O que eu vou dizer lá em casa, McLaren? – Parte 2 (coluna+YouTube)

Quebrado, remendado, reinventado: a história de um piloto que venceu duas corridas
28/11/2025

Desde que Gordon Murray sugeriu fazer paradas programadas durante as corridas no início da década de 1980, trazendo de volta os pit-stops para as corridas de F1, a estratégia se tornou algo primordial para se vencer um Grande Prêmio. Nesses mais de quarenta anos em que os pit-stops modernos estão presentes na F1, várias corridas foram vencidas ou perdidas por uma estratégia certeira ou um grande vacilo do pit-wall. Nesse domingo em Lusail, vimos a segunda opção acontecer.

A McLaren tinha tudo para conseguir uma dobradinha que a deixaria tranquila para a etapa final em Abu Dhabi, até mesmo com chances de deixarem Norris e Piastri decidirem o título entre eles na insossa pista de Yas Marina, trazendo à tona as famigeradas Papaya Rules. No entanto, um ‘gênio’ sentado no pit wall da McLaren fez com que o time comandado por Zak Brown entregasse a vitória de bandeja para Max Verstappen, que chega para a última etapa com boas chances de conquistar um pentacampeonato, que alguns meses atrás parecia próximo do impossível.

O Lusail International Circuit foi construído em 2004 para receber o Mundial de Motovelocidade e seu circuito fluído, bem apropriado às corridas de moto, logo caiu no gosto dos pilotos da MotoGP e quando o autódromo no Catar recebeu a F1 pela primeira vez em 2021, os pilotos também adoraram o circuito de alta velocidade e um setor intermediário insano, com os carros atingindo 5G’s em algumas curvas.

No entanto isso faz com que as ultrapassagens se tornem quase impossíveis em provas de F1 e a corrida Sprint desse sábado demonstrou isso mais uma vez, numa prova completamente entediante vencida por Piastri, piloto dominante do final de semana até ali. Praticamente sem mudanças após a primeira volta, a mini corrida no Catar foi um longo bocejo, que foi usado para as equipes mais como uma espécie de terceiro treino livre de luxo.

Horas depois a classificação ocorreu sem maiores problemas, com a McLaren demonstrando a mesma força dos melhores momentos de 2025 da equipe papaia. Mais atrás, Lewis Hamilton seguia em seu suplício, onde repetiu a mesma posição nas duas classificações que participou no Catar: uma inglória 18º posição. Como sempre Max Verstappen levou seu Red Bull nas costas e andando acima do limite do seu carro, beliscou o terceiro lugar no grid. Após vencer sem sustos na Sprint, Piastri ficou com a pole, numa disputa direta contra Norris, que errou em sua tentativa final do Q3, mas ainda assegurou um lugar na primeira fila.

Para quem viu a corrida Sprint, não se surpreendeu com a prova principal no domingo. A corrida no Lusail International Circuit esteve longe de empolgar, com as notórias dificuldades de se ultrapassar que apareceram na véspera retornando com tudo no domingo, algo que os táticos da McLaren deveriam ter levado em conta mais tarde. Mesmo não largando na pole, Lando Norris mostraria como seria o seu domingo com uma largada fraca, onde Max Verstappen rapidamente se colocou na segunda posição e mesmo o inglês tentando uma manobra durante a primeira volta, Max facilmente se defendeu e as posições se mantiveram entre os três primeiros.

Destaque para a ótima largada de Andrea Kimi Antonelli, que superou seu companheiro de equipe já na saída, enquanto Russell caía para sétimo. Nico Hulkenberg e Lewis Hamilton foram os únicos a largarem com pneus macios, fazendo funcionar a audaciosa tática ganhando algumas posições nos primeiros metros. Hulkenberg pressionava fortemente Pierre Gasly e na abertura da sétima volta, o alemão fez uma bela manobra por fora da curva um, mas Gasly resolveu ‘embarrigar’ a curva e o toque foi inevitável. Ambos furaram seus pneus, mas se Gasly se manteve na pista e se arrastou rumo aos boxes, Hulkenberg ficou parado na brita, com o carro atolado, trazendo o único e decisivo Safety Car da noite.

Nesse momento o ritmo da McLaren era superior ao da Red Bull, com Piastri disparando na frente de Verstappen, enquanto Norris vinha numa distância o suficiente para não superaquecer os pneus e tentar o bote quando fosse possível. Por causa do enorme desgaste de pneus em Lusail, a Pirelli sugeriu e foi acatada por motivos de segurança com uma regra de que os pilotos poderiam dar vinte e cinco voltas no máximo em cada set de pneus, não importando o grau de dureza da borracha. Com o Safety-Car parado no final de reta dos boxes esperando os líderes, Piastri passou a entrada dos pits, enquanto Max Verstappen embicou para dentro do pit-lane. Norris poderia simplesmente marcar Verstappen, mas provavelmente a McLaren quis manter a igualdade de tratamento na tal ‘Papaya Rules’ e o inglês seguiu o companheiro de equipe. O problema foi que os demais dezesseis pilotos seguiram Max Verstappen, configurando que ou a tática da McLaren era bestial ou besta.

A conta era simples. Com a obrigatoriedade de se parar com 25 voltas por força do regulamento, a McLaren teria que visitar os pits mais duas vezes, enquanto os demais pilotos do pelotão tinham ‘ganhado’ um pit com a visita aos boxes no período de Safety-Car. De forma resumida, a dupla da McLaren teria que acelerar como nunca para abrir uma vantagem grande o suficiente para se manterem na ponta. Como diria Garrincha, faltou combinar com os russos. Ou com Max Verstappen.

Na relargada a dupla da McLaren acelerou forte e abriu vantagem sobre os demais carros, porém, Max Verstappen manteve a dupla papaia não muito longe. Piastri estava num bom dia e era mais rápido do que Norris, mas Verstappen não era tão mais lento, fazendo com que os três estivessem numa liga a parte nesse domingo. Isso por si só já estragaria completamente o raciocínio da trupe de Andrea Stella e seus papaias caps. Com Verstappen à espreita, a corrida estava definitivamente perdida.

Talvez no único acerto ‘mclariano’ do dia, Piastri e Norris fizeram suas respectivas paradas e retornaram logo à frente de um grupo de pilotos liderado por Fernando Alonso. Os dois escaparam de ficar presos atrás de pilotos mais lentos, mas com Max Verstappen bons 16s na frente, só um milagre salvaria o dia da McLaren. Piastri, que tinha tudo para vencer a prova, executou uma bela ultrapassagem em cima de Antonelli, mostrando bem como estava o australiano nesse domingo. O mesmo não se pode dizer de Norris, que ficou preso atrás do italiano até ele fazer sua parada. Algo que os demais pilotos também fizeram.

A liderança da dupla da McLaren foi efêmera e ainda sobrou mais um erro para os papaias. Se quisesse pelo menos atacar Max no final, o lógico era colocar pneus macios no curto stint final. Pois bem, a McLaren colocou pneus… duros para a sua dupla. Se Piastri ainda voltou em segundo, Lando Norris não teve uma parada tão boa e acabou atrás de Sainz e Antonelli. Enquanto esteve na frente de Verstappen no final do seu segundo stint, Norris quase perdeu o carro e reclamou que o seu difusor, tão sensível nos carros atuais da F1, estaria danificado. Lando não teve mais o mesmo ritmo e mesmo com pneus bem mais novos que o de Antonelli, foi incapaz de realizar um ataque mais incisivo contra o jovem italiano da Mercedes.

Max Verstappen venceu com tranquilidade outra corrida em que saiu da Classificação pessimista com o ritmo do seu carro, mas no momento decisivo, o neerlandês mostrou toda a sua genialidade, mas como o próprio Max falou depois da corrida, ele contou com uma ajuda inesperada e fundamental da McLaren. Oscar Piastri subiu ao pódio com cara de pouquíssimos amigos. Após semanas de inferno astral, Piastri viu seu final de semana mais dominante do ano se transformar num triste segundo lugar, onde Oscar mal comemorou. Mesmo tirando bons pontos de Norris no campeonato, Piastri vê Verstappen com uma boa vantagem e com o viés totalmente de alta. E Norris ainda teve uma sorte com Antonelli errando nas voltas finais, ganhando uns pontinhos ao terminar em quarto lugar, colado em Sainz.

Mesmo tendo essa sorte, não se pode negar o domingo pífio de Lando, o que pode significar que o inglês pode estar sofrendo com algo normal para qualquer piloto: fechar o primeiro título mundial. E para um piloto sensível como Lando Norris, isso pode estar sendo elevado a outro nível. Com apenas catorze pontos de vantagem sobre Max Verstappen indo para a corrida final, Lando tem um tríplex em sua cabeça, enquanto Piastri viu uma vitória que poderia ser um vislumbre de recuperação nesse finalzinho de campeonato se transformar numa enorme decepção. Depois da corrida a McLaren já anunciou que não pedirá a Piastri que trabalhe a favor de Norris. Ai Papaya Rules…

Já Max Verstappen irá para Abu Dhabi ainda como franco atirador, pois todo mundo sabe que ele ter o mesmo número de vitórias que a dupla da McLaren (sete) e ter chances reais de ser campeão já é histórico.

Carlos Sainz conseguiu seu segundo pódio com a Williams fazendo uma corrida sólida, sempre à frente de Antonelli e mesmo com ligeiro problema reportado nas últimas voltas, segurou sem maiores arroubos o ataque final de Norris. Depois de um início de campeonato claudicante, Sainz se recuperou muito bem e já encosta no campeonato em Albon, que hoje fez uma corrida medíocre e sem chances de pontos.

Mesmo com o erro que cometeu nas últimas voltas, permitindo a ultrapassagem de Norris e causando uma certa celeuma entre os dirigentes de Red Bull e Mercedes depois da corrida, Antonelli fez uma bela prova começando com a largada, onde não tomou conhecimento de George Russell e no final do dia, o italiano cruzou a linha de chegada 20s na frente de George, que começa a perceber que terá bastante trabalho em 2026. Mais trabalho terá a Ferrari.

O time comandado por Fred Vasseur simplesmente não se encontrou em nenhum momento no final de semana no Catar e Leclerc teve que se conformar com uma oitava posição na bandeirada após subir duas posições em relação ao grid, numa corrida sem maiores emoções para o monegasco. Hamilton continua sua temporada literalmente deprimente e saindo mais uma vez das últimas posições, Lewis ficou a corrida inteira sem frequentar a zona de pontuação, fazendo o inglês adjetivar sua corrida de ‘uma bosta’. A Ferrari terá que convencer a si e a seus pilotos que 2026 será bem diferente da decepcionante temporada atual.

Fernando Alonso liderava um trem de pilotos, mas uma rodada fez com que o espanhol perdesse terreno, mas não seu lugar na zona de pontos, fazendo uma corrida bem honesta. Um bom resultado para uma equipe que decepcionou deveras em 2025, numa semana em que a Aston Martin surpreendeu a todos ao anunciar Adrian Newey como chefe de equipe a partir do ano que vem. E que Alonso será papai. O espanhol contou também com o furo de pneu de Hadjar nas últimas voltas, tirando o francês dos pontos após outra corrida forte do novato. A Red Bull falou que deve anunciar suas duplas para 2026.

Tsunoda fez outra corrida fraca, só pontuando pelo abandono de Hadjar, mas ainda atrás de Liam Lawson, que terminou em nono. Bearman estava na zona de pontos quando a Haas se atrapalhou durante o pit-stop do inglês e sem chances de progredir, além de ter que cumprir uma punição, Bearman optou por abandonar. Bortoleto fez uma corrida sem graça, onde ficou preso no meio do pelotão, enquanto a Alpine viu suas chances de pontuar ir embora com o toque de Gasly com Hulkenberg nas primeiras voltas, manobra que decidiu a prova.

No fim das contas, a ‘regra de segurança’ da Pirelli para forçar os pilotos a irem para duas paradas novamente não funcionou, lembrando o fracasso em Mônaco. A maioria dos pilotos reclamou que não tiveram como avançar, pois a estratégia ficou engessada e a corrida no Catar com duas paradas foi tão ou mais entediante se os pilotos parassem apenas uma vez.

A chatice da corrida desse domingo contrasta com um final de campeonato eletrizante e totalmente inesperado, vide o tamanho da dominância da McLaren em vários momentos no ano. Os três primeiros colocados irão para a etapa final em Abu Dhabi com chances de ser campeão, algo não muito corriqueiro nos 75 anos de história da F1.

Numa conta curta e simples, basta um terceiro lugar para Lando Norris ser campeão, independente do que os demais fizerem. No entanto, vimos um Lando Norris inseguro na corrida catariana, ainda mais depois do erro estratégico crasso da McLaren. E se Lando pipocar na classificação próximo sábado? E se aparecer um Safety-Car? Apenas uma semana depois da desclassificação dupla em Las Vegas, a McLaren meteu os pés pelas mãos e vai para a última corrida do ano de forma frágil.

Para Oscar Piastri, só lhe restar repetir o final de semana catariano, onde o australiano foi o piloto mais rápido, mas acabou derrubado pela própria equipe. É vencer ou vencer para Piastri, para depois ver o que acontece ao seu redor.

Tudo isso faz com que Max Verstappen vá para a etapa final com a mente tranquila e leve, ao contrário dos seus rivais. Max ter chances reais de título já é impressionante, mas o neerlandês pode colocar seu nome ainda mais na história com um pentacampeonato contra todos os prognósticos. Se o lema for que ‘vença o melhor’, sabemos quem é o melhor piloto da F1 atual.

Abraços!

João Carlos Viana

JC Viana
JC Viana
Engenheiro Mecânico, vê corridas desde que se entende por gente. Escreve sobre F1 no tempo livre e torce pelo Ceará Sporting Club em tempo integral.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *