Moco e Os Mamonas

Ciclos
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A contribuição de Pace
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Dois ícones, de duas áreas distintas, com trajetórias parecidas e finais idênticos.

Há exatos 16 anos, no dia 2 de março de 1996, Dinho, Bento Hinoto, Sérgio Reoli, Samuel Reoli e Julio Rasec – os integrantes do grupo “Mamonas Assassinas” – faleciam após um acidente aéreo na Serra da Cantareira, próxima a São Paulo. 19 anos antes, no mesmo março (dia 18), José Carlos Pace, o Moco, falecia também após um acidente aéreo no mesmo local.

Mais do que mencionar as datas e essa triste coincidência, Moco e os Mamonas merecem ser relembrados sempre pois, cada um à sua maneira, ambos foram ícones de suas áreas e marcaram gerações de fãs que até hoje cultivam suas memórias.

Os integrantes da banda eram também vidrados em carros: o maior hit falava na clássica “Brasília Amarela”; o vocalista Dinho chegou a revelar em entrevista que ficou trancado no quarto por duas semanas após a morte de Ayrton Senna; e o cd do grupo emula o símbolo da Volkswagen.

Quando morreram, tinham em média 25 anos, e tiveram uma carreira demasiado curta: foram apenas 7 meses entre o lançamento do disco e a morte dos integrantes. Mesmo assim, o álbum figura até hoje entre os 10 mais vendidos de todos os tempos – e a marca de 1 milhão de cópias foi ultrapassada em apenas um mês.

Moco morreu aos 32 anos (mesma idade de Jim Clark, e com os mesmos 72 GPs do “escocês voador”) quando muitos acreditavam que ele poderia ser o novo brasileiro campeão mundial, numa época em que Emerson Fittipaldi abraçava o projeto de sua equipe e deixaria de vencer na categoria máxima do automobilismo.

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Pessoalmente, tenho em minha família a paixão pela música da mesma forma que o automobilismo e o futebol nos cativaram a todos. Assim, essa coluna é, antes de tudo, o relato de alguém apaixonado pelos Mamonas e pela Música brasileira (e pelo rock, também) e pelo personagem Pace e a Fórmula 1.

Não vi Pace correr, mas ler sobre ele e ouvir o relato de pessoas que o viram me traz aos dias em que eu vi os Mamonas na TV.

Eu sei que muita gente considera o grupo de Guarulhos como o início da derrocada da qualidade na música do Brasil – ou então “os precursores de Michéis Telós” – e que na época muitos os odiavam, mas eu os curti muito na minha pré-adolescência e até hoje consigo escutá-los.

O real valor dos Mamonas foi justamente o contrário do que acontece hoje em dia: eles tinham talento, muito talento (Dinho era extremamente performático, e só quem viu Bento Hinoto à guitarra sabe que se tratava de um ex-futuro mestre do instrumento), mas decidiram produzir um disco totalmente escrachado em que cada faixa fazia paródia ou alusão a um ritmo que era sucesso vigente: ali, vamos do Heavy Metal (“Débil Metal”) ao pagode (“Lá Vem o Alemão“), passando por Roberto Leal (“Vira-vira“) e Genival Lacerda (“Jumento Celestino“).

Alinho os Mamonas a algo mais próximo do que a Tropicália foi do que a qualquer semelhança que críticos queiram apontar a, sei lá, “É o Tchan” ou até mesmo grupos de funk carioca.

Os caras apareciam direto na TV, no Gugu ou Faustão? Sim, mas com certeza aquilo foi um desafio para os apresentadores e suas emissoras, pois os anfitriões nunca foram esculachados pelos convidados. Sempre o contrário.

E então vem a morte. Trágica. Só temos teorias: por quanto tempo eles poderiam permanecer naquele estilo musical? O próximo disco atingiria o mesmo sucesso do primeiro? Eles teriam sumido de uma vez por todas? Perguntas sem resposta. Podemos nos alinhar a quem diz que eles seriam “nada”, ou então acreditar que seriam um dos artistas mais bem-sucedidos de sempre. Ou então que virariam uma espécie de Titãs, Paralamas, etc.

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E José Carlos Pace? Ontem mesmo publicamos em nossa página do Facebook uma nota relativa ao GP da África do Sul de 1975, corrida onde Moco marcou sua primeira e última pole na F-1. Além da pole, foram 6 pódios, 5 voltas mais rápidas, e uma solitária vitória, justamente a primeira dobradinha de pilotos brasileiros na história.

Sua melhor temporada foi justamente a de 75, quando terminou na 6ª colocação e  a pole e a vitória vieram, no mesmo ano em que Fittipaldi conquistou outro vice-campeonato e algumas vitórias. Em 1976, um ano difícil, com apenas 7 pontos marcados e a 14ª colocação geral. Mas o suficiente para ter sido o melhor brasileiro.

1977 começou na expectativa do desempenho de Pace, uma vez que seria o único brasileiro com chances (Fittipaldi em sua Copersucar, e outros compatriotas procurando seu lugar ao sol) de almejar quaisquer conquistas.

A primeira prova do ano trouxe alguma esperança: a segunda colocação no GP da Argentina, também com a segunda melhor volta, deu a impressão de que o ano poderia ser promissor. O GP do Brasil seria um tanto frustrante, ainda que a segunda posição no grid da África do Sul foi um feito notável. O abandono marcou a última corrida de Pace na F1. 13 dias depois ele estaria morto.

Até hoje há quem diga que Pace poderia ter sido campeão da F1, o que não parece condizer com a realidade, por conta das condições das suas equipes e da feroz concorrência que iria enfrentar no fim dos anos 70 e início dos 80. Só que isso não diminui seu valor em nenhum momento, pelo contrário.

Pace foi vencedor por onde passou, um ídolo do automobilismo, um apaixonado, um piloto extremamente talentoso e que além de tudo era muito carismático. Foi um dos pilotos mais queridos no Brasil, abaixo talvez somente de Ayrton Senna. E isso não é pouco.

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Moco, acima de tudo, amava correr. Como os Mamonas amavam a música. E por isso quem viveu nas referidas épocas continua com uma legítima nostalgia ao mencioná-los. Mesmo sem saber o que eles teriam sido, pois vale mesmo o que eles foram.

Os dois fazem muita falta ao Brasil, e por aqui não se tem mais nada parecido com eles hoje em dia. Nem em programas de TV, muito menos na F1.

Só quem viveu sabe!

Bom fim-de-semana a todos.

Marcel Pilatti
Marcel Pilatti
Chegou a cursar jornalismo, mas é formado em Letras. Sua primeira lembrança na F1 é o GP do Japão de 1990.

5 Comments

  1. Ronaldo disse:

    Boa análise; entretanto, não posso deixar de lembrar Bernie Ecclestone, então diretor da Brabham, que afirmou que se Pace tivesse sobrevivido, ele não teria precisado de Niki Lauda. Se é verdade, o nível de comparação o creditaria como possível campeão.

  2. Tabajara Aparecido Jorge disse:

    Sensacional história. O Moco era o novo herói que estava chegando na área, as corridas estavam ficando cada vez mais interessantes. Uma pena ele ter partido.

  3. Becsom Salles disse:

    Faltou ao Moco a sorte de campeão, pois talento e velocidade ele tinha. Interessante é que o que faltou ao Pace sobrou durante toda a carreira do Emerson Fittipaldi. Dificil compará-los, dizer qual era melhor, mas uma coisa é certa, Moco tinha um estilo de pilotagem mais inspirado e arrojado do que o do Emerson.
    Quem quiser saber mais sobre a carreira e vida deste grande piloto brasileiro é só acessar o site: http://www.autoclassic.com.br/autoclassic2/?p=13224

    Becsom Salles de Carvalho
    Belo Horizonte MG.

  4. Rogerio Kezerle disse:

    Tive a imensuravel honra de estar em Interlagos e presenciar a vitoria de Moco.
    Infelizmente ele não teve a sorte de correr em uma equipe de ponta e coroar o seu talento com um titulo. Um piloto fantastico.
    Quanto aos Mamonas, ele eram talentosos sim e as musicas, apesar de todo o escracho, eram bem feitas e muito bem tocadas. Por que musica não pode ser engraçada? Onde eles chegariam nunca saberemos, mas desprezar o talento dos garotos é muita sacanagem. O brasileiro parece que anda ficando mal humorado,
    O bom humor sempre foi uma caracteristica dos brasileiros.
    Ele aceita todo tipo de palhaçada na politica e quer criticar musicos que fazem palhaçadas?????

  5. Fernando Marques disse:

    O que faltou ao Moco para ser campeão? Digo que faltou a mesma estrutura que Emerson teve quando chegou na Formula 1. O Emerson debutou numa equipe de ponta, no caso a Lotus e ainda teve a sorte de ter um dos carros mais vencedores da cateria, no caso o Lotus 72 … Já o Moco debutou numa Surtees que sofria para se classificar no grid e dificilmente chegava ao fim de uma corrida … só depois de 2 anos na categoria conseguiu ter um carro a altura de seu talento (no caso a Brabham) … a meu ver tambem creio que o sucesso do Emerson atrapalhou a sua carreira. Os europeus (leia-se ingleses) certamente usaram de preconceitos e artificios para brecar uma possivel hegemonia sul americana na categoria. Sim pois alem do Pace o argentino Carlos Reutman despontava como um top driver.
    A vitoria que mais vibrei na minha vida foi exatemente a do Jose Carlos PAce em 75 no Brasil. Adorava o Emerson mas era fã mesmo do PAce. Uma outra coincidencia me fazia ser mais fã dele. Comemorávamos aniversario no mesmo dia (6 de outubro). A morte dele foi uma baque para mim na epoca. O melhor piloto que vi na Formula 1 para mim foi o Nelson Piquet. Por que ele tinha o lado estrategico e paciencia do Emerson e a rapidez e impetuiosidade do Moco. Uma mistura bem perfeita.
    Com relação aos Mamonas, os caras foram bons e divertidos. Mas por ser um fiel roqueiro de bandas inglesas e americanas do anos 70 (até hoje eu sou) jamais gostei do estilo deles.

    Fernando MArques
    Niterói RJ

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