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Porque as nanicas merecem existir, sim.

Tenho apenas um metro e cinquenta e seis centímetros de altura. Segundo meu irmão, quem não chega a 1,60m não tem altura, tem horário. Nunca me incomodei com isso porque pertenço a uma família de baixinhos, em sua maioria, mas invoco com o termo “nanico”. Sua sonoridade remete ao sarro, à crítica, ao desprezo. Mas cristalizou-se para definir entidades sem expressão, que na maioria das vezes só estão em cena para cumprir tabela. Empresas nanicas, candidatos nanicos, equipes de Fórmula 1 nanicas.

O paralelo entre um candidato nanico em uma eleição e uma equipe nanica de Fórmula 1 é evidente: ambos parecem estar no jogo apenas para se locupletarem do dinheiro alheio. Chega a ser intrigante o que faz um candidato entrar em pleitos seguidos para prefeito, governador e até presidente sem jamais ultrapassar 1% da preferência do eleitor. Conhecendo um pouco mais do sistema eleitoral brasileiro, é fácil concluir que, em muitos casos, a participação do candidato é mera forma de arrecadar fundos. Transpor a situação para a Fórmula 1 não é algo ilegítimo.

O que fazem equipes minúsculas, sem chance alguma de vencer ou sequer de pontuar, arrastarem-se durante várias temporadas no grid? A resposta mais óbvia é a sanha de seus administradores por dinheiro. Como um Lawrence da Arábia após percorrer o deserto e se atirar sofregamente em um copo de limonada, muitos desses gestores agarram-se a qualquer fonte passível de jorrar dinheiro: patrocinadores, parceiros tecnológicos, pilotos. Sangram o que é possível no tempo que lhes é dado. O grande objetivo não é, contudo, contentar-se com esta colheita no varejo. O sonho (plano? golpe?) é esperar que alguma grande marca cresça os olhos para sua diminuta estrutura e lhe faça uma oferta, daquelas de ombrear-se com os delírios de Mark Zukerberg.

Esse tipo de plano de enriquecimento rápido passou a fazer mais sentido depois que Bernie Ecclestone trancou a Fórmula 1 e jogou a chave fora. Quer ter uma equipe de Fórmula 1? Entenda-se com as que aí estão. E, no passado não muito distante, deu certo para muitos. Eddie Jordan vendeu sua equipe, que estreou em 1991, para o russo Alex Shnaider, que a vendeu para o holandês Victor Muller, que a repassou para o indiano Vijay Mallya. De Jordan tornou-se Midland, que virou Spyker, que transmutou-se em Force India, que parece ser o balcão de negócios mais descarado da Fórmula 1 atual.

Mas há nanicas que se agigantaram com o tempo. Claro que soa exagero chamar a Stewart de nanica. Sir Jackie montou seu time no final dos anos 1990 praticamente como um banco de ensaios para a Ford, com quem já tinha longuíssima relação. A marca do oval escolheu a bandeira Jaguar para competir e, já neste século, repassou a equipe para o milionário austríaco que fez dela o fantasma rubro-taurino a ser batido.

Nestes quase trinta anos de Fórmula 1, vi muita cena inesquecível protagonizada por equipes pequenas. As pré-qualificações no início dos anos 1990 eram praticamente um campeonato à parte. Não deixava de ser risível assistir a meia dúzia de pilotos disputando para ver quem ficaria com a rabeira do grid. Mas era uma disputa, que diabos! Por essa mesma época, vi com estes olhos que a terra não há de comer (doem-nos, se ainda prestarem) ao triste espetáculo da equipe Andrea Moda tentando fazer um de seus carros andar em Interlagos. Era triste ver aquele carro remendado com fita tipo silver tape, mas tinha algo de quixotesco, de delirante, de suicida e, por que não dizer, de apaixonado. Não dava para olhar para aquele box, rascunho mal acabado da pobreza, e imaginar que alguém ali estava se locupletando de qualquer coisa que fosse.

Talvez fosse só minha ingenuidade de jornalista em início de carreira, realizando o sonho de cobrir uma corrida de Fórmula 1, mas de fato olhar aquela turma me fazia ter pena. Da mesma forma que olho certos candidatos nanicos e, por trás de seus cabelos tingidos e de suas plataformas de campanha esdrúxulas, só vejo fome de cifrões, naquela ocasião olhar para esses coitados é algo que se assemelha, hoje, a ver os candidatos do PSTU e do PCO competindo ano após ano. Talvez fosse só a minha inocência, mas esse tipo de espetáculo de amadorismo inexiste hoje na Fórmula 1. Por mais molambenta que seja uma equipe hoje, seu box é arrumadinho, a programação visual é bem cuidada, não tem nada de improvisado ou mal acabado ali.

Sejam golpistas ou idealistas, candidatos e equipes de Fórmula 1 nanicos existem porque têm o direito de existir. Os primeiros fazem parte da democracia; os outros, do sistema mercadológico parido por Bernie Ecclestone. Meus pilares democrático e inclusivo não me permitiriam negar-lhes a existência, mas a história me desperta. Ao longo de mais de seis décadas, as nanicas serviram para pouco mais além de enriquecer seus donos, ganhando no varejo ou colhidos por golpes de sorte no atacado, e povoar nossa memória com histórias bizarras, como a do silver tape.

Porta de entrada para futuros grandes pilotos? Poucos. Na década passada, Fernando Alonso alçou a fama após estrear pela Minardi (depois transformada em Toro Rosso). Ayrton Senna estreou pela Toleman, equipe pequena que, no entanto, havia marcado dez pontos no ano anterior, superando quatro adversários. Em geral, o caminho percorrido por um piloto a partir de uma equipe nanica é árduo, custa caro e raramente termina no estrelato. Vou torcer bastante para que a Marussia e Luiz Razia, juntos, queimem minha língua.

O regulamento mudou pouco do ano passado para este. A revolução deve acontecer só no ano que vem. Na base do “como está fica”, acho que os favoritos ao título em 2013 são os mesmos de 2012: Vettel, Alonso, Button e Raikkonen, não necessariamente nesta ordem. A McLaren terminou bem a temporada passada. Button agora tem a equipe praticamente só para ele. E é bom que se aproveite disso, porque levar couro de Checo Perez será o começo do fim para o inglês. E seria triste ver o campeão de 2009 peregrinando por equipes pequenas nos próximos anos. Além do que, Button não parece ter predileção por nanicas. Jessica, sua namorada modelo, tem 1,73 metro.

Humpf…

Alessandra Alves
Alessandra Alves
Editora da LetraDelta e comentarista na Rádio Bandeirantes desde 2008. Acompanha automobilismo desde 83, embalada pelo bi de Piquet e pelo título de Senna na F3.

5 Comments

  1. Lucas dos Santos disse:

    O que essas equipes nanicas fazem é desviar a atenção dos maus resultados das equipes “não-nanicas”.

    Por exemplo, em 2009, a STR era considerada “equipe de fim de grid”, ocupando a última posição do campeonato de construtores. Já em 2010, com a chegada das equipes nanicas, elas passaram a ser “equipes de fim de grid”. Mas quem foi que terminou o campeonato logo à frente das nanicas? A STR. Se as nanicas não existissem naquele ano, a STR seria mais uma vez a “equipe de fim de grid”.

    Em 2011 não foi diferente. Apesar da Williams ter ficado com a pior posição entre as “não-nanicas”, quem estava lá junto com ela na tabela de construtores? A STR. Em 2012, a mesma coisa. Lá estava a equipe italiana logo à frente das nanicas.

    O que eu quero dizer com isso? Que as equipes nanicas, indiretamente, acabam fazendo com que o mau resultado de uma equipe na temporada não fique tão evidente. Para todos os efeitos, a equipe terminou o campeonato e passando o tempo todo na frente de três das rivais e isso influencia bastante na imagem que a equipe passa para os patrocinadores e o público em geral.

    Em momento algum estou criticando ou “implicando” com a STR. Foi só um exemplo, para demonstrar como as equipes nanicas fazem as “não-nanicas” parecerem o que não são.

  2. Mauro Santana disse:

    Lembro do nanico Teo Fabi, era tão pequeno quanto o Prost.

    Abraço!

    Mauro Santana
    Curitiba-PR

  3. Ron Groo disse:

    Sem mais, expôs tudo que eu pensava sobre o assunto .
    Perfeito.

    Só uma coisa… A Jessica pode não ser nanica em altura, mas em peso… Seus quase 40 quilos não mentem.

  4. Fernando marques disse:

    Legal o texto … mas pensa bem … o que tem de mais na Formula 1 é nanico … creio que o unico não nanico é J. Button … os demais não passam dos 1,60m … mas como seus bolsos estão altos em volume de grana o que não falta é mulher para estes caras …


    Brincadeiras a parte a Formula 1 nos moldes atuais jamais permite que uma equipe pequena surja nocenario como uma equipe vencedora … me lembro da Shadow que sempre andou bem e conquistou vitorias … a Ligier idem … a Penske idem (alias que vitoria linda ela conseguiu na Austria debaixo de chuva com uma atuação impecável dop J. Watson … e que tal a Wolf que venceu na sua corrida de estreia com J. Schekter … estas equipes tiveram pequena duração de vida na Formula 1 … acho que em longetividade nada se comparou a Minardi … apesar de sempre ter alinhados os piores carros no grid de largada …

    Fernando Marques
    Niterói RJ

    • Lucas dos Santos disse:

      Hoje em dia tem vários pilotos “não-nanicos” na F1, além do Button.

      Petrov, Hulkenberg e Webber, por exemplo, não aparentam ter menos de 1,60m – aparentemente, pois, em uma pesquisa rápida, não fui capaz de encontrar informações sobre a altura dos pilotos.

      Deve ter mais, mas estes foram os primeiros nomes que me vieram à mente.

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