A PEQUENA MARAVILHA
Tudo começou com um hilariante e-mail do Alexandre Zamikhowsky Filho, lembrando que vira nosso colaborador Bob Sharp pilotando um DKW nos anos 60 em Interlagos.
Bob sacou, então, do fundo do winchester uma foto dele e do irmão Billy ao volante da “pequena maravilha” (para quem não sabe, DKW são as iniciais de A Pequena Maravilha em alemão). Daí em diante, o papo engrenou e outros amigos do GPTotal começaram a lembrar das corridas, pilotos e carros naquela época, produzindo belíssimos textos que, com alguns cortes, reproduzo a seguir. (EC)
Edu
Reparou que o DKW tinha pintura em duas cores? Era o que se chamava na época saia-e-blusa. Dá uma olhada melhor e você vai ver gente sentada na parte de fora da curva. Era assim que a gente assistia as corridas naquele tempo. Aliás essa foto tá com cara de Mil Milhas, lá pra 1961,será? Tinha um bueiro na entrada da curva 4 que a gente, às vezes, se enfiava dentro pra ver os carros de um ângulo legal mas também na parte interna do Laranja a gente se deitava no chão e podia ver em detalhes como alguns carros faziam a curva. Os Alfas levantavam a roda dianteira interna…
Alexandre Zamikhowsky Filho, São Paulo
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Pegando carona na foto do DKW 95 do Bob Sharp peçam a ele que mande e explique porque um outro carro do mesmo modelo só corria faltando um farol.
Depois, se o baú do Bob estiver disponível, que acham dele começar a mandar suas “vidas” automobilisticas em fascículos. O “Home” andou de tudo! Uma foto do Protótipo Heve que na época voava… e por aí vai!
Termino aqui pois só o que eu lembro já iniciaria uma enciclopédia.
Um abraço
Roberto Costa, Fortaleza
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Caro Roberto,
Segue foto do DKW-Vemag com carroceria modificada, em que todos os painéis (teto indusive), portas e tampas foram reproduzidos em plástico reforçado com fibra de vidro. Ficou só a estrutura e o assoalho do habitáculo originais. O peso baixou de 845 kg para 620 kg.
Como a dianteira passou a ser peça única e removível para acesso mecânico ideal, a separação compartimento do motor–caixa de roda foi eliminada, por questão de simplicidade. O motor tinha dois carburadores Weber 45 DCOE, horizontais, em que um dos corpos foi eliminado, pois não era necessário (como era habitual nos carros da Equipe Vemag, por questão de espaço). Então as três cornetas de admissão ficavam voltadas para a caixa de roda, “vendo” a roda dianteira direita.
No primeiro teste o carro se mostrou muito lento de reta, principalmente a partir de 120 km/h. Claro, pensamos em falta de potência, verificamos tudo. Após uma das verificações, fui com o carro para a pista sem a tampa do motor, por qual motivo não me lembro. Veio a surpresa: o carro andou o que deveria, enchendo a quarta, perfeito, apesar da perda aerodinâmica resultante da falta da frente. Encerramos o teste e voltamos para a oficina, mas ainda sem a explicação do que acontecera.
Por uma dessas coincidências, eu estava em casa, à noite, e peguei um livro sobre a história do Mini, de Lawrence Pomeroy, um dos mais brilhantes jornalistas automobilísticos. No capítulo do desenvolvimento do carro, havia a descrição de um problema de superaquecimento que parecia insolúvel. Haviam tentado de tudo. Até que alguém resolveu medir a pressão atmosférica no interior da caixa de roda dianteira. A pressão era negativa, depressão. Como o radiador era lateral e a hélice do ventilador puxava ar da caixa de roda para o compartimento do motor, não havia fluxo de ar suficiente para o radiador cumprir o seu papel. A solução foi simples: bastou inverter o passo da hélice e o fluxo de ar passou a ser do motor para a caixa de roda. Inclusive, graças à depressão ali, o fluxo ficou melhor que esperado.
Naquele momento, eureka! O motor do DKW não estava conseguindo aspirar ar suficientemente, devido à depressão naquele ponto — causada pela eliminação da separação compartimento do motor–caixa de roda. A solução óbvia foi remover a carcaça do farol direito, restabelendo-se a pressão positiva na caixa de roda. Como as provas daquela categoria, Protótipo Experimental CBA, eram só diurnas, não havia necessidade de farol. Com a “tomada de ar”, o carro passou a andar o que era previsto, e muito bem por sinal.
Note na grade, na direita e em cima, um desenho diferente do resto. É que devido à frente ter abaixado e ficado ligeiramente mais curta, a grade pegava no carburador do cilindro 1 (o tal Weber cortado). Tivemos de fazer outro “buraco”, eliminando algumas lâminas da grade. Veja se consegue notar um pequeno calombo bem no centro do capô, perto da grade: também pelo motivo da frente ter ficado mais baixa, foi preciso criar espaço para a polia do ventilador.
Está aí a história.
Forte abraço!
Bob Sharp
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Romeu, boa tarde!
Pouca gente sabe, mas a DKW Vemag tinha uma Vemaguete de serviço, toda rebaixada e calibrada, “jogada no chão”, como diz o Edgard Mello Filho. Essa Vemaguete, quando recebia aqueles motores que só o Crispim e o Jorge Lettry sabiam preparar, virava um foguete e rodava Interlagos em tempos ligeiramente melhores que os Belcar de fábrica, com os mesmos motores.
Na época, não se sabia o motivo. Ninguém entendia nada de aerodinâmica. Nada, nadinha! Hoje eu me pergunto se não era o design da traseira da Vemaguete que dava esta condição aerodinâmica e proporcionava um tempinho melhor. Olha a brincadeira: seria a Vemaguete um Belcar “lang heck” como eram os Porsches de Le Mans, para aproveitar o retão de Mulsanne? Não vamos saber nunca. Não temos mais o retão nem a pista antiga. Nem as décadas endiabradas.
Abraços
Manuel Carvalho, Santos
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Ôi Manuel
é um prazer bater um papo com você, que pelo que já percebi andou freqüentando o nosso querido autódromo na mesma época que eu.
Quando comecei a escrever algumas coisas para o GPTotal foi justamente falando sobre o velho traçado que foi criminosamente destruído. E lembrando de pilotos, carros e corridas que o pessoal mais novo infelizmente não conheceu.
Contei ao Edu que eu tinha tido o prazer de assistir em Interlagos a largada das 1ª Mil Milhas Brasileiras em 1956 (eu tinha 8 anos). O meu fanatismo por carros, roncos de motores e corridas foi se acentuando até que em 1958 quando a Vemag lançou o DKW sedan (em 1957 já havia lançado a perua), eu de cara me apaixonei pelo carro.
Me lembro que um tio comprou um na Serva Ribeiro (Concessionária Vemag, talvez a primeira da marca) e eu adorava aquele barulho característico dos motores 2 tempos e até do seu cheiro que muitos odiavam. O acabamento interno do bichinho era triste. Quando esses carrinhos foram então para as pistas com a criação do Departamento de Competições da Vemag, no início dos anos 60, eu fiquei louco de vez pelos carros. E virei um torcedor fanático da marca.
Vi grandes corridas proporcionadas pelos Dékas preparadas pelo Lettry e pelas mãos mágicas do Crispim como você bem lembrou. Era um absurdo o desempenho de um carro com 1000 cilindradas, dando pau em carros da mesma cilindrada como os Gordinis e Willys Interlagos, mas também nos Simca (2.600cc), JK (2000 cc), e até nas carreteiras com motores Thunderbird e Corvette de até 4.500 cc.
Com o DKW, vi nascer alguns pilotos que para mim se tornaram ídolos como o grande Bird Clemente e Mário César de Camargo Filho. Corriam de DKW também outros pilotos dos quais assisti a grandes shows: o misterioso “Volante 13” (Flodoardo Arouca), Charles Marzanasco (pai), Waldomiro Pieski, Eduardo Scuracchio, Jan Balder, o saudoso Expedito Marazzi também fez algumas corridas de Déka. Nas corridas de longa duração vinham Norman Casari (do Rio). Do sul, Henrique e Karl Iwers (sogro e cunhado de Jan Balder). Norman Casari algum tempo depois, bateu o recorde de velocidade com o “Carcará” (DKW).
Eu não afirmo 100%, mas tenho quase certeza que vi algumas vezes o Roberto Dal Pont correr com o DKW- Vinhais. A esquisitice daquele protótipo do Vinhais (Nilo de Barros Vinhais) era explicável.
O DKW tinha um chassis em formato de xis, que acabava justamente no eixo traseiro, portando o porta malas do sedan e o bagageiro da Vemaguet não tinham estrutura nenhuma. E aquela inocente peruazinha foi cortada exatamente após o eixo traseiro. E lá na frente, aquele “motorzão” do qual já falamos lá em cima. As propagandas da Vemag, inseridas nas Revistas 4 Rodas da época, mostravam a parte inferior de um DKW, e dizia ser aquele o único chassis com “xis”.
Eu tenho um folheto com os inscritos para as Mil Milhas de 1966 (aquele famoso em que o Jan Balder e o Emerson perderam o 1º lugar com um GT Malzone, para a Carreteira do Camilo nas últimas voltas) em que o Roberto Dal Pont está inscrito com um DKW Carreteira. Seu parceiro não era o Vinhais, mas o Pedro Victor Delamare. Não me lembro se seria ou não o tal protótipo Vinhais. Bem, chega de ficar cutucando a memória. O marcador de temperatura já está chegando nos 100º.
Manuel, quando tiver um tempinho escreva de novo. Acho que temos assunto por um bom tempo.
Abraços
Romeu Nardini, São Paulo