Brincando de vencer

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No meio da corrida desse domingo em Spa, Max Verstappen teve algumas discussões com seu engenheiro de pista. Nada demais, mas a temperatura subiu algumas vezes nas conversações via rádio. Largando em sexto devido a uma punição por troca de câmbio, Max assumiu a ponta ainda antes da metade da corrida e imprimia um ritmo muito mais forte do seu companheiro de equipe Sergio Pérez. Meio que para acalmar os ânimos com seu engenheiro Gianpiero Lambiase, Max sugeriu uma terceira parada unicamente para ‘treinar pit-stops’. Em 2023, Max Verstappen brinca de massacrar seus adversários com uma facilidade desconcertante.

Em doze corridas realizadas até agora, a Red Bull simplesmente está invicta em 2023, aumentando o recorde quebrado semana passada na Hungria, que pertencia à McLaren de 1988. Mas se havia algum equilíbrio entre Senna e Prost, trinta e cinco anos depois Verstappen rouba a cena com dez das doze vitórias do time comandado por Christian Horner, sendo oito consecutivas.

A F1 já viu inúmeros domínios, principalmente nos últimos trinta anos, mas o que Max vem executando em 2023 já pode ser considerado o maior domínio por um piloto já visto pela F1, pois nada parece ser capaz de segurar Max ou até mesmo que o neerlandês diminua seu ímpeto.

O final de semana belga começou agitado nos bastidores da F1, com a demissão em massa da cúpula da Alpine, dispensando o chefe de equipe Otmar Szafnauer, o diretor esportivo Alan Pérmane e o executivo técnico Pat Fry, esse já tendo a Williams como destino. Tendo uma montadora tradicional como a Renault por trás, a grande realidade é que a Alpine não está conseguindo os resultados que dela se espera e os franceses parecem perdidos onde investir para dar um salto e voltar a brigar por vitórias, como em outras passagens dos franceses na F1.

Nessa semana surgiu a notícia de que a FIA pensa em equalizar os motores da F1 justamente por causa da Renault, que teria ficado bem para trás em termos de potência em comparação à Red Bull/Honda, Ferrari e Mercedes. Mais um exemplo da falta de gestão da Alpine e quem sofre são seus dois bons pilotos, que nesse domingo efetuaram belas ultrapassagens, mas Ocon e Gasly só comemoram poucos pontos.

Nesse momento, a única coisa que está funcionando bem na Alpine é a guilhotina…

A chuva caiu com força em Spa na sexta e no sábado e para quem acompanha as corridas na mítica pista belga, deve estar falando agora: e qual a novidade nisso? O problema é que a F1 se tornou refém das suas invencionices e isso acaba por atrapalhar a própria categoria. Pediu-se pneus mais largos para aumentar a aderência mecânica. Check! Pediram mais ultrapassagens e reviveram o efeito-solo para os pilotos poderem acompanharem mais de perto os carros à frente. Done! Porém, isso em circuito seco não tem maiores problemas, mas quando a pista molha…

É um Deus nos acuda para a F1, pois os pneus maiores e o assoalho sendo responsável pelo aumento de downforce incrementa também a quantidade de spray jogado pelos carros quando a pista está molhada, fazendo com que a visibilidade se tornar um problema bastante sério para os pilotos, ainda mais com a recente morte de Dilano Van’t Hoff na mesma pista de Spa poucas semanas antes. Outro vilão disso tudo são as dimensões dos carros atuais, que aumenta a chance de aquaplanagem.

Tudo isso faz com que a F1 passe vexames quando a pista molha um pouquinho a mais, como aconteceu em Spa várias vezes nesse final de semana. Antes da largada da Sprint uma tormenta passageira encharcou a pista de tal maneira que houve um atraso na largada. Por sinal, algo que já ocorreu até mesmo nos ‘bons tempos’. No entanto, fica constrangedor as várias voltas atrás do Safety-Car, esperando que a água espalhe um pouco mais para melhorar a visibilidade. No entanto, isso faz com que os pilotos busquem os pneus intermediários rapidamente, fazendo com que a própria Pirelli critique a situação. “Hoje, os pneus de chuva extrema só servem para ficar atrás do Safety-Car?”, argumentou Mario Isola.

Se antigamente os fãs da F1 clamavam por chuva para dar mais emoção às corridas, hoje rezam, numa adaptação da passagem de ‘Súplica cearense’, que chova, mas que chova de mansinho.

Se a chuva foi protagonista na sexta e no sábado, o céu não estava muito carrancudo na hora da largada nesse domingo, mesmo havendo uma expectativa de chuva. Sabedor do seu potencial, Max Verstappen só tinha um receio nesse domingo, que era a sempre apertada primeira curva de Spa. E realmente houveram problemas. Oscar Piastri, grande sensação da corrida Sprint no sábado, colocou seu McLaren por dentro da Ferrari de Carlos Sainz, mas provavelmente o espanhol não viu a McLaren no apertado hairpin La Source e houve o toque que acabou com a corrida de ambos. Piastri quase que imediatamente e Sainz, com a lateral bastante afetada, apenas mais tarde. Verstappen se afastou ao máximo do entrevero da primeira curva, mas já havia ganho duas posições de graça. Com Hamilton e Leclerc, Verstappen usou a força do seu Red Bull e uma zona de DRS longa demais para ultrapassar a Mercedes e a Ferrari com uma facilidade de cair o queixo. A diferença entre as velocidades máximas de Max e Lewis na reta Kemmel superou os 30 km/h quando Max abriu a asa.

Com Pérez a situação foi menos tranquila, mas nem de longe fez com que Max suasse seu macacão. Após a primeira parada de ambos, Max encostou no mexicano, usou o DRS na reta Kemmel e assumiu a liderança na volta 17 de 44 do Grande Prêmio da Bélgica. Ponto final? Ainda não, pois a chuva realmente caiu em Spa, mas foi tão leve que os pilotos que estavam entrando nos pits bem no momento do chuvisco nem arriscaram colocar pneus intermediários, mas Verstappen levou um baita susto quando pegou a zebra úmida na Eau Rouge e chegou a ficar ligeiramente de lado. Talvez esse momento tenha feito Max suar mais do que ultrapassar Pérez e abrir 22s sobre o mexicano. Quase 1s por volta. Tanta diferença que motivou Verstappen a brincar com sua equipe.

Já tendo vencido a Sprint Race com facilidade no sábado, Max só não levou os 100% dos pontos do final de semana porque Hamilton colocou pneus novos no fim para marcar a volta mais rápida e encostar de vez em Alonso na luta pelo terceiro lugar do campeonato, pois Sergio Pérez começa a desgarrar novamente na vice-liderança. Checo parece ter colocado na cabeça (ou o convenceram disso…) que lutar pelo título contra um Max Verstappen iluminado não passou de um devaneio de verão e tudo o que o mexicano precisa fazer é garantir o vice-campeonato e uma inédita dobradinha para a Red Bull no campeonato. Fazendo isso, Pérez garantirá seu lugar na equipe em 2024 e quem sabe em 2025.

Se perdeu Carlos Sainz praticamente na primeira curva, a Ferrari fez um bom serviço com Leclerc, lhe proporcionando uma corrida tranquila rumo ao possível terceiro lugar. Largando da pole, o monegasco arrancou bem, mas ainda na reta Kemmel foi superado por Pérez com incomplexidade. Charles sabia que sua corrida não era contra a Red Bull, mas contra a Mercedes de Hamilton, que se manteve sempre perto de Leclerc durante toda a corrida, mas sem ameaçar. Nos dois pit-stops de Lewis, a Ferrari não inventou a roda e trouxe Leclerc imediatamente aos pits e tudo ocorreu de forma tranquila para outro pódio para Leclerc no ano. Hamilton perdeu na sua luta direta com Leclerc e da mesma forma do que o ferrarista, teve uma corrida extremamente solitária, sem atacar muito e tendo Alonso bem atrás para se preocupar. Porém, Hamilton já enxerga o terceiro lugar no Mundial como um fato bastante possível, ficando apenas a um ponto de Alonso, que vê a Aston Martin engolida por Ferrari e Mercedes nesse momento.

Os pódios consecutivos de Fernando no começo do ano só duraram um terço do campeonato, mostrando à Aston Martin a diferença entre construir um bom carro e desenvolver um carro vencedor. Alonso segurou um quinto lugar muito pela escolha da McLaren em apostar na chuva que nunca veio nesse domingo. Piastri saiu na primeira volta e Norris sofreu com um carro com muito arrasto na reta, sendo alvo fácil durante as primeiras voltas, fazendo com que o inglês da McLaren chegasse a ocupar a última posição. Quando a corrida se assentou, Norris recuperou bastante posições e ainda garantiu um sétimo lugar, logo atrás do seu compatriota George Russell. O inglês da Mercedes foi atrapalhado por Piastri, que se arrastava com problemas em sua McLaren após o toque com Sainz, fazendo Russell cair para 11º na primeira volta. Com um bom ritmo, Russell galgou muitas posições, terminando a prova num bom sexto lugar, ajudando a Mercedes se garantir cada vez mais na segunda posição do Mundial de Construtores.

Pressionado pela presença de Daniel Ricciardo, Yuki Tsunoda fez sua melhor corrida no ano, acabando a corrida em décimo e marcando um pontinho importante. Stroll fez uma prova dentro das suas limitações e tomando 23s de Alonso, ainda terminou em nono, superado nas voltas finais por Esteban Ocon.

O pelotão intermediário teve muitas trocas de posição pelas várias táticas e acertos escolhidos pelas equipes, devido à previsão incerta do clima, mas também pela longa zona de DRS, com os pilotos usando o artefato por um longo tempo na reta Kemmel, deixando o piloto da frente ainda mais indefeso do que o normal. O DRS é outra invencione da F1 que de tão mal utilizada, acaba por ser um tiro no pé da categoria.

As vitórias de Verstappen estão acontecendo tão ao natural, que até mesmo suas corridas de recuperação não são nada emocionantes. Algumas pessoas se incomodaram com as falas de Toto Wolff, quando disse que ‘Verstappen parece correr com um F1, enquanto os demais guiam carros de F2’, mas o dirigente austríaco não está tão longe da realidade. Com performances de tirar o fôlego, Verstappen vai se colocando como um dos grandes da história da F1.

Correndo em sua segunda casa, na Bélgica, Max Verstappen mais do que pilotou um carro de F1 histórico. Ele se divertiu com ele!

Abraços!

João Carlos Viana

JC Viana
JC Viana
Engenheiro Mecânico, vê corridas desde que se entende por gente. Escreve sobre F1 no tempo livre e torce pelo Ceará Sporting Club em tempo integral.

1 Comments

  1. Fernando Marques disse:

    J. C. Viana

    antes da largada pensei … quantas voltas será necessário para Verstappen liderar a corrida, caso saia imune da largada? arrisquei 5 voltas. Errei, precisou de 17 voltas … mas creio que para permitir o Peres o gostinho de liderar uma corrida por mais tempo e melhorar a sua alto estima …
    Agora, tirando a Verstappen, até que a briga está equilibrada. No inicio foi a Austin Martin como segunda força, depois a Ferrari, Mercedes, quem sabe agora a Mercedes … sei lá a briga para ser vice campeão, ou campeão da categoria B na Formula 1 está em aberto … a não ser que a RBR dê um bólido pro Peres igual ao do Holandês …
    Com relação aos números do Vertappen, até 2025 muitos recordes serão batidos por ele e a RBR … já e tri campeão, vai ser tetra e penta com certeza … pelo que sei regulamento novo só em 2026 …

    Excelente sua análise sobre o GP da Belgca

    Mas nós brasileiros temos o que comemorar … Caio Collet na Formula 3 e Enzo Fittipaldi na Formula 2 fizeram o hino nacional ser tocado no sábado … algo que vem ficado cada vez mais raro no automobilismo mundial …

    Fernando Marques
    Niterói RJ

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