Max Gigantesco

Colin Chapman está vivo*
01/04/2025
Memórias são boas, e as vezes não a do piloto que vence
11/04/2025

Vinte e sete anos atrás, a McLaren iniciou a temporada, a primeira com Adrian Newey como projetista chefe, com uma diferença abismal para as demais equipes e foram duas dobradinhas nas duas primeiras provas. Conta-se que Ron Dennis, então chefe de equipe, estava tão confiante que apostou que conquistaria o 100% que havia escapado por tão pouco dez anos antes. Porém, na terceira corrida da temporada 1998, um gênio acabou com a banca da McLaren e de Ron Dennis. Na Argentina, Michael Schumacher aproveitou-se das características do circuito portenho e o clima instável para derrotar David Coulthard (com uma ultrapassagem bem agressiva) e Mika Hakkinen para vencer pela primeira vez no ano. O que parecia ser um passeio da McLaren, acabou sendo uma disputa renhida, só decidida na última corrida do ano a favor de Hakkinen.

Zak Brown não fez nenhuma aposta de que venceria todas as corridas em 2025, mas todos sabem que a McLaren tem o melhor carro do pelotão e vinha de duas vitórias, com direito a uma dobradinha. Como em 1998, um gênio acabou com a invencibilidade da McLaren, mas se Schumacher só mostrou suas armas no domingo, Max Verstappen o fez ainda no sábado, com uma volta antológica na classificação que lhe deu a pole e a vantagem necessária para derrotar a dupla da McLaren numa corrida enfadonha em Suzuka.

Falo com bastante pesar, mas conta-se nos dedos de uma mão as corridas de F1 realmente boas em Suzuka nos últimos vinte anos em piso seco, já tirando da equação a geração atual dos carros como culpado pela dificuldade de se ultrapassar em Suzuka. Mesmo sendo uma pista para pilotos, os próprios artistas do espetáculo falaram em sua grande maioria neste domingo que a corrida fora chata.

Contudo, não se pode imaginar o calendário da F1 sem a magia de Suzuka!

O final de semana nipônico começou com todos os olhos em cima de Yuki Tsunoda e o motivo não era porque o japonês corria em casa. A Red Bull esperou apenas duas corridas para mandar Liam Lawson de volta à Racing Bulls e trazer Yuki Tsunoda como novo companheiro de equipe de Max Verstappen, que por sinal não gostou nada da troca. O motivo é muito simples. O neerlandês sabe que o problema da equipe não são os pilotos, mas é que o carro tem uma janela de utilização tão estreita, que apenas um piloto do calibre de Max é capaz de tirar algum desempenho de forma constante do Red Bull. Ou seja, trocar pilotos é apenas uma cortina de fumaça frente a um problema mais sério de concepção do Red Bull RB21.

E falando em troca de pilotos, Jack Doohan deu mais razão para que seu lugar na Alpine esteja ainda mais à perigo. O australiano não participou do primeiro treino livre, mas logo na primeira volta rápida do TL2, Doohan bateu forte na curva um de Suzuka. A Alpine não teve pudor em apontar o dedo para o australiano, num erro banal de não desativar o DRS na rápida curva um. Enquanto treinava no simulador, Doohan teria conseguido fazer a curva com o DRS ativado, enchendo o filho de Mick Doohan de confiança para fazer o mesmo na vida real. Enquanto isso, Franco Colapinto apenas sorri do lado de fora, enquanto aguardar a sua vez.

Piastri e Norris dominaram os treinos livres e as duas primeiras partes da classificação, mas ninguém contava com um inspirado Max Verstappen. Vindo de três poles consecutivas em Suzuka, Max conseguiu uma volta no Q3 simplesmente antológica, derrotando a lógica e ficando com uma pole assombrosa. Análises de telemetria mostram um Max Verstappen usando os freios de forma magistral na chicane, ganhando um décimo somente ali, lembrando que Norris e Piastri ficaram menos de um décimo atrás de Verstappen. Para piorar, Piastri ainda errou em sua volta no primeiro setor.

Num circuito de ultrapassagens complicadas como Suzuka, a pole de Max Verstappen faria toda a diferença.

Como ocorre em Mônaco, a corrida em Suzuka desse domingo foi decidida basicamente na classificação. A volta sensacional de Max Verstappen o deixou em situação privilegiada, mesmo com o notório ritmo superior da McLaren. Com ar limpo, Max poderia administrar melhor os pneus e se defender dos ataques que certamente viriam da dupla da McLaren. A esperada chuva veio cedo demais e os pilotos não titubearam em largar com pneus slicks, mesmo com alguns pontos úmidos no asfalto.

Na largada, foi interessante ver como Max e Lando posicionaram seus carros apontando um para o outro, o que prometia uma largada agressiva, mas assim como a chuva, isso não apareceu e Max não teve muito trabalho para se manter na ponta, seguido por Norris e Piastri. Russell tentou ataques em cima de Leclerc, mas o representante da Ferrari se defendeu muito bem e não deu chances para o britânico, enquanto Antonelli e Hadjar não se intimidaram com Hamilton, com idade para ser pai deles (principalmente do italiano), e mantiveram suas posições na frente do inglês da Ferrari. Largando com pneus duros ao lado de pilotos com compostos mais macios, Bortoleto foi quem mais perdeu posições, caindo para último. E foi assim que se iniciou a procissão nipônica.

Conseguindo seu objetivo inicial de ter o ar limpo como aliado, Max Verstappen tratou de conseguir mais uma pequena vitória contra as McLarens, que era abrir mais de 1s, não dando chance à Norris usar o DRS, pouco efetivo em Suzuka, mas ainda de grande valia. Ainda na segunda volta o piloto da Red Bull amealhou mais essa vitória e não deu mais chances a Norris. Foi uma corrida estática, mas houveram momentos de tensão entre os líderes.

Se a diferença entre Max e Lando não baixou de 1s, também não foi superior a 2s, tornando essa vitória de Max ainda mais especial, pois nunca é fácil ter um piloto com um carro superior lhe fustigando a corrida inteira. Verstappen não poderia errar. E ele não errou! Na única rodada de pit-stops, Norris se aproximou perigosamente de Max na entrada do pit-lane e uma parada não perfeita da Red Bull expos mais uma vez a inocência de Lando Norris. Os dois líderes saíram lado a lado da saída dos boxes e Max simplesmente deixou seu carro na linha normal. Em nenhum lugar da face da Terra Max daria espaço, que por sinal não existia, para um rival direto, mas Lando Norris se manteve lado a lado e quando a pista acabou, o inglês passeou na grama, perdendo um tempo precioso. Lando esperneou pelo rádio, mas Max não fez nada demais, tanto que a FIA concordou e o baile seguiu. Bastava Norris tirar ligeiramente o pé, ficar colado em Verstappen na saída dos pits e usar o ritmo superior da McLaren para tentar completar uma ultrapassagem, pois com pneus duros, a McLaren tinha um ritmo melhor do que a Red Bull. Lando Norris declarou novamente que quer ser campeão sem ser um babaca. Esse tipo de atitude pode não o fazer um babaca, mas poderá não o tornar campeão.

O aniversariante Piastri via tudo isso placidamente, mas no segundo stint parecia ser o mais rápido dos três, chegando a esboçar ataques em cima do seu companheiro de equipe. O australiano chegou a vocalizar isso via rádio, esperando um presente de aniversário da equipe com uma troca de posições, mas as contas da McLaren eram simples. Com Norris em segundo, ele mantinha a liderança do campeonato por apenas um ponto à frente de Verstappen. Como não havia garantias de uma ultrapassagem de Piastri sobre um inspirado Verstappen, Andrea Stella e seus papaias caps preferiram manter a coisa como estava até a bandeirada. Mesmo que na última volta Lando quase entregava o presente a Oscar ao sair da pista na chicane.

Vitória categórica de Max Verstappen, daquelas conquistadas no braço numa pista que nitidamente evidencia quem pode fazer a diferença. Como falou Alonso após a volta da pole de Max, somente o neerlandês parece ser capaz de fazer voltas como a de sábado hoje em dia.

Tsunoda teve uma estreia discreta na Red Bull, limitado pela má volta no Q2 que o relegou a décima quarta posição do grid e Yuki acabou ficando de fora dos pontos, mas a torcida japonesa não quis nem saber e votou Yuki como o piloto do dia. Essa eleição ficou avacalhada…

A McLaren saiu com um sabor amargo de uma derrota para um piloto que, mesmo excepcional, tinha claramente um carro pior. Norris e Piastri saíram dos seus carros com caras de poucos amigos, pois sabem que não poderá vacilar no resto da temporada, pois Max estará prontinho para capitalizar o menor dos erros dos pilotos da McLaren.

Leclerc terminou num distante quarto lugar, onde seu único trabalho foi controlar Russell, que terminou num decepcionante quinto lugar, abaixo da expectativa pelo o que George vinha fazendo nos treinos livres. Antonelli fez uma bela corrida, liderou pela primeira vez uma prova de F1, se tornando o mais jovem na história de 75 anos da categoria, e com pneus duros no segundo stint, era o piloto mais rápido da pista, chegando a encostar em Russell no final. Antonelli se mostra um enorme potencial, farejado por Toto Wolff. Hamilton se livrou facilmente do seu fã Hadjar ainda no começo da corrida, mas depois disso o inglês pouco fez, terminando a prova num obscuro sétimo lugar, só ficando à frente de Tsunoda entre as quatro equipes grandes da atualidade. Um início nada auspicioso para Hamilton na Ferrari.

Numa prova sem abandonos e apenas Tsunoda tendo problemas (na classificação) das equipes grandes, restaram apenas três posições de pontos para as equipes do pelotão intermediário. Sem maiores dramas estratégicos, Hadjar levou seu Racing Bulls facilmente aos pontos, mostrando que o francês tem velocidade e pode ser uma das surpresas do ano. O retorno forçado de Lawson à Racing Bulls deixou bastante a desejar. O neozelandês foi rapidamente ultrapassado por Tsunoda e viu não apenas que o nipônico fez um trabalho melhor do que o seu com o carro da Red Bull, como também Liam ficou abaixo de Yuki na comparação com o carro da Racing Bulls. Lawson ficou longe do novato Hadjar e também dos pontos. O rebaixamento pode ter causado um estrago definitivo na confiança de Lawson.

Albon continua sua temporada sólida com a Williams, mesmo com várias reclamações via rádio, marcando mais pontos e superando com folga seu badalado companheiro de equipe. Sainz esteve bem mal na corrida, saindo várias vezes da pista na chicane e ficando bem longe dos pontos. Por fim, Bearman garantiu o último ponto para a Haas, fazendo uma boa corrida depois da largada decente que fez, além de superar com alguma folga o experiente Ocon, metido em brigas nas últimas posições.

Alonso ficou a prova inteira na P11, segurando os ataques de Gasly no primeiro stint e de Tsunoda no segundo, mas ficando longe de Bearman, fazendo com que o espanhol continuasse zerado no campeonato. Numa pista onde o piloto faz muita diferença, não foi surpresa Stroll ficar em último e sendo o único a tomar volta, numa prova sem nenhuma intempérie. Gasly tentou um ataque duro em Alonso na primeira volta, mas foi rechaçado e depois de um pit-stop ruim, acabou superado por Tsunoda e teve ajuda de Doohan para manter a frente dos demais do pelotão intermediário. A Sauber tinha o pior ritmo da corrida, mas bastante próxima dos rivais. Hulkenberg e Bortoleto andaram no bolo do pelotão intermediário, contudo, numa corrida sem intervenções externas, nem puderam sonhar com os pontos.

Não foi uma corrida emocionante e se não fosse a tensão das últimas voltas, com os três primeiros colocados andando juntos, o Grande Prêmio do Japão de 2025 seria um belo sonífero nessa madrugada. Para quem aprecia uma bela pilotagem, foi bonito de ver Max Verstappen vencer uma prova no braço, não tendo o melhor carro e se defendendo da superior McLaren usando um ritmo fortíssimo e sem direito a errar. E Max fez isso de forma gigantesca!

A McLaren pode ter o melhor carro, mas Suzuka provou que é impossível descartar Max Verstappen no rol dos favoritos ao título da temporada 2025.

Abraços!

João Carlos Viana

 

JC Viana
JC Viana
Engenheiro Mecânico, vê corridas desde que se entende por gente. Escreve sobre F1 no tempo livre e torce pelo Ceará Sporting Club em tempo integral.

2 Comments

  1. Rubergil Jr disse:

    Cara, eu fiquei impressionado com o paralelo histórico entre esta prova do Japão 2025 e Hungrria 1991.

    Em ambos os casos, um piloto genial fez a pole “no braço” em cima da dupla de pilotos que tinha o melhor carro. E na corrida, o piloto genial segurou “na marra” a dupla mais forte – e claro, aproveitando o circuito desfavorável a ultrapassagens.

    A unica diferença entre estas corridas é o momento do campeonato. Se aquela corrida (há quase 34 anos!!) foi vital para o tri de Senna, num campeonato com ainda mais de 20 provas por acontecer essa corrida de Suzuka pouco peso tem na decisão final. Mas psicologicamente o impacto foi tão grande quanto.

    Abraços!

  2. Fernando Marques disse:

    J. C. Viana,

    Eu gosto do traçado de Suzuka … considero uma pista peculiar até pelo fato de ser uma das maiores com mais de 6 km para completar uma volta ( espero não estar enganado) … mas corrida deste fim de semana se comparada com a anterior (China) não foi chata … foi chata demais da conta pra meu gosto … salvo obvio a bela tocada do Verstappen disparado o melhor piloto do grid … o desempenho da McLaren foi até certo ponto decepcionante e se poderíamos ter alguma emoção na corrida era ela com Norris que poderiam dar mas ficaram devendo … talvez o fato da temporada ser longa (24 etapas) pode ter sido o principal fator para tal falta de atitude da equipe no decorrer da corrida, afinal eles têm o melhor carro do grid …
    E pra terminar a Sauber mais uma vez foi uma draga … até na estratégia que propuseram ao Bortoleto … chegar na frente do Stroll não é nenhum motivo para estar satisfeito e orgulhoso com o desempenho que na verdade foi pífio e triste de se ver …

    Fernando Marques
    Niterói RJ

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *