Ainda estou na dúvida em relação à veracidade de um e-mail que recebi em 1o de dezembro, depois da publicação da minha última coluna, onde apelava para que Bernie Ecclestone cedesse às grandes montadoras. Assinado apenas com um “B.E.”, o e-mail respondia às minhas indagações e provocações ao chefão da Fórmula 1. Seria apenas uma piada ou uma resposta do destinatário das minhas súplicas?
Na dúvida, decidi partilha-lo com os leitores e deixar que cada um tire as próprias conclusões.
Caro jornalista
Não seja tolo!
Você pede o impossível. Quer que eu abra mão de tudo o que conquistei e entregue a Fórmula 1 embalada em papel de presente para as montadoras que, em termos históricos, acabam de chegar? E você tem a coragem de me pedir isso logo depois do papelão da Ford, que virou as costas para a categoria sem qualquer aviso prévio, só porque vem acumulando prejuízos?
Pois vá sonhando – você e as montadoras. Não vou abrir mão de nada, não vou ceder nada, não vou dar nada a ninguém.
Você pode pensar que eu estou sendo ganancioso. Desculpe a franqueza, mas isso é típico de quem fica de fora, olhando pessoas que, como eu, transformam as coisas. Você acha mesmo que fiz tudo isso só pela grana? Acha que já não tenho o suficiente para eu, minhas filhas, netos, bisnetos e tataranetos? Acha que me abalo até cantos remotos do planeta como este horrível Interlagos só porque quero subir naquela ridícula lista dos mais ricos do mundo?
Será possível que você e os que me criticam não são capazes de ver que, no exato momento em que virar as costas, tudo o que a Fórmula 1 conquistou vai começar a ruir? Você não entende que só eu sou capaz de manter esta operação incrivelmente complexa funcionando bem e no horário? Que há literalmente milhares de detalhes a serem resolvidos, das acomodações dos convidados aos painéis de publicidade, dos controles de segurança às instalações para a imprensa (aliás, nunca lhe ocorreu reclamar do conforto que oferecemos para você e seus colegas trabalharem, não?).
Você reclama que faturo US$ 2 bilhões e fico com US$ 1,5 bilhão, deixando o resto para as equipes. Pois você sabe quanto elas ganhavam antes de eu organizar a Fórmula 1? Uns trocados dos donos dos autódromos. Estes US$ 2 bilhões não existiam antes que eu começasse a trabalhar neles. Se existem hoje foi porque eu corri atrás de cada dólar. Ensinei aos donos de autódromo o lugar deles, arranquei centavo por centavos das redes de TV, dos patrocinadores, dos fornecedores e dos licenciados que vendem estes cacarecos com marcas das equipes. E agora você quer que eu abra mão deste dinheiro e o entregue para as equipes?
Logo elas, que nunca tiveram que esquentar a cabeça porque sempre tiveram aminha cabeça para esquentar, inclusive quando o dinheiro acabava no meio da temporada e vinham chorar no meu ombro. Você tem idéia de quantas equipes ajudei? E não venha me dizer que elas estão gastando demais. Não sou quem as força a torrar milhões e milhões de dólares nos salário dos pilotos e engenheiros. Não sou eu quem as força a construir túneis de vento. Se querem torrar dinheiro como se ele desse em árvores, que o consiga por conta própria. Ocorre a você gastar R$ 1 milhão por mês no GPTotal e depois apelar para seu vizinho, querendo que ele pague as suas contas? Pois é exatamente isso que as montadoras estão querendo.
Mas deixe elas pensarem que estou encurralado. De noite, dou risada e lembro daquele pessoalzinho ridículo da Cart que, há uns dez anos, achou que podia comigo. Olha só ao que eles estão reduzidos hoje.
Fique você sabendo que tenho nas mãos os contratos com todas as grandes redes de TV e todos os autódromos mais importantes do mundo. As montadoras querem organizar um campeonato de Fórmula 1? Pois quero ver eles terem de se arranjar com o autódromo de Jacarepaguá ou, aqui na Inglaterra, com Donington, porque Interlagos e Silverstone, assim como Mônaco, Bahrein, Malásia etc. etc. estão na minha mão, com contratos bem amarrados por muitos anos ainda.
E quero ver quem vai transmitir as corridas porque as grandes emissoras do mundo, todas elas, também têm contrato assinado comigo.
Enquanto isso, o que as montadoras têm? Três equipes – Ferrari, McLaren e Renault –, um motor – o BMW (porque a Williams nunca disse que estava alinhada com as montadoras) – e um contrato com uma empresa que disse ser capaz de organizar o campeonato para eles ainda que nunca tenha feito nada parecido. Pois eu também sou capaz de construir um foguete e ir até a Lua.
E mais: estes bancos otários que hoje têm 75% da minha empresa podem sonhar que vão tomar a administração da Fórmula 1 das minhas mãos. Eles sabem que meu contrato com a Fia, que me deu a organização do campeonato por 100 anos, contém uma cláusula pela qual ela pode rompe-lo a qualquer momento caso o controle da minha empresa mude de mãos.
Os bancos, as montadoras, as equipes e você e seus amigos jornalistas pensam que são espertos. Pobres tolos! Acho que foi um compatriota seu quem disse: “vocês vão ter de me engolir”.
Pois é…
B.E.
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Não sei, sinceramente se o GPTotal está violando algum tipo de direito autoral ao disponibilizar as maravilhosas imagens do GP da França de 79. Se estamos, nossas sinceras desculpas; se não estamos, que grande bobeira a nossa de não ter disponibilizado o download antes!
O filme circula pela internet já há muitos anos, tendo ganhado uma versão mais caprichada. É esta a versão que vocês encontram em nossa home page.
O combate é empolgante não só pelas manobras mirabolantes de Gilles Villeneuve mas também pelo fato de terem sido feitas em um momento em que os carros estavam literalmente caindo aos pedaços, desgastados por 300 km de corrida (note que Villeneuve estava com problemas sérios de pneus, o que pode ser comprovado pela maneira como o seu Ferrari balança a traseira nas saídas de curvas, o motor V12 acelerado impiedosamente pelo canadense).
É uma batalha em quatro atos:
1o ato: Arnoux passa Villeneuve na Curva Villeroy, uma ultrapassagem sem maiores atrativos não fosse a férrea resistência do canadense, tentando manter-se por fora.
2o ato: o troco de Villeneuve na volta seguinte, na mesma curva, naquela que é, provavelmente, a mais bela travada de pneus da história. Notem que o canadense não entrou na reta colado em Arnoux, que o procura pelo retrovisor de forma desesperada. Teria Arnoux sido enganado por Villeneuve, que se escondeu atrás dele? Teria o francês achado que a distância que conquistara era o bastante para inibir uma tentativa de ultrapassagem, sentido-se dispensado de adotar uma trajetória defensiva?
3o ato: a revanche de Arnoux. Aqui, o notável é a força de Villeneuve mantendo-se por fora na Villeroy que, certamente, estava repleta de detritos. Há leis da física que foram flagrantemente violadas por Villeneuve nesta manobra, assim como em algumas seguintes. Creio que até mesmo Arnoux se assustou com a manobra e se sentiu inibido em ser mais agressivo na tomada da curva, como se pensasse: Villeneuve não vai conseguir segurar o carro e eu vou ganhar a posição sem risco nenhum.
4o ato: os dois saem da Villeroy desequilibrados, Villeneuve segurando o seu Ferrari de forma inexplicável por dentro da primeira da série de curvas intituladas Sablières, Arnoux saindo com as quatro rodas fora da pista. A tomada para a pequena reta que dá acesso à curva Parabólica decide a corrida. Ainda procurando o equilíbrio, Arnoux resiste como pode a uma ultrapassagem, empurrando Villeneuve para as bordas da pista. Mas o poder de recuperação do canadense é todo um compêndio de pilotagem: ele apruma o Ferrari, acelera fundo, pensa em passar Arnoux por fora mas nota que o francês, por qualquer motivo, vacila e erra feio na tomada da Parabólica. Assim, ele dirige o Ferrari por dentro e liquida a fatura. Uma possibilidade para o erro de Arnoux: os motores turbo, ainda em sua fase inicial de desenvolvimento, demoravam a responder à aceleração (era preciso, antes “encher” o turbo). Talvez Arnoux tenha deixado cair muito a rotação de seu motor em meio àquelas manobras loucas.
Nunca tive grandes simpatias pelo francês mas aprendi a admira-lo quando reclamou, anos atrás, que os pilotos contemporâneos não se emocionavam mais com a Fórmula 1. “No meu tempo”, disse ele, “quando os mecânicos apertavam o cinto, nossos corações disparavam pois sabíamos que o que iríamos fazer nos momentos seguintes era algo muito, muito especial”.
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Serei eu, oh Senhor, merecedor de todas as alegrias que o Santos F.C. reserva aos seus torcedores?
Boa semana a todos
Eduardo Correa |