Histórias de pilotos III

Primeiras respostas
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Treino é treino, corrida é corrida
31/03/2017

Tim Schenken dividiu com Ronnie Peterson a pilotagem do Ferrari 312PB no Mundial de Protótipos de 72. Eram bons amigos e na noite anterior à largada para as 24 Horas de Daytona, uma prova de prestígio quase igual a de Le Mans, Peterson propõe: “que tal pegarmos um carro alugado e dar uma volta pela praia”.

Schenken está ao volante mas é parado pela polícia – certamente não porque estivesse andando devagar ou derrapando loucamente sobre a areia… A dupla da Ferrari está sem documentos e acaba na delegacia. Schenken propõe ficar por lá enquanto Peterson é liberado para ir ao hotel buscar o passaporte de ambos. Os policiais topam. Peterson arranca com o carro em altíssima velocidade e, a caminho do hotel, é perseguido e preso – novamente – pela polícia, que o reconduz à delegacia, às 2h da manhã!

Alguns telefonemas mais tarde, os dois são liberados e se apresentam pontualmente para a largada às 10h. Terminam a corrida em 2º lugar.

Ao saber do acidente de Nelson Piquet nos treinos para Indy 92, Ayrton Senna, treinando em Imola, foi até uma igreja, rezar, presumivelmente pelo restabelecimento do ex colega de Fórmula 1.

A história é contado por um amigo intimo de Senna, o fotógrafo italiano Angelo Orsi.

O desenvolvimento do motor BMW turbo no começo dos anos 80 foi um dos momentos altos da carreira de Piquet.

Foi um longo e penoso processo, que custou muito trabalho, dinheiro e dedicação. Sempre houve potência de sobra no motor mas faltava-lhe um mínimo de durabilidade. Uma breve esperança surgiu quando a Bosch desenvolveu talvez a primeira central eletrônica de gerenciamento de motores, usada num teste em Donington, no final de 81. Uma das muitas versões levadas ao teste funcionou muito bem.

Todos ficaram entusiasmados e a Bosch, antes de tentar entender o que fizera de certo daquela vez, quis fazer três cópias do software da central mas alguém da sua equipe plugou algum fio errado e simplesmente derreteu a placa com uma descarga de alta voltagem.

Talvez com vergonha do erro bisonho, os técnicos da Bosch ficaram na moita e disseram que sabiam exatamente como refazer a caixinha mas isso, aparentemente, não era verdade. Na sessão seguinte de teste, em Paul Ricard, uma sessão que se estendeu por 15 dias, Piquet viu estourar nada menos do que 17 motores BMW.

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O legendário Dan Gurney acumulou histórias em praticamente todas as grandes categorias do automobilismo mundial nos anos 60 – Fórmula 1, Can-Am, Sport-Protótipos, Indy – como piloto e construtor.

Em 64, ele pilotou os Cobra GT, de Carroll Shelby. Em Targa Florio, o carro se revelou particularmente difícil e, ainda por cima, teve uma suspensão danificada, o que fez Gurney conduzi-lo muito devagar na fase final da corrida, ao longo de intermináveis voltas de mais de 70 km cada uma (isso mesmo: 70 km).

Quando finalmente Gurney recebeu a bandeirada, tendo vencido a corrida em sua categoria, ele encontrou os seus boxes vazios. A equipe, cansada de espera-lo, havia ido toda a um restaurante próximo, jantar!

Grande Prêmio de Portugal 58, disputado nas ruas da cidade do Porto. Stirling Moss liderava a corrida, a antepenúltima da temporada, com grande vantagem sobre seu rival direto na luta pelo título daquele ano, Mike Hawthorn, que corria em 2º lugar. Mantendo estas posições, ele iria para as corridas finais com quatro pontos de vantagem sobre Moss.

Mas com graves problemas nos freios a tambor de seu Ferrari, Hawthorn roda na última volta e deixa o motor morrer. Ele desce do carro e o empurra até o motor pegar. Mesmo assim, cruza em 2º.

No entanto, os comissários chamam Hawthorn e o informam que vão desclassifica-lo porque ele teria empurrado seu carro na contramão da pista. Pânico geral! Desta forma, Moss abriria dois pontos de vantagem no campeonato e Hawthorn, ainda por cima, teria de passar a descartar resultados nas corridas seguintes.

Moss, então, se apresenta voluntariamente aos comissários e os informa que teria visto ele próprio o rival empurrar o Ferrari mas numa área de escape, distante do circuito e sem risco para os demais concorrentes. O depoimento convence os comissários e, assim, graças ao fairplay de Moss, Hawthorn confirma o seu título nas corridas seguintes, com um único ponto de vantagem sobre Moss que, pela 4ª vez na carreira, terminaria o campeonato na vice-liderança.

O GP dos Estados Unidos de 59, disputado no autódromo de Sebring, marca a estreia de um monoposto americano na Fórmula 1 – uma estreia vergonhosa.

Pilotado por Roger Ward, o Kurtis, um carro da categoria midget, tinha o sistema de freio acionado à mão e câmbio de duas velocidades. No treino, o carro tomou a 43 segundos do pole e 10 do penúltimo colocado no grid.

Nas vésperas do GP da França de 2008, Kimi Raikonnen passeou por Paris pela primeira vez na vida.

Frank Gardner, falecido no ano passado, aos 78 anos de idade, nunca foi famoso pelo seu desempenho nas pistas mas acumulou fama de sobra pelo seu notório bom humor e sagacidade. Correndo naquele período mortífero entre os anos 60 e 70, geralmente no Mundial de Sport-Protótipos, Gardner disse que nunca quis ser o piloto mais rápido do mundo – mas sim o mais velho…

Uma das suas contribuições mais notáveis foi ter feito parte do time de pilotos que desenvolveu o Porsche 917, tendo-o pilotado na primeira vez que o modelo competiu, em Nurburgring 69. Naquela altura, a maioria dos pilotos que testara o 917 estava no hospital, vítima de algum acidente com o carro.

Frank precisava de um parceiro para dividir a pilotagem pelos 1000 km de extensão da prova. Convenceu a Porsche a chamar o inglês David Piper. Ele topou mas, depois de dar uma única volta, decidiu voltar para a Inglaterra, atemorizado pelas reações do carro. Custou um bom tempo para Frank convencê-lo a ficar.

Empurrado por um motor animalesco, o chassi tubular do 917 simplesmente não resistia às pressões, contrações e contorções, rompendo-se seguidamente. Um paliativo pensado pelos engenheiros alemães foi injetar gás nos tubos e medir a pressão interna, de forma que qualquer rompimento seria percebido pelos pilotos por meio de um manômetro. Assim, eles poderiam ao menos tentar parar o carro em segurança antes de tudo se desintegrar. Tão grande era a, digamos, flexibilidade, do chassi que Frank precisava procurar a alavanca de marchas. Ela nunca estava no mesmo lugar!

Outra boa história contada por Gardner: correndo na Nascar no final dos anos 60, ele jura ter visto vários pilotos acendendo cigarros em plena corrida, assim que bandeiras amarelas eram acionadas.

Aliás, diz a lenda de Interlagos que Ciro Caires também o fazia – e em plena corrida -, tomando apenas o cuidado de esconder o cigarro dentro do carro quando passava diante dos boxes.

Na Áustria 77, Alan Jones, pilotando um Shadow, consegue uma vitória de tal forma inesperada que os organizadores da corrida sequer dispunham de um disco com o hino da Austrália para tocar na cerimônia do pódio.

A solução: alguém com um trompete tocou Parabéns pra você – sim, a cândida musiquinha que se canta enquanto o aniversariante sopra as velinhas – enquanto Jones recebia seu troféu.

Perguntando anos depois sobre o que aprendeu, depois de uma vida inteira na Fórmula 1, Jones respondeu: “a não acreditar em ninguém…”

Algumas equipes já emprestaram a sua marca ou mesmo o talento dos seus engenheiros para desenvolver séries especiais de carros de rua mas nunca, que eu saiba, uma equipe ajudou no desenvolvimento de um cortador de grama!

Foi o que fez a Williams em meados de 2008 em parceria com um especialista do setor, lançando um cortador ao preço de quase 7 mil euros.

Fangio disse: vence não quem anda mais rápido mas sim quem anda menos lento e erra menos.

Abraços,
Eduardo Correa

Eduardo Correa
Eduardo Correa
Jornalista, autor do livro "Fórmula 1, Pela Glória e Pela Pátria", acompanha a categoria desde 1968

3 Comments

  1. Fernando Marques disse:

    Edu,

    show de bola!!!
    Saudosos bons tempos de muitas historias a serem contadas. E sempre boas histórias!!! … Tempos de uma galera com pouco ou quase nenhum juízo e nada de politicamente correto. A junção disso só pode render grandes histórias.

    Fernando Marques
    Niterói RJ

  2. Rubergil Jr. disse:

    Esta coluna é antológica! Junto com as partes 1 e 2, mais as “Lendas” (do Edu e do Ricardo Divila), formam um compêndio delicioso de ler. Valeu Edu!

    Rubergil Jr.

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