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Nem tudo que reluz é ouro! – parte 1
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O pioneiro do ar – parte 2
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Confira a conclusão desta fabulosa história.

(confira a primeira parte dessa história clicando aqui)

A temporada de 1980 começa e Thieme continuava com suas extravagâncias. Com a chegada das corridas na Europa, Thieme aparece com um grande e espetacular ônibus de dois andares pintado com as cores da Essex, ao que se lhe havia montado uma plataforma no teto como se fosse um mirante onde seus convidados VIP podiam se sentar comodamente para ver a corridas enquanto desfrutavam de suculentos manjares regados com finos vinhos e champanha. Sem dúvida, Thieme sabia agasalhar seus convidados e aquele ônibus foi o precursor dos atuais Motorhomes.

No que ao campeonato se refere, o Lotus 81 não foi bem, mas Thieme continuava a injetar seus milhões. Como o contrato com a ESSEX estipulava que a Lotus devia construir um novo modelo para cada temporada (o que dava a Thieme a ocasião de organizar uma boa festa de apresentação), Chapman trabalhava num original conceito com o que pretendia voltar a dominar seus rivais: o duplo chassi. Assim, antes do inicio da temporada de 1981, Thieme organiza outra grande apresentação no “Royal Albert Hall” para mostrar o Lotus 88. Mais de 1000 convidados estavam presentes e, nesta ocasião, era Ray Charles o encarregado de amenizar a festa.

httpv://youtu.be/6Q7K8MrxquE

Porém, para decepção de Chapman, o carro seria proibido obrigando à Lotus a improvisar outro carro: o Lotus 86. Logo viria outra decepção: no mês de abril Thieme é preso pela justiça suíça acusado de fraude e seu jato particular, um luxuoso Mystére,  é confiscado. Thieme não soube avaliar as consequências da guerra entre o Iraque e o Ira, que provocou uma súbita queda do preço do petróleo, deixando-o incapaz de afrontar seus compromissos finaceiros com o Credit Swiss Bank. Inclusive, quando a equipe se dirigia à Italia para disputar seu GP em Monza, tão logo entram em território suíço, a policia também confisca o luxuoso ônibus. Com isto, o extravagante David Thieme desapareceria de cena e a publicidade da  ESSEX… também.

Pouco antes, em janeiro, o primeiro dos DeLorean DMC12 saia da linha de produçao. Contudo, o carro nao era o super esportivo que se havia anunciado e as vendas nem de longe se aproximavam às esperadas. Assim, Margareth Thatcher, agora no poder, perante os problemas econômicos da empresa e relutante a seguir concedendo mais subvençoes (quase 100 milhões de libras já haviam sido concedidos) diz a DeLorean que, para continuar recebendo dinheiro do governo britânico, este devia buscar financiamento complementário. Porém, e devido à incapacidade da companhia para afrontar suas dividas, no mês de outubro Thatcher ordena uma investigação sobre a situação financeira da empresa.

Nessa mesma época, antes do fim da temporada, Peter Warr, após seu passo pela equipe Wolff, retornaria à Lotus e, segundo contaria mais tarde, encontrou Colin muito diferente daquele que havia deixado no fim de 1979, pois John DeLorean e David Thieme o haviam  introduzido na opulência e luxo da boa vida, da qual Chapman já estava totalmente cativo.

Longe estavam os dias em que Chapman ficava trabalhando com seus mecânicos até altas horas da noite buscando solucionar os problemas. Agora, Chapman apenas passava tempo com seu pessoal e já nem almoçavam juntos como antes faziam, aproveitando para discutir alguma solução técnica. Chapman, que se havia acostumado a se deslocar no helicóptero da ESSEX, agora dispunha do seu próprio. Segundo conta Mike Lawrence em seu livro sobre Chapman, este já só conseguia se manter ativo e cumprir sua apertada agenda com ajuda de substâncias estimulantes .

Enquanto a temporada de 1982 avança, a investigação sobre a DeLorean acaba desvendando uma elaborada arquitetura financeira disposta com o único propósito de desfalcar a empresa. Basicamente, o dinheiro das subvenções recebidas, era enviado à GPD, um intermediário com sede no Panamá, a traves de seu escritório em Geneva. Desde o Panamá, o dinheiro era transferido de volta à Inglaterra para pagar o trabalho de assessoramento técnico da Lotus.

Porém, o problema é que, no processo, cerca de 10 milhões de libras haviam desaparecido, e tudo parecia indicar que esse dinheiro teria acabado nos bolsos de John, de Colin e de Fred Bushell, numa soma menor. Bushell era o diretor financeiro da Lotus, amigo  e homem de confiança de Chapman em todo o assunto.

Em Novembro de 1982, Chapman é requerido pelo oficial judiciário que se encarregava do caso, quem lhe pergunta por todo o assunto e sua conexão com a GPD (se suspeitava que a tal companhia pertencia a DeLorean e Chapman). Contudo, Chapman nega todo conhecimento, e uma nova entrevista é fixada para dentro de alguns dias, para que Chapman prestasse depoimento oficial.

No Entanto, Chapman já nao compareceria a essa nova entrevista pois na manha do dia 6 de dezembro apareceria morto em sua cama, levando consigo a chave para esclarecer todo a falcatrua.

Quando se celebra o juízo pelo fraude da DeLorean, Fred Bushell prefere se declarar culpável dos delitos que se lhe imputavam e, assim, evitar novas investigações. Bushell, receberia uma condena de três anos de prisão e o juiz do caso diria que, se vivo, Chapman teria se enfrentado a uma condena de, no  mínimo, dez anos devido à magnitude do fraude.

Por sua parte, DeLorean, que se encontrava nos EE.UU. quando o escândalo sai à tona, aproveitaria a morte de Chapman para dizer que os milhões que lhe foram encontrados lhe haviam sido emprestados por Chapman de forma pessoal, e conseguiria evitar a sua extradição ao Reino Unido.

Como resultado de tudo isso, um dos homens mais destacados da história da formula um acabava com seu nome e sua memória maculados para sempre. Colin Chapman, sucumbiu ao glamour da reluzente vida de luxo e extravagâncias à que lhe haviam introduzido tanto DeLorean quanto Thieme.

Colin Chapman, como a pobre borboleta que se aproxima demais a uma vela, atraída por sua luz, não soube ver a verdadeira natureza daquela luz. Assim, cegado por aquele brilhante luxo e opulência que se haviam apresentado perante seus olhos, Colin não foi capaz de perceber que, como nos ensina o ditado… nem tudo que reluz é ouro.

Sejam bons e até a próxima.

Manuel Blanco
Manuel Blanco
Desenhista/Projetista, acompanha a formula 1 desde os tempos de Fittipaldi É um saudoso da categoria em seus anos 70 e 80. Atualmente mora em Valência (ESP)

4 Comments

  1. Manuel, como sempre, nos ensinando histórias que pensávamos conhecer em todos os detalhes
    Grande texto, velho amigo..

  2. Sandro disse:

    Great Scott!

    Como a empresa tinha falido, escolheu-se o DeLorean DMC-12 (DeLorean Motor Company – 12 “o 12 era referente a doze mil dolares, o valor estimado do carro!) para o filme De Volta para o Futuro. Acabou virando um icone do cinema! A maquina do tempo era para ser uma…. geladeira! Mas vai que algum doido entra na geladeira e morre congelado! O carro era uma tentativa “um pouco menos suicida”!

    E reza a lenda que Colin Chapman forjou a morte e mudo-se secretamente para o Mato Grosso… :p

  3. Fernando Marques disse:

    Manuel.

    a história de Collin Chapman daria um belo filme … pela riqueza de seu sucesso como construtor e dono da Lotus e o caminho que acabou-lhe dando um final épico e ao mesmo tempo trágico.
    Interessante também o fracasso comercial que foi o De Lorean, mesmo com “De Volta pro Futuro” batendo recordes de bilheterias no cinema. E no entanto hoje em dia, o De Loeran é uma relíquia que vale um bom dinheiro nas mães de colecionadores. No caso dele demorou mas reluziu como ouro …

    Fernando Marques
    Niterói RJ

  4. Mauro Santana disse:

    Que fantástica coluna Manuel, Parabéns!

    Muito interessante toda está história/farsa, e como tudo terminou.

    No fim das contas, provavelmente a JPS voltou pra Lótus atravee de Peter War.

    Correto!?

    Fico imaginando as bagunças e fulias que tanto Mário Andretti e Élio de Angelis presenciaram neste período.

    Abraço!

    Mauro Santana
    Curitiba-Pr

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