Panda
O que é que deu em Rubinho domingo passado?
Não sei, ninguém sabe, talvez nem o próprio Rubinho. Apenas queremos mais.
Atuações memoráveis e vitoriosas dele, daquelas que a gente gosta, aplaude e se orgulha, parecem condicionadas a situações adversas/inusitadas e, creio eu, também a ausência de ameaça de direta de disputa de posição com Michael Schumacher.
Os pontos em comum entre Hockenheim 00 e Silverstone 03 são, neste sentido, evidentes. Schumacher fora da prova logo na largada na Alemanha e atrasado por um treino classificatório desastrado domingo passado e depois por uma pilotagem longe de inspirada, além do enorme prejuízo causado pela entrada nos boxes para a primeira troca de pneus atrás de Rubinho.
Mas resta Áustria e Nurburgring 02, ambas corridas perfeitas do nosso garoto. Será que a minha teses continua válida? Aparentemente sim.
Na Áustria, Rubinho largou da pole e sempre esteve à frente de Schumacher até o final. Na corrida seguinte, ele se classificou atrás do alemão mas largou bem e foi embora, enquanto Schumacher pagava os pecados, inclusive rodando na pista, além de ser óbvio para qualquer pessoa sobre a face da Terra que a Ferrari não teria coragem de determinar uma inversão das posições.
Será esta a explicação? Todos sabemos da condição de segundo piloto de Rubinho na Ferrari, uma condição inamovível e aparentemente definitiva, já que Schumacher ainda vai pilotar por muitos anos.
Sabemos também que Rubinho não se acomodou a esta condição, que resiste a se conformar como talvez Irvine o tenha feito, e que ainda sonha de uma forma um tanto juvenil em se alcançar o posto de primeiro piloto ou, melhor ainda, de bater Schumacher, firmando-se como um herdeiro legítimo e respeitado das tradições dos grandes campeões brasileiros.
Intuímos, por fim, como esta condição esquizóide deve pesar sobre os ombros de Rubinho, uma pessoa que luta com unhas e dentes pela própria afirmação no topo do automobilismo esportivo mundial, e como isso pode provocar altos e baixos na sua motivação.
Domingo passado, as condições pressumivelmente ideais foram surgindo uma a uma: primeiro a pole, depois o padre irlandês, as condições do próprio carro, o fracasso retumbante de Schumacher, a incapacidade dos adversários em opor resistência à uma corrida inspirada e triunfal. Até aquela declaração idiota do alemão na quinta-feira, de que Rubinho nunca o ajudou, parece ter ajudado.
Assim a resposta à pergunta o que aconteceu com Rubinho domingo é: “sua cabeça funcionou bem e a equipe e o carro não o atrapalharam”. Em poucas palavras, foi isso o que aconteceu domingo na opinião deste humilde comentarista.
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Você e os leitores, em comentários afiadíssimos, examinaram a corrida por vários ângulos, por isso queria apenas adicionar mais duas observações.
1 – Não creio que Rubinho tinha em mãos um carro majoritariamente superior ao da concorrência. Lembre-se que a qualidade de um carro deve ser sempre julgada pelo pior elo da equipe. E, domingo, Schumacher penou para ultrapassar Bar e Renault. De modo que a arrancada de Rubinho foi mais mérito próprio do que do carro ou eventual fraqueza dos adversários.
2 – Por falha da TV britânica, não pudemos ver bem como foi a entrada dos dois Ferrari nos boxes para a primeira troca de pneus. Será que Rubinho foi chamado para entrar antes? Será que ele tomou a decisão por conta própria diante do vácuo de ordens da equipe ou, pior ainda, contrariou uma determinação de ceder a vez a Schumacher que, naquela altura, tinha algumas chances de chegar na frente?
Ninguém na equipe, inclusive o próprio Rubinho, tocou no assunto mas foi ali, naquele momento preciso, que se decidiu o destino da corrida. Foi o pulo do gato do brasileiro, mesmo tendo caído para 8º. Se tivesse continuado na pista, certamente teria caído muito mais na classificação e não conseguiria recuperar-se.
Esta história uma hora virá a tona. Vamos aguardar.
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Uma lágrima por Pizzonia, vítima da politicagem mais abjeta da Fórmula 1, envolvendo interesses cruzados de gente sem escrúpulos e de equipes que lutam por migalhas, e também da própria incapacidade de dar a volta por cima como Mark Webber o fez.
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O leitor Celso Vedovato enviou há pouco uma versão do que estava escrito no cartaz que o tal padre irlandês carregava: “Rubinho, volta pro box. Tu tá com o carro do Schumacher!”.
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A vitória de Rubinho não foi o único baile promovido por brasileiros na Europa no domingo.
Em Lausitz, na Fórmula 3 alemã, também teve samba tocado por João Paulo de Oliveira. Ele largou dos boxes e conseguiu alcançar a liderança e a vitória na última volta, deixando o autódromo inteiro deslumbrado com sua coragem, audácia e precisão. Foi a oitava vitória seguida de João Paulo.
Eu e Panda devemos desculpas aos leitores do GPTotal por, até este momento, nunca ter mencionado a extraordinária trajetória de João Paulo de Oliveira na Fórmula 3 alemã, o que me rendeu uma bronca do amigo Chico Rosa, a quem reencontrei na semana passada.
Chico que, para quem não conhece, foi uma espécie de irmão mais velho de Emerson, Wilsinho, Pace (a quem acompanhou lado a lado durante toda a sua trajetória no automobilismo europeu) e, mais tarde, Piquet, está entusiasmado com o talento de João Paulo.
Ele garante: o garoto tem o pé pesado, é do tipo que pega rapidamente a mão do carro e, apesar de contar com meios financeiros pra lá de restritos, tem garra para ir buscar resultados, como se viu depois do desastre da temporada passada, também na Fórmula 3 alemã, onde seu carro, motores, ferramentas e até caminhão da equipe foram destruídos em um incêndio.
Abençoado país este, que produz talentos para o automobilismo com a mesma facilidade com que os produz para o futebol.
Boa sorte, João Paulo. Te vemos em breve na Fórmula 1.
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Em 2000, tive a oportunidade de ver in loco algumas etapas da corrida ciclística Le Tour de France e desde então me apaixonei por ela, ainda que pouco entenda do assunto.
Na terça-feira, assisti na TV, em um boletim sobre a prova, a um fato que, imaginava, não acontecia mais no esporte contemporâneo: líder e vice líder do Tour – respectivamente Lance Armstrong e Jan Ullrich – corriam junto. Armstrong sofre uma queda, causada involuntariamente por um garoto à beira da estrada. Ullrich ao invés de aproveitar-se para escapar na frente, reduz o ritmo e espera por Armstrong. Quando este o alcança, recomeçam a pedalar furiosamente montanha acima (eles percorreram naquele dia, uns 160 km de estradas em montanhas). Armstrong acaba vencendo espetacularmente a etapa. Foi talvez o momento decisivo da corrida, que termina neste domingo. As oportunidades para Ullrich descontar a diferença nas etapas que faltam são mínimas. Mesmo assim ele não titubeou em esperar pelo adversário caído.
O que quero dizer com isso? Nada de especial e nem estou sugerindo que Rubinho devesse devolver a posição a Raikonenn quando este saiu da pista na segunda vez em que foi ultrapassado. Apenas que ainda há espaço, mesmo em categorias top, para a mais bela mensagem do esporte: a de que o importante é competir.
Bom final de semana a todos
Eduardo Correa