Ombreando gigantes

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Quando recebeu a bandeirada em Barcelona na quinzena passada, Max Verstappen chegou à sua quadragésima vitória na F1 e com o domínio da Red Bull esse ano, a 41º vitória viria rapidamente, fazendo com que Max se igualasse à Ayrton Senna no ranking dos maiores vitoriosos da história da F1. A verdade foi que Verstappen nem precisou esperar muito para ombrear-se ao inesquecível tricampeão. Como havia sido na Espanha, Verstappen simplesmente ignorou a presença dos demais dezenove pilotos no grid em Montreal para vencer mais uma vez e empatar com Senna no ranking histórico de vitórias da F1.

Para sacramentar um momento tão especial, Verstappen esteve cercado por dois pilotos lendários no pódio, que brigaram a corrida inteira pela segunda posição, que foi o que Max permitiu para os demais. Alonso não largou tão bem e enfrentou problemas nos freios, mas segurou Hamilton para garantir a segunda posição na frente do inglês da Mercedes, subindo ao pódio pela sexta vez em oito corridas. Para completar um pódio estrelado, Adryan Newey recebeu o troféu de construtores no que foi a centésima vitória da Red Bull na F1.

Os quatro somam mais de trezentas vitórias na F1!

O final de semana canadense prometia muita chuva e ela veio com força no sábado, mexendo um pouco no status quo da relação de forças da F1 atual. Só não mudou o primeiro colocado. Na chuva ou no sol, Max Verstappen vem mostrando uma pilotagem excepcional, colocando mais de 1s de vantagem sobre seu mais próximo perseguidor com uma pole esmagadora. Em teoria Nico Hulkenberg, que sempre se apresentou muito bem em pista molhada, largaria em segundo, mas o alemão da Haas acabou punido por erro de sua própria equipe, fazendo com que Alonso largasse em segundo, tendo as duas Mercedes na segunda fila. A Ferrari vacilou na pista em que vinha melhor se apresentando, enquanto Sergio Pérez novamente ficou fora do Q3. Pela terceira corrida consecutiva, com o mesmo carro cujo companheiro de equipe vem dominando o campeonato.

Se Pérez tivesse anteninhas de vinil, elas estariam detectando a presença de vários inimigos, loucos para tomar o lugar de Checo no próximo ano.

O domingo amanheceu sem chuva, significando uma corrida bem normal e sem maiores emoções na luta pela vitória. Sim, pois a normalidade da F1 em 2023 é Max Verstappen largando bem, contornando a primeira curva na frente e disparar na frente, administrando a corrida até a bandeirada. E o que aconteceu? Exatamente o descrito. Verstappen simplesmente administrou a prova em Montreal a seu bel-prazer, só não garantindo um Grand-Chelem, que seria o segundo consecutivo para Max, por causa de Pérez, que ficou com a melhor volta da corrida já no final da prova, pois Max garantiu todos os demais requisitos: pole, vitória e liderança em todas as voltas. Verstappen fez uma corrida trivial rumo à 41º vitória na carreira e chegou até mesmo rir de um pequeno erro que cometeu no final da corrida. Com apenas 25 anos de idade, já se começa a especular o quanto Max ainda conseguirá em sua carreira, ainda mais com um Red Bull muito acima das adversárias nessa Era.

Se Max não deu chance a ninguém, a luta pelo segundo lugar foi mais animada. Alonso pulou para segundo com o infortúnio de Hulkenberg, com as duas Mercedes lhe fungando o cangote. Ajuda de Stroll? Nem sonhando. O desempenho do canadense frente à Alonso já está se tornando constrangedor para Lance, mas todos sabem que o emprego de Stroll está mais do que garantido na Aston Martin, mesmo com Lance Stroll sabotando a própria equipe do pai no Mundial de Construtores. Hamilton sabia que não poderia ameaçar Verstappen pela vitória, mas ele poderia encher o saco de Alonso. Por mais que chegasse a dizer que queria a vitória, Alonso sabia que o segundo lugar era o máximo que poderia alcançar. Dois velhos rivais novamente juntos na luta por bons pontos marcou a corrida, com Hamilton começando em vantagem ao largar muito bem e ultrapassar até com certa facilidade Alonso, que ainda teve que se defender dos ataques de George Russell. No primeiro stint, Hamilton, Alonso e Russell andaram próximos, numa fase de estudos, mas esse estágio foi interrompido quando o próprio Russel cometeu um incaracterístico erro e bateu num dos vários muros de Montreal. Incrivelmente Russell ainda teve condições de retornar à corrida e teria pontuado, se não fosse um problema de freio identificado pela Mercedes já no final da prova. Além de ter dimensões de um Landau, o carro de F1 também tem a resistência de um tanque de guerra!

Foi nesse momento que ocorreu o segundo round entre Hamilton e Alonso, já que os dois aproveitaram o SC para fazerem suas primeiras paradas na corrida. A Mercedes soltou Lewis no pit-lane bem à frente de Alonso, que catimbou ao dizer que quase foi atingido pela Mercedes. Se fosse futebol, Alonso teria dado um senhor mergulho na área numa dividida com Hamilton para provocar um pênalti, mas o juiz, sabiamente, mandou o jogo, ou a corrida, seguir. Nesse segundo momento, com ambos com pneus duros, Alonso tinha um melhor ritmo e deu o troco em Hamilton usando o DRS. Simples assim, sem choro, nem vela. Porém, o SC trazido por Russell fora muito cedo para uma corrida praticamente inteira sem paradas e um segundo pit-stop foi necessário para a turma que parou. Como não restavam tantas voltas, Hamilton arriscou médios, enquanto Alonso foi para um segundo set de duros. Para complicar, a Aston Martin identificou problemas no carro de Alonso e a diferença entre os dois diminuiu, fazendo com que todos esperassem uma nova briga entre os dois titãs. ‘Deixe comigo’, falou Alonso pelo rádio. E o espanhol, com problemas de freios e tudo, segurou com maestria Hamilton, que no fim desistiu de qualquer ataque no final, se conformando em completar um pódio histórico.

Novamente a Ferrari se viu envolvida em problemas táticos no final de semana, não colocando os pneus corretos no carro de Leclerc na classificação, fazendo o monegasco largar no meio do pelotão. Correndo com o capacete de Gilles Villeneuve, após uma longa negociação com a família, Leclerc ficou irado com mais um erro da Ferrari. Porém, o SC provocado por Russell trouxe algo que não vem ocorrendo muito nos últimos anos: a Ferrari acertando na estratégia. Nada como um dia após o outro. Mesmo largando com pneus médios, como a maioria do grid, a Ferrari deixou Leclerc e Sainz na pista quando veio o Safety Car, os colocando numa posição melhor dentro da corrida na relargada. Os dois ferraristas fizeram um bom trabalho com os pneus e pararam apenas uma vez, subindo para quarto (Leclerc) e quinto (Sainz) na bandeirada. Aleluia! Já Pérez foi um piloto sorumbático no domingo. A luta inglória que Checo tem que manter contra um gênio como Max Verstappen parece ter afetado definitivamente a confiança de Pérez, que com vários erros e exibições ridículas, simplesmente não consegue performar como em suas duas vitórias no começo desse ano. Para piorar, Checo já vê um Alonso em fase esplendorosa bastante próximo no campeonato.

Muitas vezes há injustiças na escolha do Piloto do dia promovida pela F1, com a torcida de determinado piloto acabando por influenciar a eleição. Não foi o caso em Montreal. Mesmo com a vitória histórica de Verstappen, o ‘melhor homem em campo’ foi mesmo Alexander Albon. O piloto da Williams se beneficiou do lotérico Q2 para largar entre os dez primeiros e na corrida Albon arriscou parar apenas uma vez e usando o pouco downforce que tem seu Williams, proporcionando uma boa velocidade final, Alexander segurou um enorme pelotão nas voltas finais para garantir ótimos pontos com um miraculoso sétimo lugar.  Ocon estava com a asa traseira balançando bastante e não foi capaz de ultrapassar um Albon inspirado, enquanto Norris, punido em 5s por andar lento demais durante o SC, perdeu a chance de pontuar, mas efetuou uma bonita manobra em cima de Bottas para, no fim, atacar Albon e Ocon, garantindo o entretenimento no final da corrida. Bottas fez sua melhor corrida em muito tempo, mas ainda assim o nórdico foi ultrapassado na bandeirada por Stroll. Mesmo conseguindo um ponto, Bottas ficou com um gosto agridoce na boca.

Destaque negativo para o péssimo ritmo de corrida da Haas e a bizarra luta por posição entre Kevin Magnussen e Nyck de Vries, que mais pareciam dois adolescentes querendo chamar atenção da garota bonita no trânsito, se fechando sem nenhuma razão ou noção.

Quando Michael Schumacher foi lembrado que tinha se igualado à Senna em número de vitórias em Monza, no já longínquo ano 2000, o sempre taciturno alemão se debulhou em surpreendentes lágrimas. Já Verstappen pareceu um pouco indiferente com a marca. Nascido em 1997, ou seja, depois da morte de Senna, Max Verstappen já tem um certo distanciamento do mítico brasileiro, algo que Schumacher não teve.

Verstappen pode ter empatado em vitórias com Senna e certamente o ultrapassará, mas nunca se igualará ao brasileiro. Senna foi único, assim como Fangio, Clark, Stewart, Lauda, Fittipaldi, Piquet, Prost, Schumacher, Alonso e Hamilton. Todos esses monstros sagrados estão num panteão do esporte em que Max Emilian Verstappen brevemente estará não apenas por causa dos números, mas por causa do enorme talento do neerlandês e sua pilotagem de excelência.

Abraços!

João Carlos Viana

JC Viana
JC Viana
Engenheiro Mecânico, vê corridas desde que se entende por gente. Escreve sobre F1 no tempo livre e torce pelo Ceará Sporting Club em tempo integral.

2 Comments

  1. Andre Xavier disse:

    Obrigado por mais essa excelente matéria. A corrida foi muito legal no meu ponto de vista, até porque o circuito Gilles Villeneuve é muito bonito e os muros pertinhos são uma atração a mais. Quando li “Se Pérez tivesse anteninhas de vinil, elas estariam detectando a presença de vários inimigos, loucos para tomar o lugar de Checo no próximo ano.” rachei de rir. E é verdade, a batata dele tá assando faz um tempo. Seria bom ver o que Ricardo consegue tirar dessa nave, ou, menos provável, uma recuperação mental do Perez pra deixar o campeonato mais agitado. Abraço!!

  2. Fernando Marques disse:

    J. C>. Viana,

    Acho que após a corrida do Canadá uma pergunta me parece pertinaz: será que o Checo tem um carro igual ao de Verstappen?
    Sei lá, eu pens que não … nem as Ferraris ele conseguiu superar nas pistas … sequer chegar perto do Russel, Alonso e Hamilton …

    Apesar do DSR a ultrapassagem de Alonso sobre Hamilton foi no capricho … show de tecnica do Alonso no ataque, show de técnica do Hamilton na defesa …

    Quanto ao Verstappen, alguém viu ele na corrida? … Supremacia que chega a ser covardia …

    Fernando Marques
    Niterói RJ

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