“SÓ” FALTOU A VITÓRIA

se eu fosse você, ficaria na caixa d´água
31/03/2003
Antes do dilúvio
09/04/2003
São Paulo, 06 de abril de 2003

Edu e amigos leitores,

Antes de mais nada, mil perdões pelo texto truncado que ficou no ar entre domingo à noite e as primeiras horas da manhã de segunda-feira. Por algum motivo que só os deuses da informática saberiam informar, nossos parceiros da Ksoft só receberam os dois primeiros parágrafos do meu texto. Agora sim, seguem versão e raciocínio completos…

Edu,

O que escrever sobre este GP do Brasil que terminou 18 voltas antes do previsto, com um líder que não levou a vitória e ainda por cima viu seu carro pegar fogo nos boxes?

Teria muitas coisas a escrever sobre tudo isso. Como preciso escolher um tema principal, prefiro destacar a bela atuação de Rubens Barrichello, tanto nos treinos quanto na corrida. Não quero, nem preciso, lamentar a falta de sorte: prefiro lembrar que esta foi uma das melhores atuações de Barrichello na Fórmula 1. Mais do que a pole, mais do que a liderança que ocupava quando o carro quebrou, chamou a atenção o fato de sua atuação ter sido muito melhor que a de Michael Schumacher durante todo o final de semana.

Reproduzo abaixo o motivo do abandono de Barrichello. O texto é dos nossos amigos do www.grandepremio.com.br, que deram um show de noticiário durante a semana: “A Ferrari, sem acesso à telemetria do carro de Barrichello por causa de um problema de eletrônica, não descobriu um defeito na alimentação de combustível, que aumentou muito o consumo. A equipe usava o carro de Michael Schumacher como referencial para a parada do brasileiro. Quando estivesse perto do momento de o alemão parar, Barrichello seria chamado. Quando Schumacher bateu, o time ficou às cegas”.

Este poderia ter sido o grande dia de Barrichello. Infelizmente, não foi. Espero que ele, apesar de tudo, continue com a mesma atitude demonstrada durante todo o final de semana: sereno, maduro, tranqüilo. Uma postura de vencedor. Foi assim que ele venceu quatro GPs no ano passado.

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Muitos brasileiros adoraram ver Michael Schumacher rodar e baterna pista molhada. Como todos sabem, não estive entre eles e não faço parte da turma que já apregoa que o alemão está acabado, desmotivado e outros etecéteras.

Ele, sem dúvida, teve uma atuação apagada em Interlagos (principalmente se o parâmetro for Barrichello) e está tendo um mau começo de temporada. Daí a considerá-lo acabado vai uma distância muito grande. Todos os outros campeões mundiais de F 1 já tiveram começos de temporada com maus resultados, e em alguns casos até se recuperaram. Usar essas três corridas para afirmar que Schumacher “não guia tudo isso” ou coisa parecida é muito mais frase de botequim do que análise séria.

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O acidente de Schumacher aconteceu na Curva do Sol, que agora vem sendo chamada de “curva 3”. O alemão teve o mesmo destino de outros pilotos: no meio da curva, perdia aderência ao passar por uma lâmina d’água que cruzava o asfalto. Rodaram ou bateram ali Juan Pablo Montoya, Antônio Pizzonia, Michael Schumacher, Ralf Schumacher, Jarno Trulli, Mark Webber, Justin Wilson e Jenson Button – não necessariamente nesta ordem.

Foi impossível não lembrar do ocorrido no GP do Brasil de 1977. Naquele ano, o asfalto da curva 3 do antigo traçado se desfazia em pedregulhos e nada menos que oito carros escorregaram e bateram naquela curva. Com um detalhe: naquela época, não havia safety-car nem tratores, e a área de escape era pequena. Os carros iam batendo e ficando por ali, com a corrida seguiu normalmente até o final. Os pilotos que bateram naquela curva? Jochen Mass, Clay Regazzoni, Patrick Depailler, Vittorio Brambilla, Ronnie Peterson, Jacques Laffite, John Watson e José Carlos Pace.

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Quem leu as colunas que escrevi durante a Copa do Mundo de 2002 sabe que não dou a menor importância para futebol. Mesmo assim, como bom nativo de Santos, não pude conter minha satisfação ao saber que Schumacher escolheu o time da minha cidade (bicampeão do mundo, permitam-me lembrar) para realizar um amistoso beneficente e, por que não, se divertir um pouco.

Para quem não sabe, Schumacher adora futebol e, nas horas vagas, atua em um time da segunda ou terceira divisão do campeonato suíço. Em 2000, venceu o GP do Brasil e recebeu o troféu das mãos de Pelé – e era visível o respeito que o “Rei do Futebol” inspirava no piloto alemão.

O mais curioso foi ver que um jogo amistoso entre titulares e reservas do próprio Santos, com Schumacher atuando um tempo em cada time, atraiu um público pagante de cerca de 13.000 pessoas – mais do que se vê em muitas partidas oficiais. Em tempo: a peleja terminou em 3 a 3, com o alemão fazendo um gol de pênalti.

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Pobre Giancarlo Fisichella. Parece ser um daqueles bons pilotos marcados a passar pela F 1 e não vencer nenhum GP.

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Coisas da chamada “nova Fórmula 1”:

1) Três vitórias seguidas da McLaren. Convenhamos, é tão “novo” quanto três vitórias seguidas da Ferrari ou da Williams.

2) Pneus de chuva: agora as equipes são obrigadas a escolher um único tipo por GP. Em Interlagos, foi o que se viu: Bridgestone e Michelin trouxeram pneus intermediários (ou seja, para pista úmida e chuva fraca). Quando choveu forte, tivemos que agüentar largada e oito voltas com safety-car, simplesmente porque não havia pneus adequados. Parece coisa de categoria de amadores, não de Fórmula 1.

3) Casos como os de Antônio Pizzonia e Cristiano da Matta. Seus carros tiveram problemas no treino classificatório e eles, além de não terem chance de melhorar seus tempos, ainda foram obrigados a largar com carros defeituosos porque o regulamento proíbe as equipes de consertá-los. Ridículo.

É por essas e outras que eu repito, agora a plenos pulmões: o novo regulamento é uma merda.

Abraços e boa semana a todos,

LAP

 

“INTERLAGOS, VELHA DE GUERRA”

Luis Fernando Ramos

No próximo domingo, Interlagos entra para a história ao sediar a 700a corrida da Fórmula 1. Como vem ocorrendo nos últimos anos, o público brasileiro vai lotar as arquibancadas e emprestar à esta ocasião especial uma paixão só comparada a dos tifosi. Esta efeméride é um justo prêmio para um circuito destinado a ser grande em seu projeto original – e talvez apenas nele. Prefiro acreditar o circuito paulistano está iniciando uma caminhada para ter o respeito que merece, mas é preciso muito cuidado aqui.
Infelizmente, a importância de Interlagos para o automobilismo brasileiro jamais foi reconhecida em forma de conservação e boa utilização do espaço. Para se ter uma idéia, nos últimos cinco anos foram gastos mais (talvez bem mais) de 30 milhões em obras no autódromo. Incrivelmente, esta fortuna jamais conseguiu solucionar o problema das ondulações no asfalto.
Não há como negar o positivo impacto econômico que o evento gera na cidade, mas a questão aqui não é o que acontece em Interlagos durante o GP do Brasil, mas antes e depois dele. Há poucos anos atrás, a ciclo anual do autódromo era deprimente. Após a maquiagem feita para receber a Fórmula 1, a pista era esquecida, com a grama crescendo à vontade, fios elétricos, torneiras e até vasos sanitários sendo roubados.
Foi até com certa estranheza que cheguei na pista no final do ano passado para as rodadas finais da Stock-Car, Fórmula Renault e Super Nissan, e vi tudo bem organizado e estruturado. Só faltou mesmo o público lotando as arquibancadas, mas o importante é que finalmente Interlagos deixou de ser tratada como uma velha prostituta para voltar a receber cuidados mínimos.



Vale aqui uma viagem no tempo. O autódromo nasceu na prancheta do engenheiro Luís Romero Sansom, que trabalhava para a companhia Auto Estradas. O projeto original era um primor: um autódromo de oito quilômetros de extensão (além de um anel externo) com estacionamento para dez mil veículos. Além disso, seriam feitos dois restaurantes e um centro esportivo com um enorme estádio, piscinas e quadras de tênis.
Apenas a pista saiu do papel. Foi um serviço mastodôntico, que removeu meio milhão de metros cúbicos de terra e utilizou 475 toneladas de asfalto. Mas desde a inauguração, em 1940, pouco ou nada mais foi feito em Interlagos até 1969. Naquele ano, após muita pressão da extinta Associação Paulista de Volantes de Competição, é que o autódromo finalmente recebeu investimento maciço. Foram construídos um sistema de galerias para escorrer as águas da chuva, zebras, alambrados, túnel que dá acesso à parte interna do circuito e a torre de cronometragem.
Nos anos 70, Interlagos viveu sua década de ouro, sediando oito GPs de Fórmula 1, o último deles em 1980. Depois de perder o evento para Jacarepaguá, a pista entrou em esquecimento e viveu sua pior fase. A reforma feita em 1989, se trouxe a categoria de volta à São Paulo, “assassinou” o traçado original, sem dúvida um dos mais desafiadores em todo o mundo. O de agora, ainda que banal, é considerando um dos mais interessantes da temporada para muitos pilotos. Para você ver o nível atingido pela “estética Hermann Tilke” – o engenheiro alemão que projetou Sepang e os novos Hockenheim e Zeltweg.
Interlagos, o primeiro autódromo construído na América do Sul e berço dos cinco brasileiros vencedores na Fórmula 1, completará 63 anos no próximo dia 12 de maio sonhando em resgatar os bons tempos. Tempos de arquibancadas lotadas nas Mil Milhas Brasileiras e na Semana de Velocidade. Hoje em dia, elas só ficam repletas na F-1 e, fenômeno inexplicável, na Fórmula Truck. Se existe um cuidado mínimo com a conservação, investir em estrutura (especialmente buscar uma solução para estacionamento) e criar uma política de utilização inteligente poderia atrair de volta o público. Porque Interlagos, por tudo que já fez pelo nosso automobilismo, merece.

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E já que estamos falando de ineficiência administrativa, e a Jaguar, hein? Na última semana veio à tona os motivos da saída de Niki Lauda: basicamente, o X da questão era o salário 11 milhões de dólares anuais, o triplo do que ganha o vice-presidente da Ford, Richard Perry-Jones. E o austríaco já ameaça ir à justiça para requerer uma indenização de seis milhões de dólares por sua demissão.
Enquanto isso, a equipe viveu dois fins de semanas caóticos e os carros verdes são os únicos que ainda não viram a bandeira quadriculada nesta temporada.

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E já que estamos falando em uso discutível de quantias astronômicas, a plástica que está sendo feita em Hungaroring vai custar, no câmbio de hoje, R$ 14,5 milhões. É uma obra complicada, que vai ampliar a reta principal em 200 metros e retirar a chicane situada antes da entrada dos boxes, substituindo por uma reta maior e uma curva de baixa velocidade.
Em 2000, o recapeamento do asfalto de Interlagos e a construção de um anexo atrás dos boxes – que, aliás, já está com as estruturas comprometidas – custou R$ 11 milhões. Neste ano, um novo recapeamento e um novo anexo consumiram R$ 9,5 milhões.
Só para comparar…

GPTotal
GPTotal
A nossa versão automobílistica do famoso "Carta ao Leitor"

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