TIRO PELA CULATRA

Os treinos da Austrália
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NÃO AQUI, MAS NA CHINA
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Responda, caro leitor: não é gostoso imaginar cartolas vaidosos e metidos a gênios verem suas idéias idiotas dando com os burros n’água? Pois é assim que me sinto ao analisar os três dias de pista do GP da Austrália.

Mudaram o regulamento de merda (para pior), criaram a regra de um único motor por final de semana, baixaram leis proibindo pilotos de observar os carros dos concorrentes (!!!)… Só não fazem aquilo que realmente deveria ser feito: diminuir as barreiras à entrada de novas equipes, liberando-as da obrigação de construir seus próprios chassis e do pagamento de caução de “módicos” US$ 48 milhões, a serem devolvidos em suaves prestações se não aparecer antes um oficial de justiça na porta, segurando um pedido de falência.

Desde o final de 2002 estamos vendo a Fórmula 1 ser transformada em um amontoado de regras esdrúxulas, única e exclusivamente porque os dirigentes querem de alguma maneira “equilibrar a competição” e “melhorar o espetáculo”. Não conseguiram nem uma coisa nem outra. Pelo que vimos na Austrália, vamos ver em 2004 mais um passeio da Ferrari e, quem sabe, o heptacampeonato de Michael Schumacher. Só tenho medo do que ainda pode ser inventado pelo sr. Max Mosley, presidente da FIA e pai (ou no mínimo patrono) do sistema de classificação com apenas uma volta, do sistema de pontuação que diminuiu a importância das vitórias e desse regulamentozinho que a F 1 tem hoje.

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As especulações de pré-temporada apontavam para um ano de muito equilíbrio, com Williams e McLaren em posição de combate para tirar o título da Ferrari, o “carro-onda” da Renault chegando cada vez mais perto e a BAR evoluindo muito, quem sabe beliscando alguns pódios. Apostava-se na “lâmina de barbear”, apelido que o novo Williams FW 26 ganhou devido ao formato do bico. Falava-se muito do carro da McLaren, descendente direto de um modelo que nem chegou a correr por pura falta de confiabilidade, mas que tinha idéias revolucionárias e estaria com todos os problemas resolvidos. Por último, esperava-se que seria a hora de a Ferrari iniciar sua queda, depois de tanto tempo no topo. E havia uma especulação, na verdade fruto de meras esperanças, de que Michael Schumacher já não estaria tão motivado depois de conquistar seis títulos mundiais e ter completado 35 anos de idade. Lembram disso tudo?

Aí, veio um “festival de recordes”. Não passava dia em que uma das equipes citadas deixasse de ser notícia ao bater o recorde de alguma pista. Muitos já apostavam em cinco equipes disputando vitórias renhidamente durante o ano. A regra de um único motor por final de semana traria algumas surpresas. E declarações mais pessimistas, como as dos pilotos da McLaren, foram encaradas por alguns como tentativa de despistar os adversários.

Quando chegou a hora da verdade, descobriu-se que mais uma vez os tempos detestes serviram apenas para encher de notícias vazias as páginas de papel, as ondas de rádio e as telas de TV e computador. A Ferrari mostrou na Austrália que quem quiser desafiá-la vai precisar trabalhar muito. Montoya, 5º colocado, só não levou uma volta de Schumacher porque o alemão preferiu diminuir o andamento nas últimas três ou quatro voltas e garantir a vitória. O sexto colocado, Jenson Button, já havia sido ultrapassado e voltou a ficar na mesma volta do vencedor. Schumacher fez a pole position, liderou de ponta a ponta e fez a volta mais rápida. Barrichello largou em 2º, ocupou essa posição durante todas as voltas e ali terminou, tendo feito a segunda volta mais rápida da corrida. E as melhores voltas de Schumacher e Barrichello foram quase 1 segundo mais rápida que a de Fernando Alonso, autor da terceira melhor volta. Isso diz tudo sobre o GP da Austrália, e creio que dá o tom exato do que muito provavelmente veremos nas demais 17 corridas do ano.

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Nos tempos em que a F 1 tinha um sistema decente de definição do grid de largada (isto é, os pilotos faziam tantas voltas rápidas quantas fossem possíveis), havia uma regra muito simples: em caso de empate, a melhor posição de largada ficava com o piloto que havia obtido o tempo antes.

Só que, com o sistema classificação que passou a valer em 2003, em que cada piloto tem somente uma volta para marcar tempo, essa regra gerou uma distorção: como a ordem de entrada na pista é inversa à do treino anterior, o piloto que entra na pista depois (ou seja, o mais rápido na volta que define a ordem de entrada na pista) acabava prejudicado. Isso aconteceu no ano passado com Rubens Barrichello, que em algum GP empatou com Montoya e largou atrás do colombiano, depois de ter sido mais rápido que ele no primeiro treino.

Este ano, a FIA corrigiu a metadistorção e determinou que em caso de empate no treino classificatório a melhor posição de largada fica com o piloto mais rápido na volta de definição da ordem de entrada. Foi por isso que Montoya largou à frente de Button em Melbourne. Na verdade, é apenas um leve borrifo de perfume no regulamento de… bom, vocês já sabem de quê.

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Eu pretendia comentar o GP da Austrália, mas a corrida foi tão chata e sem graça (a não ser por manifestações isoladas de agressividade, como nos embates Fisichella/Heidfeld, Montoya/Trulli e Montoya/Button) que creio ser mais apropriado analisar as perspectivas de cada equipe, a partir do que foi visto na telinha e ainda sem acesso a maiores informações de bastidores:

Ferrari – A Williams fez o “aparelho de barbear”, mas quem fez barba, cabelo e bigode foi a Ferrari. A equipe italiana larga disparada como favorita ao título. As performances de Schumacher não são novidade para mais ninguém, mas vale a pena notar que os melhores tempos de Barrichello ficaram sempre muito próximos dos de Schumacher.

Williams – Preocupante. Com Montoya, o carro mostrou-se capaz de acompanhar a Ferrari… durante uma volta rápida. Na corrida, faltou pouco para Ralf tomar uma volta do irmão – com Montoya, isso só não aconteceu porque Schumacher M. diminuiu seu andamento em três ou quatro segundos nas voltas finais.

McLaren – Entre as grandes equipes, protagonizou o maior fiasco de Melbourne. O novo MP4/19 é lento e as queixas dos pilotos quanto à falta de potência do motor e à confiabilidade não eram conversa para despistar os adversários, como chegou a ser dito.

Renault – Entre as grandes, foi a que teve desempenho mais digno, graças principalmente ao talento de Alonso. Se Williams e McLaren não melhorarem muito, o espanhol deverá ser o terceiro colocado no campeonato e o maior candidato a vencer corridas quando as Ferrari não estiverem na pista.

BAR – Confirmou sua evolução e mostrou que os bons testes não eram fruto de carros fora do regulamento. Pode até beliscar um pódio, mas brigar por vitórias ainda é uma perspectiva distante.

Sauber – O de sempre, ou seja, o meio do pelotão é seu lugar. Fisichella mostrou a agressividade habitual. Massa teve um bom momento na disputa com Raikkonen, mas depois errou duas vezes.

Jaguar – Como em vários GPs de 2003, teve seu momento de glória nos treinos e não fez nada na corrida. Vai ter mais um ano difícil.

Toyota – Junto com a McLaren, o maior fiasco de Melbourne. Os carros foram lentos o tempo todo. Panis e da Matta vão ter um ano bem mais difícil do que imaginavam.

Jordan – Vai aparecer muito durante o ano graças às brincadeiras e inscrições que Eddie Jordan vai colocar nas carenagens a cada GP. Nada mais.

Minardi – Nem dá para levar a sério.

Por enquanto é isso. São três e meia da manhã e vou para a cama. Boa noite e abraços a todos. (LAP)

GPTotal
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A nossa versão automobílistica do famoso "Carta ao Leitor"

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