Smooth Operator

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Alguns anos atrás, Carlos Sainz resolveu musicar suas conquistas na F1 com a clássica música Smooth Operator, da cantora nigeriana, mas de ascendência inglesa Sade. Além de mostrar um belo gosto musical, Carlos Sainz vinha reunindo outras qualidades dentro das pistas que resultaram em sua bela vitória nesse domingo na pista de Cingapura.

Não é muito segredo que a Ferrari escolheu Charles Leclerc como o líder da equipe nos próximos anos, mas se o monegasco pode ser até mesmo mais talentoso que Sainz, o espanhol tem algumas valências que fazem Carlos superar Leclerc em determinados momentos. Na pista travada de Cingapura e numa noite abafada, a velocidade não seria o principal fator para vencer a prova cingapuriana. Precisava usar a cabeça. E com uma visão de corrida privilegiada, Carlos Sainz venceu a prova na cidade-estado, quebrando a invencibilidade da Red Bull, que esteve irreconhecível nesse final de semana.

“Não há lugar para terminar, mas algum lugar para começar”

Com a chegada à Cingapura, a lembrança do que ocorreu quinze anos atrás vem à tona, principalmente com toda a celeuma que Felipe Massa vem causando com seu processo contra os envolvidos. Sinceramente, não darei muitas linhas para isso.

“Amor a venda”

Não é segredo que a Aston Martin vem perdendo bastante dinheiro com Lance Stroll. Com a evolução da Aston Martin, as deficiências do canadense ficaram ainda mais aparentes e ser o filho do dono é a ÚNICA razão do canadense permanecer na equipe ad eternum, mesmo que Lance não faça por onde ter o bom carro que tem em mãos. A questão que fica é que tendo somente Fernando Alonso marcando bons pontos, a Aston Martin começa a sofrer no Mundial de Construtores e se no começo do ano a equipe sonhou com a segunda colocação, agora amarga uma distante quarta posição, significando um baita prejuízo para a equipe no final do ano.

No sábado, Stroll estava em último e suas parciais indicavam que ele ficaria no Q1, que por si só já é um mico tremendo para Lance, mas não satisfeito por passar vergonha pela lentidão, Stroll destruiu seu carro num acidente fortíssimo na última curva, que o deixou de fora da corrida por conta de dores, além do carro estar sem conserto. Se a Aston Martin perderá milhões no final do ano com o possível quarto lugar no Mundial de Construtores, Lawrence perdeu mais alguns milhões pelo carro destruído pelo filho.

“Seus olhos são como de anjos, mas seu coração é frio”

Com a Red Bull sofrendo, as demais equipes aproveitaram a oportunidade desde sábado e Carlos Sainz confirmou a liderança nos TL2 e TL3, fazendo com que o espanhol comemorasse a segunda pole consecutiva. Isso seria essencial na corrida. Tendo superado Charles Leclerc, Sainz teria a prioridade na estratégia da Ferrari, que teria que funcionar muito bem para tentar mitigar o velho problema de desgaste de pneus dos italianos.

A corrida cingapuriana não foi das mais emocionantes no seu começo, apesar da transmissão insistir no contrário. A largada foi bem convencional, onde a única mudança importante foi Leclerc, montado com os pneus macios, pular melhor do que Russell e assumir a segunda posição, completando a dobradinha da Ferrari. Hamilton fez uma largada agressiva, quase bateu no seu companheiro de equipe Russell e para evitar isso, saiu da pista, retornando em terceiro, mas foi solicitado pela equipe a voltar à quinta posição original, mesmo que depois a direção de prova dissesse que Hamilton até pudesse ficar na frente de Norris. A partir de então, começou uma espécie de procissão para todos os pilotos fazerem os pneus funcionarem na corrida mais longa do calendário. Sabedora que é uma das equipes que mais magoam a borracha da Pirelli, a Ferrari tratou de estabelecer uma tática em torno da vitória. Mesmo sendo o queridinho do time, Leclerc ficou como o boi de piranha para fazer funcionar a estratégia de Sainz. Com a Mercedes tendo um melhor ritmo de corrida, a Ferrari sabia que um undercut era não apenas possível, como bem provável e por isso, fez com que Leclerc segurasse o pelotão o máximo possível, se tornando um escudeiro para Sainz. A tática nem sempre funcionou da melhor maneira, seja pelo pé pesado de Charles, como pela ótima visão de Sainz. Se acelerasse demais, Sainz poderia ter problemas de desgaste de pneus e por isso preferiu não forçar tanto, guardando seus pneus, enquanto Leclerc fazia o jogo sujo. Isso significava um pelotão compacto e os líderes andando até 10s mais lentos que os tempos conseguidos na classificação. A corrida estava morna, quando o horrível Logan Sargeant passou reto com seu Williams e mesmo não ficando parado no muro e tendo danos relativamente pequenos, a direção de prova resolveu colocar o Safety-Car na pista de forma bem discutível, lembrando aquelas bandeiras amarelas da Nascar ‘por detritos’. Que nada mais é do que uma tentativa artificial da Nascar em mexer na corrida. Tão americana quanto a Nascar, a Liberty traz algumas coisas que simplesmente não combinam com a F1, mas não se pode negar que essa manobra para lá de discutível da direção de prova modificou um pouco o andamento da corrida.

A Ferrari pretendia esticar o máximo do stint com pneus médios e ter uma boa margem para colocar os duros. O Safety-Car fez com que a Ferrari antecipasse os pit-stops e para piorar a situação, Leclerc teve que ficar parado mais tempo do que o normal por causa do tráfego dentro do pit-lane, fazendo com que Sainz perdesse seu escudeiro, tendo Russell em seu encalço. O SC também estragou bastante a estratégia da Red Bull. Mesmo Max Verstappen ganhando algumas posições no início de prova, o neerlandês entrou na pasmaceira do pelotão e preferiu ficar na oitava posição, atrás da briga entre Alonso e Ocon. Contudo, Max e Checo estavam calçados com pneus duros, o que indicava que fariam a tática inversa das outras equipes, ou seja, eles teriam pneus melhores nas fases derradeiras da corrida. No entanto, a dupla da Red Bull não parou no SC e mesmo pulando para segundo com a parada da maioria do grid, Max se tornou um alvo fácil com seu problemático (pelo menos em Cingapura) Red Bull, o mesmo acontecendo com Pérez um pouco mais atrás. Com ninguém mais parando até bandeirada e os dois pilotos da Red Bull tendo que parar obrigatoriamente, a estratégia da Red Bull parecia condenada, com Verstappen e Pérez caindo para as profundezas do pelotão. Enquanto isso, Sainz dava um show de controle de conservação de pneus, ao mesmo tempo em que não sofria maiores ataques de Russell. O próprio inglês parecia impaciente com a situação, onde via que tinha mais ritmo do que Sainz, mas era incapaz de ataca-lo. Com Sainz brincando com o seu ritmo, logo um longo pelotão se formou até o sexto colocado Leclerc.

Mais atrás, Ocon fazia uma ótima corrida bem no dia do seu aniversário, incluindo uma bela ultrapassagem em cima do seu desafeto Alonso. Porém, a corrida do francês terminou quando seu câmbio travou e Ocon deixou seu carro na saída dos boxes. Pela lógica, o Safety-Car entraria na pista, mas apenas o virtual deu as caras. Vai entender…

“Não há lugar para iniciantes ou corações sensíveis”

A Mercedes viu ali uma oportunidade para tentar algo diferente e sair daquele marasmo, chamando seus dois pilotos para colocar pneus médios novos para as últimas quinze voltas. Os pneus foram guardados especialmente para isso, algo que a Ferrari não tinha e por isso, mais uma vez, Leclerc foi o sacrificado, ficando na pista. Sainz e Norris também ficaram na pista, mas quando a bandeira verde apareceu novamente, o ritmo da dupla da Mercedes era simplesmente avassalador, tornando as voltas finais bem interessantes. Sainz tentou fugir, mas andando em média 2s mais rápido, Russell deixou rapidamente Leclerc para trás, trazendo consigo Hamilton, e nas voltas finais encostou no seu compatriota Norris. Mais uma vez Sainz usou a cabeça e diminuiu um pouco o ritmo para dar um pouco de DRS ao seu antigo companheiro de equipe, o que seria primordial nas animadas últimas voltas. A dupla da Mercedes realmente colou em Norris, mas usando o DRS, Lando segurou sua posição, contando com a decisiva ajuda de Sainz, que venceu pela segunda vez na carreira, quebrando uma sequência histórica da Red Bull. Na última volta, Norris deu uma raspada no muro, mas Russell emulou o compatriota com mais força e acabou no muro de proteção, entregando o lugar no pódio para Hamilton, que com o terceiro lugar assumiu o mesmo posto no campeonato, se aproveitando de uma corrida extremamente ruim de Alonso, que pisou na linha branca na entrada dos boxes, viu sua equipe se atrapalhar toda no momento de cumprir a punição e ainda rodou sozinho, fazendo com que Fernando cruzasse a linha em último entre os que receberam a bandeirada.

O SC virtual reascendeu a corrida da Red Bull, que por vias tortas viu sua estratégia original funcionar e Verstappen era o carro mais rápido das voltas finais, fazendo ultrapassagens em sequência e ainda chegar colado em Leclerc, salvando um quinto lugar no pior final de semana da Red Bull em muito tempo. Ainda assim Max aumentou sua vantagem no campeonato, contando com outra corrida ruim de Pérez, que a muito custo foi oitavo colocado em sua corrida 250 na F1, após se envolver num toque com Albon nas voltas finais. Pérez foi punido, mas manteve a posição. Se Ocon saiu da disputa, Gasly pelo menos se manteve vivo na disputa e terminou em sexto, marcando bons pontos para a Alpine. Após sair das últimas posições, Oscar Piastri fez uma prova correta e terminou num bom sétimo lugar, mas foi outro novato que chamou a atenção. Apenas em sua terceira corrida na F1, Liam Lawson fez uma prova madura e marcou seus primeiros pontos com um nono lugar, enquanto Tsunoda sofreu um toque com Pérez na primeira volta e abandonou. Pior que sequer poderá reclamar, pois Pérez é da equipe matriz, Tsunoda vê Lawson mostrar muito serviço e com Ricciardo praticamente confirmado para 2024, deverá sobrar para o japonês o olho da rua. Com um ritmo de corrida tão baixo, a Haas se aproveitou para beliscar um pontinho com Magnussen.

Assim como em 1988, a Ferrari protagonizou o fim de uma sequência histórica na F1. Foram quinze vitórias consecutivas da Red Bull, que não casou com a pista de Cingapura, mas outro fator que não podemos esquecer foi que nesse final de semana, a FIA baixou uma nova diretiva com relação à flexibilidade de asas e assoalhos dos carros. Se esse fator influenciou no final de semana pobre da Red Bull, os austríacos poderão ter sérios problemas até o final da temporada. Suzuka irá responder essa questão.

Num final de semana em que a Red Bull simplesmente não se encontrou, Carlos Sainz novamente pôde cantar ‘Smooth Operator’ e vencer mais uma vez, além de mostrar à Ferrari que ele pode ser bem mais do que um mero segundo piloto.

E como não poderia deixar de ser. Eis a bela canção:

 

Abraços!

João Carlos Viana

JC Viana
JC Viana
Engenheiro Mecânico, vê corridas desde que se entende por gente. Escreve sobre F1 no tempo livre e torce pelo Ceará Sporting Club em tempo integral.

1 Comments

  1. Fernando Marques disse:

    JC Viana,

    perfeito o seu relato da corrida … só acrescentaria duas coisas:
    – quando a Mercedes fez aquele pit stop duplo final, achei que o Hamilton estava mais rápido que o Russel … e penso que se fosse ele que tivesse atrás do Noris, teria alcançado a segunda posição.
    – Numa temporada bem morna e a Formula 1 com duas categorias, O GP de Cingapura foi bem divertida e vou ser sincero, gostei de ver o Verstappen comendo um pouco de poeira

    Fernando Marques
    Niterói RJ

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