Leia a 1ª parte desta série aqui https://gptotal.com.br/senna-acidente-e-fatalidade/, a 2ª, na qual começa a entrevista, aqui https://gptotal.com.br/senna-a-entrevista-1/, a 3ª aqui https://gptotal.com.br/senna-a-entrevista-2/ e a 4ª aqui https://gptotal.com.br/senna-a-entrevista-3/
COMO SENNA LEVOU PIQUET PARA A LOTUS
Ayrton Senna: Eu fiz um acordo, também verbal com o Ron, porque tinha uma briga entre Williams e Lotus, quem ia ficar com o motor, Piquet poderia sair da Williams. Os japoneses queriam que a Williams colocasse o Nakajima, da Lotus na Williams, ai então eles deixavam o motor na Williams e pegavam o motor da Lotus e levaram para McLaren, uma encrenca toda, né?
E ao longo do ano eu peguei o acordo com o Ron e falei olha, é assim, assim, assim a situação, dá para fazer com a Honda e isso eu estou te dizendo porque eu acho que para Honda é a melhor decisão técnica e esportiva. Assim como eu acho que para McLaren também, como é para mim. É uma coisa ideal para todas as partes.
EC: Exatamente.
AS: Não estou jogando a favor de um ou de outro; estou jogando pelo sucesso de todos nós porque é o objetivo de todos nós e é o que eu realmente acredito.
Então eu estava trabalhando para o grupo, estávamos trabalhando com o mesmo objetivo. E fizemos um acordo verbal que ficou pendente segundo a solução da Honda que estava desenvolvendo por aqueles meses, que foi o mês de maio, mesmo, junho e julho. E em agosto, a gente assinou o contrato no GP da Áustria já estava tudo delineado, definido, e ali era só assinar o contrato porque tecnicamente eu não podia assinar o contrato – o meu contrato com a Lotus não permitia assinar antes de agosto daquele ano. Então eu judicialmente não poderia assinar senão estaria quebrando o contrato. Então foi feito todo um contrato verbal mas condicional a uma data que eu tinha que respeitar.
E ali eu não tinha receio nenhum que pudessem mudar a história pela Lotus porque ali eu já tinha mais ainda a segurança e a certeza que eu tinha na Honda forte para garantir que o que fosse combinado seria cumprido, né?
E foi realmente o que aconteceu, não teve problema nenhum e a gente assinou o contrato no final de semana do GP da Áustria, foi divulgado…
EC: Em Monza
AS: …a corrida seguinte e a coisa foi em frente.
EC: Entendi. E a solução para própria Lotus se encaminhou naturalmente na medida em que a Honda gostaria de manter o Piquet como campeão do mundo naquela altura mais um ano correndo com o próprio motor.
AS: O que eles queriam realmente era ter o Nakajima correndo com o motor Honda. Então o Nakajima tinha entrado na Fórmula 1 na Lotus, comigo, foi uma das condições para trazer o motor Honda para a Lotus, eles pediram para ter o Nakajima fosse piloto e a Lotus acabou aceitando porque era importante.
EC: Sim. E ainda com o motor Renault, né?
AS: E o objetivo deles era, no ano seguinte, colocar na Williams o Nakajima. Mas o Frank Williams recusou, e recusou, recusou, recusou, achando que podia lutar contra este pedido e, por consequência, ele acabou perdendo.
EC: Compreendo, e também pela própria forma como as coisas aconteceram…
AS: Ele (o Piquet) percebeu que a Williams ia perder o motor e a Williams sem o motor Honda não ia ter futuro imediato, tanto é que acorreu exatamente isso. Eles caíram muito.
EC: Sim, foram de motor Judd.
AS: Sim, com Judd não tinham condições de vencer. Então ele (Piquet) passou da Williams para a Lotus depois que eu deixei o caminho livre. A Lotus tinha dinheiro para pagar o Piquet, que era o dobro do que ele ganhava na Williams, já estava tudo certinho. Eu deixei o caminho aberto e a Honda continuaria na Lotus, (inaudível) garantindo lugar para o Nakajima.
Então, nessa altura, o objetivo da Honda era, na verdade, continuar com a Williams mas colocando o Nakajima. Como isso não foi viável, eles então optaram por continuar na Lotus, sabendo inclusive que tecnicamente ela era inferior a Williams, mas sabendo ao mesmo tempo que em quem eles estavam realmente apostando era na McLaren, certo?
Então, a Williams seria o ideal, mas não seria um problema ser a Lotus porque ela atenderia a necessidade de acomodar o Nakajima. Então essa foi a estratégia.
EC: O encaminhamento, né? Quer dizer que as confusões da Williams ao longo de 86 e 87 com Mansell e Piquet naquela situação não foram tanto as causadoras dessa solução, mais essa questão realmente do Nakajima…
AS: A razão principal de eles permanecerem na Lotus, porque eles não conseguiram convencer o Frank a aceitar o Nakajima foi exatamente esta: manter o Nakajima na Fórmula 1 com motor Honda, que era importantíssimo para eles no mercado japonês.
Tanto é que eles duraram apenas mais um ano na Lotus e saíram.
SENNA E O MCLAREN DE 91
Eduardo Correa: A McLaren de 91 era um carro que padecia de problemas dessa natureza e se eu estou bem lembrado, seria uma entrevista ao Estadão dizendo que os problemas da McLaren em 91 começaram num túnel de vento defeituoso que a McLaren tinha. E que o Henry Duran quando veio da Ferrari percebeu esses erros…
Ayrton Senna: É, exatamente. O carro da McLaren de 91, depois do de 88, foi o melhor McLaren que eu guiei. Ele foi um carro de último momento, feito pelo Henry Duran na parte de aerodinâmica e com a experiência que ele tinha acumulado na Ferrari durante os anos anteriores (inaudível).
Ele veio para a McLaren em 1990 e ficou ali procurando se adaptar a McLaren, conhecer o pessoal da equipe e tudo o mais e só foi nomeado como encarregado pela área de aerodinâmica em novembro quando o projeto já estava pronto praticamente.
Ele foi nomeado tarde para a área porque ele veio para ficar, realmente, para assumir e quando ele assumiu não tinha tempo para (inaudível) no design do carro. Então, o que ele fez, foi uma Ferrari melhorada com a experiência (inaudível) e adaptou para o carro McLaren.
Desenhou e inovou em construção sem ter experimentado numa maquete. Depois que o carro estava pronto é que ele, em janeiro ou fevereiro, experimentou num modelinho para fazer os primeiros testes e ajustes de detalhes daqui e dali no carro. Então, foi um carro que nasceu da experiência que ele tinha tido na Ferrari.
E esse carro (inaudível) era muito superior na parte de aerodinâmica embora, embora, ele ainda tivesse alguns problemas fundamentais que aí eram mais decorrência de falta de, realmente, botar o carro no túnel de vento – era um modelinho, a gente fazia um carro de tamanho (inaudível)
Mas devido aos problemas na época de 89 e 90 de aerodinâmica serem tão grandes, aquilo que ele tinha produzido já era muito superior ao que existia na McLaren, tá certo?
EC: Sim…
AS: Que tinha sido mascarada de certa forma em 89, 90 porque o motor Honda V10 era muito superior aos outros motores e que nos dava a oportunidade de usar muito mais aerofólio, inclinação de aerofólio, sem ter problema de velocidade em reta. Ele tinha uma potência maior do que os outros, né?
Mas aí foi apertando, os outros chegando, chegando e em 91 se a gente não tivesse aquele chassi, a gente não teria vencido porque a Williams Renault entrou com um carro tecnicamente muito superior, aerodinamicamente assim milhões de kms melhor a McLaren de 91 mesmo. O motor Renault entrou para valer naquele ano e a gente estava iniciando um trabalho com o V12 que andava bem, direitinho, mas que estava no início da vida dele e não estava na altura do Renault e a confiabilidade que a equipe Williams tinha (inaudível) e depois a gente foi crescendo, crescendo e no final do ano a gente estava forte de novo.
EC: Eu reli uma entrevista do Frank Williams à AutoSprint, nessa altura, e ele fala exatamente isso: o que definiu o campeonato foi o desempenho no começo do ano o seu desempenho no começo do ano. Depois disso você esteve numa situação de força para controlar os resultados do Mansell. Teve aquele episódio na Hungria, que é realmente uma vitória fundamental. E aí chegam no Japão e Austrália numa situação de administrar resultados e que, vamos ser francos, não há comparação com o Mansell, quer dizer, com o Mansell correndo contra resultado adversos que não precisava descontar ponto, a situação se tornava muito favorável.
AS: Mas foi isso mesmo, tanto é que no ano seguinte, 92, o carro que o Henry mesmo fez, ele fez um carro (inaudível), talvez o pior de todos os McLaren que eu guiei (inaudível) mas foi também pelos resultados da galeria de vento. O Henry é um cara competente (inaudível).
EC: Ele está na McLaren ainda?
AS: Não dava a leitura correta. O cara lia ali e na hora de passar para o modelinho…
EC: Não batia
AS: quando transferia do modelinho para o carro verdadeiro, na pista, não dava nada daquilo que a gente achava que tinha, de peso, de pressão aerodinâmica, de equilíbrio e tudo o mais e isso foi complicando cada vez mais e mais e mais e a gente não sabia nada do que estava acontecendo lá e provar aos próprio técnicos da McLaren.
A BRIGA COM ALAIN PROST
Eduardo Correa: San Marino 89. Olhando aquela questão toda das reclamações do Prost, do tal acordo e tudo mais, me parece muito claro, eu queria saber se você concorda com essa minha interpretação, que a atitude do Prost a partir de San Marino não foi de forma alguma uma atitude emocional. Ela foi sim uma atitude fria, talvez a gente possa até usar a expressão, uma atitude comercial, quer dizer, o Prost convenceu-se que a única forma que ele tinha pra fazer frente à você seria tomar uma atitude como aquela de brigar, de agredir, enfim, de fazer o que ele fez, da forma como ele fez.
A gente olhando em retrospecto vê que ele foi, ele foi, depois recuou, parece que teve o episódio de uma reunião sua, dele e do Ron logo depois de San Marino, onde ele teria se retratado. E depois ele vai, dá uma entrevista pro L’Equipe antes de Mônaco e começa a dar entrevistas assim, fora da característica dele, te criticando, atacando, quer dizer…
Você concorda que foi da parte dele uma atitude, que a gente pode chamar de comercial?
Ayrton Senna: Mas é exatamente isso. Ele sabia que em condições de igualdade ele não conseguiria competir e ele sabia que talvez única maneira era realmente desestabilizar a equipe, tendo eu como alvo principal, fora do carro, né?
EC: Era pôr fogo na casa…
AS: Exatamente. Pra então, dentro da confusão, ele talvez poder manipular uma série de situações. E foi o que ele realmente tentou fazer e foi muito ruim para ele quanto para mim. Ninguém saiu ganhando daquilo, na verdade. Aquilo lá foi o início de uma guerra sem fim. (inaudível).
Então foi uma situação altamente destrutiva. Na minha opinião, ninguém saiu ganhando mas foi uma opção que ele fez, de desespero somado a experiência toda que ele tinha, já, de muito tempo de janela, muito malandro, não necessariamente correto, eticamente falando, mas que infelizmente refletia e reflete no caráter dele.
Na sexta-feira, dia 27/1, na última parte da entrevista, Senna fala de Suzuka 89 e a influência política na F1
1 Comments
Edu,
Época boa aqueles tempos.
Mas a história de Piquet ao ir pra Lotus é um pouco diferente
A moral dele estava alta na Honda. Afinal a Honda foi campeã pela primeira vez na fórmula 1 com Nelson.
Mas de uma maneira em geral a entrevista é muito boa.
Fernando Marques
Niterói RJ