Uma Targa Florio sem discussão

Nos ombros dos gigantes
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No limite
09/10/2023

Essa prova tinha 2 percursos.

Com o ciclone que causou a queda de barreiras e pontes, em 1931 o circuito médio, de 108km, se tornou impraticável, levando a organização a optar pelo circuito longo, de 149km, ainda mais perigoso.

Para a edição de 1932, a 23a , havia preocupação com a possibilidade de condições climáticas críticas no mês de maio, que poderiam tornar esse circuito também impraticável.

Presidente do Automobile Club da Sicilia e criador da prova que levava seu nome, o conde Vincenzo Florio tratou de se garantir.

Projetou um circuito menor, com 72km, foi ao então chefe de governo, Mussolini, e o convenceu a construir uma estrada nova, ligando Caltavuturo e Colesano.

Representava um risco adicional para pilotos e carros experientes, por ser novidade, mas era uma atração a mais para a audiência, que agora veria os concorrentes passando 8 vezes ao invés de 5.

A expectativa era de um grande confronto entre as 3 principais marcas presentes na categoria.

Varzi tinha conquistado o GP de Túnis para a Bugatti, Nuvolari tinha vencido em Monaco e Fagioli tinha imposto uma potentíssima Maserati no recente GP de Roma.

A inscrição custava 1.000 liras e esta edição era aberta a carros de corrida sem distinção de  capacidade cúbica do motor.

O vencedor levaria 80.000 liras como prêmio, o segundo colocado a metade disso e o terceiro 20.000 liras.

Todo competidor que completasse as primeiras 4 voltas, mas em tempo menor que 45 minutos do líder, garantia um bonus de 2.500 liras e quem cruzasse a linha de chegada na última volta em tempo menor que 90 minutos após o vencedor ganhava 4.000 liras.

Para se ter uma referência, a verba destinada para a construção dessa nova estrada foi 1,5 milhão de liras.

A Bugatti compareceu com suas duas T51 2,3L 4 cilindros habituais, disfarçadas em “independentes”, para Varzi e Chiron, sendo este o único piloto não-italiano.

A Alfa Romeo se fez representar pela Scuderia Ferrari, com Tazio, Borzacchini, Pietro Ghersi e o marquês Antonio Brivio com as 2,3L 8 cilindros Monza.

Consta que exceto a de Brivio eram as Alfas que tinham competido em Monaco, sem paralamas dianteiros e com o estepe fixado ao lado do piloto.

Ernesto Maserati trouxe duas 2,8L de 8 cilindros para Fagioli e Amedeo Ruggeri, ambas com estepe fixado no lado direito do cofre do motor.

Uma Bugatti T35B de 2,3L foi inscrita por Archimede Rosa e 2 T37A 1,5L 4 cilindros por Carlo Cazzaniga e Francesco Sartorelli.

O marquês Guido D’Ippolito alinhou uma Alfa 1.750cc 6 cilindros.

Os demais concorrentes eram Emanuele De Maria, com Fiat 509S 1,1L 4 cilindros, uma O. M. 665 2,2L 6 cilindros pilotada por Silvio Rondina e Clemente Biondetti com sua MB Speciale de 2,5L 8 cilindros.

Para alívio de Florio o tempo amanheceu limpo no dia da corrida, já com temperatura elevada.

Pouco antes da 9 horas os competidores já estavam alinhados, em fila indiana, aguardando o sinal do barão Federico di Abriola, presidente do Reggio Automobile Club d’Italia.

Em ordem definida pelo A. C. da Sicilia, o primeiro a largar era D’Ippolito, que optou por levar seu mecânico.

Após 3 minutos largou Cazzaniga, sem mecânico. E assim sucessivamente, com esse intervalo de tempo, Rondina (sem mecânico), Brivio (sem mecânico), Chiron (sem mecânico), Borzacchini (com mecânico), Fagioli (sem mecânico), Ruggeri (sem mecânico), Rosa (com mecânico), Nuvolari (com mecânico), Biondetti (com mecânico), Varzi (sem mecânico), De Maria (com mecânico) e Sartorelli (com mecânico).

Naturalmente os “big guns” trataram de se impor o mais rápido possível.

O avanço mais notável foi de Nuvolari, acompanhado por seu mecânico Paride Mambelli.

Eles tinham largado 15 minutos após Chiron, o primeiro dos big guns.

E são eles os primeiros a cruzar a linha de chegada, marcando impensáveis 53m03.4s, média de 81.432km/h.

Borzacchini e Chiron vem a seguir, duelando pelo segundo lugar, separados por meio segundo, mas 44” atrás dos ponteiros.

Varzi tentava se sustentar na prova em quarto, sofrendo com problemas de câmbio.

Brivio vinha em quinto, 2m14s acima do tempo de Tazio.

Ghersi em sexto, seguido por D’Ippolito, Ruggeri, Rosa, Fagioli, Biondetti, Cazzaniga, Rondina e De Maria. Sartorelli abandonou ainda nessa primeira volta, uma Bugatti a menos.

Na segunda volta a dupla Nuvolari/Mambelli vai ainda mais rápido, marcando 52m56.6s, média de 81.596 km/h. Bacconin se mantém na segunda posição, mas já cedendo 3 minutos para a Alfa líder. Chiron tem problemas com as velas, pára rapidamente no box e retorna sem perder a posição, porque Varzi vai ficando para trás, com a piora da caixa de câmbio.

Fagioli, com a segunda marcha quebrada, é obrigado a abandonar.

O traçado sinuoso e traiçoeiro começava a cobrar seu preço.

Após Chiron vinham Brivio, Ghersi, D’Ippolito, Ruggeri, Rosa, Varzi, Rondina, Cazzaniga, De Maria e Biondetti.

Varzi abandona na volta seguinte, assim como D’Ippolito (mola quebrada) e Cazzaniga (incêndio). Rosa tem um acidente e igualmente abandona.

Nuvolari/Mambelli completam a terceira volta cumprindo 2h39m20s de prova.

Borzacchini cruza mais de 4 minutos depois, seguido por Chiron, Brivio, Ghersi, Ruggeri, Rosa, Biondina. Biondetti e De Maria continuavam mas muito atrás, mais de 45 minutos do líder.

Na volta seguinte Brivio tem falha nos freios e vai para os boxes. Demasiado perigoso para continuar. Quando Ghersi pára, Brivio é escalado para tomar seu lugar.

Rosa capota na altura de Caltavuturo. Ele tem ferimentos na cabeça e seu mecânico Favero ferimentos abdominais graves, mas felizmente ambos são declarados fora de perigo após serem atendidos no hospital. Biondetti, com problemas mecânicos, abandona.

Completada a 4a. volta, metade da prova, a ordem era Nuvolari/Mambelli, Borzacchini (a mais de 5 minutos), Chiron, Ghersi, Ruggeri, Rondina, com De Maria ainda mais atrasado.

Durante a quinta volta Tazio/Mambelli param para trocar os 4 pneus, tarefa cumprida em 1m58s.

Borzacchini perde 1m18s para a mesma operação e Chiron, trocando somente rodas (e ao mesmo tempo freios, conforme a tecnologia Bugatti) traseiras, perde 1m07s.

Mesmo assim os líderes aumentam a vantagem para a segunda Alfa para mais de 6 minutos.

Chiron, ainda se recuperando do acidente de Monaco e sofrendo com o intenso calor, pára novamente nos boxes, completamente exausto. Varzi assume seu posto, com uma desvantagem na casa dos 10 minutos. De Maria abandona por problemas na embreagem.

Na sexta volta a ordem era Nuvolari/Mambelli, Borzacchini, Varzi, Brivio, Ruggeri, Rondina e é assim que terminam a prova.

A Alfa líder cumpriu as oito voltas no tempo total de 7h15m50.6s, Borzacchini cruzou 5m39.2s atrás, Varzi mais de 19m depois.

 

 

Ao ver Nuvolari cruzar a linha, a multidão explodiu em aplausos e rodeou a dupla vencedora assim que esta chegou ao box, expondo sua imensa alegria por esse triunfo italiano indiscutível.

Até o próxima

Carlos Chiesa

Carlos Chiesa
Carlos Chiesa
Publicitário, criou campanhas para VW, Ford e Fiat. Ganhou inúmeros prêmios nessa atividade, inclusive 2 Grand Prix. Acompanha F1 desde os primeiros sucessos do Emerson Fittipaldi.

6 Comments

  1. Rafael Friedrich disse:

    E Eu aqui só amando o GPTotal cada vez mais. No final do último vídeo ,eu coração estava igual ao da vinheta de despedida. Parabéns a todos os Ecribas. Vida longa e próspera a todos que aqui navegam; excelente final de semana à todos os GPetos.
    n

    • Carlos disse:

      É entusiasmante descobrir que tem mais gente que aprecia a raiz do automobilismo. Vida longa aos entusiastas!

  2. Grande Chiesa.
    Estamos muito bem servidos de automobilismo pré-F1 aqui no Gepeto.
    Abraço, amigo.

  3. Fernando Marques disse:

    Chiesa

    Targa Florio que história … sensacional …

    Fernando Marques
    Niterói RJ

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