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Infelizmente, Bahrein
20/04/2012
The Dark Side of the Moon
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Uma corrida legal, que nunca deveria ter acontecido.

Uma corrida legal, que nunca deveria ter acontecido. Falar do GP do Bahrein de 2012, desde já, significa abordar um assunto que deve ser dividido em questões internas e externas ao esporte. Obedecendo a finalidades propagandistas de um governo que sabidamente desrespeita direitos humanos e normas de representatividade, a corrida será lembrada ainda pelo ridículo boicote televisivo à equipe Force India, especialmente durante a classificação. Razões pelas quais eu e Lucas Giavoni optamos por focar nossa cobertura do GP no ultimavolta tão somente na transmissão dos resultados e na abordagem das implicações contextuais.

Aqui, no entanto, dedicarei algumas palavras à corrida.

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Desde os treinos de sexta-feira ficou bastante claro que Vettel voltava a se sentir à vontade com o Red Bull, e ambos formavam o conjunto mais forte na pista de Sakhir, quando todos estavam calçados com pneus médios. Nada, no entanto, indicava que a pole fosse possível, dado o aparente déficit dos rubrotaurinos em relação a McLarens e Mercedes nas simulações de classificação.

A pole de Vettel, portanto, valeu meia vitória, tanto por tê-lo posicionado em conformidade com seu ritmo potencial, quanto pelo grau de ousadia e dificuldade que envolveu. No duro, foi uma grande volta. Curiosamente, e por caminhos opostos, a classificação também acabou por lançar as bases para a grande corrida de Kimi Räikkönen, na medida em que ele foi chutado da Q3 nos instantes finais por seu próprio companheiro de equipe. Deste modo, Kimi acabou levando para a corrida ao menos um jogo a mais de pneus novos, da mesma forma como fizeram Paul di Resta e Fernando Alonso.

No confronto direto com Romain Grosjean – que finalmente mostra na F1 a velocidade que sempre teve –, o jogo extra de pneus acabou sendo um fator de decisão em favor do finlandês.

Aliás, que corrida fez o Kimi. Considere que ele brigou duramente por posições com Felipe Massa no início da corrida, e que superou na pista a maioria dos pilotos que o separavam da liderança, além de ter caçado e alcançado a Red Bull do bicampeão mundial. A rigor, por pouco Räikkönen não assumiu a ponta durante a volta 36, antes de seus pneus começarem a perder rendimento. Foi, com certeza, o tipo de atuação que se espera de um time que investiu em sua dupla de pilotos, optando por pagar salários em meio à enorme oferta de bons corredores pagantes.

E aqui cabe uma confissão. Vendo o potencial dessa safra de competidores, não consigo evitar uma ponta de tristeza pela ausência do grande Robert Kubica. O polonês merecia sorte melhor, da mesma forma como a atual geração merecia se medir contra alguém de sua qualidade.

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Quatro corridas disputadas, quatro vencedores diferentes. Sem considerar as provas em Indianápolis nos anos 50, esta é uma situação com apenas 10 precedentes em toda a história do campeonato mundial – e apenas um caso (2003) nos últimos 29 anos. O recorde absoluto, de cinco vencedores diferentes nas cinco provas iniciais de uma temporada, pertence aos anos de 1967, 1975 e 1983.

Mais importante que as estatísticas, no entanto, é notar que efetivamente a hierarquia entre equipes e conjuntos vem mudando corrida a corrida. Uma situação bastante atípica, principalmente quando lembramos que a temporada começa com corridas distantes das fábricas, para as quais os times não mandam muitas atualizações. Daí levantamos duas hipóteses: ou os carros atuais nasceram com características bastante diferentes uns dos outros, e aí cada um se adapta melhor a uma determinada pista; ou a evolução de setup obtida através do melhor conhecimento dos respectivos carros tem sido bem maior do que em anos anteriores.

Num cenário ou noutro, fato é que os desempenhos até aqui estiveram muito mais próximos, ficando o ordenamento em cada etapa sujeito a pequenas nuances ocasionais. Prova disso é que Mark Webber aparece em 3º na tabela de pontos, bastante próximo da liderança, sem em nenhum momento ter subido ao pódio na atual temporada.

Jenson Button, por outro lado, parece formar com a McLaren o conjunto mais forte deste princípio de ano, apesar de estar atrás de Webber na classificação. Vencedor na Austrália, Button estava à frente do companheiro Hamilton quando se chocou contra Karthikeyan na Malásia, foi impedido de lutar pela vitória na China por conta de um pit stop problemático, e abandonou no Bahrein quando mais uma vez respondia pela melhor McLaren em pista. Não fosse pelos problemas enfrentados, desfrutaria de uma liderança razoavelmente folgada no mundial de pilotos.

Quanto aos brasileiros, Bruno Senna teve um fim de semana difícil no deserto, complicado ainda mais por este contrato que o impede de ir à pista na primeira sessão livre de sexta-feira. Ainda assim, Bruno volta para a Europa com a tranqüilidade de ter respondido a principal questão que se levantava a seu respeito: se teria ele condições de manter um bom ritmo ao longo dos 300km de um GP. As boas atuações na Malásia e na China tiraram a pressão dos ombros, e o carro também está ajudando.

Felipe Massa, por sua vez, sempre andou bem em Sakhir, e em 2012 voltou a fazê-lo. Manteve o ritmo de Alonso durante toda a corrida, apesar de novamente ter sido muito mais lento na classificação. Ainda assim, um fim de semana para se construir em cima e tentar buscar alguma dose de confiança, interna e externa. Seu destino talvez já esteja selado, mas o que está em jogo aqui é algo mais profundo. A questão com Felipe é recuperar a autoestima, e todos torcemos para que ele volte a ter prazer no que faz.

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Essa torcida, no entanto, não passa por parcialidades ou factóides. Dizer que sua corrida foi melhor que a de Alonso seria fechar os olhos para o que realmente importa, que é a totalidade do fim de semana. Ora, se o espanhol esteve sempre à frente, então é óbvio que teve um fim de semana melhor. Felipe, no máximo, ultrapassou os carros que Alonso já tinha deixado para trás durante a formação do grid.

Não costumo entrar nessa seara, mas desta vez a transmissão da Rede Globo foi qualquer coisa de lamentável. Ignorando sempre que possível os problemas contextuais, diminuindo-os quando a citação se fazia inevitável, e sendo comandada por um Galvão Bueno arrogante e incompetente, a Vênus Platinada fez sua parte para que nosso áudio estivesse em sintonia com os problemas do vídeo e da organização.

Tudo bem que Galvão troque o número de vitórias obtidas por Carlos Reutemann – embora ele seja muito bem pago para fazer sua reciclagem. No entanto, a forma constrangedora como tolheu a Reginaldo Leme e Luciano Burti – ambos muito mais lúcidos e úteis – combinou perfeitamente com a atuação descartável da Mariana Becker.

Há quem diga que não seria ético criticar companheiros de profissão, e eu entendo isso. No entanto, aqui estamos falando da imprensa, que luta por sua liberdade irrestrita de expressão, e que se sente bastante à vontade para criticar e denunciar tudo que não pareça certo além dos limites das redações. Ora, liberdade de imprensa significa, antes de tudo, poder questionar a própria imprensa. E eu me envergonho pelo papel desempenhado pela equipe da Globo em relação ao GP do Bahrein.

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Em relação às imagens, repercutiu muito mal o boicote da geração à equipe Force India, especialmente durante a classificação. Tudo porque o time havia optado por voltar ao hotel mais cedo na sexta-feira, abrindo mão da participação no 2º treino livre, após parte de seu staff ter sido ameaçado em meio a um protesto contra a realização do GP.

Durante a corrida as câmeras buscaram Paul di Resta logo nos instantes iniciais, de forma a tentar calar os protestos da imprensa internacional. No entanto, nos 2/3 finais do GP, a ótima corrida do escocês – 6º colocado e único piloto a fazer apenas duas paradas – mal apareceu na telinha.

Foi uma grande atuação de piloto e equipe, fazendo funcionar uma estratégia baseada em acerto e compromisso, apesar do menor tempo em pista que tiveram. Fica aqui o devido destaque ao feito.

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Quanto ao aspecto esportivo, duas considerações.

Julgamentos de punições após a prova são bons por um lado, pois têm a propriedade de tornar reversíveis eventuais estragos em casos de injustiça. No entanto, pelo mesmo motivo, eles admitem protestos e recursos, transformando em disputa algo que, na maioria das vezes, poderia ter se encerrado no momento. Assim, este tipo de procedimento só seria recomendável quando restassem dúvidas sérias a respeito de atitudes em pista. Não creio que tenha sido o caso em relação às defesas de posição por parte de Nico Rosberg.

Por sua vez, é ridículo ver equipes e pilotos simulando panes nas voltas derradeiras, quando se encontram fora da zona de pontuação. Sintomas de um regulamento artificial, que gera desconforto ao zombar da inteligência de quem acompanha o que restou do esporte.

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Na semana em que foi decretado o fim da F-Futuro, Luiz Razia e Felipe Nasr voltaram a demonstrar excelente desempenho na GP2. Ao que parece, apesar de todo o descaso nacional em relação às categorias de base, o Brasil continuará com bons representantes na F1 ainda por mais alguns anos.

Em parte, claro, fico feliz que seja assim. No entanto, não deixo de lamentar que esse fluxo quase inexplicável de talentos continue a mascarar a falência de nosso automobilismo de monopostos, passando por CBA, imprensa esportiva e interesses, tanto empresariais quanto de público.

É sempre uma pena quando não podemos falar apenas de corridas, afinal.

Abraço a todos, e uma ótima semana.

Márcio Madeira
Márcio Madeira
Jornalista, nasceu no exato momento em que Nelson Piquet entrava pela primeira vez em um F-1. Sempre foi um apaixonado por carros e corridas.

12 Comments

  1. bruno wenson disse:

    Sobre o que escreveste “Tudo bem que Galvão troque o número de vitórias obtidas por Carlos Reutemann – embora ele seja muito bem pago para fazer sua reciclagem. No entanto, a forma constrangedora como tolheu a Reginaldo Leme e Luciano Burti – ambos muito mais lúcidos e úteis – combinou perfeitamente com a atuação descartável da Mariana Becker.”
    Não lembro de frase mais perfeita para dizer o que quem acompanha a fundo a F1 pensa.
    GAlvão não acrescenta nada ao conhecimento ou ao entusiasmo do espectador que assiste a corrida querendo conhecer e aprender. Assistir pelo canal pago é perder Reginaldo e Burti, que são excelentes. É dolorido isso. Esperemos 2017, e vejamos quem irá substituí-lo.

    • Fernando Marques disse:

      Piquet uma vez disse que até gosta do Galvão mas não compreende o fato dele querer descobrir o que se passa na cabeça dos pilotos … Galvão dizia que Piquet dormia antes da largada numa forma de se concentrar … depois Piquet disse que dormia por que estava com sono mesmo … hehehehe

      Fernando MArques
      Niterói RJ

  2. Eduardo Trevisan disse:

    Marcio, seu comentário sobre o massa (nos comentários, respondendo ao Flaviz) foi o melhor e mais lúcido que vi a respeito.

    Concordo e fiquei feliz em saber que alguém mais pensa assim.

  3. Fernando Marques disse:

    Realmente chama a atenção a s mudanças de hieraquias a cada corrida … alguem arrisca um palpite para a proxima corrida?

    Fernando Marques
    Niterói RJ

  4. Flaviz disse:

    Marcio,
    Acredito que o Massa salvou um Match Point, e só! Nada mais que obrigação.

    • Salve Flaviz!
      Rapaz, eu não me aprofundei muito na questão do Massa porque penso que ela seja complexa o bastante para merecer uma coluna exclusiva, e mesmo assim deixaria alguns pontos em aberto.
      Mas minha inibição maior em criticá-lo não se deve ao nacionalismo, e sim porque não consigo deixar de relacionar seu desempenho constrangedor às sequelas de seu acidente em 2009.
      Acredito de verdade que existam outros fatores como a superioridade de Alonso, a ordem de equipe na Alemanha em 2010, a má adaptação aos pneus e ao atual regulamento esportivo, além de uma profunda crise de confiança. No entanto, o Massa de 2007 a 2009 era um piloto muito rápido e brigador, que nada tem a ver com o atual.
      E pensar que a origem dessa variação reside naquela mola que quase ceifou sua vida, me faz sempre maneirar nas críticas.
      Aquele abraço, e uma ótima semana.

    • Roberto Andrade disse:

      Marcio, pode-se – em grau menor, claro – dizer o mesmo de Barrichello sobre San Marino-94?

    • Allan disse:

      Márcio, lembre-se que muitos pilotos sofreram – e ainda sofrem – com os pneus atuais, pois simplesmente não conseguem moderar o pé direito (e esquerdo, já que a agressividade na frenagem também auxilia no desgaste). Vejo claramente Hamilton, Massa e Schumacher com esses problemas. Talvez Webber também.

    • Boa pergunta, Roberto. Resposta difícil.
      Acho que a gente precisa dividir a coisa aqui em complicações físicas e psicológicas. Se a gente pensar na batida do Piquet em 87, por exemplo, ou no choque do Massa contra a mola, em nenhum dos casos a origem dos problemas teve relação com excesso de velocidade. Tanto Nelson quanto Felipe tiveram prejuízos físicos, que efetivamente os tornaram mais lentos (e isso pode até evoluir com o tempo para alguma complicação psicológica, como certamente já ocorreu com Massa), mas nenhum deles teve motivos para acreditar que deveria ter mais cuidado ao pilotar. Eles não se sentiram “culpados”, por assim dizer.
      Já a batida de Rubinho em Imola só aconteceu porque ele vinha numa volta para lá de arrojada, guiando até mesmo acima dos limites.
      Recentemente ele já falou sobre o assunto chamando a si mesmo de “idiota”, dando a entender que na época arriscava demais. Assim, podemos concluir que sim, aquela pancada lançou uma sombra sobre o desenrolar de sua carreira.
      Agora, daí a dizer que Rubens se tornou mais lento por conta de alguma sequela física, ou se simplesmente reavaliou sua forma de pilotar ao sentir que a empolgação podia machucar, é algo que talvez ninguém possa dizer com certeza.
      Abraço, e escreva sempre.

    • Pois é Allan, esse é um fator muito importante sim, como defendi em minha coluna “Revisitando 2007”. Inclusive, acho que muitos dos problemas enfrentados por Alonso naquele ano se devem justamente ao fato de Hamilton ter a seu dispor todos os pneus de que precisasse para despejar toda sua velocidade.
      Schumacher – outro que sempre viu o próprio desempenho despencar quando precisava poupar pneus – apontou a metralhadora para a Pirelli, dizendo que atualmente os pilotos guiam como se estivessem sob a tutela do safety car, de tanto que tiram o pé para pouparem os pneus.
      Não tenho dúvidas de que esse fator tem afetado a competitividade do Felipe, embora seja difícil apontar em qual medida.
      Abraço, e obrigado pela colaboração.

    • Fernando Marques disse:

      Esta historia de pneus pode ser uma boa desculpa … principalmente para o momento atual do MAssa …

      Fernando MArques
      Niterói – RJ

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