A importância de vencer em Mônaco

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Vencer em Mônaco é talvez a maior glória de um piloto de F1 depois do título mundial.

Por que Lewis ficou – aparentemente – tão incomodado com a perda da pole nesta última edição do GP de Mônaco? Bem, pode ser que seja guerra psicológica, como palpitou Prost, reconhecidamente um professor na matéria.

O relato da conferencia de imprensa pós-qualifying:

Q: Coming to you Lewis. Nico’s mistake, ironically, and the subsequent yellow flags meant that you couldn’t improve on your lap. Your feelings?

Lewis HAMILTON: Yeah, it is ironic. But it’s OK. I was up a couple tenths so it’s OK.”

Se ele estava dois décimos acima no início de sua última volta, e estava OK, por que toda essa tempestade depois? Também pode ser o gostinho de vencer em um dos fenômenos mais evidentes da atual F1.

O anacronismo da pista salta mais aos olhos a cada evolução tecnológica da categoria.

A mesma pista em que Nuvolari, Caracciola, Rosemeyer se batiam antes da guerra, com 600 HP em cima de pneus estreitos, sem guard-rail, sem capacete integral, serve a esta formula de híbridos turbinados, computadores e comunicação por rádio.

Perder a pole é perder a corrida? Não necessariamente.

Não deve ser à toa que Mônaco tem um dos mais importantes cassinos da Europa. Ele reúne dois dos elementos que costumam marcar presença no GP desse minúsculo país: elegância e surpresa.

Com frequência o GP apresenta resultados inesperados, com a vitória de azarões, ou quase vitórias, como foi o caso de Senna pilotando a Toleman.

E assim, fama. Ou mais fama para quem já tem.

Então vamos por em marcha nosso arqueólogo Indianapolis Jones e investigar uma dessas roletas automobilísticas.

Em 1972, Emerson, em grande forma e com a Lotus 72 impondo as vantagens de sua concepção inovadora, faz a pole.

A quem ele devia temer? Ickx, a bordo da Ferrari 312, largando a seu lado. Logo atrás dele, Regazzoni, com a outra Ferrari, sendo o último piloto a virar abaixo de 1’22. Ao lado do suíço, o francês Beltoise, com a BRM P160B, com 1’22”5.

Na terceira fila, Hulme e Stewart, rivais diretos pelo campeonato.

Curiosidades: Helmut Marko, com uma BRM P153, larga na nona fila, com 1’24”6. Duas filas atrás dele, Wilsinho Fittipaldi, com Brabham-Ford BT33, 1’25”2, e Lauda, com March-Ford 721X, 1’25”6. Pace fecha a penúltima fila, com March-Ford 711 da equipe Williams, 1’26”6.

Chove torrencialmente na hora da largada.

Epa, Ickx é considerado o maior especialista em chuva do grid! Stewart não fica atrás dele, tem aquela lendária vitória em Spa em seu ativo.

Largam e…. Beltoise toma a ponta.

Uma espécie de rio está rolando pelas ruas e vai continuar assim por toda a corrida.

A mistura de água com óleo torna a pista absolutamente venenosa.

Aqueles pneus enormes lançavam verdadeiros geysers, transformando a corrida de quem vinha atrás em um vôo cego.

Os retrovisores eram inúteis. E assim as ultrapassagens eram roleta, mas russa.

Metade dos 25 pilotos que largaram rodaram ao menos uma vez. Entre eles Hulme e Stewart.

Beltoise vence de ponta a ponta.

O único piloto a não tomar uma volta dele foi Ickx.

Emerson chega em terceiro, conquistando pontos preciosos para seu primeiro título, até porque Hulme não marca pontos.

Quem era Jean Pierre Beltoise até então?

Uma espécie de vice-Chris Amon. O segundo mais azarado.

Não lhe faltavam coragem, habilidade e classe.

Veio das motos, como Surtees, Mike “The Bike” Hailwood, onde tinha sido muito bem sucedido, assim como nas fórmulas de acesso, pilotando para a Matra.

Já tinha estado para vencer o GP da Espanha de 1968 e o da França de 70, sendo traído por um reles retentor de óleo no primeiro e um pneu furado no segundo.

Era considerado a maior esperança francesa depois da morte de Jean Behra e aposentadoria de Maurice Trintignant.

A mudança para a BRM não parecia ter sido feliz.

Embora 12 cilindros, o motor britânico não era páreo nem para os Cosworth V8, quanto mais para os 12 da Ferrari.

Os 12 cilindros tem menos torque que os V8 por isso aceleram mais suavemente, o que parece ter dado ao francês uma certa vantagem. Depois da corrida, ele disse que venceu exatamente porque seu motor era o menos potente dos três.

Ideal para essa pista e aquelas condições.

Foi sua única vitória na F1.

Mas até o primeiro título de Prost, a maior façanha de um piloto francês em décadas de F1.

Carlos Chiesa
Carlos Chiesa
Publicitário, criou campanhas para VW, Ford e Fiat. Ganhou inúmeros prêmios nessa atividade, inclusive 2 Grand Prix. Acompanha F1 desde os primeiros sucessos do Emerson Fittipaldi.

5 Comments

  1. wladimir duarte sales disse:

    Carlos Chiesa,
    Diante do que escrevi e das réplicas que recebi não tenho mais nada contra os méritos de Prost. Mas você está me dizendo que os franceses não tiveram nenhum momento significante de animação com Renê Arnoux (3º em 1983), Jacques Lafitte (4º em 1979, 1980 e 1981) e Didier Pironi (vice em 1982 devido ao acidente nos treinos de Hockeiheim e a um possível abalo psicológico pela morte de Gilles Villeneuve)? E nem mesmo a comprovada habilidade de Prost como acertador de carros ajudou a Renault a vencer na melhor oportunidade que teve durante a era turbo (1983)? Essa última eu respondo: num anuário de F1 referente à temporada de 1984 Prost disse que a Renault não respondia prontamente às suas sugestões sobre o acerto do carro. Diferente de quando ele voltou à McLaren já na era Ron Dennis: os engenheiros estavam em perfeita sintonia com ele e com Niki Lauda, tanto que as configurações eram feitas e refeitas imediatamente após os testes. Aguardo esclarecimentos quanto à primeira questão.

    • Carlos Chiesa disse:

      Respondo com todo prazer, Wladimir. Como disse, Beltoise foi a primeira esperança de campeão francês, após a morte de Behra e a aposentadoria de Trintignant. Ele e a Matra pareciam estar na bica de realizar o sonho duplo, pilotos e construtores. Daí a associação com a Tyrrell. Os resultados não foram bem os esperados e JP acabou indo pra BRM. Cevert foi o destaque seguinte, até sua morte. Depois vieram vários pilotos franceses, muito em decorrência dos programas de desenvolvimento, como o Volante Shell/Volante Elf. Sem dúvida eles tiveram grandes emoções depois da aposentadoria de JP, mas aquela vitória permaneceu simbólica, a meu ver, por ter sido obtida por um piloto com fama de azarado e uma equipe azarona. Ou seja, após a morte do Cevert, passou-se um bom tempo até que o sonho de ter um piloto campeão se tornou realidade. Estou falando de impacto e não de estatísticas. Assim como a primeira vitória do Emerson foi um tremendo impacto aqui no Brasil. Parecia impossível ter um piloto brasileiro disputando o campeonato de igual para igual com pilotos consagrados. Imagine se o primeiro campeonato dele tivesse demorado mais tempo para ser conquistado.

  2. Mauro Santana disse:

    Impressionante como a pista monegasca fez a alegria de muitos franceses, pois em 96 Oliver Panis conquistaria tanto para si como para a Ligier sua primeira e única vitória no principado.

    O que para o francês se tornaria sua única vitória na carreira, para a Ligier se tornaria a última na F1.

    Realmente Mônaco é especial e diferente de tudo.

    Abraço e boa semana a todos!

    Mauro Santana
    Curitiba-Pr

  3. Carlos Chiesa disse:

    Cevert começou um pouco depois dele. Eram cunhados e foi JP quem teve que dar
    a noticia da morte para a família. Sem duvida Cevert tornou-se uma esperança maior que ele, principalmente por estar na equipe certa no momento certo. JP apostou na Matra até onde deu. Sua primeira e última vitória também foi a última da BRM, portanto essa equipe não foi uma boa opção para ele. FC seria o substituto natural do Stewart mas infelizmente o destino interviu tragicamente. Certamente sua morte desanimou o JP e daí os franceses só foram se animar de verdade com o primeiro título de Prost. Lembre-se que os Renault Turbo bateram na trave e Alain teve que ser campeão pela McLaren.

  4. Fernando Marques disse:

    Será que Jean Pierre Betoise foi uma esperança maior que F. Cevert?

    Fernando Marques
    Niterói RJ

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