Paulada na moleira

Desfazendo mitos — parte 1
01/11/2024
Desfazendo mitos — final
08/11/2024

É cada vez mais raro a Formula 1 nos proporcionar cenários em que temos a certeza que a importância do piloto foi absolutamente preponderante no resultado. Isso porque sabemos da imensa parcela do equipamento nessa equação.

O que Max Verstappen fez no GP de São Paulo 2024 foi, fundamentalmente, uma vitória de piloto. Mesmo notadamente não tendo o melhor equipamento e com uma desafiadora 17ª posição de grid no apagar das luzes vermelhas, o holandês sobrou diante da concorrência em uma corrida disputada com diversos graus de chuva.

Ora, mesmo líder da tabela desde o começo, Max não vencia há 10 corridas. E é claro que questionamentos começam a circular, sobretudo pelo seu (repreensível) comportamento em situações pontuais dentro e fora da pista. Mas a performance genial em Interlagos não deixa dúvida alguma sobre seu incrível talento.

Uma coisa (e aqui não estou colocando meu juízo) é não gostar de Max e/ou não concordar com algumas de suas atitudes. Outra é não reconhecer que ele é absurdamente rápido com um carro de competição – e isso inclui também o universo das corridas virtuais, onde ele também é um dos pilotos mais destacados do mundo.

Podemos medir a genialidade de sua performance quando constatamos que ele marcou a volta mais rápida 17 vezes durante a corrida. E que nove delas foram as mais rápidas de toda a corrida.

Nosso canal de Youtube está para completar 1 ano de muito conteúdo sobre esporte a motor. Toda semana com análises dos GPs da F1, entrevistas exclusivas e pautas especiais sobre história, além dos cortes com o que de melhor foi falado.

Para este fim de semana, além da análise habitual da corrida, ainda contamos com o relato testemunhal do querido amigo e parceiro João Carlos Viana, que saiu da capital do Ceará (cujo nome não vou escrever) para assistir a corrida das arquibancadas, com todas as dores e delícias de ser um espectador in loco.

Para quem não viu, vale a visita. E claro, aproveito para reforçar o convite para que ative as notificações e faça uma visitinha ao diretório de vídeos.

Claro que ainda estamos em pleno aprendizado, aprimorando formatos. Apesar de jornalista, eu sou péssimo em frente à câmera e nosso equipamento audiovisual é, sim, uma bela porcaria. Mas pelo menos no conteúdo, a gente se garante. Quem não viu ainda, vai gostar bastante – assim espero.

Max no controle, Lando sem controle: a foto que resume à perfeição os rumos do campeonato 2024

A vitória de Verstappen acontece em um momento de definição dos rumos de uma temporada cheia de “opa, isso não estava no script”. Interlagos não foi apenas uma vitória de Max. Foi principalmente uma paulada na moleira de Lando Norris que praticamente sela o quarto – e merecido – título consecutivo para o holandês.

Norris, apesar de evoluído ao longo do ano de promessa para piloto de ponta, ainda não tem uma relação íntima com a vitória; muito menos tem musculatura para ser um candidato a título mundial. Tais estágios precisam continuar evoluindo, porque ainda não é suficiente para uma McLaren que desde Miami tem o melhor carro do grid. Norris provou que não é um Martin Brundle. Agora tem que provar que não é a versão atualizada de David Coulthard.

Lando continua sendo bonzinho demais nas divididas de bola, hesitante nas largadas (em Interlagos era pole…) e comete mais erros sob pressão do que um candidato a título deve cometer. Ele até mesmo partiu com o carro em uma largada abortada em Interlagos! Ficou barato não ser punido esportivamente.

Também é sorte para ele seu companheiro Oscar Piastri ter sido bastante discreto nos últimos três GPs, abaixo do que havia mostrado até então. Talvez Lando não tenha a mesma sorte ano que vem. Pilotos, ao longo da carreira, constroem reputações – sejam elas positivas ou negativas. Seria horrível para Norris ficar com a fama de frouxo.

Piastri teve que ceder posição para Norris na Sprint Race do sábado

Ainda sobre McLaren, esta deve uma explicação. Pediu para seus pilotos trocarem de posição, favorecendo Norris numa Sprint Race que vinha sendo liderada por Piastri. E depois de levar a cacetada que levou de Verstappen na corrida, veio com o discurso “o título de pilotos para Norris nunca foi nosso principal objetivo”.

Assim como se pergunta sobre o Scooby-Doo, coerência, cadê você?

Ao procurar a coerência desaparecida, também nos deparamos com um regulamento que não tenho outro adjetivo, a não ser classificá-lo como imbecil.

Entre a Qualificação e o GP, você está sob a regra do Parque Fechado, que te priva de regular o carro para enfrentar chuva, ou vice-versa. Mas numa situação de bandeira vermelha e corrida interrompida, você pode mexer no carro.
É um problema descarado e idiota demais para não ser notado.

Russell liderou o primeiro terço de corrida, mas na chuva, o carro alto não era competitivo

Em tempo seco, as Mercedes começaram o fim de semana competitivas e depois sumiram, ainda que George Russell tenha liderado o primeiro terço da corrida, aproveitando-se que Lando nunca falha em falhar na largada quando na pole.

Explica-se: não é de hoje que a competitividade da Mercedes está diretamente relacionada à capacidade do carro ser baixado o máximo possível em relação ao solo. Foi assim na Bélgica e na Inglaterra – não por acaso, duas vitórias da equipe.

A configuração de carro baixo não apenas era nítida durante o primeiro treino, como o próprio JC confirmou isso como testemunha ocular, já que o assoalho estava batendo demais no chão.

E aí chegamos a duas situações: primeiro, de constatar que o novo asfalto de Interlagos (por contrato, renovado a cada 10 anos) tá cheio de indesejáveis ondulações. Vem cá: quando é que vão aprender a fazer um serviço bem feito?

Já em tempo molhado, mais uma vez foi vergonhosa a performance do pneu de chuva pesada da Pirelli, de borda azul. É um pneu inútil, porque com chuva severa ele não funciona bem, e com chuva leve, pilotos usam o pneu intermediário de borda verde.

Quando é que a F1 vai deixar de passar pano e admitir que isso é um enorme problema? Só não vou espinafrar mais por aqui porque já fiz isso no vídeo, a partir de 41min30s.

Franco trouxe os apaixonados argentinos de volta à F1

Tivemos uma grande invasão argentina em Interlagos. Franco Colapinto trouxe uma legião de novos fãs para a Formula 1, como a gente já havia testemunhado recentemente com a campanha vitoriosa da Argentina na última Copa do Mundo, no Catar. E que torcida apaixonada é essa argentina, dá gosto de ver.

Não apenas isso, Franco também atesta que a F1 precisa renovar seu grid, e isso tem sido feito após um longo e tenebroso período sem mudanças nos assentos disponíveis.

Elogio instantâneo: a equipe de fiscais de Interlagos é de uma eficiência exemplar. As remoções de carros acidentados foi sempre muito mais rápida que qualquer outra pista.

Precisamos falar sobre Lance Stroll.

Se antes havia ainda alguma diplomacia e um grau acentuado de discrição sobre o tema, agora vários comentaristas já falam abertamente o óbvio: ele é o elo mais fraco de todo ambicioso projeto que envolve a Aston Martin na Formula 1. E palavras como “dispensa”, “demissão” e congêneres marcam presença nos textos.

Ele fez uma besteira na Q2 que arruinou as chances de Verstappen entrar na Q3 e na corrida, bem… qual corrida, né? Atolar o carro na brita daquela maneira constrangedora não combina com alguém que tem experiência de mais de 160 largadas na categoria.

Já falei algumas vezes e repito: há uma saída honrosa para Stroll, que é ele migrar para o programa de WEC da Aston Martin, que vai amadurecendo o desenvolvimento do Valkyrie. Testes de pista já estão sendo realizados e, uau, que som de V12 aquele carro tem! Mal posso esperar para ouvir isso em Interlagos ano que vem.

Hamilton com a McLaren-Honda MP4/5B e bandeira brasileira à mão

Tivemos uma enxurrada de “Senna” no fim de semana do GP. E os 30 anos do falecimento acabaram por fazer o papel de “números redondos” para justificar a grande quantidade de ações.

Precisei refletir um pouco sobre isso. E chegar à conclusão de que há uma clara virada de chave nisso tudo. Explico. Até umas décadas atrás, tudo relacionado a ações envolvendo o nome Senna era voltado para o público que testemunhou sua carreira, seja pela TV, seja pela presença como espectador no autódromo. Ou seja, me encaixo nesse grupo.

Mas agora isso mudou. As ações são para apresentar um Senna a quem não viu. É para uma nova geração que já se empolgou com a Formula 1 através do Drive to Survive e que agora também terá a série Senna na Netflix a estrear dia 29. São conteúdos que eu até posso/poderia assistir. Mas não são pra mim.

Sobre a escolha de Lewis Hamilton para pilotar a McLaren de 1990, ela faz todo sentido e as polêmicas levantadas, sinceramente, acho infrutíferas. Hamilton é o senhor dos números da Formula 1, admirador de Senna e que, claro, conseguiria a maior repercussão possível para o evento, dada sua enorme popularidade entre milhões de seguidores.

E como lembrou o Márcio Madeira, não bastasse isso, Hamilton pilotar é a reverência estrangeira ao nosso talento brasileiro. Se fosse um piloto brasileiro, este status seria perdido. Isso você não encontra no texto de ninguém – só na nossa análise do GP em nosso canal de Youtube.

Minha única reclamação nisso tudo é o risco da “monocultura”, termo que não exige explicações mais extensas.

Emerson Fittipaldi acabou de completar 50 de seu segundo título mundial, que também foi o primeiro da McLaren. Lamentavelmente, nada foi feito no fim de semana para comemorar este enorme feito – mesmo com a presença de Emerson no paddock.
Também seria muito relevante uma homenagem ao gigantesco Wilsinho Fittipaldi, que nos deixou neste ano.

Ano que vem teremos a celebração de 50 anos da vitória de Pace. Sim, aquele que dá nome ao autódromo. Preciso dizer mais alguma coisa?

Mattia Binotto, diretor da Sauber, dá boas vindas a Bortoleto

E hoje, em meio ao fechamento deste texto, tivemos a confirmação de Gabriel Bortoleto como titular da Sauber em 2025, a fazer dupla com Nico Hulkenberg. Após um longo inverno desde 2017, temos um brasileiro titular no grid.
Talentoso ele é. Veremos como a imprensa e como a própria torcida vai processar essa novidade.

Abração!

Lucas Giavoni

Lucas Giavoni
Lucas Giavoni
Mestre em Comunicação e Cultura, é jornalista e pesquisador acadêmico do esporte a motor. É entusiasta da Era Turbo da F1, da Indy 500 e de Le Mans.

2 Comments

  1. Fernando Marques disse:

    Lucas,

    O GP de São Paulo foi o melhor de todos até aqui em 2024 .
    Verstappen é hj em dia disparado o melhor piloto da formula 1 .
    Quem pode desbanca-lo?
    Hamilton na Ferrari

    Fernando Marques
    Niterói RJ

  2. RAFAEL FRIEDRICH RUDOLF BRANDÃO MANZ disse:

    Nunca me arrependo de vir aqui, bom final de semana a todos.

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