Luis Fernando Ramos |
Qual a importância histórica da Hungria no automobilismo mundial? Aparentemente nenhuma. Há dezessete anos eles sediam uma corrida de Fórmula 1 num dos circuitos mais insossos do mundo e um local, Zsolt Baumgartner, testou uma Jordan num evento especial antes do GP do ano passado.
O que poucos se lembram é que o primeiro piloto a vencer um Grande Prêmio era húngaro. Em 1906, ao volante de um Renault AK com 90 cavalos de potência, Ferenc Szisz venceu o GP da França, a primeira competição do gênero na história. Num circuito de 103 quilômetros de extensão utilizando as estradas próximas da cidade de Le Mans, a prova foi disputada em dois dias, com seis voltas em cada um. Szisz venceu com um tempo total de 12 horas, 14 minutos e 7 segundos, uma média de 101,195 km/h.
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Mas quem vai à Budapeste assistir ao GP da Hungria tem muito mais o que fazer do que se preocupar com a história. O charme da cidade é magnético. Um dos pólos do antigo império austro-húngaro, Budapeste concentra diversas construções maravilhosas às margens do Danúbio. Um show para os olhos de qualquer romântico.
No fim de semana da corrida, a cidade pulsa a mil quilômetros por hora. Todos ali querem ganhar naqueles três dias o que mal fazem em seis meses. Nas apinhadas ruas do centro, turistas disputam espaço com uma horda de prostitutas. As mais sortudas conseguem um bom pagamento dormindo com os mecânicos (e, às vezes, com os pilotos) das equipes de Fórmula 1.
Hotéis, pensões ou casas de família triplicam o preço normal de suas diárias, que ainda assim se mantém equivalentes aos das principais capitais européias. Mas o pior são os motoristas de táxi. Dizem não saber falar inglês, fazem a viagem e cobram 5 mil e tantos Forints (o dinheiro de lá). O turista paga para depois, com mais calma, percebeu que o pequeno trajeto lhe custou o mesmo que uma noite num hotel de luxo.
E que o indignado viajante não resolva ir até a polícia, pois eles também estão ocupados aumentando seus rendimentos. Poucos turistas sabem, mas o nível de tolerância de álcool no trânsito é 0,0 – ou seja, é expressamente proibido beber e dirigir.
Um conhecido locutor esportivo de um certo país sul-americano caiu numa destas armadilhas. Depois de degustar uma ou duas taças de vinho num jantar com a esposa e o companheiro de trabalho, foi parado nas ruas por um policial. O servente da lei queria algo como 300 dólares para esquecer a pequena transgressão. O jornalista ficou exaltado, o que só piorou as coisas: foi colocado num carro de polícia e levado para a delegacia. Só foi solto após pagar uma soma maior que a originalmente solicitada. No dia seguinte, abriu a transmissão na tevê com um alerta contra as atuações da polícia húngara.
O curioso é que, por mais sacaneados que sejam, os turistas não hesitam em voltar ano após ano a Budapeste para ver a corrida. Não importa as armadilhas a que são submetidos, não importa a procissão de carros nos sempre chatos GPs da Hungria, eles querem estar lá. Por que a festa é divertida. Por que Budapeste tem algo de mágico. Vale a pena conferir!
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Neste ano teremos a estréia do “novo” autódromo de Hungaroring. O circuito ganhou duas novas curvas, bem no padrão atual estabelecido pelo alemão Hermann Tilke, o desenhista oficial da FIA: curvas de raio bem fechado, para ver se aumentam as probabilidades de ultrapassagem.
Sou do princípio que qualquer modificação em Hungaroring é sempre bemvinda. Mas me dói o coração em ver destruída a primeira curva do circuito após a reta dos boxes. Ali, a história nos trouxe duas ultrapassagens de arrepiar: uma de Nelson Piquet em 1986 e outra de Nigel Mansell em 89, ambas sobre Ayrton Senna.
As duas manobras foram lindas, em especial a de Piquet, uma derrapagem controlada de tirar o fôlego e descrita por Jackie Stewart como a mais bonita de todos os tempos. Concordo, Piquet também e talvez até mesmo Senna, que era um osso duro de roer e deve ter se admirado naquele momento com a perícia do rival.
Bons momentos, para ficarem gravados permanentemente na memória.
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Abraços e preparem um bom café para agüentar a corrida deste domingo,
Luis Fernando Ramos