“A HORA DE PARAR”

POR ONDE ANDA… (De Alex Caffi a Maurício Gugelmin)
15/12/2003
POR ONDE ANDA… (de Mika Hakkinen a Karl Wendlinger)
17/12/2003

Luis Fernando Ramos

Um esportista enfrenta muitos momentos delicados ao longo da carreira. Derrotas, contusões e suspensões são momentos de intenso reflexo na moral do atleta. Mas nada é mais difícil do que decidir a hora de parar.

Alguns têm sorte. Gil de Ferran, por exemplo: ganhou as 500 Milhas de Indianápolis, foi pole e venceu no Texas, sua despedida das pistas. Deixou a sanguinária IRL por cima, com um vice-campeonato. E teria fatalmente levado o título não tivesse ficado de fora da corrida de Motegi, no início do ano, se recuperando de um acidente.

O lendário Juan Manuel Fangio é outro desta turma. Depois de conquistar o penta, sentou em uma Maserati cheia de problemas em 1958. Num teste, quando reclamou dos amortecedores, soube que estes teriam de ser mantidos por um acordo da marca com a equipe. Saiu do carro, pegou o boné e foi para Buenos Aires curtir a vida de mito.

Jackie Stewart também estava com a aposentadoria decidida, como tricampeão, mas teve uma despedida amarga com a morte do grande amigo e companheiro de equipe François Cevert. Encerrou consigo uma era de gentlemans na Fórmula 1.

Parar enquanto se está por cima é uma arte que poucos souberam fazer. Mas muitos acusados de não o conseguir fazê-lo são uns injustiçados. Nelson Piquet é um deles. Já vi muita gente dizer que “Schumacher aposentou Piquet”. Mentira das grossas.

O tricampeão se manteve na Fórmula 1 até se esgotar seu tesão pela coisa. Os anos de ostracismo na Lotus e de bonita perseverança na Benetton não tinham diminuído o prazer de competir. Foi sim o maltrato com o amigo Roberto Moreno que esgotou a paciência de Piquet.

Tivesse a Benetton, em vez de Schumacher, contratado o Mimo Schiatarella, Piquet teria andado três segundos na frente do italiano e teria se aposentado no final da temporada do mesmo jeito. A questão ali foi desejo de correr e não uma alma remoída com a velocidade do novato alemão – os dois até se davam bem.

E como diminuir alguém que correu até cansar?

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E o que dizer então de Carlos Sainz? Após a frustrante decisão do WRC deste ano, quando bateu no Rali da Grã-Bretanha após se desconcentrar com uma câmera instalada em seu carro que insistia em pegar fogo, “el Matador” anunciou que 2004 seria sua última temporada.

Não demorou nem um mês para voltar atrás. “Não sou político, então não tenho de cumprir minhas promessas! Ainda estou competitivo e correr ainda é minha grande paixão”, declarou o espanhol. Mais um que só tem compromisso com seus próprios desejos.

Sorte nossa!

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A maior pergunta sobre este assunto está na aposentadoria de Schumacher. Muitos apostam que um título mundial para Kimi ou Montoya representaria o fim da carreira do alemão. Parte da mídia aposta que a palavra final é da mulher Corinna – se ela mandar, ele pára.

Eu acho que Schumacher é da estirpe de Piquet e Sainz. Se em 2006 a Ferrari estiver meio capenga e ele tiver de suar para um mísero lugar no pódio, não haverá problemas porque ele ainda terá prazer em sentar no carro vermelho e acelerar. Uma questão de alma, de desejo, de prazer na profissão além dos resultados.

Se o Edu ou o Panda discordarem, já está valendo uma Warsteiner: Schumacher corre até 2006, mesmo que não ganhe mais nenhum título até lá! Apostado?

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Eu sei que deveria estar comentando sobre o assunto da semana: os testes de Nelsinho Piquet em Jerez. Mas, por princípios, me recuso a debater um assunto baseado apenas em tempos e número de voltas, sem a menor pista das condições encontradas pelo brasileiro e por seu adversário na briga pela vaga de piloto de testes na Williams, Nico Rosberg.

Vale, talvez enumerar apenas duas curiosas semelhanças entre os príncipes da nova geração. Fora o carro da Williams, Nelsinho e Nico só sentaram a bunda em carros preparados pelos pais. Uma prova inequívoca de que o sobrenome, aliado a um esquema bem pensado, ajuda. E muito.

Outro dado interessante. Estamos falando aqui de dois pilotos… alemães! Nico nasceu em 27 de junho de 85 em Wiesbaden. Nelsinho veio ao mundo pouco menos de um mês depois, em 25 de julho, na bela cidade de Heidelberg. Eu sei que não dá para questionar o fato de Nelsinho ser brasileiro, afinal passou a maior parte de sua vida e – o mais importante – iniciou-se no kartismo e no automobilismo por aqui.

Nico é um caso diferente. Nasceu e cresceu, na Alemanha, sempre correu por lá e – o pior de tudo – não fala uma frase completa em finlandês. Não é à toa que sua cotação entre a mídia e o público de seu país não seja exatamente alta.

Abraços e até a próxima,

Luis Fernando Ramos

GPTotal
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A nossa versão automobílistica do famoso "Carta ao Leitor"

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