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Mais do que datas, me ligo a temporadas. E não poderia atravessar o ano de 2011 sem dedicar ao menos uma coluna a dois momentos muito especiais de nossa história automobilística: o primeiro título do Piquet, em 1981, e o último de Senna, em 1991.

Ao contrário de boa parte de meus colegas de site, eu não sou muito afeito a datas. Preocupo-me mais em guardar de cabeça os aniversários dos amigos, do que lembrar qual piloto venceu qual corrida em qual dia. Mas, em contrapartida, me ligo bastante a anos e temporadas. E, sob este aspecto, não poderia atravessar o ano de 2011 sem dedicar ao menos uma coluna a dois momentos muito especiais de nossa história automobilística, que fazem aniversários “redondos” este ano: o primeiro título do Piquet, em 1981, e o último de Senna, em 1991.

Certamente cada uma destas conquistas mereceria não apenas uma coluna, mas um livro exclusivo. No entanto, é de propósito que escolho falar dos dois ao mesmo tempo. Afinal, estes dois títulos marcam o início e o fim de um incrível período de dominação brasileira nas pistas do mundo. Além disso, Senna e Piquet sempre fizeram de tudo para estarem afastados um do outro, eventualmente dando início a uma rivalidade muitas vezes apaixonada entre seus respectivos fãs. Eu, no entanto, sou admirador assumido dos dois, e os considero os pilotos mais interessantes que vi na Fórmula 1 até hoje. Assim, tenho prazer em colocá-los juntos num mesmo texto.

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Entre 1981 e 1991, o Brasil venceu o campeonato mundial por seis vezes na Fórmula 1; a Fórmula Indy e as 500 Milhas de Indianápolis em 1989; a F-3000 em 1988 e 1991; o Campeonato Mundial de Marcas em 1987; a F-3 inglesa em 1983, 1985 e 1991; o GP de Macau com Moreno, Senna e Gugelmin… Mas, tudo isso talvez não tivesse ocorrido se Nelson Piquet não tivesse resgatado o fio estendido por Emerson Fittipaldi dez anos antes, e que ameaçava afundar junto com a morte de José Carlos Pace e o sonho da equipe brasileira, ridicularizada de forma muito injusta pela imprensa nacional.

Com a aposentadoria de Emerson, o sucesso brasileiro no topo do esporte a motor corria o risco de não ter herdeiros, da mesma forma como aconteceria anos mais tarde com as conquistas de Guga no tênis – tanto mais com o automobilismo sendo cada vez mais visto como fonte de piadas de mau gosto. Sob este aspecto, portanto, a conquista de Piquet em 1981 não poderia ter sido mais oportuna ou importante para o esporte a motor nacional.

E não apenas oportuna, mas também bastante difícil. Trinta anos atrás, seria possível dizer que a Brabham teve o melhor carro em pista apenas em três das 15 corridas válidas para o mundial: Brasil, Argentina e San Marino. Uma vantagem obtida através da inventividade da equipe, burlando a proibição às minissaias através de prolongamentos laterais da carenagem, sustentados por uma suspensão hidropneumática que cedia sob a carga aerodinâmica das altas velocidades.

Antes que a inovação fosse copiada pelos rivais, Nelson venceu na Argentina e em Ímola, e provavelmente teria vencido também no Rio, se não tivesse sido obrigado a largar com compostos lisos em pista molhada, justamente em função da dificuldade causada pelo novo aparato às trocas de pneus. Além dessas provas, Nelson teve carro realmente competitivo em apenas outras três oportunidades: em Mônaco, na França e na Holanda. A vitória de Piquet em Hockenheim foi inesperada e se deveu a boas doses de sorte e competência, posto que o brasileiro teve que adaptar sua pilotagem a um carro que tornou-se extremamente dianteiro a partir do momento em que teve uma de suas minissaias danificada.

Apesar de não ter o melhor carro do ano e de ter perdido vários pontos por azar, erros ou uma manipulação infame de resultado no GP da França, Nelson se beneficiou da fragilidade mecânica dos carros da Renault e, sobretudo, da guerra fratricida entre os dois pilotos da Williams para se manter na briga até o fim. E mesmo guiando no limite e trabalhando muito na evolução do equipamento, foi somente ao fim da última corrida que ele assumiu pela primeira vez no ano a liderança do campeonato.

Nelson Piquet campeão do mundo em 1981 foi o resultado de uma campanha tão difícil e madura quanto a de Fittipaldi em 1974, num momento em que o automobilismo nacional precisava demais de um novo sopro de otimismo.

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Entre 1981 e 1984 Nelson Piquet foi, sem sombra de dúvida, o melhor piloto da Fórmula 1. E muito mais que as vitórias ou os dois campeonatos, são suas atuações em corridas e testes que dão total respaldo a esta afirmativa.

Tendo sido campeão em 1981, Piquet percebeu que o futuro residia nos turbos e abriu mão do campeonato seguinte em busca do estabelecimento de uma hegemonia no médio prazo. Ao longo do ano que cobrou as vidas Paletti e Villeneuve, Nelson mostrou-se sempre rápido e disposto a experimentar soluções como o reabastecimento, antes que algum novo problema mecânico novamente o levasse a abandonar mais uma corrida. Em 1983, como todos sabem, ele liderou a pequena Brabham na histórica campanha que coroou o primeiro motor turbo campeão do mundo, batendo a poderosa Renault que há muito mais tempo desenvolvia aquela tecnologia.

Por fim, em 1984, Nelson e a Brabham formaram o único conjunto que efetivamente fez frente ao domínio da McLaren, senão em resultados, ao menos em treinos e durante boa parte das corridas. Suas atuações soberbas em corridas como África do Sul, Canadá, Detroit e Grã-Bretanha são, ainda hoje, muito menos lembradas do que mereceriam.

A partir de 1985, no entanto, com sua temporada condenada de antemão graças ao contrato firmado entre Bernie Ecclestone e a Pirelli, Nelson parece, pela primeira vez, um tanto desinteressado. Mesmo a grande vitória em Paul Ricard, sob calor mediterrâneo, parece mais confirmar do que contrariar esta observação, ao sugerir que ele talvez fosse capaz de andar um pouco mais nas demais corridas. A transferência para a Williams, anunciada antes do fim da temporada, piora ainda mais as coisas, ao afastar o bicampeão do desenvolvimento do carro. Não por acaso, a Brabham jamais voltaria a vencer um grande prêmio.

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Concluo na segunda-feira.

Márcio Madeira

Márcio Madeira
Márcio Madeira
Jornalista, nasceu no exato momento em que Nelson Piquet entrava pela primeira vez em um F-1. Sempre foi um apaixonado por carros e corridas.

7 Comments

  1. Salve Humberto! Pois é, meu amigo, eu penso que todo amante do esporte a motor tem uma temporada especial, na qual deixou de ver as corridas simplesmente porque elas estavam passando, e passou a assistir e gravar por opção.
    Curiosamente eu passei pela mesma coisa, também aos 13 anos. E por sorte, essa minha experiência ocorreu justamente em 1991, no tri do Ayrton.
    Lembro de absolutamente tudo daquele ano, tenho tudo gravado, e tenho a felicidade de ter entrevistado três dos quatro brasileiros que competiram naquela temporada. Infelizmente, o campeão se foi antes que eu tivesse a chance de completar a turma.
    Abraço, e escreva sempre.

  2. Humberto Luís Mendes disse:

    Amigo Marcio, grande post! Lembro da temporada 1981 com muito carinho, pois certamente foi a mais importante para a minha “carreira” de fã da F1. Do menino que via uma ou outra corrida nos anos 70, passei em 1981 ao adolescente com 13 anos que nunca mais deixou de ver nenhuma corrida, religiosamente, até 1994 quando o Senna morreu. Depois disso, continuei assistindo regular mas não religiosamente à F1.
    Mas voltando ao ano de 1981, lembro bem da temporada, lembro do Piquet se afirmando cada vez mais como um grande piloto, rumando a um título que pela lógica estava nas mãos da Williams.
    E naquele inferno de Las Vegas (corrida no estacionamento do Hotel, terreno praticamente plano, num calor insuportável) ele se sagrou como o segundo piloto brasileiro a ser campeão, nosso terceiro título!
    Parabéns, excelente texto e fantásticas lembranças.
    Abraços,
    Humberto

  3. Fernando e Arlindo lembraram bem. De fato, o desinteresse da Globo em relação à F1 foi um sinal claro do risco que nosso esporte a motor corria naquele fim da década de 70. A rigor, as provas de 1980 foram transmitidas pela Bandeirantes, com narração do Galvão e comentários de Giu Ferreira. Com as vitórias do Piquet a Globo retomou o interesse, e em 1981 ela novamente escalou Luciano do Valle para a narração, ajudando mesmo a confundir a memória.
    O mais importante, no entanto, é perceber o quanto a participação brasileira na F1 andava em descrédito.
    Abraços!

  4. era bom ter bons pilotos brasileiros…. quando teremos um novo piloto braço de verdade??

  5. Arlindo Silva disse:

    A globo transmitiu a F1 em 1981. Foi em 1980 que a Bandeirantes transmitiu as corridas.

    A única corrida que a Bandeirantes transmitiu em 1981 foi a prova do campeonato alternativo do Bernie Ecclestone (WFMS) em Kyalami.

  6. Fernando Marques disse:

    A temporada de 1981 foi muita equilibrada. Foram 15 etapas e 7 vencedores:
    Nelson Piquet/Brabham – 3 V – Argentina, San Marino e Alemanha
    Alan Prost/Renault – 3 V – França, Holanda e Italia
    Gilles Villenueve/Ferrari – 2V – Monaco e Espanha
    Jacques Laffite/Ligier – 2 V – Austria e Canadá
    Alan Jones/Willians- 2V – EUA Oeste e EUA Detroit
    CArlos reutman/Willians – 2V – Brasil e Belgica
    John Watson/Maclaren – 1V – Inglaterra

    Isto sem falar que o companheiro de Piquet na Brabham era um tal de hector Rebaque (Mexicano) em que nada ajudou …

    Fernando Marques

    Niterói RJ

  7. Fernando Marques disse:

    Marcio,

    um fato interessante tambem aconteceu na Formula 1 em 1981 … como voce mesmo disse havia um desanimoo em relação aos brasileiros na F.1 por causa a morte do Moco e pelo fato do Emerson correr na Copersucar … a TV Globo não transmitiu a temporada pois tambem não acreditou em Piquet, mesmo ele tendo sido vice campeão em 80 … quem transmitiu a temporada foi a Bandeirantes e Luciano do Valle que apresentou ao Brasil o primeiro titulo do Piquet. Vendo o vacilo a Globo retomou as transmissões em 82.

    Fernando Marques
    Niterói RJ

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