UM SHOW NA CHUVA

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Edu,

Como o tempo passa… Hoje está fazendo 18 anos daquele histórico GP de Mônaco sob chuva em que Ayrton Senna deu um show na pista molhada. O brasileiro, disputando seu 6º GP de F 1 pilotando um modesto Toleman-Hart, alinhou em 13º no grid, pulou para 9º na largada, ultrapassou vários concorrentes e ganhou posições com os abandonos de outros, até chegar ao 2º lugar, atrás de Alain Prost. Foi diminuindo a diferença rapidamente, às vezes sete segundos em uma única volta. Quando ia ultrapassar Prost… a prova foi paralisada (oficialmente por falta de segurança) após serem completadas 31 das 78 voltas previstas.

Até hoje discute-se se houve manipulação de resultados ou não na decisão de paralisar aquela corrida. Prost corria pela poderosa McLaren, que estava prestes a ser derrotada por uma equipe de meio de pelotão. Haveria ainda a pressão de dar a vitória a um piloto francês no principado de Mônaco. E o fator decisivo para alimentar as teorias conspiratórias: o diretor de prova em Mônaco, desde alguns anos antes, era o piloto belga Jacky Ickx, que nessa mesma época disputava o Campeonato Mundial de Esporte-Protótipos pela equipe oficial da Porsche – justamente a fornecedora de motores da McLaren naquela época…

O show de trapalhadas foi tão grande que a corrida foi interrompida mostrando-se na linha de chegada, ao mesmo tempo, a bandeira quadriculada e a bandeira vermelha. Prost, avisado da interrupção e provavelmente imaginando que a corrida poderia ser reiniciada, parou quase como se estivesse encostando no grid – portanto, um pouco antes da linha de chegada. Se fosse considerada apenas a bandeira quadriculada, Senna seria considerado vencedor, já que ele passou normalmente pela linha de chegada. Mas o regulamento era claro: em qualquer caso de interrupção prematura, o que vale é a classificação da volta anterior à última percorrida (depois, se não me engano, passou a ser a de duas voltas antes). E, naquela volta, Prost estava na frente. Também de acordo com o regulamento, os pilotos e equipes receberam seus pontos pela metade, já que não haviam sido cumpridos 75% da distância prevista.

Tudo isso incendiou a imaginação de todos. Na época, eu tinha 16 anos e, como muitos, achei que tinha havido uma “armação” para dar a vitória a Prost. Se foi isso ou não, dificilmente saberemos. O fato é que depois aconteceu, no mínimo, uma ironia do destino. A vitória “pela metade” valeu 4,5 pontos ao francês, que no final do ano perdeu o título para Niki Lauda por 0,5 ponto. Se a corrida tivesse ido até o final, Prost poderia ficar em 2º lugar, marcando 6 pontos e ganhando do austríaco no final por apenas um ponto…

Na época, Ickx justificou sua decisão afirmando que a chuva havia ficado mais forte depois da largada e que as condições de segurança estavam muito abaixo do aceitável. “É preferível parar a corrida uma volta cedo demais do que uma volta tarde demais”, disse ele. Um argumento bastante sensato e baseado nos fatos. Hoje, passados 18 anos, eu não o condeno. Ser diretor de corrida (qualquer corrida) é uma tremenda responsabilidade, ainda mais em Mônaco (onde tudo precisa funcionar com perfeição absoluta) e com chuva.

Com o tempo, amadureci minha opinião sobre o “caso Mônaco”. É líqüido e certo que Senna passaria Prost naquela volta ou nas duas seguintes. Mas quem garante que ele seguiria em frente até o final das 78 voltas? Ele poderia ganhar a corrida, como poderia também quebrar ou bater. E, se uma destas duas coisas acontecesse, o brilho de sua atuação certamente seria menor, assim como a repercussão por seu desempenho e, quem sabe, seu cacife para negociar contratos futuros.

Sabe aquela história de que Deus escreve certo por linhas tortas? Tenho certeza de que foi o caso. Senna não precisou daquela vitória para tornar-se o maior vencedor da história de Mônaco. Para ele, o resultado oficial do GP de Mônaco de 1984 não teve a menor influência em termos futuros. Como acabou não tendo também para Prost…

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Toda essa polêmica fez com que outra atuação brilhante daquela corrida fosse menos comentada. O alemão Stefan Bellof, que como Senna havia estreado no GP do Brasil daquele ano, saiu em último lugar com seu Tyrrell e também fez ultrapassagens sensacionais e andou tão forte quanto Senna. Estava em 3º quando a corrida foi interrompida. Meses depois, a Tyrrell foi desclassificada de todos os GPs daquela temporada e Bellof ficou sem os pontos daquela corrida (prometo contar esta história em breve).

 

 

Bellof tinha um talento natural enorme e encheu os olhos de quem o viu correndo. Como Ickx, era um dos pilotos da Porsche no Mundial de Esporte-Protótipos e conquistou o título desta categoria no final daquele mesmo ano de 1984. Morreu no ano seguinte, aos 27 anos, ao colidir com Ickx em plena curva Eau Rouge durante os 1000 Km de Spa. Na época, ele era cotado para assumir um cockpit na McLaren ou na Brabham. Sua morte causou enorme comoção, pois ele tinha tudo para ser o primeiro alemão a conquistar um título de F 1.

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Quem me conhece sabe: basta conversar comigo durante cinco minutos para perceber que eu não entendo nada de futebol. Para você ter uma idéia, não assisti sequer às finais das Copas de 1994 e 1998. Enquanto a Seleção jogava e o Brasil acompanhava, eu fiquei lendo, ouvindo música ou, em 1998, navegando na internet (em 1994, a própria palavra “internet” ainda era coisa para uns poucos iniciados). Não por nervosismo, mas porque simplesmente não tenho paciência para assistir aos jogos. Acho muito chato e não entendo nada do que está acontecendo em campo (muitas vezes ouvi coisas parecidas sobre automobilismo…).

Mas nestes tempos de Copa do Mundo é impossível não falar alguma coisa sobre o assunto. Estou torcendo pela Seleção Brasileira e, também, pelos demais países latino-americanos (Argentina, Uruguai, Paraguai, Equador, México e Costa Rica). “Mas você torce pela Argentina?”, já me perguntaram espantado. Se for o caso, sim. Eu sou um ser utópico, que sonha com uma América Latina tão forte, desenvolvida e integrada quanto a Europa ocidental… Também merecem minha simpatia os times de Portugal e Itália (de onde vieram meus avós e bisavós) e a Croácia. Esta última por uma razão bizarra: a camisa da seleção croata tem um quadriculado branco e vermelho que lembra uma bandeirada de chegada…

Quero apenas fazer um observação. Em 1938, a Itália sagrou-se campeã no auge do regime fascista; em 1970 e 1978, as vitórias do Brasil e da Argentina foram usadas pelos governos dos dois países como forma de “legitimação” de sangrentas ditaduras. Era aquela história do “ópio do povo”.

Nesta Copa de 2002 a favorita é a Argentina, que (segundo quem entende do assunto) tem o melhor time da Copa. Mas minha mulher, Alessandra, que ao contrário de mim adora futebol, diz que já surgiram boatos de que a conquista do título já estaria “acertada” para a Argentina, como forma de aplacar a ira da população do país vizinho. Como se sabe, desde o final do ano os argentinos estão mostrando nas ruas o quanto estão fartos de governos incompetentes e corruptos. A conquista da Copa seria uma forma de dar alegria ao povo.

Parece história de conspiração, mas fica aqui o registro para quem quiser conferir possíveis “coincidências”… Uma dica: em 1998, a Alê disse, ainda nos primeiros jogos da Copa, que um sujeito não se chama Zinedine Zidane à toa. “Para ter um nome desses, deve ser marcado para fazer alguma coisa muito especial ou diferente…”. Saberíamos disso direitinho no jogo final, contra o Brasil…

Abraços e boa semana,

Panda

GPTotal
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A nossa versão automobílistica do famoso "Carta ao Leitor"

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