Edu,
Um dos assuntos do final de semana que passou foi a oferta da Toyota a Rubens Barrichello. Pode ser resumida assim: três anos de contrato, um bom salário anual e todas as benesses do cargo de primeiro piloto. Barrichello prefere renovar com a Ferrari, mas esta lhe oferece apenas um ano de contrato.
Não deixa de ser uma proposta tentadora. A Toyota tem enorme potencial para crescer nos próximos anos. Mas é também arriscado: a equipe pode simplesmente não acertar e ficar patinando no meio do pelotão durante todo esse tempo. A Jaguar parecia promissora quando comprou a Stewart no final de 1999. Eu mesmo cheguei a pensar se Barrichello não estaria cometendo um erro ao deixar a Stewart em ascensão e cheio de moral para ser segundo piloto da Ferrari. Não precisei de mais que alguns meses para ver como meu palpite estava errado (é por isso que eu nunca me meti a gerenciar carreiras de pilotos…).
Ficar na Ferrari, mesmo que garantido por apenas mais um ano, parece ser a melhor aposta para Barrichello em termos esportivos. Mas pilotos são profissionais como quaisquer outros e também precisam pensar no futuro. Portanto, não seria surpreendente se uma oferta de bom salário por um período de tempo relativamente longo seduzisse o brasileiro a ponto de fazê-lo trocar a competitividade garantida da Ferrari pelo investimento de risco da Toyota. Outros pilotos já fizeram opções semelhantes no passado – alguns se deram bem, outros nem tanto. É esperar para ver.
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Além de Barrichello, fazem parte da lista de “Toyotáveis” nomes como Coulthard e Heidfeld. É praticamente certo que um dos atuais pilotos da Toyota (Mika Salo e Allan McNish) deve “dançar” no final do ano.
A Toyota não quis arriscar colocar um piloto vencedor em sua primeira temporada (se quisesse teria dinheiro até para bancar uma eventual saída de Schumacher da Ferrari). Se o fizesse e os resultados fossem ruins, a culpa seria atribuída ao carro. Com Salo e McNish, qualquer resultado razoável seria atribuído também às qualidades do TF102.
A experiência de Salo e o conhecimento técnico de McNish, porém, já não bastam para a Toyota. Ela já percebeu que precisará de um piloto vencedor para atingir seus objetivos. Barrichello pode ser um deles.
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Leio no Grande Prêmio (www.grandepremio.com.br) que Cristiano da Matta, o favorito para conquistar o título da CART nesta temporada, vai testar o Toyota de Fórmula 1 no final de maio em Paul Ricard. Sua equipe da CART, a Newman-Haas, usa propulsores da marca japonesa.
Um convite desses não surge à toa. Se Ove Andersson, o chefão das atividades esportivas da Toyota na F 1, aceitou colocar o brasileiro ao volante de um de seus carros, é porque percebe que ali há um potencial a ser, no mínimo, analisado. Cristiano (junto com Hélio Castro Neves e Tony Kanaan) é um dos brasileiros que correm nas categorias dos Estados Unidos e, até prova em contrário, podem fazer bonito se tiverem um carro decente na F 1.
É impossível prever o que pode sair deste teste. Pode ser que Cristiano mostre seu talento de forma límpida a ponto de render-lhe imediatamente um contrato para estrear na F 1 em 2003. Aconteceu a mesma coisa com Jacques Villeneuve quando ele testou a Williams em 1995. Em compensação, a Jaguar viveu uma experiência inversa em 2000: bastou um teste para a equipe perceber que Dario Franchitti não teria muito futuro na F 1. Isto foi decisivo para a equipe fechar com Luciano Burti para a temporada seguinte.
Boa sorte, Cristiano.
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Eu, particularmente, tenho uma lembrança muito agradável do Cristiano. Em 1994, quando editava a Grid, recebi de meu chefe Jorge de Souza a tarefa de encontrar um Fórmula 3 para testar e depois escrever uma matéria para a revista. Augusto “Formigão”Cesário, dono da equipe Cesário Fórmula, colocou-me à disposição o Dallara-Mugen que era usado pelo Cristiano, líder do campeonato.
No dia do teste (para mais detalhes, basta fazer uma busca na seção “Pergunte ao GPtotal”), Cristiano, Formigão e José Avallone Neto (então engenheiro da equipe) me ajudaram bastante e sequer esboçaram qualquer preocupação em entregar um Fórmula 3 novinho em folha a um jornalista travestido de piloto. Quem ficou mais preocupado foi o Toninho da Matta, pai do Cristiano e um dos melhores pilotos de carros de turismo que o Brasil já teve. Mas o Toninho ficou bem mais tranqüilo quando eu expliquei o objetivo do teste – e mais ainda quando o carro do filho foi devolvido inteiro. No final do ano, Cristiano conquistou o título, depois de uma dura batalha com Hélio Castro Neves.
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Rob Walker, um dos personagens mais importantes da história do automobilismo, morreu aos 84 anos no último dia 29 de abril. Naquele dia, escrevi um pequeno artigo para nosso site parceiro Grande Prêmio (www.grandepremio.com.br). Reproduzo-o abaixo:
“Imagine hoje a seguinte situação: um milionário, pertencente a uma família de famosos fabricantes de uísque do mundo, decide levar a cabo sua paixão pelo automobilismo de alto nível e decide montar uma equipe própria para disputar a F-1. Para isso, compra carros de um construtor já estabelecido na categoria, (Williams, só como exemplo). Escolhe seu piloto entre os melhores disponíveis, prepara seu carro com esmero… e vence várias corridas, derrotando inclusive os times oficiais dos quais adquiriu seus carros.
Uma história como essa seria difícil hoje, até porque o regulamento não permitiria (atualmente, cada equipe deve fabricar seus próprios carros).
Mas nos anos 60 era possível e permitido. E Rob Walker foi o único dono de equipe particular que aproveitou essa chance em alto estilo. Durante dez anos, a Rob Walker Racing Team foi presença obrigatória na Fórmula 1. Venceu nove GPs com carros como Cooper e Lotus. E teve participação ativa em dois momentos de profunda revolução na Fórmula 1: a passagem do motor para a traseira dos carros e a introdução do patrocínio comercial nas equipes.
Rob nasceu na família proprietária do apreciado uísque Johnnie Walker. Em 1945, aos 28 anos, recebeu uma herança de 1 milhão de libras – alguma coisa em torno de US$ 30 milhões em valores de hoje. Com esse dinheiro, começou a correr, chegando a disputar a 24 Horas de Le Mans. Por amor à esposa, encerrou a carreira de piloto e passou a financiar equipes – algo muito raro numa época em que o patrocínio comercial era proibido no automobilismo europeu.
Foi com o seu dinheiro que a Cooper chegou à F 1 e conseguiu, em 1958, a primeira vitória de um carro com motor traseiro na categoria (GP da Argentina, com Stirling Moss). A revolução de Cooper fez com que, três anos depois, os monopostos com motor dianteiro se transformassem em coisa do passado. E, sem a preciosa influência de Rob Walker dentro e fora do automobilismo, teria sido ainda mais difícil para Colin Chapman fazer com que os organizadores de corridas aceitassem a inscrição dos Lotus pintados nas cores do cigarro Gold Leaf.
A última vitória de Rob Walker aconteceu no GP da Inglaterra de 1968, com o suíço Jo Siffert. A mais memorável, porém, foi a de Mônaco, em 1961, quando Moss aproveitou-se da maneabilidade de seu Lotus para derrotar as potentes (e favoritíssimas) Ferrari. A derrota inesperada gerou um comentário azedo de Richie Ginther, um dos pilotos da equipe italiana: “É como ver quem é mais rápido em uma sala, um cavalo de corrida ou um cachorro…”. O troféu desta corrida ocupava lugar de honra na sala do escritório de Walker.
Rob Walker manteve sua equipe em atividade até 1970, quando Graham Hill era seu piloto. No ano seguinte, juntou-se a John Surtees, mas o temperamento difícil deste último inviabilizou a parceria. Manteve-se ligado a equipes diversas até meados dos anos 70, quando passou a atuar como colaborador da conceituada revista norte-americana Road and Track. Mesmo afastado das pistas, acompanhou e respirou automobilismo até o fim da vida. Certamente morreu realizado, consciente de seu papel na história. Sem ele, a Fórmula 1 teria demorado um pouco mais para ser o que é hoje.”
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Jacques Villeneuve está desmentindo a si próprio.
Em 1995, quando acertou contrato com a Williams para disputar a F 1 a partir do ano seguinte, ele deu uma entrevista na qual afirmou o seguinte: “Ganhar dinheiro é importante. Mas se você ganhar dinheiro e não ganhar corridas, não vai ganhar dinheiro por muito tempo”.
Bem, Jacques venceu seu último GP em 1997. Hoje, estima-se que ele receba da BAR um salário anual da ordem de US$ 23 milhões…
Abraços,
Panda