para que tanta potência?

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28/01/2002
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04/02/2002

Panda

Nas últimas semanas vários leitores dirigiram e-mails ao Pergunte ao GPTotal versando sobre a velocidade máxima e aceleração de Fórmulas 1 e outros carros de corrida. Revendo os textos me veio à mente o seguinte: você não acha pouco 360 km/h como velocidade máxima de um Fórmula 1?

Eu acho. Os sport-protótipos que correm em Le Mans também atingem esta velocidade com facilidade e os Fórmula Indy vão muito além. Pois acabei tropeçando na resposta: os Fórmula 1 não são mais velozes porque não precisam de mais velocidade nas retas; eles precisam é de mais velocidade nas curvas e, nisso, não há no mundo nenhum carro mais rápido do que um Fórmula 1.

A resposta às minhas dúvidas é uma gentileza de Mauro Coppini, l´ingegnere del lunedì – o engenheiro da segunda-feira -, colunista de Autosprint (sempre ela). O título da coluna é uma ironia a uma ironia de Enzo Ferrari, que chamava de engenheiros da segunda-feira a turma de palpiteiros como nós que, depois das corridas, ficavam corneteando que a Ferrari deveria ter feito isso ou aquilo.

Diferentemente da maioria dos jornalistas, Mauro Coppini sabe do que fala. Ele nota que a velocidade final de um Fórmula 1 está cada vez mais próxima da sua velocidade média. Ou seja: um Fórmula 1 percorre os trechos mistos dos autódromos a velocidades cada vez mais próximas daquelas com que circula nas retas.

Por que? Antes de tudo porque os motores são cada vez mais potentes. Motores potentes permitem aos engenheiros trabalhar com aerofólios e apêndices aerodinâmicos cada vez mais ativos, de forma que os carros podem ir rápido nos trechos sinuosos sem prejuízo da velocidade nas retas.

Você sabe que os aerofólios e outros apetrechos aerodinâmicos só são válidos nas curvas. Nas retas, eles são um limitador de velocidade. Tire as asas de um Fórmula 1 e ele rasgará as retas de Monza a 450 km/h e não a 360 km/h. Nas curvas, porém, seria muito mais lento, anulando qualquer vantagem da maior velocidade. Os engenheiros dos anos 60, época em que os aerofólios chegaram a Fórmula 1, já sabiam disso tanto que desenvolveram carros com asas móveis. Nas retas, o piloto apertava um pedal e elas diminuíam o ângulo de ataque e a resistência aerodinâmica. Soltando o pedal, as asas voltavam à inclinação original e ajudavam na aderência dos carros nas curvas. Imagine o que os engenheiros não fariam hoje, com toda a eletrônica disponível na Fórmula 1, se a Federação Internacional de Automobilismo não houvesse proibido todo e qualquer movimento dos aerofólios…

A questão toda tornou-se central para as equipes atuais. A menor potência dos motores Mercedes na temporada passada em relação aos BMW e Ferrari fez com que os engenheiros da McLaren não pudessem usar tanto apoio aerodinâmico no carro. Resultado: sem muita asa, os carros tornaram-se muito mais difíceis de serem dirigidos, oscilando belíssimas corridas – Brasil, Áustria, Inglaterra, Indy – a outras, medíocres.

Os engenheiros riram quando os Toyotas alcançaram as maiores velocidades nas retas de Barcelona. Para eles, foi um sinal claro que faltava apoio aerodinâmico aos carros japoneses. Dito e feito: os Toyota estão sempre entre os mais lentos nos tempos de volta.

Assim, quando você ler que os engenheiros estão lutando para aumentar a potência do motor x, não espere que o carro seja mais rápido nas retas. O que os engenheiros querem, de fato, é dar condições ao piloto de percorrer as curvas maior rápido, mesmo porque as retas são cada vez mais curtas. As de Hockenheim, por exemplo, nesta altura, já devem ter sido retalhadas pelas escavadeiras…

É por isso também que antes do final da década – talvez em 2008 -, os motores de Fórmula 1 certamente terão a sua cilindrada reduzida de 3 mil centímetros cúbicos para 2,5 mil ou menos, com a provável limitação no número de cilindros, de dez para oito. Seria a maneira das autoridades esportivas reduzirem os riscos de acidentes.

Anos atrás, ouvi Max Mosley, presidente da Fia, dizer que a violência de um acidente na Fórmula 1 era proporcional ao nível de aderência do carro. Não entendi a relação entre uma coisa e outra. Agora, as coisas ficam mais claras. Mais aderência nas curvas levam os carros a percorrê-las a velocidades maiores. Se o piloto perde o controle do carro, a violência do choque é maior. Por isso as autoridades esportivas investiram nos pneus com sulcos, uma forma de reduzir a aderência nas curvas. A tentativa, porém, deu em nada. O próximo passo certamente será uma limitação na potência dos motores via redução da cilindrada.

Só espero que esta limitação venha em 2008, quando o Pacto da Concórdia, o acordo esportivo-comercial que rege a Fórmula 1, será renovado e não como resultado de alguma tragédia, como a que levou a redução das cilindradas do motor de 3,5 mil centímetros cúbicos para os atuais 3 mil.

Abraços

EC

Eduardo Correa
Eduardo Correa
Jornalista, autor do livro "Fórmula 1, Pela Glória e Pela Pátria", acompanha a categoria desde 1968

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