Sexo e aceleradores

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Homens verdadeiros só pensam em sexo; Corredores, em acelerar. Simbolicamente, comemoram seus feitos com jorros vigorosos de champagne.

Homens verdadeiros só pensam em sexo, na mesma medida em que Corredores só pensam em acelerar. Simbolicamente, comemoram seus feitos com jorros vigorosos de champagne.

Digo isso depois de relembrar em mais detalhes as circunstâncias do GP do Japão de 76, que definiu a sorte da temporada revivida por Rush. Segundo as melhores reconstituições do que ocorreu nas horas pré-largada, os pilotos, inclusive James Hunt, haviam concordado em abortar a corrida, dadas as condições de segurança da pista.

No entanto, os pilotos aceitaram as ponderações de Bernie Ecclestone, de que precisavam largar e cumprir algumas voltas, de forma a atender aos contratos com os organizadores e emissoras de TV. Bastou, porém, ouvirem o ronco dos motores e saírem para a pista para que quase todos esquecessem o trato e se engalfinhassem na disputa, exatamente como havia acontecido no GP da Espanha de 75.

Apenas Niki Lauda, Emerson Fittipaldi, Carlos Pace e Larry Perkins cumpriram o acordo no Japão. Lauda, tolamente, restou nos boxes, esperando que os outros pilotos cumprissem sua parte no trato. Nunca se queixou da traição dos seus companheiros.

Talvez entendesse, melhor do que ninguém, que corredores só pensam em acelerar.

Um fato e um mistério resgatados daqueles tempos distantes (eu estava diante da TV, esperando pela largada mas sucumbi ao sono…)

O fato: primeira opção da Ferrari para substituir Lauda foi Emerson. O brasileiro, comprometido com o projeto Copersucar, nem quis conversar. A segunda opção era Ronnie Peterson, então exilado na equipe March. O sueco topou e é marcado um teste para ele na pista privada da Ferrari. Lauda, em rápida recuperação, é informado do caso e decide reagir, talvez por considerar que Peterson era um companheiro de equipe demasiado temível (lembrem-se que eles haviam corrido juntos na March, em 72).

Lauda reclama não com Enzo Ferrari mas direto com Gianni Agnelli, dono da Fiat e da Ferrari. O teor da conversa entre eles nunca veio a público mas é grave o bastante para que Agnelli se disponha a ligar para Enzo e demove-lo da iniciativa. Deve ter sido uma conversa memorável dada a cabeça dura de Enzo. Não houve como avisar Peterson previamente, de forma que ele só ficou sabendo que o teste tinha ido para o espaço no momento em que desembarcou na Itália. Voltou pra casa jurando vingança contra Lauda. De fato, no Japão, ele é dos poucos que insiste em competir, mesmo sob aquelas condições terríveis.

O mistério: Alan Jones e Clay Regazzoni, afinal, facilitaram a ultrapassagem de Hunt na voltas finais do GP do Japão, dando a ele as posições de que precisava para chegar ao título de 76?

Para Mauro Forghieri, diretor técnico da Ferrari naquela altura, não há dúvidas de que Jones amoleceu para Hunt. Ele nada diz sobre Regazzoni mas é indiscutível que o suíço foi para o Japão totalmente desmotivado, já sabendo que não continuaria na equipe no ano seguinte, logo ele que sonhava substituir Lauda.

Corrida após corrida, vemos a excelência do trabalho de Sebastian Vettel, Adrian Newey e de toda a equipe RBR.

O GP de Cingapura talvez tenha sido o ápice dessa demonstração de superioridade e uma das facetas dela é a estratégia de pneus posta em prática por Vettel. Largando com os Pirelli super macios, ele foi capaz de percorrer 17 voltas, ante 14 e 10 de Alonso e Kimi, respectivamente. Nem o finlandês tendo optado pelo mesmo tipo de pneu no seu segundo stint (portanto com o carro já mais leve) conseguiu percorrer tantas voltas com um composto comprovadamente tão problemático.

E de novo na Coreia: Vettel conseguiu esticar bem o seu primeiro stint – 11 voltas –, principalmente quando comparado a Alonso e Hamilton, que chegaram a apenas 9 voltas. No segundo stint, com pneus médios, Vettel foi até a 31ª volta, feito só igualado por Romain Grosjean, e palmas para ele pois havia parado uma volta antes do alemão.

Aliás, corrida a corrida, crescem minhas simpatias por Grosjean.

Agora, uma demonstração de competência técnica da RBR.

Os Pirelli mudaram no GP da Alemanha, depois do vexame em Silverstone, certo? Suponho que tenha sido um grande desafio para as equipes se adaptarem ao novo tipo de pneu, os carros atuais sendo esses cristaizinhos delicados que são.

Pois, a partir da Alemanha, a RBR conseguiu ampliar sua vantagem no Mundial de Construtores sobre Ferrari e Mercedes. Apenas a Lotus conseguiu melhorar em relação ao período pré-Alemanha.

E explique essa: no domingo, o carro de Mark Webber era o mais rápido nas retas da Coreia, chegando a 320 km/h. Enquanto isso, Vettel mergulhava na mediocridade, sendo apenas o 13º mais rápido – 314 km/h.

As discussões decorrentes do vídeo que mostrava o motor de Vettel em Cingapura soando totalmente diferente do resto do grid evoluiram pouco na Coreia. Há a certeza de que não se tratava de nada ilegal, como disse em minha coluna Black Blocs, citando a revista AutoSprint.

O que surgiu de interessante é uma declaração de Hamilton: “a tração do carro de Vettel não era normal. Na saída das curvas, ele conseguia acelerar tudo antes dos outros pilotos, o que se podia ver pela câmera onboard. Desde 2008, com o fim do controle de tração, não consigo acelerar desse jeito”.

Especula-se que, de fato, o Renault que empurra Vettel tenha uma mapatura eletrônica diferente, que corta a ignição em alguns cilindros em determinadas circunstâncias, facilitando a tração do carro em curvas de baixa velocidade. Seja qual for essa mapatura, no momento as equipes rivais não a entendem e, muito menos, conseguem imita-la.

Até onde sei, a curva do Lago, em Interlagos, apresenta condições ideias para que o barulho estranho se repita. Espero estar lá para ouvir o Renault eu mesmo.

Um dos motivos alegados por Bernie Ecclestone & Cia para que países periféricos como Brasil, Índia, Bahrein etc. organizem GPs é torná-los mais conhecidos do mundo civilizado.

Queria aproveitar a oportunidade tornada possível pelo GP da Coreia para lembrar os amigos leitores que a menos de 400 km de Yeongam fica Pyongyang, capital da Coreia do Norte, a mais selvagem e desprezível ditadura neste planeta de expiação.

Os cidadãos daquele país não são mais do que escravos submetidos à terceira geração de donos de fazenda, que deles só tira o trabalho, sob as mais terríveis condições, dando em troca pouco mais do que violência e desprezo. A Coreia do Norte vive exclusivamente da exploração do trabalho dos seus cidadãos, da mesma forma que Cuba, como vimos nessa abjeta operação denominada Mais Médicos.

Eduardo Correa

Eduardo Correa
Eduardo Correa
Jornalista, autor do livro "Fórmula 1, Pela Glória e Pela Pátria", acompanha a categoria desde 1968

9 Comments

  1. Rodrigo disse:

    Eu só não duvido que esse molequinho mequetrefe esteja fazendo uso de um carro acertado só para ele. o regulamento técnico é dúbio e sempre deixa brechas para artimanhas, ainda mais de um gênio como newey.

  2. Lucas dos Santos disse:

    Ainda sobre o carro de Sebastian Vettel, alguém leu esta suposição de que o carro da Red Bull estaria utilizando um controle de tração através do KERS? http://www.jalopnik.com.br/red-bull-racing-pode-ter-criado-um-novo-sistema-hibrido-de-controle-de-tracao/

    O que acham disso?

  3. Muito pertinentes as observações sobre a Coreia do Norte, Edu. Realmente algo que deveria ter sido mais discutido.
    Em relação a Fuji 76, já li um depoimento do próprio Clay reclamando que após o abandono do Lauda a equipe ficou tão atônita, que praticamente o abandonou à própria sorte. Ele conta que poderia ter chegado à frente do Hunt sem maiores dificuldades, caso tivesse feito a troca de pneus na hora certa.
    Sempre achei esse episódio mais importante do que nos faz parecer a tradicional versão dos fatos.
    Abraço,

    • Fernando Marques disse:

      Tudo o que aconteceu em Fuji 76 está diretamente ligado a decisão do Lauda naquela corrida … e que o realmente poderia ter acontecido se ele não desistisse da corrida …

      Fernando Marques

    • Mário Salustiano disse:

      sobre a atuação de Regazoni em 76 a impressão que dá é que não apenas no Japão mas da Holanda em diante a Ferrari ficou tão perdida que não entregou mais um carro competitivo, diferente do que aconteceu até a Alemanha, acho que o Suiço poderia ter sido melhor utlizado pela equipe para neutralizar a arrancada de Hunt, mas isso é apenas achismo de minha parte nada que exista registrado que comprove

      abraços

  4. Eduardo Correa disse:

    A última frase da minha coluna está mal escrita e dá a impressão de que sou contra o Mais Médicos. Não sou. Sou contra a forma como os médicos cubanos vieram parar no Brasil.

    Eduardo Correa

    • Guilherme disse:

      Que pena, Edu. Estava em pé aplaudindo sua coluna, aliás, como sempre faço!!! Mas tive que parar depois deste seu comentário.
      Inteligente, crítico e astuto como você é, sugiro estudar um pouco mais sobre tudo o que está envolvido neste programa, também conhecido como Maus médicos…A parte que aparece na imprensa é bonita. o resto…

  5. Fernando MArques disse:

    Independentemente do passeio que o Vettel/RBR vão dar no Japão eu acho que vale a pena ficar acordado para ver a corrida em Suzuka … é uma pista que quase nada fica a dever a SPA …

    Fernando Marques
    Niterói

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