Saudades

Super Sic
24/10/2011
Bem-vindos a Índia!
28/10/2011

Atenção, brasileiros. Se Kimi tomar o lugar do Rubens, Kubica reassumir o seu e o Ferrari do ano que vem não favorecer o estilo do Felipe, preparem-se, porque o nosso jejum de títulos pode acabar sendo maior que o dos italianos.

Nosso faiscante chefe teve a ideia de mostrar uma série de carros de outro planeta de outros tempos. Aplausos efusivos. Começou com a legendária Alfa 158 e a não menos famosa Ferrari 500. Carros italianos e pilotos italianos dominando o início da F1 “dopo guerra”, enfim. O início da transformação dessas marcas em mitos.

No momento em que a Itália chora a morte de Simoncelli e a evolução errática da F150 (a nova asa dianteira não foi bem), sem falar na ausência – há décadas – de um piloto italiano capaz de se tornar campeão do mundo na F1, talvez seja o momento de relembrar Alberto Ascari. O primeiro campeão do mundo com Ferrari e o último italiano.

Parêntesis: sobre nova asa dianteira, cuidado com a Mercedes; parece que a deles vai suprir a falta do F-Duct.

Alberto Ascari nasceu em 13 de julho de 1918, filho de Antonio Ascari, um dos maiores pilotos de sua época, nos primórdios das corridas de automóvel. Portanto, Alberto praticamente nasceu no meio das corridas. Antonio morreu quando liderava o GP da França, disputados em Montlhèry, duas semanas antes do filho completar 7 anos. Como Damon Hill e Jacques Villeneuve posteriormente, a morte do pai não fulminou o amor pelo automobilismo.

Assim que ganhou idade e liras suficientes, Alberto comprou uma motocicleta e saiu em disparada. Foi tão rápido que logo passou para os carros e sua primeira corrida foi simplesmente as Mille Miglia de 40, mesmo ano em que se casou. O carro era uma Ferrari. Enzo, que tinha sido companheiro de equipe e grande amigo de Antonio, passou a prestar atenção no rapaz mas aí veio a guerra.

Enzo o contratou em 49, dois anos depois que Alberto voltou a correr, junto com Luigi Villoresi, seu grande amigo e mentor. A dupla vinha obtendo sucesso em corridas locais entre 47 e 48 com Maseratis. Ascari teve oportunidade de pilotar uma Alfa 158 no GP da França, em Reims, em 48, fazendo um terceiro lugar atrás dos companheiros de equipe Wimille e Sanesi.

Ciccio (apelido de Alberto) correspondeu às expectativas do Comendador, vencendo seis corridas em 49, incluindo o GP da Argentina.

No ano seguinte deu nove vitórias para a Ferrari. Mais seis em 51, tornando-se vice-campeão do Mundial, atrás de Fangio, mesmo correndo contra as 158/159 alienígenas. Em 1952, tirou a barriga da miséria, empanturrando-se com 12 primeiros lugares. E olha que deixou de participar do GP da Suíça para participar das 500 milhas de Indianápolis.

Essa foi a única corrida que não venceu, sua Ferrari 4,5 litros teve um problema de rodas na 40a. volta e foi obrigado a abandonar. É preciso dizer que esse passeio schumacheriano ou vetteliano se deveu também à ausência forçada de Fangio, vitimado por um acidente em Monza, em junho. Em 53, Fangio estava de volta, acompanhado de Froilan Gonzales na Maserati, mas a dupla Ferrari/Ascari voltou a se impor, mostrando que o fator ausência não era determinante.

Uma característica interessante de Ascari era que ele se sentia mais à vontade quando liderava, o que o tornava praticamente imbatível. “Quando está na liderança, não é fácil ultrapassá-lo, na verdade isso é virtualmente impossível”, disse o próprio Enzo Ferrari.

Mas estava longe de ser um piloto relaxado. Os carros e capacetes da época deixavam os pilotos muito mais visíveis e era evidente que ele trabalhava muito concentrado. Seu estilo, ao contrário dos demais, que venciam as curvas em uma derrapada controlada continua, era construído com uma série de derrapagens curtas, quando andava no limite.

Em 54, ele deixou a Ferrari para apostar na inédita escuderia Lancia, que tinha construído seu primeiro e inovador carro de F1.

Mas a produção do carro atrasou e agora um novo predador estava em campo: a temível Mercedes com suas flechas de prata, pilotadas por Fangio, Moss, Kling etc. A sombra de um domínio tedesco voltou a pairar sobre as cores italianas. No campo dos pilotos, 54 foi um ano argentino, com Froilán se sagrando vice campeão.

 

Separador

 

Veio, então, 55. Com Ascari, Gigi Villoresi e Eugenio Castelotti, a Lancia finalmente parecia estar em condições de rivalizar com a esquadra prateada. Os três D50 quebram na Argentina, abertura da temporada, mas vencem duas corridas extra-campeonato. Chega o GP de Mônaco.

Fangio abandona na volta 50 com a transmissão quebrada. Moss passa à liderança com sua Mercedes W196. Ascari, tenso como costumava ficar quando não estava na liderança, mantém um bom ritmo e vai encurtando a distância. Na volta 81, Moss encosta nos pits, com o motor fumegando. Logo fica claro, para quem viu a cena, de que era fim da linha para a Mercedes. Pista livre para a Lancia obter sua primeira vitória. Os alto-falantes transmitem para a audiência que Moss já desceu do carro mas Ciccio, é claro, não tem como ouvir.

Ele contorna o Casino e apruma para a estação quando nota que os espectadores estão se agitando. Parece que estão tentando dizer alguma coisa. Parece que essa coisa tem a ver com ele. Estranho…
Mas ele tem que se concentrar em tirar o máximo da sua D50, na perseguição que move àquela maledetta W196.

Ele entra no tunel e quando sai, no meio daquela claridade, consegue perceber mais gente gesticulando e apontando para ele.
“Che cazz…!”

Bastou uma fração de segundo para ele afrouxar a concentração e com isso perder a chance de contornar a chicane. Fardos de feno pela frente e… TCHIBUM! Ele mergulha no mar com seu Lancia

O míssil vermelho torna-se lentamente um submarino e o às italiano é recolhido por ocupantes de um barco antes mesmo do resgate oficial.

Alberto entra em choque e é levado para o hospital. Felizmente, nada além de um nariz quebrado, se descontarmos a frustração, e quatro dias depois ele já na beira da pista de Monza, observando os treinos para uma corrida de carros esporte.

Pouco antes de sair para almoçar com sua esposa, Alberto resolve dar algumas voltas com a Ferrari de seu amigo Castellotti. Assim do nada. Tanto que nem tinha levado capacete, usa o do dono do carro.
Na terceira volta, saindo de uma curva rápida, que hoje leva o seu nome, o carro inexplicavelmente derrapa e capota duas vezes.

Ciccio é expelido, cai na pista, sofre múltiplos ferimentos e morre em poucos minutos.

 

Separador

 

Sua morte foi um trauma similar ao da perda de Ayrton Senna, atraindo condolências enviadas por chefes de estado europeus, por exemplo. O funeral teve lugar na Piazza del Duomo, em Milão, onde se viram bandeiras pretas com a inscrição “Na última linha de chegada encontre, Senhor, a alma de Alberto Ascari”.

Quem já esteve na Piazza Del Duomo sabe que é um dos lugares mais visitados da cidade, portanto sempre cheio de gente e barulhento. Dizem que nesse dia o silêncio era tanto que se podia ouvir claramente os telefones tocando nos escritórios vazios em volta.

Alguns dias depois, a Lancia se retirou oficialmente das corridas, repassando carros, motores, peças de reposição e desenhos técnicos para a Ferrari.

 

Separador

 

Atenção, brasileiros. Se Kimi efetivamente tomar o lugar do Rubens, Kubica reassumir o seu e o carro do ano que vem não favorecer o estilo do Felipe, preparem-se, porque o nosso jejum de títulos pode acabar sendo maior que o dos italianos.

E as saudades do Ayrton maiores que as que Alberto Ascari deixou.

Abraços

Carlos Chiesa

Carlos Chiesa
Carlos Chiesa
Publicitário, criou campanhas para VW, Ford e Fiat. Ganhou inúmeros prêmios nessa atividade, inclusive 2 Grand Prix. Acompanha F1 desde os primeiros sucessos do Emerson Fittipaldi.

7 Comments

  1. Fernando Marques disse:

    Caro Chiesa,

    obrigado pelos esclarecimentos a respeito das laterais do Lancia, por sinal um carro muito bonito e bem diferente em relação aos demais da epoca …

    Fernando Marques
    Niterói RJ

  2. Carlos Chiesa disse:

    Rubens e Felipe já mostraram que são capazes de vencer corridas. Só não mostraram ser capazes de superar consistentemente seus companheiros de equipe mais fortes, como Michael e Fernando.

    No caso do Senna, ainda não dá para cobrar nada dele. Este ano assumiu um carro que estava sendo desenvolvido por um piloto que foi demitido por falta de resultados. Natural que tenha altos e baixos, mas para poder mostrar serviço precisa ganhar quilometragem, portanto todos eles precisam realmente de um carro de ponta. Além disso, precisam se entender com os pneus.

    Conversando com meu amigo Gigante, ele observou que Webber andava bem com Bridgestone e este ano sumiu. Massa teve um ano desastroso com os Bridgestone e este ano reagiu com os Pirelli, ainda que tardiamente.

    Portanto aparentemente alguns pilotos conseguem manter o mesmo nivel de eficiencia com pneus diferentes, outros não.
    Sobre as laterais da Lancia, boa pergunta. O estilo de condução dos pilotos de ponta da época era baseado em derrapagem controlada. Os Alfa, Maserati e Ferrari eram feitos para derrapar. Vittorio Jano, ex-projetista da Alfa Romeo e um inovador por natureza, iniciou com esse carro a tendência atual, sem derrapagem nenhuma. Ele tratou de compactar ao máximo, concentrando o peso entre eixos e baixando o centro de gravidade. Isto o levou a um motor V8 inédito. Até então se usava 6 ou 8 em linha, portanto muito mais longos, e a colocação dos tanques de combustível e óleo no centro. São exatamente essas laterais a que você se refere.
    A disposição clássica do tanque de combustível era atrás do eixo traseiro o que, com o consumo gradual, terminava por afetar imensamente o balanço do carro. Jano também buscou solucionar isso com essa nova proposta.

    O sucesso veio em 56, sob a marca Ferrari, nas mãos de Juan Manuel Fangio.

  3. Fernando Marques disse:

    Caro Chiesa,

    seus argumentos estão certíssimos … e nem quis desmerecer o talento de Barrichello, Bruno Senna e Felipe Massa mas sim o equipamentos que eles dispõem … a Willians anda caduca faz tempo, a Lotus Renault uma promessa duvidosa e a Ferrari longe de comandar a pontaria no circo. Veja bem, não nego que o Barrichello ainda esteja na F1 por prazer, mas de que adianta ele estar na sua melhor tecnica tendo um dos piores carro do circo … A Lotus Renault não me parece bem estruturada como no passado … O Kubica faz falta sim mas estaria andando atras das RBRs, Mclarens e Ferrari (ao menos o do Alonso) … O Felipe Massa tem o melhor equipamento dos brazucas mas está tendo que se conformar em ser o 2º piloto e não faz nada por merecer ao contraio …


    Com relação a historia me parece claro que a LAncia já buscava novidades tecnologicas já naquele tempo … o que seria aquelas laterais dos carros alem de tanque de gasolina assim presumo?

    Fernando Marques

    Niterói RJ

  4. Carlos Chiesa disse:

    Ao Fernando:

    Possivelmente não mudaria nada, ao menos no curto prazo. No entanto, Rubens se diz no melhor momento de sua carreira. Penso que ele está falando com sinceridade. Talvez tenha resolvido alguns de seus pontos fracos. Nada impede que um profissional maduro continue a evoluir, desde que continue motivado. E o que o motivaria a continuar na F1, como já deixou claro ser a intenção? Certamente não é por dinheiro, assunto bem resolvido faz tempo. Da mesma forma que Michael, provavelmente é por prazer mais do que tudo. Talvez, talvez, ainda queira ter uma chance de ser campeão, a única coisa que realmente falta conquistar, sabendo-se que ele sempre foi um piloto tecnicamente talentoso. Quanto ao Bruno, a ultima corrida foi bem decepcionante, ao contrario da primeira. Então, qual é o verdadeiro Bruno? Para descobrir isso é preciso ganhar quilometragem. Se a gente for olhar para o Vettel, ele efetivamente se destacou ao ganhar o GP de Monza debaixo de chuva. Em contrapartida, o veterano Mark Webber, que a maioria provavelmente considerava como apenas mais um piloto no grid, conseguiu chegar perto do título no ano retrasado, surpreendendo a maioria dos observadores. Portanto existem muitos fatores a considerar, e o tempo é mais influente deles.
    Quanto ao ultimo e-m, fico feliz que goste dessas voltas ao passado. Costumo dizer que a gente deve olhar para o passado da mesma forma que olha para o retrovisor. Não é o foco principal, mas não se pode perder de vista.

    Para o Mauro:
    Pois é, a Lotus Renault iniciou a temporada com a cotação em alta e essa valorização acabou não se confirmando. A lógica indica que a ausencia do Kubica fez a diferença. Se não na pista, no desenvolvimento do carro. Tanto o Petrov quanto o Senna não parecem ter quilometragem suficiente na F1 para desenvolver o carro na direção certa.
    Recentemente a equipe levou um novo pacote aerodinamico para a pista no qual depositava grandes esperanças e… voltou pra trás. Neste ultimo GP, Senna visivelmente não conseguiu fazer o carro se entender com a pista, treinando no molhado e correndo no seco. Parece que só o simulador não resolve…

    Abraços

  5. Fernando Marques disse:

    Mais uma coisa … eu acho simplesmente fantastico as historias e biografias dos antigos pilotos da Formula 1 …

    Fernando Marques
    Niterói RJ

  6. Fernando Marques disse:

    Chiesa,

    vamos supor que o Kimi não volte a Formula 1 e que Kubica ainda não possa voltar a correr em 2012 … será que vai mudar alguma coisa em relação ao jejum de titulos brasileiros na Formula 1?

    Eu acho que não …

    Fernando Marques
    Nterói RJ

  7. Mauro Santana disse:

    É Carlos Chiesa, você tem razão!!

    A nós brasileiros, infelizmente na F1 não temos muito o que comemorar.

    Aproveitando a oportunidade, gostaria de fazer uma pergunta:

    Tanto Senna quanto Petrov não deveriam estar andando com esta Lotus Renault entre os 10 primeiros?

    O que acontece?

    Abraço!

    Mauro Santana
    Curitiba-PR

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *