Início de uma dinastia?

Que venha 2023!
02/03/2023
O que eu acho da…
09/03/2023

Sempre que há uma mudança drástica nos regulamentos técnicos, há a expectativa de uma mexida no status quo da F1, contudo, normalmente acontece apenas de mudar de bastão quem está dominando a categoria. Foi assim de 1997 para 1998 e de 2013 para 2014. Se a F1 estava cansada de um forte domínio, na verdade teve que se acostumar com outro. Após um 2021 inesquecível, a F1 vivia expectativa de um novo regulamento que prometia mais equilíbrio para 2022, mas o que se viu foi a Mercedes, que dominou a F1 por oito anos, entregar o bastão para a Red Bull, que quebrou recordes com Max Verstappen.

Chegou 2023 e nos parcos três dias de testes pré-temporada, a Red Bull se mostrou tão ou mais forte do que no ano anterior. Ligou-se a luz vermelha, que nesse caso, não se trata do cabaré de Maria Boa em Natal, como diria o mítico Francisco Diá. A F1 teria um novo domínio? A apertada classificação no sábado deu esperanças aos fãs, mas no domingo Red Bull e Max Verstappen acabaram com toda a brincadeira, com uma vitória daquelas que somente uma hecatombe histórica pode tirar o tricampeonato do neerlandês.

Como falado na coluna anterior, sobre os testes da F1 de 2023, escrito de forma fenomenal (como sempre) pelo Flaviz Guerra, não se podia esperar que o domínio da Red Bull evaporasse, ainda mais com mudanças apenas pontuais no regulamento, porém, algumas respostas que ficaram no ar após a mini-pré-temporada da semana passada, onde os pilotos tiveram meros 1,5 dia de pista em média antes de estrearem no campeonato, foram de certa forma respondidas.

Se em ritmo de classificação a Red Bull ainda vê as rivais de perto, em ritmo de corrida é pura covardia, com os carros austríacos muito na frente do trio Ferrari, Mercedes e Aston Martin. Sim, a equipe capitaneada por Lawrence Stroll entrou na parada para tentar impedir uma temporada ainda mais esmagadora da Red Bull em 2023. Porém, o time verde terá que encarar a guerra de desenvolvimento, algo que não está acostumada e mesmo a Ferrari, com tanta tradição nas costas, não conseguiu acompanhar a Red Bull e ainda se viu alcançada pela Mercedes em 2022.

Contudo, ver Fernando Alonso em posições mais dignas para um multi-campeão como ele dá um ótimo tempero para esse campeonato, que já parece ter o campeão definido após apenas 4,34% do certame realizado.

Sendo bem sincero, não foi uma corrida de encher os olhos, principalmente na ponta do pelotão. As brigas que houveram foi sempre do segundo lugar para trás, com mais ênfase no meio do pelotão. A Red Bull estapeou a concorrência!

Na realidade, o único percalço sofrido pela Red Bull nesse domingo em Sakhir ocorreu na largada, quando Sérgio Pérez saiu mal, foi atacado por Leclerc e os dois quase levaram Carlos Sainz à roldão no aproche da primeira curva. Por sorte, não houve um único toque sequer, mas Leclerc, que guardou um jogo de pneus macios novos no sábado, superou Pérez, que tentou aqui e ali, mas rapidamente o chicano percebeu que não valeria a pena arriscar uma ultrapassagem naquele momento. Um dos indicadores da pré-temporada foi que a Ferrari tinha sérios problemas de desgaste de pneus, tanto que Leclerc preferiu nem tentar a pole no sábado. Porém, se Charles se aproveitou da tática na largada, durante o primeiro stint de nada serviu para o monegasco, pois ele não conseguiu ir para cima de Max. O neerlandês simplesmente não deu uma chance sequer a ninguém no começo da noite barenita. Certa vez perguntaram à Max se ele ficaria incomodado em dominar uma temporada de F1, no que Verstappen disse que não teria qualquer problema. E Verstappen vem mostrando isso na prática. Ele simplesmente ignorou seus adversários, raramente ficando menos de 10s de frente para quem quer que fosse o segundo colocado. Na primeira rodada de paradas, a Red Bull optou em calçar seus pilotos com pneus macios e foi assim que Pérez atacou Leclerc para conseguir a segunda posição e disparar. Havia o risco de algum Safety-Car estragar a festa austríaca, mas o SC virtual veio justamente por causa de Leclerc, que abandonou com o motor quebrado, enquanto nos boxes Piero Lardi Ferrari quase comia seu fone. A vitória da Red Bull ficava ainda mais fácil, com Max e Checo completando uma fácil dobradinha na frente.

Com a quebra de Leclerc, a briga pela terceira posição ficou bem animada e nela constava um Alonso inspirado, que usou até da malandragem de sua equipe para ter vantagem. A Aston Martin se preparou para a entrada de Stroll, mas como ninguém sabia se era o canadense a entrar, a Mercedes resolveu trazer Hamilton, que entrou nos boxes reclamando que os pneus estavam bons. ‘Podemos levar um undercut de Alonso’, respondeu Bono em sua voz inconfundível. Pena que a transmissão não mostrou a cara de Toto Wolff quando quem entrou nos pits foi Stroll, enquanto Alonso ficou na pista algumas voltas que se mostraram essenciais. Com todo mundo preferindo os pneus duros, Alonso tinha a vantagem de ter pneus mais frescos nas voltas finais e saiu à caça de Hamilton, numa luta emocionante, que acabou vencida pelo espanhol, isso depois de Fernando já ter dado um baile em Russell mais cedo na prova. Se não bastasse esse handicap, Alonso viu Sainz ter os pneus se desmanchando, provando que a Ferrari tem mais voracidade por borracha italiana que um moleque esgalamido após passar a tarde brincando. Alonso rapidamente encostou no compatriota, que se diga de passagem, fez uma corrida bem mequetrefe, bem distante do seu companheiro de equipe Leclerc. Sainz tentou resistir, mas quem poderia resistir a magia de Alonso? O bicampeão ultrapassou Sainz rumo a um comemorado pódio, além de lembrar de parabenizar Stroll por ter finalizado a corrida, mesmo o canadense tendo se quebrado inteiro numa queda de bicicleta na quinzena anterior. Alonso mostrou que sua magia permanece e que a Aston Martin virá muito forte para 2023, muito impulsionada pela energia de Alonso.

As cenas pós-corrida dos mecânicos da Aston Martin demonstram bem o impacto que Alonso trouxe ao time nesse momento. Com a Red Bull muito na frente, Alonso pode repetir o que Nelson Piquet fez em 1990, quando ficou em terceiro no Mundial de Pilotos, na frente de pilotos mais bem equipados do que ele, mas Nelson simplesmente esteve inspirado. Como Alonso nesse domingo.

Hamilton fez uma boa largada e namorou com o pódio, mas após ser ultrapassado por Alonso, não soube ultrapassar um ‘descalço’ Sainz nas voltas finais, tendo que se conformar com a quinta posição. Foi nítido a diferença entre Alonso e Hamilton no planejamento de ultrapassagem. Mais acostumado às brigas no meio do pelotão, Alonso tinha sempre um truque para derrotar seus adversários. Já Hamilton passou boa parte da última década contando com o melhor carro do pelotão e não esperava muito para ultrapassar alguém. O inglês simplesmente usava a força de sua máquina para superar seu adversário. Sem ter o melhor carro e por consequência sem poder usar a força bruta para atropelar os rivais, Hamilton não soube ultrapassar Sainz.

Russell lutou bastante na prova, mas foi ainda mais atrapalhado pela galhofa da Mercedes no meio da corrida e ao parar mais tarde do que Stroll, acabou ultrapassado pelo canadense, que mesmo tendo dificuldades em correr pelos machucados, ainda pôde marcar alguns pontinhos pela equipe e segurar Russell.

Como esperado, a briga no meio do pelotão foi acirrada e cheia de protagonistas. Bottas foi o melhor do resto, com o nórdico da Alfa Romeo tendo feito uma corrida sólida, onde sua estratégia no primeiro stint o colocou à frente de Mercedes e Aston Martin por um breve momento. Se ano passado Zhou conseguiu acompanhar o já veterano Bottas, dessa vez o chinês mal apareceu na TV e ficou fora da zona de pontos. Após uma classificação terrível, Pierre Gasly se recuperou no domingo e numa prova muito boa, levou à Alpine aos pontos, sendo que o francês foi o piloto que mais ganhou posições no domingo. Totalmente o inverso aconteceu com Ocon, que fez uma corrida completamente mal-ajambrada, onde foi tantas vezes punido, que parecia que o francês seria um novato.

E falando em novatos, esse ano temos três novatos e o melhor da corrida foi o americano Logan Sargeant, que chegou a flertar com os pontos e andou próximo de Alexander Albon, que fechou a zona de pontuação, tendo que segurar Tsunoda nas voltas derradeiras. O companheiro de equipe Tsunoda, De Vries, mal apareceu na transmissão e não lutou para estar na zona de pontos, mas os prospectos da Alha Tauri eram bem sombrios, assim como a Williams, e hoje as duas escuderias brigaram pelo último pontinho, o mesmo não acontecendo com a Haas, que colocou Hulkenberg no Q3 no sábado, e a grande decepção desse início de ano, a McLaren. Oscar Piastri foi o primeiro abandono do dia quando seu carro travou como um Google Chrome que o patrocina. Já Norris ocupou boa parte da prova a última posição, onde terminou, com um problema de pressão que tornou suas paradas mais longas, além da McLaren não ter tratado tão bem os pneus.

Para completar o dia da McLaren, Pato O’Ward liderava a corrida em St Petersburg, na abertura da Indy e poderia salvar o dia da McLaren. Zak Brown deve ter ficado todo animado com as últimas voltas do seu pupilo liderando, mesmo com a dupla da Ganassi se aproximando perigosamente. Porém, na abertura da penúltima volta, O’Ward abanou seu McLaren na entrada da reta dos boxes e Ericsson ultrapassou graciosamente Pato. Depois da corrida O’Ward, com cara de pouquíssimos amigos, acusou um ligeiro problema no motor, que entrou no modo errado e permitiu a ultrapassagem decisiva de Ericsson.

Como diria outro: Que fase da McLaren!

A Red Bull começou o ano mostrando que 2022 ainda não acabou para ela e tende a dominar mais uma vez a F1, com Max Verstappen mais inspirado do que nunca, rumo ao tricampeonato. Checo Pérez completou a primeira do que pode ser várias dobradinhas nesse ano. Mesmo sem forçar, a Red Bull enfiou 40s em Alonso e a Ferrari voltou a ser assombrada por velhos fantasmas, com a confiabilidade do carro vermelho ainda não sendo um ponto forte. A Mercedes sofre com um conceito único (zeropod), mas que sem testes, não consegue destravar mais do potencial do carro e por isso já se fala num conceito menos radical e mais fácil de lidar a partir da Espanha.

Até lá, corre o risco de a Red Bull e Max Verstappen já terem uma gap tão grande, que mesmo Aston Martin conseguindo desenvolver seu carro, a Ferrari melhorar a confiabilidade e o desgaste dos pneus e a Mercedes conserte seu conceito, nem faça tanta diferença assim. Mesmo com as punições pelo teto orçamentário podendo atrapalhar o desenvolvimento do carro desse ano (e o de 2024), hoje a Red Bull tem uma diferença tão abissal para as demais, que já se pergunta: a Red Bull já dominou ano passado e Max vem de dois títulos, estamos vendo o surgimento de uma nova dinastia na F1?

Abraços!

João Carlos Viana

JC Viana
JC Viana
Engenheiro Mecânico, vê corridas desde que se entende por gente. Escreve sobre F1 no tempo livre e torce pelo Ceará Sporting Club em tempo integral.

1 Comments

  1. Fernando Marques disse:

    JC

    Estou com George Russel. Se a RBR deixar Verstappen ganha as 23 corridas da temporada. E dane se Sérgio Peres

    Fernando Marques
    Niterói RJ
    I

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *