louvar em excesso o caráter e as conquistas de Emerson.

Li em algum lugar que ele está decidido a voltar a correr. Vai lá, Emerson. Conte com a minha torcida.

+++

Não posso terminar sem registrar minha emoção pelo primeiro aniversário do GPTotal. Me associo incondicionalmente a você nos agradecimentos aos nossos amigos da Ksoft e do www.grandepremio.com.br, sem os quais nada teria sido possível, e quero registrar agradecimentos especiais aos amigos Carlos Chiesa, incentivador da idéia muito antes dela existir, ao Romeu, ao Alexandre e ao Bob. Mas de nada teria valido todo nosso esforço se não fosse o reconhecimento dos nossos leitores. O site começa e termina neles. Muito obrigado, de coração.

Eduardo Correa

Eduardo Correa
Eduardo Correa
Jornalista, autor do livro "Fórmula 1, Pela Glória e Pela Pátria", acompanha a categoria desde 1968

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *