Max Verstappen chegou à Miami farejando sangue. Para um animal competitivo como o neerlandês, perder duas vezes num mesmo final de semana para o seu companheiro de equipe, como aconteceu em Baku, deve ser uma dor lacerante para Verstappen, ainda mais com Sérgio Pérez se engraçando no campeonato. Verstappen já estava na F1 e pilotando nas primeiras posições em 2016 quando Nico Rosberg conseguiu tirar um título que estava endereçado à Lewis Hamilton, quando a Mercedes nadava de braçada, assim como ocorre com a Red Bull em 2023. Verstappen já tem a mentalidade mais sólida do que Hamilton em sua décima temporada de F1, na ocasião da derrota para Nico. Max não precisava apenas da vitória. Max precisava de uma consagração nesse final de semana.
E Verstappen o fez na sem graça pista de Miami. Largando apenas em nono fruto do destino (e de mais uma presepada de Leclerc no sábado), Verstappen escalou o pelotão usando apenas a força do seu Red Bull RB19 nas primeiras voltas. Ao natural. Quando só teve Pérez à sua frente, Max soube administrar seus pneus duros por mais de quarenta voltas com um ritmo competitivo antes de dar um xeque-mate em Checo Pérez e vencer uma corrida que mostra de forma cristalina um recado de Verstappen ao mexicano: nem venha, Checo, o título de 2023 é meu!
Conhecida por ser a Cidade Mágica, Miami se notabiliza pelo seu caldeirão cultural, com vários latinos morando na cidade da Flórida, além de um ambiente descontraído, como toda cidade a beira mar. Porém, isso não explica totalmente as equipes de F1 quererem mostrar novas cores em seus equipamentos e os pilotos trazerem capacetes com cores vibrantes, para usar um adjetivo ameno para brega. A pista de rua ao redor do estádio do Miami Dolphins nem parece muito um circuito de rua, com curvas abertas e praticamente sem nenhuma curva de esquina, como se caracterizam as pistas citadinas. Fora das pistas, uma imensidão de celebridades e convidados especiais aparecem no paddock.
Antes mesmo do final de semana de competição se iniciar, os pilotos já avisavam que a pista de Miami, que foi totalmente recapeado após as críticas do ano passado, poderia trazer inúmeras dificuldades de ultrapassagem, como foi visto semana passada em Baku. Essa era a esperança de Pérez após a classificação desse sábado, quando o mexicano ficou com a pole, enquanto Verstappen sairia apenas em nono após cometer um ligeiro erro na classificação e ter sua segunda tentativa abortada por uma batida de Charles Leclerc. Na mesma curva onde batera no dia anterior, diga-se. Em todos os treinos Verstappen mostrava uma superioridade flagrante em cima de Pérez e mesmo com toda a torcida a seu favor, Checo não contava com um Verstappen motivadíssimo para acabar com essa história de Rei das Ruas, alcunha ganha por Pérez semana passada, após as vitórias em Baku.
Como vem sendo norma nessa temporada, as equipes trataram de se programar para apenas um pit-stop, mas quem largou mais atrás optou por sair com pneus duros, esticando o primeiro stint antes de colocar os pneus médios. Já quem estava na frente, querendo se colocar bem após a largada, que poderia ser decisiva como fora em Baku, optaram pelo composto médio, parando o mais breve possível para colocar os pneus duros e terminar a corrida assim. Talvez um Safety-Car poderia ajudar esse pessoal que optou pelos médios, ainda mais num circuito de rua, mas como dito anteriormente, Miami tem várias situações diferentes, começando pela apresentação dos pilotos antes da largada até o fato de que o SC não deu as caras em nenhum momento nas 57 voltas de corrida, numa prova sem nenhum abandono.
Alonso declarara que iria para cima de Pérez na primeira curva, mas como gato tem medo de água fria, Checo imediatamente fechou o caminho de Alonso na largada e se manteve na ponta, seguido por Alonso e Sainz, continuando o top-3 com língua espanhola. Magnussen, que também se beneficiou da bandeira encarnada trazida por Leclerc no sábado, saiu muito mal e rapidamente caiu de quarto para sétimo, engolido por Gasly, Russell e Leclerc. Max largou de forma tão cautelosa, que chegou a perder a nona posição durante a largada, recuperando-a ainda na primeira volta ao ultrapassar Ocon. Antes mesmo que o DRS pudesse ser usado, Verstappen iniciava sua corrida de recuperação com ultrapassagens cirúrgicas, enquanto suas vítimas nem colocavam muita objeção. O ritmo da Red Bull hoje é tão superior às demais nove equipes da F1, que qualquer batalha com Checo ou Max é uma mera perca de tempo para os demais dezoito pilotos.
Mais à frente, Pérez não abria uma grande diferença para a dupla hispânica, com Alonso ficando confortavelmente à frente de Sainz. Essa falta de ritmo de Pérez com os pneus médios acabaria por prejudicar sua corrida de forma decisiva. Enquanto você lia isso… Max já estava fungando no cangote de Sainz, para entrar no pódio. Newey é um gênio não apenas pelo conjunto da obra, mas por pequenos detalhes. O DRS da Red Bull é tão mais eficiente que os demais carros, que basta um carro azul abrir a asa que deltas de até 20 km/h surjam, deixando os pilotos à frente dos carros da Red Bull ainda mais indefesos. Enquanto isso, Max já ultrapassara a dupla espanhola e não estava nada distante de Pérez.
A grande verdade foi que Verstappen parecia estar querendo mostrar algo, mesmo que ninguém duvide da capacidade do neerlandês. Rei das Ruas? Max mostrou num circuito de rua quem é que manda na F1 e, principalmente na atual temporada, na Red Bull. Mesmo com pneus duros, Verstappen já estava 1,3s atrás de Pérez quando este foi aos boxes colocar os mesmos pneus duros de Max. Com borracha nova, Pérez foi ligeiramente mais rápido do que Max no início do segundo stint dele, mas não demorou para, com pneus com mais de trinta voltas de idade, Verstappen igualar o ritmo de Pérez e ainda tirar voltas mais rápidas, quando foi necessário. Como diria Prost trinta e cinco anos atrás: Max não queria derrotar Checo. Ele queria humilha-lo! Faltando doze voltas para o fim, Verstappen foi aos boxes colocar pneus novos. Pelo rádio, a Red Bull dizia que Max sairia dos pits com 1,7s de desvantagem. Na realidade, ele saiu com… 1,6s! Porém, com a fome de Verstappen nesse final de semana, era até covardia. Com pneus médios novos, Verstappen demorou pouco mais de uma volta e meia para completar a manobra decisiva. Pérez tentou. Colocou seu carro por dentro, freou no limite, mas nada que o chicano pudesse fazer poderia impedir Max Verstappen de conquistar a sua 38º vitória na carreira e dar uma resposta definitiva para Pérez.
Na briga pelo resto, Alonso esticou sua parada sabendo que Sainz tinha errado e ultrapassado o limite de velocidade nos pits, ganhando um pênalti de 5s. Além do mais, é sabido o tratamento nada amistoso que a Ferrari tem com os pneus Pirelli. Mesmo saindo atrás do compatriota quando fez sua parada, Alonso não demorou muito para ultrapassar Sainz e garantir o terceiro lugar, seu lugar cativo em 2023 e onde Alonso deverá terminar no final do ano. Com a Ferrari comendo pneus vorazmente, Sainz não apenas perdeu contato com Alonso, como acabou ultrapassado por George Russell, que fez uma corrida sólida, como é a característica do inglês. Leclerc fez uma corrida mequetrefe, onde sofreu horrores para ultrapassar a Haas de Kevin Magnussen. O monegasco levou dois trocos do danes e o sétimo lugar ainda pode ser considerado lucro para o final de semana de Lecrash…quer dizer, Leclerc!
Hamilton não foi ao Q2, não largou bem, reclamou de um toque que só estava na cabeça do inglês, que chegou ao circuito de Miami com um estilo para lá de cafona domingo pela manhã. Lewis acabou se recuperando quando colocou pneus médios e fez várias ultrapassagens, culminando com a sexta posição tirada de Leclerc já nas voltas finais. Mesmo assim, a temporada da Mercedes até o momento vem sendo decepcionante e Toto Wolff não cansa de verbalizar isso, quase que cobrando seus engenheiros publicamente por soluções. O novo pacote da Mercedes surgirá em Ímola na próxima quinzena, mas Wolff já parece exausto em ter que dar explicações do porquê a Mercedes não ter nenhuma consistência em 2023, com seus pilotos ora indo ao pódio, ora penando para passar ao Q2. Já a Ferrari sofre de algo parecido, mas ao inverso. Charles Leclerc pode mostrar muito mais do que nesse final de semana e já foi pole em 2023, mas em ritmo de corrida a Ferrari cai de rendimento de forma assustadora.
Outra equipe que parece já ter problemas para explicar aos seus acionistas ter tantos desempenhos abaixo do esperado é a Alpine. Sendo uma equipe de fábrica, tendo todo o apoio da Renault, surgiu a informação de que a Alpine poderá ser parcialmente vendida por um fundo de investimento americano, enquanto o CEO da Alpine Laurent Rossi já trata os resultados da equipe como inaceitáveis. Otmar Szafnauer deve estar com o seu cargo na reta, enquanto os dois pilotos, tratados como arquirrivais pelo rapper que apresentou os pilotos antes da largada, optaram por táticas diferentes, mas acabaram chegando próximos, com Gasly em oitavo e Ocon em nono. Correndo na casa da equipe e tendo o mérito de ter segurado por mais da metade da corrida uma Ferrari, Magnussen levou a Haas ao último ponto numa corrida onde, de novo, não teve um único abandono sequer.
Na classificação a Aston Martin resolveu apostar que seus dois pilotos só utilizariam um jogo de pneus macios novos durante o Q1. Alonso passou ao Q2 tranquilamente, enquanto Stroll amargou um ridículo 18º lugar. O problema da Aston Martin é querer que Stroll faça a mesma coisa de Alonso. Isso é quase que pedir que o Sport do Recife marque cinco pênaltis em cima do Richard, goleiro do tricampeão do Nordeste. Simplesmente não dá! O resultado disso é que enquanto Alonso foi ao pódio, Stroll foi apenas décimo segundo, tendo marcado um pouco mais de um terço dos pontos amealhados por Alonso até agora. Ao contrário de outras oportunidades, Alonso sabe que para ter a equipe ao seu lado, ele tem que afagar seu companheiro de equipe, não o destruir. Tanto que Fernando elogiou Stroll pela manobra que lhe valeu a décima terceira posição. Nem o Funcionário do Mês da Aston Martin faria melhor.
Nesse domingo surgiu a notícia da chegada de Gil de Ferran como consultor da McLaren e pelo o que a equipe comandada por Zak Brown mostrou em Miami, Gil terá muito trabalho pela frente. Outro que deverá ser cobrado em breve será Mark Webber, que convenceu Oscar Piastri a trocar a Alpine pela McLaren em 2023. Uma troca bem longe de ser vantajosa até o momento…
Desde o começo desse milênio a F1 vai vivendo de domínios, com algumas exceções aqui e ali. A única esperança de que haja alguma briga pelo campeonato é se os dois companheiros de equipe do time dominante sejam do mesmo nível e briguem forte pelo título. Max Verstappen tratou de dar uma resposta enfática para todos em Miami: não haverá emoção em 2023. O tricampeonato de Max virou, se alguém ainda tinha alguma dúvida, uma mera questão de tempo.
Abraços!
João Carlos Viana
3 Comments
JC Viana,
só em sonhos ou pensamentos Sergio Peres um dia será campeão pela RBR tendo Verstappen como compamheiro de equipe.
Esse jogo de equipe está me parecendo uma novela bem escrita pelos cabeças da equipe.
Sabe o que atrapalha o campeonato este ano?
A Mercedes não incomoda em nada a ninguém nas pistas.
Fernando Marques
Niterói RJ
Excelente coluna. Quando eu queria lembrar de alguma temporada de F-1 posterior a 2007 sempre visitava o seu site. Vc é fera!!
Obrigado André!